Saúde sexual e reprodutiva
de mulheres quilombolas do Goiás
Sexual and reproductive health of quilombola women in Goiás
Dalila Maria de Fátima LISBOA*
https://orcid.org/0000-0001-9136-2557
Lucélia Luiz PEREIRA**
https://orcid.org/0000-0001-9722-143X
Resumo: O artigo tem como objetivo discutir a saúde
sexual e reprodutiva de mulheres quilombolas. A pesquisa, de caráter
qualitativo, foi realizada no Quilombo Mesquita, Goiás, onde foram realizadas
10 entrevistas semiestruturadas com mulheres quilombolas entre fevereiro e
abril de 2022. Como principais resultados destacam-se que as entrevistadas avaliam positivamente o acompanhamento
do pré-natal, mas apontam limitações e/ou inexistência de outros serviços de
saúde sexual e reprodutiva, como o planejamento reprodutivo, os métodos contraceptivos,
as ações de educação em saúde, a infraestrutura da Unidade Básica de Saúde
(UBS), os serviços de contrarreferência para a realização do parto etc. É
importante fomentar estratégias para garantir os direitos sexuais e
reprodutivos das mulheres quilombolas, respeitando a diversidade e buscando
combater discriminações de gênero e raça, intensificadas no Brasil devido à
onda conservadora contemporânea.
Palavras-chave: Mulheres.
Quilombolas. Racismo. Saúde sexual e reprodutiva.
Abstract: The article aims to discuss the
sexual and reproductive health of quilombola women.
The qualitative research was carried out at Quilombo Mesquita, Goiás, Brazil, and 10 semi-structured interviews were
carried out with quilombola women between February
and April 2022. As main results, it is highlighted that the interviewees
positively evaluate prenatal care but point out limitations and/or lack of
other sexual and reproductive health services such as reproductive planning,
contraceptive methods, health education actions, basic health unit
infrastructure, counter-reference services for childbirth. It is important to
promote strategies to guarantee the sexual and reproductive rights of quilombola women, respecting diversity and seeking to
combat the gender and racial discrimination, which was intensified in Brazil
due to the contemporary conservative wave.
Keywords: Women. Quilombolas.
Racism. Sexual and reproductive health.
Submetido em: 31/8/2022. Revisto em:
28/2/2023 e 25/3/2023. Aceito em: 31/3/2023.
Introdução
O |
presente estudo
objetivou discutir a saúde sexual e reprodutiva de mulheres quilombolas de
Mesquita-Goiás, dando destaque aos direitos dessas mulheres ao acesso aos
serviços de saúde ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Quilombo Mesquita está situado na Cidade Ocidental, a aproximadamente 40 km de Brasília (DF),
Capital Federal, e a 205 km da capital do Estado de Goiás, Goiânia. Ele surgiu no século XVIII e tem aproximadamente
277 anos de existência. A história do quilombo é relatada principalmente por
tradição oral. Os quilombolas narram que três escravas herdaram as terras da
família portuguesa Mesquita, e essas escravas deram origem aos quatro troncos
genealógicos: Pereira Braga, Pereira Dutra, Teixeira Magalhães e Lisboa da
Costa.
O quilombo tem cerca de 700 famílias
quilombolas. A pesquisa contou com a participação de 10 mulheres que realizaram
acompanhamento pré-natal na Unidade Básica de Saúde (UBS), localizada na
comunidade. Sendo assim, buscou-se realizar análise sobre os mecanismos de
promoção da saúde integral das mulheres quilombolas no período reprodutivo, bem
como o enfrentamento do racismo institucional que permeia a vida delas e a
superação de barreiras estruturais que prejudicam o acesso aos serviços de
saúde.
A discussão sobre acesso à saúde aponta a
necessidade de reconhecer o racismo como um determinante dos processos de saúde
e doença, estando ainda fortemente presente na vida dos quilombolas,
influenciando no acesso aos bens públicos e criando impedimentos para o usufruto
dos direitos sociais. O Brasil tem uma legislação que não realiza distinção
entre a população para acessar serviços e programas de saúde em função dos
princípios de universalidade e equidade, preconizados pelo SUS. No entanto,
apesar da garantia legal, o acesso se torna desigual em decorrência de
iniquidades sociais e raciais, ainda fortemente presentes no contexto
brasileiro (BATISTA; MONTEIRO; MEDEIROS, 2013; INSTITUTO DE ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS, 2020).
Assim, a Política Nacional de Saúde Integral da
População Negra (PNSIPN), bem como a Política Nacional de Atenção à Saúde dos
Povos Indígenas e a Política Nacional de Saúde Integral das Populações do
Campo, da Floresta e das Águas foram criadas com o objetivo de possibilitar o
acesso aos serviços de saúde pela população negra, indígena, quilombola,
populações do campo, dentre outras, buscando viabilizar o atendimento de
necessidades específicas destes segmentos populacionais.
A população quilombola é um segmento
populacional que vivencia inequidades no acesso à saúde, por isso, na
formulação e na implementação de programas de saúde é importante considerar o
contexto que permeia a vida dessa população. No caso das mulheres quilombolas,
os processos socioeconômicos e culturais contribuem para as desigualdades em
saúde e para a menor qualidade da atenção, inclusive no que diz respeito aos
direitos sexuais e reprodutivos.
2 Racismo
estrutural e direito à saúde das mulheres negras quilombolas
A PNSIPN visa a combater as desigualdades no
SUS e promover a saúde das pessoas negras de forma integral. Destaca-se que a
aprovação da PNSIPN é fruto das lutas e das mobilizações realizadas pelo
movimento negro e pela sociedade civil organizada, com representantes também
das populações quilombolas. De acordo com Araújo e Teixeira (2022), “[...] as
lideranças desenvolveram concepções sobre o processo saúde doença a partir da
noção de racismo estrutural, o que orientou a elaboração de uma agenda
política, a definição e articulação das alianças estratégicas e as formas de
atuação na esfera pública” (ARAÚJO; TEIXEIRA, 2022, p. 1).
Destaca-se que a PNSIPN se configura como um
marco no reconhecimento pelo poder público da presença do racismo estrutural e
institucional e da necessidade de implementar ações para enfrentar as
inequidades raciais no SUS. Para Almeida (2019),
O
racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo ‘normal’
com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até
familiares, não sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O
racismo é estrutural. Comportamentos individuais e processos institucionais são
derivados de uma sociedade cujo racismo é regra e não exceção (ALMEIDA, 2019,
p. 33).
Esse racismo estrutural, que Almeida (2019)
reitera fazer parte da organização econômica e política brasileira, contribui
para que determinados grupos sociais fiquem em situação de desvantagem em
relação ao acesso aos serviços de saúde. Conforme Theodoro (2014), a diversidade
é transformada pelo racismo em desigualdade, pois opera a partir de uma escala
de valores que são tornados aceitáveis socialmente e até mesmo justificável a
distribuição desigual de privilégios. Para o autor, “[...] o racismo está
presente no cotidiano das relações sociais, funcionando como um filtro social,
fortalecendo ou cerceando oportunidades, moldando e reforçando os pilares de
acesso e exclusão” (THEODORO, 2014, p. 214).
Essa desigualdade racial influencia no acesso diferenciado às políticas
públicas, principalmente de saúde.
De acordo com Arruda
(2021),
O
racismo estrutural esconde-se ao mesmo tempo em que se manifesta nas instituições
e pessoas, afetando religiosidades, sexualidades, territorialidades; produz
sofrimento psíquico, etc. Quando se banaliza, se torna
consentido pelos pares e até mesmo pelo silenciamento daqueles que não
concordam. Até mesmo pela relação de gênero, o racismo estrutural não se
manifesta da mesma forma com os sujeitos (ARRUDA, 2021, p. 515).
Dessa forma, se faz necessário discutir sobre o
racismo estrutural à luz dos direitos das mulheres negras quilombolas, pois
essa forma de inferiorização está imbricada de elementos opressores que dão
sustentação e propiciam a cristalização de fatores excludentes para essas
mulheres. São esses desdobramentos que marginalizam e reconfiguram essa
população cotidianamente.
As mulheres negras quilombolas vivem em
constantes desvantagens relacionadas à exploração e à discriminação, que são
traduzidas em desigualdades sociais. As violências e opressões são obstáculos
ao desenvolvimento identitário, tanto individual quanto coletivo. O enfrentamento
do preconceito só é possível com a criação de políticas públicas que atendam a
população negra e um conjunto de ações que tenham por objetivo a consolidação e
o enfrentamento do racismo.
É importante compreender os direitos à saúde
das mulheres negras quilombolas com base nos princípios do SUS de
universalidade, integralidade e equidade. A PNSIPN pontua, em um dos seus
objetivos específicos, a garantia e a ampliação do acesso da população negra e
das florestas, em particular as populações quilombolas, às ações e aos serviços
de saúde (BRASIL, 2017).
Garantir atenção à saúde das populações
quilombolas também exige conhecimento das especificidades desse segmento
populacional, uma vez que muitos de seus cuidados de saúde são praticados a
partir de conhecimentos e memórias que herdaram dos antepassados. Tais memórias
são preservadas por meio de medicina popular. Assim, é importante que os
serviços de saúde compreendam tais práticas ancestrais e de cuidado para que
as/os quilombolas não sejam excluídas/os dos processos de atenção à saúde
ofertados pelo SUS.
As representações do ser quilombola estão
fortemente atreladas à identidade étnica e vinculadas com o direito à terra. Essas comunidades são constituídas de
descendentes de africanos que se organizaram e “[...]
reivindicam
o direito à permanência e ao reconhecimento legal de posse das terras ocupadas
e cultivadas para moradia e sustento, bem como o livre exercício de suas
práticas, crenças e valores considerados em sua especificidade” (LEITE, 2000,
p. 334).
A pesquisadora Leite (2000) discute a construção da
territorialidade e busca da identidade quilombola, dois conceitos intimamente
relacionados. Ao falar em identidade, compreende que ela é fruto de ações
coletivas dos sujeitos sociais. As
comunidades têm como marco principal a territorialidade. A terra tem um
significado muito importante, pois ela é fonte de sustento e resistência dos povos quilombolas. A Constituição Federal traz no artigo
68, situado nas Disposições Transitórias, o reconhecimento da propriedade de
terras para as comunidades quilombolas. Essa conquista foi fruto das lutas
políticas, tanto dos negros quilombolas quanto dos movimentos sociais.
As comunidades
quilombolas possuem expressivas desigualdades socioeconômicas se comparadas às
populações urbanas, maiores índices de doenças crônicas e, ao mesmo tempo, possuem
um acesso restrito a serviços de saúde (ARRUTI et al., 2021; SILVA; SOUZA, 2021). Ao falarmos sobre a
representação nacional desse grupo populacional, é importante destacar que, de
acordo com estimativa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(2019), há 5.972 localidades quilombolas do país, em todas as regiões
brasileiras.
A
demarcação do território das comunidades quilombolas é um instrumento legal e
normativo importante para conquistas de políticas públicas que atendam às suas
demandas, por exemplo, a disponibilidade de equipamentos sociais, tais como as
UBS. Contudo, destaca-se a necessidade de garantir que os conhecimentos sobre
ciência estejam associados aos saberes tradicionais das pessoas quilombolas, a fim de preservar as suas necessidades
específicas e o direito à saúde.
Portanto, observa-se a importância fundamental da
implementação de políticas sociais que tenham capacidade de melhorar as
condições de vida e saúde da população quilombola, levando em consideração que
grande parte dessas populações vivem em áreas rurais, necessitando de melhorias
na infraestrutura e em
ações de atenção à saúde.
3
Direitos sexuais e reprodutivos de mulheres quilombolas
As
mulheres quilombolas estão inseridas em um coletivo, onde a concepção de saúde
dialoga fortemente com as particularidades étnicas e de conhecimento ancestral.
Assim, a atenção à saúde desse segmento exige uma aproximação e conhecimento
com os modos de vida, buscando respeitar essas especificidades e atender suas
demandas de saúde a partir dos serviços que são ofertados. Para Gomes, Gurgel e
Fernandes (2021), “A compreensão de saúde dos quilombolas está relacionada ao
conceito de saúde integral, considerando a totalidade dos elementos que se
relacionam e modificam o estado de saúde das pessoas” (GOMES; GURGEL;
FERNANDES, 2021, p. 6).
Ao
abordarmos os direitos sexuais e reprodutivos de mulheres
quilombolas, faz-se necessário compreender o contexto mais amplo da inserção
dessa pauta dos direitos humanos, uma vez que tais direitos são fruto de conquistas históricas e da luta pela cidadania.
Esses
direitos são, portanto, reconhecidos a partir dos seus
valores democráticos e da inserção na agenda política de direitos nacionais e
internacionais. A Conferência Internacional de População e Desenvolvimento,
realizada no Cairo em 1994, foi um marco importante na definição dos direitos
sexuais e reprodutivos como uma extensão dos direitos humanos (GALLI; ROCHA,
2014).
De acordo com Ávila (2003), os
direitos reprodutivos estão voltados para a igualdade e a liberdade na esfera
da vida reprodutiva e os direitos sexuais se relacionam mais diretamente à
igualdade e à liberdade no exercício da sexualidade. Tais direitos quando
compreendidos como algo prescritivo e normativo, a partir de modelos e regras
para o exercício da sexualidade e da vida reprodutiva, são transformados em
algo repressivo, negando e cerceando direitos.
No cenário político atual,
combina-se o conservadorismo com ideologias religiosas, resultando em uma
desproteção dos direitos sexuais e reprodutivos. O governo Bolsonaro tem imposto uma pauta moralista
e religiosa, ameaçando direitos conquistados historicamente e ferindo o princípio da laicidade do Estado (RAMOS, 2020).
Sustenta-se uma bandeira de
defesa da família e da moral, impondo retrocessos à pauta dos movimentos
feministas de garantia dos direitos sexuais e reprodutivos. Esse
conservadorismo político impacta na disponibilidade de políticas sociais,
inclusive na área de saúde, trazendo prejuízos à ampliação de serviços voltados
à saúde sexual e reprodutiva das mulheres.
A perspectiva feminista compreende
que deve ser assegurada a autonomia tanto da esfera sexual quanto reprodutiva.
Isso permite relacionar essas duas dimensões às várias outras da vida social. O
direito à autonomia das mulheres permite o rompimento com a visão conservadora
da associação intrínseca entre sexualidade e reprodução. O que se observa é a
importância do rompimento de regras e tabus que têm como premissa controlar e
reprimir as experiências das mulheres em relação a sua sexualidade e
reprodução. Essas regras são expressões do controle, fruto de uma sociedade
patriarcal (ÁVILA,
2003).
As mulheres não dispõem das
mesmas condições para exercer seus direitos (OLIVEIRA; KUBIAK 2009). No caso
das mulheres negras e quilombolas, há diversas formas de opressão que se
intercruzam gerando desvantagens no acesso a bens e serviços, dificultando a
garantia dos direitos sexuais e reprodutivos. De acordo com Pereira e Ferreira
(2016):
A
história do planejamento reprodutivo das mulheres quilombolas mostra como vivenciaram
suas experiências reprodutivas, submetidas às condições desfavoráveis, como
gravidez não planejada e acesso restrito aos serviços de Atenção Básica à
saúde, assim como, o acesso precarizado aos serviços de saúde no período
gravídico-puerperal (PEREIRA; FERREIRA, 2016, p. 47).
São direitos extensivos também à
política de saúde no sentido de promover ações e serviços para garantir justiça
social. Nesse sentido, a formulação e a execução de ações em saúde devem
considerar as desigualdades de gênero, classe, raça e orientação sexual, para
garantir equidade na atenção à saúde. Segundo Ávila (2003, p. 468), “Gravidez, parto,
puerpério, aleitamento materno, concepção, contracepção, aborto, doenças
sexualmente transmissíveis e violência sexual são questões cruciais que hoje
estão colocadas para a política de saúde”.
Ao discutir os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres
negras é importante ressaltar que elas sofrem diariamente com o racismo
institucional nos serviços de saúde. Isso demonstra a violação dos corpos
negros e de seus direitos reprodutivos e se manifesta na violência obstétrica
que permeia a vida dessas mulheres. Para Santos et al.
(2019),
as mulheres negras
[...] são as principais vítimas da
negligência e das violações em torno dos direitos e da saúde reprodutivos e
sexuais e essa mudança de paradigma se faz necessária devido à complexidade da
questão e aos enormes tabus que ela enfrenta sob os mais variados aspectos, e
que influenciam na saúde e bem-estar (SANTOS et al., 2019, p. 6).
A
partir da compreensão dos direitos sexuais e reprodutivos como campo de atuação
das políticas de saúde, é indispensável o debate da saúde sexual e reprodutiva
das mulheres quilombolas. É também necessário abarcar as noções de liberdade e
autonomia articuladas com as condições de renda, considerando os marcadores
sociais de gênero e raça. Dados de Fernandes et
al. (2020) apontam que
A
influência das características sociodemográficas
no acesso das mulheres aos exames preventivos de saúde determina a exposição
das mulheres negras ao acesso desqualificado aos serviços de saúde. Isso pode
ser observado também entre as quilombolas, que
apresentam dificuldades de acesso aos exames preventivos incluídos no rol de
atendimento do programa de atenção à mulher (FERNANDES et al.,
2020, p.5).
Dessa forma, o acesso limitado aos serviços de saúde pode
aumentar o risco de vivência de gestações não planejadas, de doenças sexualmente
transmissíveis, da não escolha do método contraceptivo, dentre outros.
Destaca-se também, como aponta Pereira (2017), que as características
geográficas da
população rural, a escassez de profissionais para trabalhar nas áreas rurais,
bem como a distância das unidades de saúde dificultam o acesso da população
quilombola aos cuidados e aos equipamentos do SUS. Portanto, faz-se necessário reduzir as disparidades raciais
na promoção dos serviços de saúde e garantir os direitos sexuais e reprodutivos
das mulheres quilombolas.
4 Dos procedimentos metodológicos
Os resultados apresentados neste artigo são
parte dos dados coletados na pesquisa de campo realizada durante o mestrado de
uma das autoras, para a elaboração de sua dissertação. A pesquisa foi realizada
com mulheres em idade reprodutiva que realizaram pré-natal na Comunidade
Quilombola de Mesquita, situada no município de Cidade Ocidental (GO). O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em
Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais (CEP/CHS)
e aprovado, tendo como parecer o nº 4.939.348. Foram realizadas 10 entrevistas
semiestruturadas a partir de uma perspectiva decolonial
e sob a coordenação de uma das autoras, mulher negra quilombola. As entrevistas ocorreram, de forma presencial, entre os meses
de fevereiro e abril de 2022. Tendo em vista a pandemia de Covid-19, é
importante esclarecer que foram tomados os cuidados necessários, como o
distanciamento e uso de máscaras e álcool em gel, tanto por parte da
pesquisadora, quanto pelas mulheres entrevistadas.
A perspectiva decolonial
tem por objetivo o afastamento de pressupostos de origem da ciência
eurocêntrica e a construção de conhecimento tendo como foco a realidade
latino-americana. Ela visa atender os objetivos do pesquisador e do pesquisado,
estabelecendo uma relação interdependente entre eles. A decolonialidade
possibilita responder demandas das classes oprimidas, não sendo essas classes
apenas objeto de pesquisa. A pesquisa pode contribuir para dar respostas às
reivindicações que surgem a partir de demandas dos sujeitos pesquisados.
Sendo assim, as
sujeitas da pesquisa foram mulheres quilombolas em idade reprodutiva, e as
entrevistas foram conduzidas a partir do diálogo sobre acesso à saúde, com foco
nas demandas relacionadas à saúde sexual e reprodutiva e barreiras sociais,
econômicas e demográficas que dificultam o acesso aos serviços de saúde. As 10
mulheres entrevistadas tinham idade entre 26 e 40 anos, todas
moradoras do Quilombo Mesquita. Das 10 (dez), 4 (quatro) eram solteiras, 1
(uma) divorciada, 4 (quatro) casadas e 1 (uma) em união estável. Algumas
solteiras vivem com companheiros, mas não os declararam na pesquisa.
Sobre o nível de
escolaridade, verifica-se que a maioria das entrevistadas possuía o ensino
médio completo (6); 1 (uma), o ensino superior incompleto; 2 (duas), o ensino
superior completo; e 1 (uma), o ensino fundamental incompleto. A maior
dificuldade para a conclusão do ensino médio é o fato de não ter escola na
comunidade para esse nível educacional. Em relação à inserção no mercado de
trabalho, a maioria não está inserida no mercado formal. Das que exercem
atividades laboral remunerada, 1 (uma) é servidora pública do município; 1
(uma) trabalha por contrato no município; 1 (uma) é atendente em um comércio da
comunidade, sem contrato formal de trabalho; e 1 (uma) realiza diárias no
comércio local aos finais de semana.
5 Resultados
Verificou-se que as mulheres quilombolas da Comunidade
Mesquita enfrentam diversas barreiras, e isso contribui para o aumento da
vulnerabilidade social, por isso, a importância do desenvolvimento de políticas
que têm como perspectiva a justiça social e a garantia de direitos, de modo que
elas acessem aos serviços ofertados pelo Estado.
A Comunidade do
Mesquita tem uma UBS, que é o único equipamento
social de saúde, no território. As mulheres quilombolas informaram que buscam a
UBS para atender as demandas mais simples e que podem ser resolvidas na
comunidade. Dentre essas demandas, foram citadas resfriado, dor de cabeça, dor
de garganta, vacinas, pré-natal e exames básicos. Para as entrevistadas, os
serviços de saúde que são ofertados atendem as necessidades em saúde das mulheres,
mas com limitações.
De acordo com a entrevistada 10, “Coisas de rotina, fazer um exame
de rotina como sangue, fezes e urina, vacinas, que é uma coisa rápida, vai ali
no posto”.
Quanto ao tema relacionado à saúde sexual e reprodutiva, as
mulheres buscam atendimento para o pré-natal e para realização de consultas
preventivas e acompanhamentos de saúde. Em relação aos atendimentos básicos do
pré-natal e pós-parto, têm-se o acolhimento, acompanhamento de pré-natal,
avaliação da mãe e do bebê após alta da maternidade, acompanhamento e atenção à
gestante, coleta de alguns exames laboratoriais, entrega de insumos básicos,
dentre outros.
Em relação ao pré-natal, todas as
mulheres afirmam ter utilizado a UBS da comunidade para o acompanhamento. Para a maioria das entrevistadas, é importante o
acompanhamento para que, em caso de gravidez de risco, essa situação seja
detectada no início, pois isso possibilita que elas não tenham a gravidez
interrompida por falta de atendimento ou a morte do filho após o nascimento.
Grande parte das mulheres quilombolas tem a percepção de que o atendimento do
pré-natal da UBS é bom, no entanto, ressalta a dificuldade para realizar determinados exames durante o acompanhamento. Apesar da avaliação
positiva dos atendimentos na UBS, destaca-se o fato de não estarem satisfeitas com os serviços disponibilizados, relatando a falta de infraestrutura
e de
disponibilização de maior número de serviços,
a alternativa, acaba sendo, a procura de atendimento na sede do município e nas
Regiões Administrativas de Brasília.
A entrevistada 2 afirma que, “O
atendimento dele é muito bom, a única coisa que falta é exame, alguns exames
que não têm, que a gente tem que procurar no particular.”
Além disso, uma das
mulheres, entrevistada 4, teve uma gravidez de
risco e acredita que a falta de recursos nos atendimentos da UBS colocou em
risco tanto a saúde dela quanto do bebê.
[...] aqui no posto é muito fraco,
fraco mesmo a gente é atendida mais pela enfermeira do que pelo médico, ela num
é obstetra e como minha gravidez foi de alto risco... Então num tem recurso
nenhum, toda vez que eu conheço alguma menina grávida que é de alto risco eu
falo: não vai para o Mesquita porque lá não tem planejamento, lá eles não
conseguem avaliar uma gravidez de alto risco (Entrevistada 4).
Na avaliação das mulheres entrevistadas, a UBS da comunidade
não realiza algumas ações importantes relacionadas à saúde sexual e
reprodutiva, como, por exemplo, ações voltadas para o planejamento reprodutivo,
a inserção de Dispositivo Intrauterino (DIU), informações
sobre os métodos contraceptivos ofertados pelo SUS, tais como entrega de
preservativos, pílulas, dentre outros. Ressaltam também falta de informações
sobre os serviços e onde estão disponibilizados. Portanto, o acesso às
informações e a falta de serviços e infraestrutura se configuram como barreiras
da atenção à saúde sexual e reprodutiva das mulheres quilombolas. Outro problema
destacado pelas entrevistadas é a falta de disponibilidade de profissionais
especializados para atender as demandas das gestantes, pois o município tem
apenas um profissional referenciado.
Ressalta-se que o planejamento é uma ferramenta fundamental
para a garantia dos direitos reprodutivos, pois ele contribui para entender
dimensões relacionadas ao processo reprodutivo e aos meios saudáveis para uma
saúde sexual de qualidade. O planejamento reprodutivo possibilita às mulheres ter autonomia em relação à quantidade de filhos,
bem como conhecimento sobre reprodução e direitos. Envolve a saúde da mulher,
do homem e da criança. Ele deve levar em consideração o contexto social,
econômico e o poder de decisão de cada indivíduo, sendo esses orientados sem
discriminação, violência ou coerção.
Nota-se que a utilização dos serviços de saúde requer vencer
diversos desafios. Sendo assim, Pereira (2016) afirma
que a
[...]
utilização nos serviços de saúde por diferentes grupos
populacionais se configura como um grande desafio para o sistema de saúde, no
caso das mulheres quilombolas, as condições geográficas e sócio-organizacionais
contribuem para um menor acesso e uso dos serviços de saúde (PEREIRA, 2016, p.
27).
A autora faz menção sobre os desafios enfrentados pelas
mulheres quilombolas na utilização dos serviços de saúde, pois são apresentadas
as mais variadas barreiras de acesso a eles e isso impossibilita o atendimento
integral.
Uma das estratégias a ser adotada no enfrentamento desses
desafios é o desenvolvimento de ações de educação em saúde, pois pode
contribuir para que essas mulheres quilombolas compreendam seus direitos
relacionados à saúde sexual e reprodutiva, bem como as formas de acesso e
utilização dos serviços de saúde. No entanto, a
infraestrutura de equipamentos de saúde na comunidade e na sede do município
são insuficientes, dificultando a realização de ações mais efetivas.
As entrevistas
abordaram também a questão do preconceito racial nos atendimentos. No Brasil, persistem mitos raciais,
como, por exemplo, o pensamento de que mulheres negras são mais resistentes à
dor. Esse mito influencia a forma de tratamento que a população negra recebe
nas instituições de saúde, inclusive no momento da gestação, no pré-natal ou no
parto, momento em que necessitam de cuidados e atenção, mas, muitas vezes,
sofrem violência física e/ou psicológica por profissionais que deveriam prestar
acolhimento. Sobre
o racismo, uma fala bastante marcante foi da entrevistada 7, na qual relata uma situação de discriminação que vivenciou:
Eu acho pra
mim uma falta de respeito com as pessoas porque você chega ali para consultar,
não pra você ser atendida e a pessoa virar, pega faz sua ficha, você sai pra
fora e a pessoa fica falando de você. Eu acho isso errado, porque várias vezes
já aconteceu isso comigo lá [na UBS Quilombola], quando eu fui para tirar os
pontos [do parto cesariana] lá, eu fui pra sala da
enfermeira [...] tirei os pontos. Eu mal saí da sala, ela já começou a falar de
mim, que eu tava com mal
cheiro. Eu simplesmente saí chateada. Eu só nunca falei isso pra
ninguém! Eu saí chateada, eu falei: se isso continuar, eu vou ter que ir lá na
Secretaria de Saúde e denunciar a [...] porque ela fica falando mal dos pacientes
dela, da onde já se viu isso? (Entrevistada 7).
Verifica-se que as mulheres quilombolas sofrem
discriminações raciais, sociais, de gênero, e essa realidade repercute
negativamente em todas as dimensões da vida delas. As condições econômicas,
sociais, culturais e ambientais são fatores que estão ligados diretamente ao
acesso das mulheres negras aos serviços de saúde (GOES; NASCIMENTO, 2013).
Nesse sentido, as mulheres da comunidade quilombola do
Mesquita enfrentam diversas barreiras no acesso aos serviços e às ações de
saúde. Em relação a essas barreiras, podem destacar as sociais e econômicas,
tais como a escolaridade e a baixa autonomia financeira. Compreende-se que as
barreiras sociais, socioeconômicas e demográficas são um entrave no acesso aos
serviços de saúde. Sendo assim, é importante que as políticas sociais busquem
atender as demandas em saúde e os direitos sociais da população quilombola.
Pensar ações para enfrentar tais empecilhos são fundamentais para promover
autonomia das mulheres quilombolas em relação a sua reprodução.
Para reduzir essas
barreiras é importante conhecer e respeitar os
saberes e as vivências dos antepassados aprendidos pelas mulheres quilombolas.
As do Quilombo Mesquita fazem uso de benzeção e
medicamentos caseiros para atender suas demandas e cuidados em saúde. Os
benzedeiros e as benzedeiras da comunidade cuidam tanto da saúde espiritual
quanto física. Utilizam da benzeção e de medicamentos
caseiros, tais como chás, banhos, unguentos, rezas, garrafadas, entre outros, no tratamento
da saúde sexual e reprodutiva.
A entrevistada 10 afirma que na comunidade há pessoas que
benzem e que já utilizou desse método popular:
Quando eu estava querendo engravidar
né, tava demorando muito, aí eu fui num senhor que tem aqui na comunidade e ele me benzeu e
falou que eu tinha que tomar uma garrafada, pra poder fazer a limpeza do útero,
pra abrir os caminhos, para que eu conseguisse engravidar. E aí eu tomei a
garrafada, três vezes ao dia. Ele faz uma oração na gente, a garrafa e a gente toma. E aí pouco tempo depois eu engravidei (Entrevistada
10).
A partir disso, observa-se que essas mulheres utilizam dos
saberes populares no atendimento das suas demandas em relação à saúde sexual e
reprodutiva. As principais ervas utilizadas são barbatimão para banho de
assento, camomila, melaleuca, losna brava, folha de
amora, entre outros. As garrafadas são preparadas por pessoas da comunidade que
conhecem as ervas e a função de cada uma. Nota-se que os saberes populares têm
forte presença tanto na vida como na cultura das mulheres quilombolas e são
muito importantes para a preservação da cultura e dos saberes populares.
É importante afirmar que a atenção à saúde sexual e
reprodutiva deve estar vinculada e ser garantida prioritariamente na atenção básica,
pois essas ações contribuem para melhorias da saúde da população quilombola.
Deve haver oferta de serviços que tenham como princípio básico a garantia dos
direitos sexuais e reprodutivos, bem como estar em conformidade com a promoção
da igualdade de gênero, raça, classe e orientação sexual. Pode também
possibilitar diminuição do racismo institucional nos serviços e ações de saúde,
pois as mulheres negras devem ter a garantia de direitos sexuais e reprodutivos
pelos serviços de saúde.
6
Considerações finais
Os
dados apresentados apontam limitações na disponibilidade e na utilização dos
serviços públicos de saúde pelas mulheres quilombolas, uma situação permeada por desigualdades sociais, raciais e de gênero. A
desvantagem no acesso à saúde, considerando a realidade de outras mulheres
urbanas e brancas, o racismo apontado nas entrevistas e o cenário conservador
têm impactado na implementação das políticas de saúde, já garantidas como
direito, fato que tem ocasionado retrocessos nos acessos aos direitos sexuais e
reprodutivos das mulheres do quilombo Mesquita. De acordo com esse quadro,
persistem ideias racistas que trazem efeitos negativos na forma de atendimento
e tratamento, especialmente quando se trata dos direitos sexuais e reprodutivos
dessas mulheres.
Os
achados da pesquisa apontaram que elas avaliam positivamente o acompanhamento
do pré-natal, mas, por outro lado, indicaram limitações nos demais serviços de
saúde sexual e reprodutiva, como o planejamento reprodutivo, os métodos
contraceptivos, os exames do pré-natal, as ações de educação em saúde, a
infraestrutura da UBS e os serviços de referência para a realização do parto.
Desta forma, identificou-se que as mulheres quilombolas encontram dificuldades
para utilizar os serviços de saúde sexual e reprodutiva. A questão geográfica
também é um elemento importante, uma vez que a localização na área rural traz
limitações para acessar os serviços de saúde, devido à distância do território
quilombola da sede do município e dos hospitais especializados. Além disso, o
transporte e o deslocamento para os equipamentos de saúde são um entrave devido
às questões econômicas.
Diante disso, é
importante dar visibilidade às demandas que surgem a partir das vivências das
mulheres quilombolas. É preciso demonstrar que as fragilidades estruturais, o
racismo institucional e as violações de direitos estão presentes no cotidiano
das mulheres negras que residem na comunidade quilombola do Mesquita. Elas
buscam cuidados em saúde no SUS, mas também buscam os recursos nos saberes
populares como benzeção, garrafadas, dentre outros,
como forma de atender às demandas,
principalmente em relação à saúde sexual e reprodutiva.
Portanto, espera-se que
este estudo possa contribuir para que novas discussões sobre direitos sexuais e
reprodutivos das mulheres quilombolas sejam pautadas na agenda política e
forneçam possibilidades para que essas mulheres quilombolas saiam da
invisibilidade e tornem-se protagonistas dos seus direitos.
É de suma importância a
movimentação junto ao Poder Público para fortalecer a Política Nacional de
Saúde Integral da População Negra como estratégia para garantir o acesso
universal, integral e equitativo aos serviços de saúde. Pontua-se também a
necessidade de ampliar as ações de educação em saúde e a participação de
usuárias e usuários quilombolas para fomentar estratégias para garantir o
direito à saúde e os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres quilombolas,
respeitando a diversidade e buscando combater as discriminações de gênero e
raça persistentes e intensificadas no Brasil devido principalmente à onda
conservadora contemporânea.
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ago. 2022.
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Dalila Maria de Fátima LISBOA Trabalhou na
concepção, análise e interpretação dos dados e redação do artigo. Revisão e
aprovação da versão final.
Possui graduação em
Serviço Social pela Universidade de Brasília (2012). Atualmente é assistente
social no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, atuando
principalmente com temas relacionado a crianças e adolescentes
vítimas/testemunhas de violência (abuso sexual e maus-tratos). Pesquisadora do
grupo de pesquisa Núcleo de Análise e Avaliação de Políticas Públicas (NAAPP/UnB).
Mestre em Política Social pela Universidade de Brasília (UnB).
Lucélia Luiz PEREIRA Trabalhou no delineamento, redação e revisão
crítica do artigo. Revisão e aprovação da versão final.
Docente do Departamento
de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da
Universidade de Brasília (UnB). Doutora em Ciências da Saúde e Mestre em
Política Social pela Universidade de Brasília. Coordena o Grupo - Núcleo de
Análise e Avaliação de Políticas Públicas (NAAPP). Tem experiência na área de
Avaliação e Monitoramento de Políticas Sociais, Saúde, Saúde quilombola, Gênero
e Raça. Coordenadora Regional - Centro-Oeste do GT Racismo e Saúde da
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO).
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* Assistente Social. Mestre em Política Social. Atualmente é Assistente
Social no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. (TJDFT,
Brasília (DF), Brasil). Praça Municipal,
Lote 01, Brasília (DF), 70094-900. E-mail: dalilamesquita08@gmail.com.
** Assistente Social. Mestre em Política
Social. Doutorado em Ciências da Saúde. Docente do Departamento de Serviço
Social e do Programa de Pós-graduação em Política Social, da Universidade de
Brasília. (UnB, Brasília (DF), Brasil). Campus Universitário Darcy Ribeiro, Asa
Norte, Brasília – DF. E-mail: lucelialp2013@gmail.com.
© A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial. O licenciante não pode revogar estes direitos desde que você respeite os termos da licença.