Abusos sexuais de crianças e adolescentes: não podemos
‘aguentar
mais um pouquinho’!
The sexual abuse of children and adolescents:
we cannot, ‘bear it a little longer’!
Sabrina Pereira PAIVA*
http://orcid.org/0000-0001-7958-4843
Elaine Reis BRANDÃO**
https://orcid.org/0000-0002-3682-6985
Resumo: O artigo objetiva contrastar dados relativos
aos abusos sexuais sofridos por crianças e adolescentes brasileiras/os,
considerando o contexto da pandemia de COVID-19, com as políticas públicas para
seu enfrentamento, do governo J. Bolsonaro (2019-2022). Para tal, utiliza
fontes documentais e bibliográficas, extraídas de endereços eletrônicos públicos,
governamentais e não governamentais. Os dados nacionais recentes demonstram que
os casos ocorrem precipuamente entre 10 e 14 anos de idade, em suas próprias
casas, provocados por pessoas próximas. Não há registros seguros estratificados
por raça/cor. Em contraste, o Plano Nacional de Enfrentamento às Violências
contra Crianças e Adolescentes (2022) fundamenta-se em uma perspectiva
familista, privatista, ultraneoliberal e teocrática, além de não prever ações
estruturais de enfrentamento às desigualdades raciais, de classe social e de
gênero.
Palavras-chave: Violência sexual. Direitos sexuais. Políticas
sexuais. Infância. Adolescência.
Abstract: The article contrasts data on the sexual abuse
suffered by Brazilian children and adolescents, with the public policies of the
2019-2022 Jair Bolsonaro government for confrontation it, taking into
consideration the context of the COVID-19 pandemic. It uses documentary and
bibliographic sources extracted from public, governmental
and non-governmental electronic resources. Recent national data shows that
cases involve victims between the ages of 10 and 14, in their own homes, and
carried out by people close to them. There are no reliable records stratified
by race/colour. In contrast, the National Plan to Combat Violence against
Children and Adolescents (2022) is based on a pro-family, privatist, ultra-neoliberal,
and theocratic perspective, and does not provide for structural actions to confront
racial, social class, and gender inequalities.
Keywords: Sexual violence. Sexual rights. Sexual policies.
Infancy. Adolescence.
Submetido em: 23/8/2022. Revisto em: 4/1/2023.
Aceito em: 16/1/2023.
Introdução
O |
artigo tem como objetivo refletir
sobre os dados e informações relativos aos abusos sexuais[1] sofridos por crianças e adolescentes brasileiras/os, considerando o contexto da pandemia de COVID-19 e, por outro
lado, contrastar tais realidades com as políticas sexuais direcionadas a esse
fim, levadas a cabo pelo governo de J. Bolsonaro (2019- 2022). Trata-se de um
recorte proveniente de uma investigação mais ampla que analisa o debate
nacional contemporâneo a respeito da educação em sexualidade, voltada para
adolescentes e jovens no âmbito das políticas públicas[2].
De fato, ao inserir o termo educação sexual no buscador Google®,
deparamo-nos com certo número de reportagens retratando a importância da
educação em sexualidade para prevenção e identificação de casos de abusos e
violências sexuais. Esses textos fazem relação entre o aprendizado implicado na
educação em sexualidade e a denúncia de parentes ou pessoas próximas que,
normalmente, vivem sob o mesmo teto que as vítimas de agressão. Pode-se
exemplificar os títulos de conteúdos publicados em portais de notícias, tais
como: Em aula de educação sexual, menina denunciou abuso; idoso é condenado
(RODRIGUES, 2022); “Dez alunos denunciam abusos no ambiente familiar
após assistirem a palestras sobre violência sexual em escola” (AMOURY; MORAIS,
2022).
Conforme demonstra estudo
recente, a grande maioria das vítimas de violência sexual (abuso e exploração)
é menina, os abusos são, em geral, vivenciados nas residências das vítimas e os
autores são, em grande parte, conhecidos delas. Em 2020, ano marcado pela
pandemia de COVID-19, houve uma pequena queda no número de registros de violência
sexual. No entanto, analisando mês a mês, observa-se que a queda se deve
basicamente ao baixo número de registros entre março e maio de 2020 – período
em que as medidas de isolamento social estavam funcionando melhor no Brasil. Essa
queda deve se referir a um aumento da subnotificação, e não a uma redução nas
ocorrências (PANORAMA DA VIOLÊNCIA LETAL E SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES NO BRASIL, 2021).
No contexto pandêmico,
diversos órgãos internacionais chamaram atenção para a importância de
abordagens críticas de gênero no que se refere às respostas dos países, já que,
em tais períodos, as mulheres têm um risco aumentado de sofrer violência,
estupro, feminicídio, entre outras várias formas de manifestação da
desigualdade nas relações de gênero (ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DE SAÚDE, 2020). O relatório Estado de la población
mundial 2022, do Fundo de População das Nações
Unidas (FONDO DE POBLACIÓN DE
LAS NACIONES UNIDAS, 2022),
reitera como essencial que as políticas públicas considerem os diferentes
contextos sociais, nos quais há imensas disparidades em termos das relações
entre gêneros, classes sociais e raças. Observa-se que as relações sexuais
muitas vezes não são consensuais, sendo vivenciadas por pressão, coerção e
outras formas de abuso e violência sexual, como os casos de estupros que podem
redundar em gravidezes (FONDO DE POBLACIÓN DE LAS NACIONES UNIDAS, 2022).
Cabe ressaltar que, apesar de as reportagens citadas acima não
evidenciarem elementos relacionados à raça/cor e classe social das vítimas de
abusos sexuais, pelo teor de suas narrativas, pelas circunstâncias e outros
elementos contextuais elencados, é possível supor que se trata de crianças e
jovens que vivem em situações de pobreza, cercadas por violências e por
desproteção e desassistência do Estado. Diante de tal precariedade, suas
famílias acabam por se tornarem coniventes e responsáveis pelos casos de abuso
e violência sexual com suas crianças e adolescentes/jovens[3].
Por outro lado, conforme demonstra ampla literatura, percebe-se que o
início do século XXI, em vários contextos nacionais, é amplamente marcado pelo
acirramento das disputas entre as posições orientadas pela defesa da laicidade
do Estado, dos direitos humanos, entre eles, os direitos sexuais e reprodutivos,
e as posições neoconservadoras, defensoras do discurso religioso e da
antilaicidade do Estado (CÔRREA; XIMENES, 2022). Além disso, nota-se que, nessa
agudização do debate em torno das agendas relativas à democracia de gênero e
sexualidade, há uma imbricação inclemente entre o neoconservadorismo religioso
e o ultraneoliberalismo que podem ser entendidos como uma ameaça à democracia e
à secularização.
Nesse sentido, no âmbito da investigação mais ampla, vimos analisando o
desenvolvimento das políticas sexuais da gestão J. Bolsonaro (2019-2022) no que
se refere às diretrizes para a educação em sexualidade de crianças e jovens no
país. Neste artigo, pretendemos problematizar o enfrentamento público dessas
graves violações de direitos de crianças e adolescentes brasileiras/os, contrastando-o
com os dados publicados recentemente sobre os abusos sexuais por elas/es
sofridos.
Percurso teórico-metodológico
Trata-se de uma
investigação socioantropológica, que parte de uma perspectiva feminista,
decolonial e construtivista. Consideramos que os postulados decoloniais e dos
feminismos críticos nos oferecem uma perspectiva de análise mais complexa para
entendermos as relações e os entrelaçamentos de raça, classe, gênero,
sexualidade, geopolítica e geração na sociedade brasileira contemporânea (LUGONES,
2020). Nesse sentido, a busca por incorporar a perspectiva decolonial passa
pela compreensão da manutenção das relações coloniais de poder, as quais se
fazem presentes nas relações entre os países, entre países e sujeitos e entre
os sujeitos, colonialidade que é “[...] de
poder, saber, ser, natureza e linguagem, sendo também constitutiva dessas”
(LUGONES, 2014, p. 940). Supomos também uma articulação estreita entre os
temas relativos aos direitos sexuais e reprodutivos e os processos sociais que
configuram as fases da vida na contemporaneidade. Pensar relacionalmente tais
dimensões possibilita-nos compreender a sexualidade como mediadora das relações
sociais e, ao mesmo tempo, como constitutiva e constituinte da identidade
social, racial e de gênero de cada um dos sujeitos no período da infância,
adolescência/juventude (HEILBORN et al., 2006).
Metodologicamente, consideramos o material bibliográfico e documental
sobre o desenvolvimento das políticas de educação em sexualidade, em especial
durante a gestão governamental de J. Bolsonaro (2019-2022). Foram incluídos
documentos extraídos de fontes públicas governamentais e não governamentais,
disponíveis eletronicamente, os quais tratam do tema da educação sexual,
políticas familiares e outros conteúdos relativos ao gênero. Para este artigo,
consideramos os seguintes documentos: -Plano Nacional de Enfrentamento de Violências
contra Crianças e Adolescentes (BRASIL, 2022a);
- Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares - PeNSE- 2009-2019 (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2022); Guia de autocuidado e prevenção ao risco
sexual precoce e gravidez na adolescência (BRASIL, 2022b); - Panorama da violência letal e sexual contra crianças e
adolescentes no Brasil (PANORAMA DA VIOLÊNCIA LETAL E SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO
BRASIL, 2021). Incluímos também reportagens recentes,
veiculadas em jornais e revistas de circulação nacional e regional, sobre o tema
da educação em sexualidade em sua relação com a prevenção e a atenção às
violências sexuais de crianças e adolescentes.
As questões que nortearam a leitura dos documentos foram: 1. Qual o
panorama brasileiro atual relativo aos abusos sexuais cometidos contra crianças
e adolescentes? 2. Qual o papel da educação em sexualidade no combate e
prevenção às violências sexuais? 3. Como estão estruturadas as políticas
públicas de proteção às crianças e adolescentes no país no que tange às
violências sexuais? 4. Investigar como e se aparece o enfoque de gênero, raça e
classe nos documentos analisados e políticas governamentais a respeito desse
tema.
Para tanto, tomamos a premissa da
análise de discurso de que “não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia”
(ORLANDI, 2007, p. 37) para pensar as violências sexuais e seus impactos
sociais (de uma perspectiva decolonial e relacional), os quais, ao se fazerem
visíveis, podem gerar transformações nas políticas públicas e nos movimentos e
debates sociais engendrados.
Os abusos sexuais cometidos contra crianças e
adolescentes no Brasil contemporâneo... compreendendo
a sua face feminina, racial e doméstica
Em reportagem publicada, em
fevereiro de 2022, pelo jornal O Globo (ADOLESCENTE..., 2022), apresenta-se a
notícia de um jovem de 23 anos, preso em um pequeno município cearense, após a
denúncia feita por sua prima, uma adolescente de 16 anos, quando ela assistiu a
uma palestra sobre educação sexual no Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS) (ADOLESCENTE..., 2022). Outra reportagem (março de
2022) expõe a denúncia de violência sexual praticada contra uma criança de 8
anos, realizada pelo seu ‘avôdrasto’. Novamente, a denúncia veio à tona
por conta dos conteúdos ministrados em educação sexual em escola no estado de
Goiás, sendo recebida pela professora da referida criança. Na decisão do juiz
responsável pelo caso, foi enfatizada a educação sexual no contexto escolar
como uma das estratégias mais eficazes para enfrentar e prevenir as violências
e os abusos sexuais contra crianças e adolescentes (RODRIGUES, 2022). Também no
estado de Goiás ocorreram várias denúncias recentemente, quando dez alunos
apresentaram acusações quanto aos abusos sexuais vividos no ambiente familiar,
após aula de educação sexual. Conforme consta na reportagem, um funcionário
público municipal foi preso e exonerado do seu cargo, por suspeitas de abuso sexual
contra a filha (AMOURY, MORAIS, 2022).
Essas cenas aqui retratadas,
tendo como referências publicações em jornais e revistas de circulação nacional,
não são incomuns e demonstram o que os veículos de comunicação e informação
trazem à luz e problematizam, no contexto atual, no que se refere aos aspectos
relativos à educação em sexualidade. Um ponto de concordância que atravessa
tais reportagens diz respeito ao lugar fundamental da educação sexual no
contexto educacional e de outras políticas públicas, em especial no que tange à
prevenção das violências sexuais contra crianças e adolescentes. Por outro lado, também expõe a realidade
vivida pelas crianças e adolescentes brasileiras em seus ambientes familiares. Todavia,
tais reportagens ocultam as dimensões de raça e classe social na
contextualização das vítimas, de seus agressores e familiares. Quem são as
vítimas e seus agressores?
Estudo publicado pelo Fundo das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança
Pública (FBSP), em 2021, denominado Panorama da violência letal e sexual
contra crianças e adolescentes no Brasil, reuniu dados relativos ao
intervalo entre os anos 2016 e 2020. A análise relativa à violência sexual,
correspondente ao período entre 2017 e 2020, expõe que foram registrados
179.277 casos de estupro ou estupro de vulnerável com vítimas de até 19 anos –
uma média de quase 45 mil casos por ano. Crianças de até 10 anos representam 62
mil das vítimas nesses quatro anos, um terço do total (PANORAMA DA VIOLÊNCIA
LETAL E SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO BRASIL, 2021).
A grande maioria das vítimas de
violência sexual é menina – quase 80% do total. No total de casos de meninas,
um número elevado envolve vítimas entre 10 e 14 anos de idade, sendo 13 anos a idade
mais frequente. Para os meninos, as ocorrências de violência sexual
concentram-se especialmente entre 3 e 9 anos de idade. Das vítimas adolescentes
de 15 anos ou mais, as meninas representaram mais de 90% dos casos. A maioria
dos episódios de violência sexual ocorre na residência da vítima e 86% dos
autores conheciam suas vítimas (PANORAMA DA VIOLÊNCIA LETAL E SEXUAL CONTRA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO BRASIL, 2021).
O
documento salienta a importância de dados uniformes e mais precisos, relativos
às idades das vítimas e ao quesito raça/cor nos registros policiais e estaduais
de violências letais e sexuais. Os dados de violências sexuais precisam ser
analisados com bastante cuidado no que se refere ao quesito raça/cor, já que,
em 41% dos registros analisados, esse dado não foi preenchido. Mesmo assim,
operando com a
desagregação de dados por raça/cor das vítimas, é possível demonstrar que o
percentual de vítimas negras vem aumentando ao longo dos anos. Ou seja, as
meninas negras, que antes eram a minoria do total de vítimas de estupro de 0 a 17
anos, em 2020, considerando os dados de maior número de estados, o percentual
se inverte em relação à média, e elas passam a ser a maior parte das vítimas (PANORAMA DA VIOLÊNCIA LETAL E
SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO BRASIL, 2021).
Entretanto,
esse dado histórico do maior número de registros de violência sexual (estupro)
ser relacionado às jovens ‘não negras’ causa certo estranhamento, já que
estamos tratando de algo que está extremamente arraigado na formação sócio-histórica
brasileira. Conforme nos mostram os registros históricos, os estupros cometidos
principalmente por homens brancos contra mulheres negras é uma das expressões
mais emblemáticas da violência colonial. Partindo da premissa de que racismo e
sexismo são dois aspectos concatenados em nossa cultura e de que temos notícias
de que as violências sexuais ainda são extremamente subnotificadas no país,
podemos supor que boa parte do que anunciamos como casos não registrados possam
ser relacionados às mulheres negras (talvez crianças e adolescentes), que não
chegam a fazer o boletim de ocorrência e a denunciar os episódios de violência sofridos
(GONZALEZ, 2020).
Faz-se
mister operarmos com a visibilização dos dados relativos à raça, gênero e
classe social, fugindo da velha armadilha de uma descrição generalista que
naturaliza o mito da democracia racial no país. O desenvolvimento das políticas
públicas para o enfrentamento das violências, entre elas a violência sexual,
não pode prescindir de um olhar sobre o racismo e a discriminação e sobre como
essas determinações afetam desigualmente as mulheres e meninas no país.
A
Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) busca captar, desde 2015, as
expressões da violência sexual entre escolares do 9º ano do ensino fundamental
(majoritariamente com idades entre 13 e 15 anos de idade). Nesse sentido, em
2019, com a intenção de aperfeiçoar a captação da informação sobre o tema,
adotaram-se algumas mudanças metodológicas. Ao invés da pergunta direta sobre o
assunto, optou-se pela utilização de exemplos de violência sexual, com a
indagação se a/o adolescente entrevistada/o havia passado por situação
parecida. Com efeito, o percentual de escolares que tiveram relação sexual
forçada, em 2019, foi de 5,6%. Com a mudança metodológica, a violência sexual pôde
ser mensurada não somente através do ato da relação sexual, mas da
identificação de outros atos que vão desde o assédio até a relação forçada.
Nesse sentido, o percentual de escolares do 9º ano, morando nas capitais que
passaram por essa situação, foi de 14,6% (INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2022). Entretanto, esses dados não são apresentados
com estratificação por raça/cor, mas apenas segmentados por escolas públicas e
privadas.
A PeNSE (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2022) também assinala que tem
crescido o número de adolescentes que inicia de forma ‘prematura’ a vida
sexual, especialmente as moças, denotando maiores riscos de gestação na adolescência
e de infecções sexualmente transmissíveis (IST). Conforme consta no documento,
“[...] a adolescência é a fase da vida de
profundas mudanças físicas e psicológicas e a iniciação sexual precoce pode
levar à gravidez não desejada e as IST” (IBGE, 2022, p. 136). Há uma clara
preocupação sobre o que se compreende como ‘precocidade’ da iniciação sexual e,
ao mesmo tempo, um entendimento subliminar de que sexo precoce é igual a sexo
na adolescência, considerando como fatores dificultadores, para o controle de
gestações e IST, as próprias mudanças físicas e psicológicas pelas quais a
população nessa faixa etária passa. Do mesmo modo, não se consideram as
profundas desigualdades existentes entre as/os adolescentes brasileiras/os, no
que concerne à raça/cor e classe social.
Outro dado relevante do documento
se refere à queda do percentual de escolares que afirmam terem recebido
informações na escola sobre prevenção de gravidez, IST e HIV, no período de 10
anos. Mesmo que as pessoas entrevistadas citem que tiveram algum tipo de
educação sexual no contexto escolar (77,6% em 2019), ainda assim, mais de 70%
observa que houve lacunas no acesso às informações dadas nesse contexto (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2022).
Em 2022, o Fundo de
População das Nações Unidas lançou o boletim sobre o Estado da população
mundial destacando a necessidade de dar “visibilidade ao invisível”,
tratando-se da crise da falta de atenção mundial às gestações não intencionais
e suas causas e consequências sociais. De acordo com o documento, o desenvolvimento
social e econômico, maiores índices de igualdade de gênero, políticas que
contemplem um incremento de acesso legal ao aborto seguro e a oferta de
educação sexual integral refletem diretamente em reduções das taxas de gestações
não intencionais e das violências sexuais (FONDO DE POBLACIÓN DE LAS NACIONES UNIDAS,
2022). Apesar de as políticas relativas ao aborto não serem foco desta
análise, é sabido que, muitas vezes, a violência sexual tem como uma das
consequências uma gestação indesejada. A interrupção da gravidez de vítimas de
violência sexual está prevista na lei brasileira, não se especificando o tempo
de gestação, especialmente quando a gravidez coloca em risco a vida da vítima.
Assim, cabe-nos
questionar: como estão estruturadas, no momento atual,
as políticas públicas de proteção às crianças e adolescentes brasileiras/os no
que tange às violências sexuais?
Políticas de enfrentamento
às violências sexuais contra crianças e adolescentes do governo Bolsonaro: familismo, teocracia
e desproteção do Estado
Em 18 de maio de 2022,
como parte das ações relativas ao dia nacional de combate ao abuso e exploração
sexual de crianças e adolescentes[4], o Ministério da
Mulher, da Família e Direitos Humanos (MMFDH), em conjunto com os Ministérios
da Saúde, Educação, Justiça e Segurança Pública, Cidadania e Turismo, bem como
outras entidades não governamentais, lançaram o Plano Nacional de Enfrentamento
à Violência contra Crianças e Adolescentes- 2022/2025
(PLANEVCA). A então ministra do
MMFDH, Cristiane Britto, ressaltou que, em 2021, o disque 100 (central de denúncias
relativas à violação de direitos humanos) recebeu mais de 18,6 mil queixas de
violência sexual contra crianças e adolescentes.
O 1º Plano Nacional de Enfrentamento
da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes data de 2000, sendo que,
antes da reformulação atual, o documento passou por duas revisões, uma no ano
de 2006 e outra em 2012/2013. Em 2021, como
parte das ações governamentais, foi lançado o decreto nº 10.701/2021, criando o
Programa Nacional de Enfrentamento às Violências contra Crianças e Adolescentes
e sua Comissão intersetorial (BRASIL, 2021a). Conforme apontado na apresentação
do novo Plano, considerando os avanços significativos no enfrentamento à
violência sexual contra crianças e adolescentes, houve a necessidade de ampliar
a atenção para outras formas de violências praticadas contra crianças e
adolescentes, tendo em vista a dura realidade de violações de direitos dessa
população no Brasil, inclusive as violências letais. Assim, o plano atual tem
como elemento novo o tratamento geral sobre as violências vivenciadas por essa
população, incorporando as violências sexuais (abuso e exploração sexual), em
conjunto com as violências físicas, institucionais e psicológicas.
Do
ponto de vista do debate feminista e decolonial, observa-se que o PLANEVCA, em sua
apresentação e marco teórico, ou seja, na contextualização dos elementos
estruturais ligados às violências contra as crianças e adolescentes no Brasil,
não chama atenção para as enormes desigualdades existentes entre as crianças e
jovens em termos de raça/cor, estratificando as desigualdades em relação a
gênero e, algumas vezes, considerando os aspectos relacionados às desigualdades
de classe social. A história das violências, bem como das políticas públicas
construídas para infância e juventude no Brasil, é contada invisibilizando-se a
variável racial, sendo que, mesmo que se faça referência à marca da escravidão
e da colonização na formação social nacional, esses segmentos etários seguem
sendo apresentados de forma indistinta em termos raciais e étnicos.
No capítulo referente
às caracterizações dos tipos de violências, no que se refere ao abuso sexual,
não apareceu, em momento algum, a reflexão sobre as desigualdades raciais. Entretanto,
na análise da exploração sexual, surge a seguinte reflexão:
A América Latina teve sua
formação econômica, social e cultural baseada na colonização e na escravidão,
levando à constituição de uma sociedade racista, com grandes desigualdades
sociais e econômicas, que pautaram a inferiorização por raça/etnia, gênero e
idade. Por isso, a maioria dos casos identificados de exploração sexual de
crianças e adolescentes está relacionada às meninas. Os meninos também são vítimas,
embora esses casos possam ser negligenciados com mais frequência. Esses mesmos
desafios de identificação também podem ser observados em relação às crianças e
adolescentes negros, indígenas e com deficiência (BRASIL,
2022a, p. 37).
Observa-se que, apesar de
aparecer o termo raça (às vezes alinhado com o termo etnia, outras vezes com
cor) nesse trecho, e também em outros momentos no
decorrer do documento, na maior parte das vezes, aparece citado ao lado de
outros marcadores sociais das desigualdades, como gênero, idade, orientação
sexual, identidade de gênero, socioterritorial, deficiência física etc. Esse aspecto
deve ser salientado, pois, a despeito de todos esses determinantes conjugarem
na conformação das violências contra crianças e adolescentes, a questão racial,
como elemento estrutural, mantém sua presença dissolvida entre os outros
marcadores sociais, sendo até mesmo invisibilizada. Essa observação pode ser
extraída do próprio texto acima, na medida em que se reconhece a dificuldade de
identificação das violências praticadas contra adolescentes negros, indígenas e
com deficiência. Assim, não é difícil conjecturar que esse ‘silêncio ruidoso’
no que diz respeito às contradições raciais se baseia em um dos mitos de dominação
ideológica mais eficazes entre nós: o da democracia racial (GONZALEZ, 2020, p.
144).
O PLANEVCA foi formulado com cinco subdivisões por eixos, quais sejam: 1.
Prevenção; 2. Atendimento; 3. Defesa e responsabilização; 4. Participação e
mobilização social; 5. Estudos e pesquisas. Não há menção à educação sexual ou educação
em sexualidade como estratégia para prevenção e enfrentamento das violências
sexuais contra crianças e adolescentes, em nenhum dos eixos. Em todo o
documento, não há menção ao termo ‘educação sexual’, nem mesmo enquanto
estratégia para fortalecimento de ações preventivas e de detecção de violências
sexuais.
Em trabalho anterior que compõe a investigação mais ampla sobre as políticas de educação em sexualidade
no Brasil (PAIVA; BRANDÃO, 2023, no prelo), foi possível perceber que o Governo
Bolsonaro, nos temas relativos aos direitos sexuais e reprodutivos, em especial
de adolescentes/jovens, articula a linguagem dos direitos humanos com o discurso
essencialista e binário a respeito da sexualidade e do gênero, buscando
enquadrar tais elementos discursivos para validação de suas posições político-ideológicas
identificadas com certos grupos religiosos e conservadores. Essa estratégia,
balizada pelo ‘pânico moral’ existente em torno da sexualidade na adolescência,
realiza-se pela ressignificação do debate sobre o pluralismo e diversidade de
gênero e sexualidade, com a ocultação das narrativas sobre prazer sexual,
enfatizando a ideia de ‘preservação sexual’. As políticas bolsonaristas nessa área,
levadas a cabo principalmente pelo MMFDH, enfatizam, numa perspectiva
comportamentalista e individualista, o autocuidado, a importância da família
como lugar de segurança, e, acima de tudo, partindo da ideia de que é preciso ‘salvar’
os/as adolescentes das ‘más’ influências culturais, que levariam à sexualização
e erotização precoces.
De Franco e Maranhão Filho (2021),
a respeito das práticas discursivas do governo Bolsonaro sobre a política
educacional, também destacam a força do núcleo familiar em relação ao debate de
gênero e sexualidade. Como exemplo, citam a retirada do debate público de
gênero e sexualidade das escolas, que tem como uma das consequências a
manutenção de um elemento central da nossa estrutura social: o de manter no
domínio privado aquilo que se quer controlar, subalternizar, invisibilizar ou excluir.
Destacam-se, nessas ações governamentais, os dois pilares que os autores
observam nas políticas educacionais deste governo: a privatização e a
teocratização, distanciando-a da perspectiva democrática, pública, social
referenciada, pluralista e defensora dos direitos humanos.
Assim, o primeiro objetivo do
eixo prevenção do PLANEVCA diz o seguinte: “[...] incentivar
grupos familiares para o desenvolvimento de habilidades parentais e protetivas
a fim de fortalecer os vínculos familiares, visando à prevenção às violências
contra crianças e adolescentes” (BRASIL, 2022a, p. 80). Como subitem desse
objetivo, há um destaque para o Programa Famílias fortes, da Secretaria
Nacional da Família.
O programa Famílias Fortes
foi desenvolvido com função eminentemente educativa, voltado para famílias que
tenham filhos entre 10 e 14 anos de idade, prevendo-se em sua metodologia que
seja executado em sete encontros semanais com a finalidade de promover o bem-estar
dos membros da família, fortalecer os processos de proteção e construção de ‘resiliência
familiar’, além da redução dos riscos relacionados aos ‘comportamentos
problemáticos’ (BRASIL, 2021b).
Entretanto, de que família se trata? Podemos supor
que se trata do modelo cisheteronormativo (pai, mãe e filho/s), na medida em
que em vários documentos governamentais a ideia de família parece remeter
implicitamente a esse modelo. Além disso, a noção de família, como lugar
prioritário de proteção e cuidado, encobre as inúmeras desigualdades e
violências que atravessam e conformam os cotidianos de vida das famílias pobres
e vulneráveis no país, as quais, em geral, por também estarem expostas à desproteção, não possuem as
mínimas condições materiais para proteger e acabam por se tornarem coniventes e
responsáveis pelas violências sexuais com crianças, adolescentes e jovens (PAIVA; BRANDÃO, 2023, no prelo).
Outra questão importante se refere ao acento dado
ao desenvolvimento de atitudes de autocuidado, autoproteção e autodefesa em
relação às violências perpetradas contra as crianças e adolescentes. Esse
elemento aparece, por exemplo, no eixo referente à participação e mobilização
social, com vistas à estruturação de ações formativas para crianças e
adolescentes na educação básica (BRASIL, 2022a).
Este enfoque foi trabalhado também em outras políticas sexuais recentes,
voltadas às crianças e jovens, da gestão Bolsonaro, como o Guia de Autocuidado:
recomendações para prevenção do risco sexual precoce e da gravidez na Adolescência,
produzido pelo MMFDH, MEC, MS e Secretaria Nacional de Assistência Social,
lançado também em 2022. Em tal guia, a noção principal trabalhada é a de
autocuidado, apresentada aos adolescentes e jovens de forma abstrata, sem
nenhuma conexão com as desigualdades e as diferentes realidades enfrentadas por
eles em seus cotidianos, considerando o autocuidado como uma característica ‘inerente
ao ser humano’, dizendo respeito à ‘[...] integralidade
do ser’ (BRASIL, 2022b, p. 7). Observa-se ainda que o guia define vários níveis
de autocuidado, como o físico, psicológico, emocional, social, espiritual,
sempre pressupondo o binarismo dos sexos feminino e masculino, invisibilizando,
assim, as diferentes identidades de gênero presentes na cena contemporânea
(BRASIL, 2022b).
Conforme argumenta
Terassi Hortelan (2019), percebe-se, na contemporaneidade, uma intensa
psicologização das relações e do cotidiano, que vem imbricada ao ideário do
feminismo liberal e ao mercado capitalista. Assim, percebemos a penetração cada
vez maior de noções, como de autonomia, autocuidado, comunicação,
autorrealização, sendo que esse regime de produção de sujeitos e essa ‘nova’
governamentalidade tende a exacerbar o tom privatista, bem como o modelo de
família cisheteronormativa. Concomitantemente, tende a invisibilizar as
desigualdades de raça, classe e gênero, além de outras que pesam sobre tais
famílias e as colocam diante de um regime de violências cotidianas nas franjas
do capitalismo periférico brasileiro.
Em junho de 2022,
ocorreu audiência pública no Senado, quando a Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa (CDH) debateu o PLANEVCA, conforme solicitação da
senadora Leila Barros (PDT-DF), pelas críticas feitas ao documento provenientes
da sociedade civil organizada. Diego Alves, presidente do Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), ressaltou que o Brasil é o
segundo do mundo em exploração sexual de crianças e adolescentes, sendo tal
situação agravada pela pobreza. Criticou a falta de participação social na elaboração
do Plano, defendendo ações, como políticas de renda básica e de emprego, para
enfrentar tal questão (BORGES, 2022).
Observa-se, assim, que, diante da
inegável gravidade da pauta relativa à proteção das crianças e adolescentes das
situações de violências, em particular as violências sexuais no nosso país, as
quais se agravaram no contexto pandêmico, a gestão de J. Bolsonaro responde com
políticas fundamentadas em perspectivas familista (privatista), ultraneoliberal
e teocrática, verificando-se que, entre os objetivos e as ações intersetoriais
elencados, não são citados ações, programas ou políticas estruturais de
enfrentamento às desigualdades de gênero, raciais e de classe social, como
medidas essenciais para fazer frente às várias formas de violências, destacando
aqui as sexuais, praticadas contra crianças e adolescentes brasileiras/os, em
seus ambientes familiares.
À guisa de conclusão
Recentemente,
assistimos, nos noticiários, ao caso de uma criança de 11 anos que foi violentada
sexualmente por um familiar durante sua infância. Como consequência do/s
estupro/s, ela engravidou e, com a ajuda da sua mãe, procurou o Estado
(hospital de referência) brasileiro, visando acessar o aborto, conforme estabelece
a legislação brasileira, desde 1940. O fato ocorreu em um hospital da região
metropolitana de Florianópolis (SC). Contudo, a criança e a mãe tiveram,
inicialmente, a solicitação negada, dando-se como justificativa o fato de que a
gestação havia ultrapassado 20 semanas. O caso alcançou expressão internacional
pelo exemplo de violação dos direitos humanos por parte do Estado brasileiro e
seus agentes.
Ao ser atendida pelo
Ministério Público, a criança (grávida) foi encaminhada, contra a vontade de
sua mãe, para um abrigo, com a justificativa de protegê-la do familiar
abusador. De fato, o caso alcançou maior repercussão mundial devido à
divulgação do vídeo de audiência judicial, em que a juíza responsável pelo caso
pergunta se a menina ‘[...] suportaria (a
gravidez) mais um pouquinho? [...]’, e ainda se o ‘pai da criança’ (estuprador)
estava ciente e de acordo com o aborto. Essa criança - que deveria ser
protegida - passou por um processo de (re)vitimização na medida em que o Estado
não somente a deixou desprotegida, mas também a violentou novamente, simbólica
e psicologicamente (MAYER, 2022).
Outro aspecto a ser
destacado desse triste episódio reside no fato de que as reportagens não
apresentam informações que ajudem a contextualizar a ‘menina gestante’ em
termos de raça/cor e classe social. Apesar disso, podemos facilmente supor que
se trata de uma criança que vive em contexto de vulnerabilidade social e
pobreza, até mesmo pelo nível de violência a que foi submetida pelos agentes do
Estado.
Em síntese, a despeito de os dados nacionais recentes e as fontes
jornalísticas demonstrarem a grave realidade
vivida por meninas (sim, a maioria dos casos ocorre entre 10 e 14 anos)
brasileiras, vítimas de abusos sexuais por parentes próximos, em seus ambientes
domésticos, as políticas públicas brasileiras, voltadas para essa população,
visando fazer frente a essa realidade, são pífias e até mesmo cruéis, pois
tendem a manter e ampliar o ciclo de violências a que estão submetidas essas
crianças e suas famílias. A análise das políticas governamentais nessa área, da
gestão J. Bolsonaro, revelou-nos que a
perspectiva familista, privatista, ultraneoliberal e teocrática está nos seus
fundamentos, ressaltando-se que, entre os objetivos e as ações intersetoriais
elencados, não são citadas ações, programas ou políticas estruturais de
enfrentamento às desigualdades de gênero, raciais e de classe social, como
medidas essenciais para fazer frente às outras formas de violências, inclusive
as sexuais, praticadas contra crianças e adolescentes brasileiras/os.
Referências
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assistir a uma palestra sobre educação sexual no Ceará. G1 Ceará, Fortaleza,
19 fev. 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2022/02/19/adolescente-denuncia-primo-por-estupro-apos-assistir-a-uma-palestra-sobre-educacao-sexual-no-ceara.html.
Acesso em: 28 jul.2022.
AMOURY, Jamyle; MORAIS, Adriel. Dez alunos
denunciam abusos no ambiente familiar após assistirem a palestras sobre
violência sexual em escola. G1 Goiás e TV Anhanguera, Goiania, 22 mar.
2022. Disponível em: https://g1.globo.com/go/goias/noticia/2022/05/22/alunos-denunciam-abuso-sexual-apos-assistirem-palestras-sobre-o-assunto-em-escolas-de-campo-limpo-de-goias.ghtml.
Acesso em: 10 jun. 2022.
BORGES, I. F. CDH discutiu o Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes. Rádio Senado,
Senado Federal- Brasília (DF), 24 de junho de 2022. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2022/06/24/cdh-discutiu-o-plano-nacional-de-enfrentamento-da-violencia-contra-criancas-e-adolescentes.
Acesso em: 17 ago. 2022.
BRASIL. Decreto nº 10.701/2021, de 17 de
maio de 2021. Institui o Programa Nacional de Enfrentamento da Violência
contra Crianças e Adolescentes e a Comissão Intersetorial de Enfrentamento à
Violência contra Crianças e Adolescentes. Brasília (DF), 2021a.
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Direitos Humanos. Famílias fortes: Manual de Introdução do Programa
Famílias Fortes. 2. ed. Brasília (DF), 2021b. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/familia/familias-fortes-1.
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BRASIL. Lei nº 13.431, 4 de abril de 2017.
Estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e adolescente vítima
ou testemunha de violência e altera a lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990.
Brasília (DF), 2017.
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Acesso em: 23 maio 2022.
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Sabrina
Pereira PAIVA Trabalhou na concepção e delineamento do
artigo, na análise e interpretação dos dados e na sua redação.
Atua como professora da Faculdade de Serviço Social e do
Programa de Pós-graduação em Serviço social (UFJF). Desenvolve pesquisas nos
temas sexualidade, gênero, juventude, violência de gênero, direitos sexuais e reprodutivos.
Integra o Grupo de Estudos e Pesquisas em Sexualidade, Gênero, Diversidade e
Saúde: políticas e direitos (GEDIS/UFJF).
Elaine
Reis BRANDÃO Trabalhou no seu delineamento, revisão e
crítica.
Atua como professora do Departamento de Medicina Preventiva,
atuando no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do
Rio de Janeiro, na área temática de Ciências Sociais e Saúde. Desenvolve
pesquisas nos temas: processos de saúde e doença; gênero, sexualidade, saúde
reprodutiva, gravidez na adolescência, contracepção; aborto; anticoncepção de
emergência; juventude, família, violência de gênero. É pesquisadora do CNPq.
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*Assistente Social. Doutorado em Saúde Coletiva. Professora na
Faculdade de Serviço Social e no Programa de Pós-graduação em Serviço Social,
Universidade Federal de Juiz de Fora. (UFJF, Juiz de Fora, Brasil). Campus universitário:
Rua José Lourenço Kelmer, s/n, São Pedro, Juiz de Fora (MG), CEP.: 36036-900. E-mail:
sabrina.paiva@ufjf.br.
**Assistente Social. Doutorado em
Saúde Coletiva. Professora no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade
Federal do Rio de Janeiro. (UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil). Ilha do Fundão.
Avenida Carlos Chagas Filho, IESC, Cidade Universitária da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ), CEP.: 21941-902. Bolsista de Produtividade
do CNPq. E-mail: brandao@iesc.ufrj.br.
© A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2022 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial. O licenciante não pode revogar estes direitos desde que você respeite os termos da licença.
[1]
Conforme a Lei nº 13.431/2017, abuso sexual se refere a “[...] toda ação que se utiliza da criança ou do adolescente para
fins sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso, realizado de modo
presencial ou por meio eletrônico, para estimulação sexual do agente ou de
terceiros” (BRASIL, 2017, não paginado). Não trataremos aqui da exploração sexual,
que se diferencia do abuso pela exigência adicional de alguma forma de troca,
ou seja, o fato de a criança/adolescente e/ou outra pessoa receber algo em
troca da atividade sexual.
[2]
Investigação desenvolvida no âmbito do estágio pós-doutoral da primeira autora,
realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro - Instituto de Estudos em
Saúde Coletiva, cujo título é: O debate social sobre a educação sexual de
jovens brasileiros/as no contexto contemporâneo: as controvérsias e disputas de
narrativas na (des)construção da política sexual brasileira (2021-2022),
sob supervisão da segunda autora.
[3]
Neste ponto, é importante destacar que compreendemos que as violências de
gênero, aqui retratadas as sexuais, atravessam todas as classes sociais e as
diferentes raças e etnias, mas o que enfatizamos é que as desigualdades de raça
e classe não podem ser invisibilizadas ou desconsideradas na análise e no desenvolvimento
das políticas públicas, pois são produzidas dentro de uma lógica complexa e
imbricada, que serve à reprodução mútua dos sistemas: patriarcado - racismo -
capitalismo.
[4]
A data - 18 de maio de 1973- faz referência ao caso de ‘Araceli’, uma menina de
oito anos, que foi sequestrada e morta em Vitória (ES). No ano de 1991, os três
acusados de matar a jovem foram absolvidos e o crime segue impune até hoje.