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O alegado discurso científico do OIB contra as Políticas Sexuais e Reprodutivas

 

The OIB’s alleged scientific discourse against Sexual and Reproductive Policies

 

Ana Kelma Cunha GALLAS*

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Descrição gerada automaticamente http://orcid.org/0000-0001-5948-1505

 

Olívia Cristina PEREZ**

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Descrição gerada automaticamente http://orcid.org/0000-0001-9441-7517

 

Resumo: Este artigo aborda as estratégias discursivas adotadas pelo Observatório Interamericano de Biopolítica (OIB) para se contrapor às políticas sexuais e de gênero no Brasil. O objetivo é evidenciar como o OIB se utiliza de informações pretensamente científicas, mas sem comprovação, para legitimar e disseminar suas causas. Para tanto, adotamos metodologia qualitativa, apoiada na pesquisa documental e bibliográfica. Foram analisados, especificamente, alguns discursos do OIB no Seminário “Gênero, Aborto e Sociedade” realizado em 2014. Os resultados do estudo mostram que a organização usa estratégias típicas da troll science para promover seus argumentos em ambientes considerados laicos, apelando, também, para uma estratégia conhecida como “viés de confirmação”. Os achados da pesquisa contribuem para entender quais as estratégias discursivas utilizadas pelos movimentos antigênero na contemporaneidade.

Palavras-chave: Observatório Interamericano de Biopolítica. Cientificismo. Gênero. Movimento Antigênero.

 

Abstract: This article addresses the discursive strategies adopted by the Observatório Interamericano de Biopolítica (OIB) to oppose Brazilian sexual and gender policies. It shows how the OIB uses supposedly scientific information, but without proof, to legitimise and disseminate its causes. We adopted a qualitative methodology, supported by documentary and bibliographic research. We analysed some of the OIB’s speeches at the 2014 “Gender, Abortion and Society” Seminar. The results show that the OIB uses typical troll science strategies to promote its arguments in environments considered secular, and also appeals to a “confirmation bias” strategy. The findings contribute to the understanding of discursive strategies used by anti-gender movements in contemporary times.

Keywords: Observatório Interamericano de Biopolítica. Scientism. Gender. Anti-gender Movement.

           

Submetido em: 28/02/2022. Revisado em: 17/1/2023; 27/3/2023; 4/5/2023.  Aceito em: 6/6/2023.

1 INTRODUÇÃO

 

N

este estudo investigamos discursos adotados pelo Observatório Interamericano de Biopolítica (OIB) para se contrapor aos direitos sexuais e reprodutivos no Brasil. O Observatório se autodefine como uma organização de cidadãos livres, conscientes e ativos, que visa a “[...] contribuir para o fortalecimento de condutas parlamentares comprometidas com a vida, família, educação e liberdade” (Observatório Interamericano de Biopolítica, 2014). Fundado em 2014 por membros da Renovação Carismática e presidido pelo professor católico Felipe Nery, o OIB se tornou uma das principais referências do tema ideologia de gênero no Brasil (Furlani, 2016).

 

Nos bastidores políticos, o grupo se notabilizou por ser um dos principais articuladores dos embates contra as políticas sexuais e de gênero, tendo um relevante papel na interdição dos direitos sexuais e reprodutivos no país (Teixeira, 2019). Nos meios digitais, a organização ganhou notoriedade disseminando conteúdos alarmistas sobre sexualidade e gênero (Gomes, 2020). Ao lado do Movimento Escola Sem Partido (MESP), o OIB atuou em campanhas contrárias “[...] à inclusão da temática das relações de gênero e sexualidade no Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) e, posteriormente, em seus congêneres estaduais e municipais” (Miskolci; Pereira, 2019, p. 14).

 

Estudos citam, ainda, o OIB como um grupo ultraconservador (Machado, 2018) e obscuro (Paiva, 2015), relacionando sua emergência na arena política brasileira à agenda pró-vida defendida por grupos fundamentalistas cristãos (Almeida, 2017; Junqueira, 2018). Mas, apesar de sua intensa atuação, o OIB é pouco estudado.

 

Para contribuir com esse campo, a pesquisa foi guiada pela seguinte questão: quais as estratégias discursivas utilizadas pelo OIB para defender suas causas? Temos como hipótese que o OIB se utiliza de um discurso pretensamente científico, mas sem comprovação, para penetrar em ambientes considerados laicos, como universidades e instituições políticas. Nesse sentido, o objetivo do artigo é evidenciar como o OIB – uma importante organização da direita brasileira – produz discursos que aparentam certa veracidade para legitimar e disseminar suas causas. 

 

No campo de estudos sobre o tema, entende-se que o discurso do fundamentalismo cristão utiliza o secularismo estratégico, que seria um deslocamento discursivo que imprime um caráter científico a argumentos de caráter religioso (Vaggione, 2005). Nesse sentido, esses grupos recorrem ao cientificismo como uma importante ferramenta capaz de conferir legitimidade às investigações não científicas (Haack, 2012; Machado, 2018; Korolczuk, 2020).

 

Contribuindo com esse campo, consideramos que o OIB não se utiliza da ciência para reafirmar fundamentos religiosos. Seus discursos estão mais próximos do conceito de viés de confirmação – estratégia utilizada para interpretar (ou distorcer) informações a fim de confirmar crenças ou hipóteses favoráveis a determinadas causas (Tuchman, 1984). Mostramos, ainda, que o OIB adota uma estratégia chamada de troll science, que consiste na inserção deliberada de desinformação em discussões relevantes da ciência para criar uma narrativa alternativa que se opõe aos fatos e discursos científicos (Eslen-Ziya, 2020). No caso do OIB, o troll science se constitui em uma estratégia para mobilizar explicações morais sobre temas tratados sob uma perspectiva secular. Nesse sentido, mais do que reafirmar dogmas religiosos com base na ciência, o OIB distorce e cria verdades paralelas, contribuindo com o pânico moral[1] em assuntos relacionados à gênero e sexualidade. Ou seja, o OIB não está penetrando na sociedade com base no discurso religioso ou científico, mas por meio de um discurso que emula o científico, mas que o distorce. Essa estratégia visa, além de manipular a opinião pública com ideias alarmistas, a interferir no âmbito político e na tomada de decisões.

 

Para entender quais recursos discursivos são utilizados pelo OIB em sua atuação política, o estudo adota uma metodologia qualitativa, apoiada na pesquisa documental e bibliográfica. Do acervo sobre o OIB, privilegiaram-se os materiais audiovisuais e, de forma eletiva, os discursos proferidos no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, promovido pelo OIB em 27 de maio de 2014, no Auditório Nereu Ramos, Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), com a chancela da Liderança do Partido Social Cristão (PSC).

 

O Seminário do OIB se insere no contexto da regulação da interrupção voluntária da gravidez pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que tramitava no Congresso sob o nome de Sugestão Legislativa nº 15 (SUG-15/2014). O documento, inscrito no portal e-Cidadania alcançou 20 mil votos favoráveis, sendo remetido à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (Biroli, 2016).

 

A intenção do Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, expressa no site da Câmara, era discutir a “[...] problemática moderna sobre o aborto, os desdobramentos nos anos recentes e as principais fundamentações teóricas” (Câmara dos Deputados, 2014). No entanto mostrou ser uma estratégia de conservadores para se contrapor à proposta de aborto legal (SUG-15/2014) que tramitava no Senado (Teixeira; Biroli, 2022). Assim a escolha desse evento como objeto de análise justifica-se, principalmente, pela importância que teve no contexto da discussão sobre a interrupção voluntária da gravidez pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

 

Ao todo foram cinco palestras proferidas no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade: três por mulheres, uma pelo Padre Paulo Ricardo e outra pelo presidente do OIB, Felipe Nery Martins Neto. Escolhemos analisar as palestras das mulheres, pois, além de apresentarem uma contraposição às causas defendidas pelo movimento feminista, adotavam um discurso pretensamente científico, inspirado em Jorge Scala. Esse advogado pró-vida argentino tem obras publicadas por editoras católicas no Brasil, entre elas a Katechesis, de Felipe Nery.

 

Nos discursos das três mulheres, identificamos a causa defendida e os principais argumentos utilizados. Especificamente, a primeira palestrante, Mantovani, condenou o aborto e o planejamento familiar. A segunda, Takitani (2014a), criticou a Suécia e os países sociais-democratas por adotarem políticas públicas que, segundo ela, incentivam o aborto. Por fim, Medrado acusou organizações transnacionais e feministas de promoverem o aborto para diminuir a população mais pobre. No texto, sistematizamos os principais argumentos das palestrantes e reproduzimos trechos que os exemplificam. Posteriormente analisamos a lógica ou estratégia utilizada para convencer o público. Para melhor compreensão desses discursos, retomamos trechos das principais obras de Jorge Scala, que servem de inspiração ao OIB.

Neste estudo, optamos por nomear as palestrantes, uma vez que essas informações são de conhecimento público e amplamente divulgadas midiaticamente. Além disso, conhecer um pouco mais sobre elas ajuda a entender por que o discurso pretensamente científico tem sido mobilizado por esse grupo. Fernanda Takitani é formada em História pela Universidade Estadual de Londrina; Isabela Mantovani, dentista, é mestra em Saúde Coletiva pela Unicamp; Andreia Medrado tem Licenciatura Plena em Língua Portuguesa e Inglesa, atuando como professora no Governo do Estado de São Paulo. Todas são reconhecidas como pesquisadoras do OIB.

 

É importante ressaltar que o engajamento de mulheres na crítica ao aborto tem sido uma estratégia recorrente no movimento antigênero[2] e antifeminista. Para Machado (2018), as mulheres do OIB, além de contestarem as formulações sobre as relações de gênero, “[...] procuraram comprometer o feminismo, associando as feministas com a cultura da morte” (Machado, 2018, p. 9). Além de evidenciar a multiplicidade de identidades e significados referente aos direitos das mulheres, essa reação demonstra que as demandas femininas não são universais, mas constituídas por discursos particulares e bem diversos.

 

Dessa forma, com este estudo esperamos contribuir para o entendimento, não apenas de como pensam os ativistas antigênero das direitas brasileiras, mas sobre quais são as estratégias discursivas utilizadas por esses grupos para disseminar suas ideias.

 

2 Discursos de mulheres do OIB no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade

 

No Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, Isabella Mantovani (2014) discutiu as controvérsias acerca das estatísticas do aborto. Sua principal alegação foi que o número de mortes de mulheres era superestimado para estimular a liberação legal da interrupção da gravidez. Ainda conforme Mantovani (2014), o planejamento familiar é incentivado por grandes ONGs internacionais, tornando-se um eufemismo para a redução populacional. Já Fernanda Takitani (2014a) discursou sobre a experiência socialista e de igualdade sexual na Suécia, incidindo sua crítica sobre a diplomata Alva Myrdal (1902-1986), considerada uma das reformadoras sociais mais influentes do século XX, e seu marido, o economista político Gunnar Myrdal. Por fim, Andreia Medrado (2014) falou sobre Aspectos Históricos da Problemática do Aborto, correlacionando a interrupção da gravidez à atuação de fundações norte-americanas, como a de John Rockfeller III.

 

Nos discursos proferidos no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, foram identificadas três alegações principais: 1) o planejamento familiar é uma engenharia social utilizada por grandes corporações estrangeiras para promover o controle populacional; 2) o aborto atende ao objetivo de reduzir populações mais vulneráveis, especialmente negros e pobres; 3) o feminismo atua na Organização das Nações Unidas (ONU) a serviço de grandes corporações que promovem o aborto (Mantovani, 2014). Nenhum desses argumentos é fundamentado em textos religiosos, mas sim em informações, ainda que descontextualizadas e sem fontes confiáveis que possam corroborar as afirmações feitas.

 

Detalhando os discursos, no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, coube a Mantovani (2014) defender o pressuposto de que as políticas reprodutivas teriam como intenção reduzir as populações mais vulneráveis, especialmente as formadas por negros e pobres. Dessa forma, os direitos sexuais e reprodutivos são entendidos como “[...] uma interferência de elites internacionais corruptas e do ‘politicamente correto’ [...]” (Paternotte; Kuhar, 2018, p. 514), que estariam corroendo os pilares de sustentação da sociedade.

 

O argumento de que o aborto atinge a população mais vulnerável, em especial as mulheres pretas e pobres, é utilizado por movimentos feministas progressistas para defender a possibilidade de que essas mulheres possam decidir sobre a continuidade ou a interrupção da gravidez. É importante ressaltar que o argumento feminista é muito diferente do utilizado pela palestrante do OIB. Para os movimentos feministas, o aborto castiga e mata mais mulheres negras e pobres porque elas não têm acesso a serviços melhores, como é o caso das mulheres com maior poder aquisitivo. O argumento da palestrante do OIB, então, pode parecer conhecido pelo fato de citar a relação entre o aborto a as mulheres mais pobres, mas é importante destacar que seu conteúdo, assim como o objetivo, é muito distinto.

 

No Seminário, Mantovani (2014) também usa de uma lógica pseudocientífica para relacionar os direitos sexuais e reprodutivos à prática da eugenia, movimento ocorrido do final do século XIX à metade do século XX, que pregava o controle social por meio da genética. Acrescenta que “[...] a IPPF foi fundada por uma senhora chamada Margaret Sanger, que é eugenista. O que ela queria? O aborto dos negros! Ela queria que os negros fossem extirpados da sociedade” (Mantovani, 2014, 8min 49s). Para endossar suas inferências conspiratórias, Mantovani evoca os casos paradigmáticos da International Planned Parenthood Federation (IPPF) e da United States Agency for International Development (USAID). Ainda afirma que a prática eugenista seria pensada, incentivada e financiada por agências internacionais, com vistas a promover uma redução populacional em países pobres.

 

Conforme Mantovani (2014) explica no Seminário, a USAID (United States Agency for International Development), agência internacional norte-americana para o desenvolvimento internacional, “[...] atuou, durante muito tempo, promovendo o aborto por meio do DIU (Dispositivo Intrauterino) e ensinando a técnica abortiva AMIU (Aspiração Manual Intrauterina), além de capacitar médicos do mundo inteiro em técnicas abortivas” (Montovani, 2014, 11min 14s). Nesse trecho é possível perceber o uso de nome de agências internacionais e de dispositivos médicos para dar um caráter mais realista à informação, embora a palestrante não apresente evidências de suas afirmações. Assim parece que seu discurso é baseado em dados, quando, na verdade, cita nomes de agências e práticas médicas para estabelecer uma crítica à verdade científica.

 

Nessa estratégia, na tentativa de assegurar uma interpretação moral dos fatos, utiliza-se um amálgama de evidências que parecem ser racionais, “[...] como um discurso científico, mas moldado em declarações de senso comum reconfortantes e populistas” (Kuhar, 2015, p. 84). Nesses termos, não consideramos que o OIB esteja utilizando um argumento científico para corroborar suas crenças religiosas; o que a palestrante faz é utilizar informações verossímeis, que são interpretadas como verdadeiras, contrapondo-se, dessa forma, ao saber cientificamente validado. Um exemplo é a crítica à eugenia, também presente no meio acadêmico e político, para denunciar o racismo e a crença na superioridade de uns sobre os outros. A palestrante do OIB evoca essa mesma crítica, mas para fazer uma contraposição à possibilidade do aborto. Nota-se, então, a utilização de pontos familiares entre os discursos, mas com argumentos e objetivos bem distintos.

 

Observa-se que os fatos e teorias conspiratórias empregadas pelo OIB em seus argumentos são uma compilação cuidadosamente selecionada de afirmativas extraídas da obra de Scala, que, mesmo publicadas e difundidas, carecem de validação científica. Trata-se de um exercício de contraconhecimento, conhecido como pseudociência, troll science ou ciência falsa (Eslen-Ziya, 2020). Nas palestras, a disseminação de tais ideias são uma tentativa de trazer desconfianças sobre conhecimentos científicos validados, instaurando uma batalha discursiva sobre a verdade. Assim, ao contrário da anticiência, que se caracteriza pela oposição à ciência e aos métodos científicos, a troll science denota a construção de argumentos que se opõem à ciência e que “[...] contestam e minam no coletivo a confiança no conhecimento científico estabelecido e em fontes comumente aceitas de expertise e competência” (Giorgi; Eslen-Ziya, 2022, p. 6).

 

No Seminário, Mantovani (2014) também recorre ao recurso da negação para desacreditar dados estatísticos brasileiros sobre o número de aborto e da mortalidade materna decorrentes dessa prática. O epicentro é a opinião categórica de que não tem como afirmar que a legalização do aborto diminui a mortalidade materna. Ao tempo em que desdiz o argumento de que a liberação do aborto diminui os casos de interrupção de gravidez, afirma que há países em que ocorreu um aumento de mais de 700% de casos de abortos depois da sua legalização. Ao expor esses dados, a palestrante questiona: “Como alguém honesto pode afirmar que a legalização do aborto diminui a prática do aborto com um dado desse?” (Mantovani, 2014, 23 min 27s).

 

Ao questionar ou colocar em dúvida dados apresentados por organizações de saúde, como a OMS, Mantovani (2014) não se utiliza de inferências fundadas na religião ou em textos sagrados de forma evidente, mas de asserções que evocam a lógica própria da ciência, sem buscar, no entanto, validar seus argumentos com base no método científico ou em procedimentos sistemáticos de investigação. Observa-se, ainda, o uso de técnicas retóricas, como a hipérbole, empregada para maximizar o impacto de tais discursos, como, por exemplo, o dado falacioso de que 700% de casos de abortos ocorreram depois da sua legalização.

 

O uso distorcido de argumentos pretensamente científicos foi uma tática recorrente em outros discursos do Seminário. Por exemplo, Takitani (2014a) critica o modelo adotado pela Suécia por incentivar o aborto. Sua crítica se dá a partir de uma cadeia de eventos, apresentados de forma relativamente superficiais: 1. Para trabalhar, as mulheres suecas abdicam de seu papel na educação dos filhos; 2. A educação propiciada pelo estado sueco é distinta da ética familiar, e, como consequência; 3. Meninas educadas nesse sistema tendem a abortar mais. Esses argumentos são usados para defender a ideia de que as políticas igualitárias, especialmente aquelas que promovem a atividade produtiva feminina, são perniciosas para a estrutura social por transferir “[...] a responsabilidade da educação dos filhos para o Estado” (Scala, 2011, p. 21). Fica implícito, nesse discurso, que as mulheres, além de suas responsabilidades reprodutivas, têm uma função objetiva no processo educativo, a educação moral. E, ao contrário disso, uma educação laica, realizada por professores, considerados “pessoas estranhas”, produziria uma anomalia social.

 

A capacidade de o Estado intervir na vida privada – tema comumente discutido nos textos acadêmicos – é frontalmente questionada por Takitani (2014a), só que para, em última instância, contrapor-se à possibilidade de a mulher decidir sobre o próprio corpo. Na linha de raciocínio da palestrante, as políticas de equidade da Suécia estimularam o trabalho produtivo feminino, mas retiraram a mulher do lar, deixando seus filhos sob os cuidados de desconhecidos, passando o Estado a dar às crianças uma formação distinta da ética familiar (Takitani, 2014a, 53 min 58 s). Conforme esse raciocínio, a academia, dominada pela orientação política e ideológica à esquerda, omitiria os aspectos negativos dessas iniciativas. Assim o compromisso dessas ativistas antigênero seria justamente mostrar como sociedades situadas em países da social-democracia têm problemas.

 

Destaca-se o uso de exemplos de países considerados social-democratas, comumente citados de forma positiva nas análises sobre política social, para contrastar um dos ideais feministas: o direito de a mulher poder abortar. Nota-se novamente que o argumento contra o aborto não é fundado em textos sagrados ou em experiências de grupos religiosos, tampouco em dados científicos comprovados, mas em exemplos conhecidos. Com efeito, países que adotam a social-democracia, e que gozam de reconhecimento por suas políticas, são usados para validar conclusões distorcidas.

 

Para convencer seu público, Takitani (2014a) recorre a discussões conhecidas de acadêmicos e políticos presentes no Seminário, mas com a finalidade de condenar o aborto. Logo militantes antigênero, a depender dos espaços que ocupam, utilizam de argumentos e exemplos próprios daquele ambiente para dar credibilidade e disseminar ideias conservadoras. Isso não significa que esses argumentos não tenham ligação com princípios religiosos, mas, sim, que uma das estratégias utilizadas pela militância antigênero é retomar exemplos e dados pretensamente científicos, para conferir uma aparência de legitimidade a argumentos falaciosos.

 

O uso de dados pretensamente verdadeiros, mas sem comprovação, também é comum nessa estratégia, a exemplo do seguinte trecho: “[...] a tendência estatística [do aborto] é de alta. As pessoas estão cada vez mais abortando mais. E mais vezes, a mesma menina” (Takitani, 2014a, 58 min 17 s). A palestrante usa de dados estatísticos falaciosos, mas que conferem aparente legitimidade ao seu discurso, reforçando as crenças do público que apoia essa agenda.

 

Um conjunto de alegações falaciosas também aparece na palestra de Andreia Medrado (2014) no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade. Medrado faz afirmativas graves, como: as feministas são agentes de grandes corporações financeiras e de ONGs que lucram com a promoção do aborto. Para ela, sob influência de grandes corporações financeiras, ONGs e feministas, a ONU tenta diminuir a taxa de natalidade de populações mais pobres de países subdesenvolvidos, estimulando mudanças na estrutura social (Medrado, 2014, 18 min 44 s).

 

Assim como Mantovani, Medrado (2014) cita os nomes de instituições e, por vezes, de pessoas, detalhando como se dá esse processo. Relata que, após a Conferência do Cairo, em 1994, sob a liderança de Adrienne Germain, cofundadora da International Women's Health Coalition, fundações como a MacArthur e a Ford foram responsáveis por disseminar as resoluções de saúde pelos países. “Junto com todas essas questões, uma das coisas que a Fundação MacArthur fazia era promover uma mudança política no Brasil, para que o aborto fosse cada vez mais inserido dentro, inclusive da legislação” (Medrado, 2014, 19 min 23 s). Na perspectiva adotada por Medrado, a defesa do aborto teria sido incentivada por organizações internacionais como prática imposta aos países mais pobres para incentivar a exploração de sua população.

 

Observa-se, nas alegações de Medrado (2014), a difusão de uma visão particular do mundo, caracterizada pelo embate entre dois paradigmas polarizados – a ciência do bem e a ciência do mal –, a partir do qual, disputa-se a verdade. Assim como nas denúncias de Mantovani e Takitani, as alegações de Medrado não são feitas com base em uma validade epistêmica, a partir da ciência. Em vez disso, os argumentos são feitos de forma superficial e sem fundamentação, visando a difundir um pânico moral em relação aos ideais feministas.

 

A perspectiva do pânico moral foi reiterada vezes acionada pelas mulheres do OIB durante o Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, especialmente quando Andreia Medrado (2014) disse que “[...] nenhum país conseguiu diminuir a taxa de natalidade sem legalizar o aborto [...]” (Medrado, 2014, 5min 15s ); quando Fernanda Takitani (2014) explica porque na Suécia, devido aos direitos sexuais e reprodutivos, cada vez mais meninas reincidem na prática do aborto: “[...] não há necessidade, até as dezoito semanas de gravidez, de comunicar os pais ou responsáveis legais. Caso uma menor de idade queira fazer aborto na Suécia, ele é liberado [...]” (Takitani, 2014a, 58 min 17 s); ou, ainda, quando Mantovani (2014) afirmou que a IPPF de Margaret Sanger executa um projeto eugenista que pretende “[...] extirpar os negros da sociedade por meio do aborto” (Mantovani, 2014, 8 min 49 s). Nota-se que, nessa lógica, as articulistas do OIB se apresentam como especialistas credenciadas que podem explicar “[...] os perigos escondidos atrás do que é entendido como superficialmente inofensivo” (Cohen, 2011, p. 8-9).

 

Como resultado das análises preliminares, identificamos que as alegações feitas pelas mulheres no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade replicam ideias contidas nas obras de Jorge Scala. Cita-se, especialmente, duas obras utilizadas nos argumentos do OIB no Seminário: a) IPPF: a multinacional da morte (2010), publicada pela Cúria Diocesana de Anápolis; e b) Ideologia de gênero: neototalitarismo e a morte da família (2011), publicada pela Katechesis, editora de Felipe Nery.

 

Os textos de Scala estão disseminados no mercado editorial brasileiro, sobretudo em plataformas acadêmicas destinadas a pesquisadores. O autor pretende “[...] alçar a 'ideologia de gênero' ao status de conhecimento válido do ponto de vista acadêmico e científico” (Lionço, 2020, p. 374). Mas, apesar da farta matéria documental utilizada e do uso de parâmetros pretensamente científicos, o seu discurso resvala, peremptoriamente, em tom conspiratório. Um exemplo: Scala (2011) acusa a ONU e suas agências de empurrar a agenda de gênero aos países, especialmente os mais pobres e subdesenvolvidos, com a finalidade de reduzir populações por meio do aborto. Conforme explicita, “[...] o alvorecer do Terceiro Milênio nos traz a ONU promovendo o genocídio universal – através do aborto e das esterilizações – e o reconhecimento de ‘direitos humanos’ a certos animais” (Scala, 2011, p. 114). A intenção do autor, afinal, é mobilizar a opinião pública contra “os supostos riscos sociais e morais implicados na agenda de direitos sexuais e de direitos reprodutivos” (Lionço, 2020, p. 373).

 

O tom conspiratório aparece, também, no discurso das palestrantes no Seminário. O discurso de Medrado (2014), por exemplo, repercute uma das principais teses de Scala (2011): a de que a militância feminista esconde, por detrás da defesa dos direitos sexuais e reprodutivos, um Cavalo de Troia.

 

A metáfora do Cavalo de Troia, eventualmente citada por grupos como o OIB, passou a evocar a ideia de que há um mal, enganosamente inocente ou difícil de reconhecer, que vem destruindo as estruturas sociais. Esse mal estaria sendo escondido da população, e a direita conservadora teria o compromisso de desvelá-lo.

 

Um exemplo é a acusação de Scala (2011), replicada pelas mulheres do OIB, de que os programas de planejamento familiar são, na verdade, artimanhas políticas de países ricos, cujo fim é “[...] fazer diminuir as taxas de natalidade dos países pobres” (Scala, 2011, p. 16). Como estratégias de convencimento, todas essas afirmações são passadas como verdadeiras e confiáveis. Assim, em que pese o senso comum considerar que a direita se utiliza somente de discursos religiosos e dados científicos, a análise dos discursos proferidos no Seminário em questão revela, por parte do OIB, um esforço retórico e persuasivo que se contrapõe a duas marcas da ciência moderna, a objetividade e o método empírico (Allen, 2004). Além disso, considerando a coleção de argumentos proferidos por mulheres no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade, o uso seletivo de fatos (distorcidos) e de dados sem comprovação como estratégia para conferir uma aparência de confiabilidade a esses discursos desvia-se da prática científica séria e tem como objetivo confundir e enganar.

 

3 A utilização do discurso pretensamente científico como estratégia do ativismo

antigênero

 

A literatura já vem afirmando como o campo conservador tem utilizado a ciência para conferir legitimidade às investigações não científicas (Haack, 2012; Machado, 2018; Korolczuk, 2020). Conforme essa interpretação, os conservadores que se opõem ao gênero, “[...] buscam se legitimar cientificamente como especialistas no campo da reprodução humana, família e política social” (Korolczuk, 2020, p. 701). Trata-se, sobretudo, de uma disputa de significados em que religiosos se apropriam de determinadas ideias do campo científico com a finalidade de definir normas sociais e legais da sociedade (Machado, 2018).

 

O cientificismo como estratégia de convencimento seria especialmente utilizado pelos conservadores no campo da discussão sobre gênero.  Por exemplo, Lionço (2020) afirma que o constructo retórico da ideologia de gênero é usado de forma recorrente por conservadores, alinhando-se, especialmente, a “[...] movimentos de anti-intelectualismo e antielitismo, bem como do fundamentalismo religioso, características contemporâneas de políticas antidemocráticas” Lionço (2020, p. 373). Essa seria uma investida de grupos conservadores que retomam “[...] a antiga disputa entre as esferas religiosas e científicas acerca da verdade e ou de como pensar as relações humanas e a ordem social” (Machado, 2018, p. 1).

 

No entanto outros estudos apontam que esses movimentos não são ideologicamente homogêneos, possuindo diferentes agendas, retóricas e repertórios de ação. Nesse sentido, pode ser enganosa a ideia de que os grupos que compõem os movimentos antigênero sejam meramente fundamentalistas religiosos (Almeida, 2017). Se tomado nessa acepção, o fundamentalismo seria mais uma categoria acusatória do que uma classificação analítica (Miskolci, 2018).

 

Defendemos neste trabalho que, mais do que se utilizar de verdades científicas para corroborar dogmas religiosos, os discursos do OIB podem ser entendidos pelo que Tuchman (1984) denomina de viés de confirmação. Essa estratégia se caracteriza pelo uso equivocado da pesquisa indutiva, interpretando (ou distorcendo) informações a fim de confirmar crenças ou hipóteses favoráveis a determinadas causas. Logo trata-se de informações falsas, a exemplo do argumento de Mantovani (2014) de que as políticas reprodutivas teriam como objetivo reduzir as populações mais vulneráveis, especialmente as formadas por negros e pobres.

 

Eslen-Ziya (2020) denomina essas estratégias baseadas em mentiras de troll science, uma referência à expressão trolling for suckers originada nos fóruns Usenet, dos anos 1990. Na gíria da internet, o troll é uma estratégia de distração, destinada a sequestrar a atenção dos usuários. A intenção do troll é interromper debates relevantes por meio de mensagens controversas, ou mesmo fúteis, desviando as atenções da discussão principal. Por esse ponto de vista, o uso da tática da ciência troll sobre o tema gênero caracteriza-se pelo uso de argumentos pseudocientíficos ou cientificamente distorcidos, com o objetivo de criar uma narrativa alternativa. Essa tática discursiva se estende, ainda, para o interior de instituições consideradas laicas, que adotam o discurso secular: “[...] através de conferências acadêmicas, seminários e publicações, a governança discursiva é implementada, tornando o movimento antigênero um campo alternativo de produção de conhecimento” (Eslen-Ziya, 2020, p. 7).

 

Essa tem sido a tática adotada pelo OIB em seu ativismo antigênero no Brasil. Por meio desses discursos, OIB concebe o sexo como uma categoria estável, biológica e binária, entendendo, por outro lado, o gênero (enquanto construção social) uma noção ideológica e ameaçadora, usada para fins imorais. A transgressão das fronteiras do sexo e gênero são combatidas como ameaças à estrutura social.

 

Em sua atuação político-discursiva, o OIB tem defendido que a ideia de um gênero socialmente construído, em vez de determinado biologicamente, é prejudicial ao desenvolvimento e formação das crianças. Nesse sentido, Felipe Nery (2014), um dos líderes do OIB, usa frequentemente a biologia para defender que apenas uma realidade é verificável: a existência de dois sexos, o masculino e o feminino. Nessa perspectiva, e usando argumentos de Scala, tem criticado o que chama de rapto do sentido das palavras, operado, segundo ele, pela retórica das teorias de gênero:

 

Se qualquer pessoa pensasse que gênero é masculino e feminino, estaria perfeito, ótimo, né? Na verdade, a palavra não deveria ser gênero e, sim, sexo masculino e feminino. Mas se fosse isso estaria muito bem. O problema é que esta palavra foi raptada. O sentido das palavras tem sido raptado. Já faz muito tempo. E aqui é a questão. Há uma guerra de linguagem (NERY, 2014, 6 min 10 s).

 

O uso das ciências biológicas como recurso de validação de crenças ontológicas sobre a relação sexo-gênero tem sido recorrente. Ao colocar ênfase nas diferenças biológicas, o OIB tenta distinguir as proposições consideradas ideológicas dos fatos considerados científicos. Sendo assim, o OIB não tenta negar a ciência, mas desafiar a produção social de significados, como a de gênero, firmando suas próprias representações na linguagem. Nessa ordem de pensamento, gênero passa a ser entendido como antinatural ou, sobretudo, como um engodo meramente linguístico. A retórica biologizante utilizada por grupos do movimento antigênero cumpre, assim, duas funções principais: tentar validar teorias essencialistas; e afastar o discurso antigênero da ortodoxia dogmática religiosa, aproximando-o do secularismo praticado nos meios acadêmicos.

 

Fernanda Takitani (2014b) também se utiliza dessa estratégia discursiva no Seminário Mulher, Família e Gênero, quando considera enganosa a noção de gênero:

Então, para os ideólogos de gênero, uma pessoa tem uma autonomia total para renegar a sua biologia. Eu tenho órgãos genitais femininos, mas se eu quiser me considerar um homem, eu preciso abrir mão dessa realidade anatômica, biológica, e fazer o que minha vontade quer (Takitani, 2014b, 1 min 16 s).

 

Ela, assim como outros participantes do Observatório, utiliza a discussão das áreas da biologia e sexualidade, mas justamente para comprovar a teoria deles e, de modo mais largo, disseminar um discurso conservador e moralista.

 

Embora não se discuta neste artigo qual seria essa nova configuração política, é possível perceber os impactos da atuação de grupos conservadores como o OIB na esfera política, seja inspirando ou criando obstáculos para determinadas políticas públicas. Estudos demonstram que, no Brasil, a partir de 2010, as manifestações antigênero se amplificaram, mobilizando católicos e evangélicos contrários à descriminalização do aborto, à criminalização da homofobia ou à legalização da união de casais LGBTQIA+ (Souza, 2013). Assim, a troll science e o uso do viés de confirmação beneficiam os projetos desses grupos.

 

Ao tentar reivindicar a verdade e impor novos significados a temas seculares, infere-se que o OIB tenta criar uma episteme moral sobre sexualidade e gênero, influindo, assim, na opinião pública e nas decisões políticas.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Neste estudo, examinou-se a atuação do Observatório Interamericano de Biopolítica na produção de discursos contra os direitos sexuais e reprodutivos no Brasil, com o objetivo de evidenciar como o OIB utiliza de técnicas da troll science para legitimar e disseminar suas causas. A análise dos discursos proferidos no Seminário Gênero, Aborto e Sociedade revela o uso estratégico de técnicas retóricas, como o viés de confirmação, e de informações pretensamente científicas e familiares, com o intuito de disseminar um discurso conservador e moralista. Além disso, o grupo procura, deliberadamente, selecionar evidências que comprovem suas visões de mundo, com dados sem validação científica.

 

Ainda que a trajetória do grupo permaneça um tanto obscura, o OIB deixou evidências de sua importância no contexto dos movimentos antigênero brasileiro. Antes mesmo de 2014, quando surgiu, tornou-se uma das principais referências da retórica “ideologia de gênero” no país. Os seus discursos e argumentos foram replicados e constantemente utilizados por lideranças partidárias, juristas e religiosos. Devido a sua influência no campo político, não apenas direitos sexuais e de gênero sofreram retrocessos, mas, especialmente, a Educação, em que seu desempenho, junto ao Escola sem Partido, fez recuar inúmeras iniciativas que visavam à equidade de gênero. Dessa forma, em que pese uma certa associação entre a direita com os discursos religiosos, mostramos que grupos como o OIB não só reafirmam os dogmas religiosos, mas, sobretudo, desqualificam os conhecimentos aferidos pelo método científico com a finalidade de promover os seus projetos e a eles próprios.

 

Nessa arena de disputas discursivas, cabe investigar, porém, de que forma o Observatório Interamericano de Biopolítica se conecta aos movimentos transnacionais antigênero, uma vez que faz uso de estratégias, repertórios e técnicas de mobilização que remetem a movimentos de outros países. Fica aberta, também, a questão sobre o quanto esse conjunto de estratégias usadas por grupos antigênero ajuda a promover a ocupação de cargos na política institucional.

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Ana Kelma Cunha GALLAS Trabalhou na concepção e delineamento e análise e interpretação dos dados, bem como, na redação do artigo.

Doutoranda em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Mestre em Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Piauí (2011-2013). Bacharel em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Federal do Piauí (1993). Atualmente é professora titular do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA). Integra o Grupo Democracia e Marcadores Sociais da Diferença (UFPI).

 

Olívia Cristina PEREZ Trabalhou na concepção e delineamento do artigo, bem como, na aprovação da versão a ser publicada.

Doutora em Ciência Política e mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Cursou o bacharelado e licenciatura plena em Ciências Sociais na Universidade Estadual Paulista (FCLAr/UNESP). Tem estágio pós-doutoral no Programa de Investigación en Ciencias Sociales, Niez y Juventud (CLACSO, Univ. Manizales/CINDE, FLACSO, UBA, PUC San Pablo, COLEF, CIPS, UNLa). Atualmente é Professora Adjunta na Universidade Federal do Piauí (UFPI) vinculada aos cursos de bacharelado e mestrado em Ciência Política e ao programa de pós-graduação (mestrado e doutorado) em Políticas Públicas. É membro do Grupo de Trabalho Infâncias e Juventudes da Clacso, do Núcleo Democracia e Ação Coletiva (NDAC/CEBRAP) e líder do Grupo de pesquisa Democracia e Marcadores Sociais da Diferença. Bolsista Produtividade do CNPQ.

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* Jornalista. Mestre em Antropologia e Arqueologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Doutoranda em Políticas Pública na UFPI. Professora do Centro Universitário Santo Agostinho. (UNIFSA, Teresina, Brasil).  Av. Prof. Valter Alencar, nº 665, São Pedro, Teresina (PI), CEP.: 64019-625. E-mail: kelmagallas@outlook.com.

 

** Cientista Política. Doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP). Professora do bacharelado e mestrado em Ciência Política e do doutorado em Políticas Públicas da Universidade Federal do Piauí. (UFPI, Teresina, Brasil). Campus Universitário Ministro Petrônio Portella Bairro Ininga, Teresina (PI), CEP.: 64049-550. E-mail: oliviaperez@ufpi.edu.br.

 

 © A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial.  O licenciante não pode revogar estes direitos desde que você respeite os termos da licença.

 

[1] Pânico moral é um processo de escalada de terror, medo ou insegurança, decorrente de um aviso alarmista sobre os perigos de um grupo social que desafia a ordem, desencadeando reações que servem de justificativa para o desejo de controle do grupo desviante (Cohen, 2011). Sendo um fenômeno social que ocorre quando uma ameaça percebida a valores ou normas sociais é amplificada de forma desproporcional pela mídia e outras instituições, o que se deseja, estrategicamente, é criar obstáculos para mudanças sociais e culturais que estão ocorrendo em relação à questão de gênero e sexualidade (Milkolci; Campana, 2017).

[2] Embora a origem dos movimentos antigêneros seja imprecisa, é possível afirmar que esses movimentos se apoiam em crenças ontológicas sobre os papéis de gênero, que visam, entre outras coisas, a promover a naturalização das relações de gênero, as hierarquizações sexuais, a heterossexualização compulsória e a inculcação das normas de gênero (Junqueira, 2019). Recentemente, os movimentos de gênero têm sido guarnecidos pelo sintagma ideologia de gênero, invenção católica que emergiu sob os desígnios do Conselho Pontifício para a Família, da Congregação para a Doutrina da Fé, entre meados da década de 1990 e no início dos 2000 (Garbagnoli, 2014; Junqueira, 2018; Vaggione, 2020). Esses discursos objetivam frear processos de laicização e de secularização de sociedades ocidentais, desarticulando agendas que promovem a diversidade e a equidade de gênero.