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O aborto nas elei��es: Brasil na contracorrente do Uruguai e da Argentina

 

Abortion and elections: Brazil going against the current of Uruguay and Argentina

 

Maur�lio Castro de MATOS*

�cone

Descri��o gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0003-2425-9802

 

Franciele da Silva SANTOS**

�cone

Descri��o gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0002-1402-114X

 

Tatianny de Souza de ARA�JO**[*]

�cone

Descri��o gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0001-5026-7027

 

Resumo: Objetiva tra�ar um paralelo entre as realidades da Argentina e do Uruguai com a do Brasil acerca da descriminaliza��o e da legaliza��o do aborto enquanto direito das mulheres e pessoas que gestam, com destaque para discuss�o sobre o tema nos contextos de campanhas eleitorais. Nos primeiros, a legaliza��o se deu a partir de um compromisso de determinadas candidaturas presidenciais em sancionarem a lei, ap�s aprova��o do Congresso Nacional. No Brasil, inexiste essa realidade, frente ao tenso e polarizado debate sobre a tem�tica no Congresso Nacional, al�m de forte presen�a de onda conservadora em diversos setores do pa�s.Para tanto, debru�a-se em pesquisas bibliogr�ficas e dados das m�dias, com abordagem qualitativa. Tais realidades distintas expressam um desencontro do Brasil com a Argentina e o Uruguai, pois mesmo sendo pa�ses com realidades parecidas, o Brasil se apresenta distante na efetiva��o da legaliza��o do aborto.

Palavras-chave: Legaliza��o do aborto. Campanhas eleitorais. Direitos das mulheres. Cone Sul.

 

Abstract: The article draws a parallel between the realities of Argentina and Uruguay and that of Brazil regarding the decriminalisation and legalisation of abortion as a right of pregnant women and people, the discussion being in the context of electoral campaigns. In the former, legalisation was based on commitments by individual presidential candidates to sanction the law, after approval by their National Congresses. In Brazil, this reality does not exist, given the tense and polarised debate on the subject in the National Congress and the presence of a strong conservative wave in various sectors of the country. It focuses on bibliographic research and media data, with a qualitative approach. The different realities express a mismatch between Brazil and Argentina and Uruguay, because though they share similar realities, Brazil is far removed in terms of effecting legalisation of abortion.

Keywords: Legalisation of abortion. Election campaigns. Women�s rights. Southern Cone.

 

Submetido em: 31/8/2022. Revisto em: 28/1/2023; 20/3/2023. Aceito em: 4/4/2023.

 

Introdu��o

 

O

artigo integra a pesquisa �Nas trilhas do direito ao aborto na Am�rica Latina e Caribe� e visa refletir sobre o descompasso entre Brasil, Argentina e Uruguai, pa�ses integrantes do Cone Sul � sub-regi�o da Am�rica Latina e Caribe, composto tamb�m pelo Chile e o Paraguai � no que se refere ao debate sobre a legaliza��o do aborto, especialmente em contextos de elei��es presidenciais.

 

Considerando-se que na sub-regi�o Cone Sul s�o a Argentina e o Uruguai quem garantem o direito ao aborto, foram realizadas sucessivas aproxima��es �s realidades desses pa�ses. Tais aproxima��es foram pesquisas documentais, bibliogr�ficas e atividades de campo no Uruguai, em fevereiro de 2019, e na Argentina, em novembro de 2022.

 

Ainda que seja imposs�vel recuperar a hist�ria dos cinco pa�ses do Cone Sul, cabe sinalizar que todos viveram sob ditaduras entre as d�cadas de 1950 e 1980 e desde a reabertura pol�tica, quando os movimentos sociais puderam se reorganizar publicamente, a legaliza��o do aborto � uma pauta constante na agenda dos movimentos feministas. As conquistas de tal agenda s�o v�rias em cada pa�s, pois dialogam com suas particularidades.

 

No Chile, o C�digo de Sa�de de 1931 permitia o aborto em caso de risco de sa�de da mulher. Tal legisla��o foi alterada em 1989, na ditadura de Pinochet, proibindo-o totalmente. Em 2015, no segundo mandato de Michelle Bachelet, a presidenta enviou projeto de lei autorizando o aborto em caso de risco de morte da mulher, inviabilidade fetal e estupro, que foi aprovado pelo Congresso apenas em 2017 (CASTILLO; FERNAND�Z, 2018). Em 2022, a proposta da nova constitui��o garantia a legaliza��o do aborto at� a d�cima-quarta semana de gesta��o, no entanto a Carta Magna n�o foi aprovada no referendo p�blico.

 

No Paraguai, de acordo com o C�digo Penal de 1997, o aborto � permitido apenas nos casos de risco de morte para a mulher. Portanto, n�o permite sequer em caso de estupro. Tamanha lei restritiva tem gerado den�ncias sobre a ocorr�ncia de muitas crian�as e adolescentes gestantes, sendo denominada como uma esp�cie de epidemia da gravidez infantil (BRONER; MENA, 2022).

 

No Uruguai o Congresso Nacional aprovou, em 2008, a legaliza��o do aborto. Entretanto, foi vetada pelo presidente Tabar� V�zquez. Na campanha eleitoral em 2009 o candidato � presid�ncia, Jos� Mujica, afirmou que se o Congresso Nacional aprovasse a legaliza��o do aborto, sancionaria tal lei, o que ocorreu ap�s a Frente Ampla, de sua base, realizar a apresenta��o na Casa Legislativa, sendo o aborto legalizado por livre escolha da mulher em 2012 (ROSTAGNOL, 2016).

 

Na Argentina, em 2018, a C�mara dos Deputados aprovou a mudan�a na lei, mas o Senado a rejeitou por poucos votos de diferen�a. Durante o processo eleitoral de 2019, o ent�o candidato Alberto Fern�ndez se pronunciou favor�vel a legaliza��o do aborto e disse que enviaria ao Congresso Nacional projeto de lei sobre o tema. Quando eleito, se comprometeu em enviar o projeto em mar�o de 2020. No entanto, sob o argumento das urg�ncias em decorr�ncia da pandemia de COVID-19, o projeto foi enviado apenas no segundo semestre, sendo aprovada a legaliza��o do aborto por livre escolha da mulher e pessoas que gestam pelo Congresso Nacional em 30 de dezembro de 2020.

 

No Brasil o aborto � regulado pelo C�digo Penal de 1940, sendo permitido em casos de estupro e risco de morte para a mulher, e, desde 2012, por decis�o do Superior Tribunal Federal (STF), tamb�m nos casos de gesta��o com anencefalia. A lei brasileira, bastante restrita, tem enfrentado imensas dificuldades de ser garantida. Ademais, existem no Congresso Nacional (C�mara de Deputados Federais e Senado) projetos de lei que visam a total criminaliza��o do aborto no pa�s (MADEIRO; DINIZ, 2016).

 

Uma das particularidades dos achados da pesquisa na Argentina e no Uruguai foi que a luta origin�ria dos movimentos feministas pela legaliza��o do aborto, em determinado contexto, foi assumida como pauta nos debates para elei��es presidenciais, devido �s press�es dos mesmos movimentos. No Brasil, sempre que oportuno, para favorecimento de pautas conservadoras, a quest�o do aborto tamb�m aparece nas campanhas eleitorais, embora na dire��o contr�ria do que vem � indicado pelos movimentos feministas no pa�s. Especialmente na elei��o de 2010, quando foi uma tem�tica central. N�o parece ser acaso ter sido essa a elei��o em que duas mulheres estiveram na disputa. O assunto foi capa de v�rias revistas e jornais, com acusa��es do candidato do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Jos� Serra, contra a candidata Dilma Rousseff, dizendo que esta defendia a legaliza��o do aborto. Dilma evitou o assunto e a outra candidata, Marina Silva, silenciou sobre o tema.

 

N�o poderia ser diferente nas elei��es de 2022, a quest�o voltou � tona a partir da falsa dicotomia, hist�rica, entre os que supostamente defendem a vida ou a morte. Ainda como pr�-candidato, Lula, ciente das pol�micas que envolvem a quest�o do aborto no Brasil, se pronunciou favor�vel � sua legaliza��o.

 

Ao tra�ar um paralelo entre os tr�s pa�ses vizinhos, discutiremos a realidade do Uruguai, que conquistou a legaliza��o do aborto em 2012, e da Argentina, que levou centenas de milhares de pessoas �s ruas para enfim garantir o direito ao aborto em 2020. Bem como analisaremos o Brasil, onde o debate sobre o direito ao aborto caminha a passos lentos, tanto na sociedade civil quanto nas inst�ncias pol�ticas que poderiam fortalecer a luta, como ocorreu nos demais pa�ses.

 

Este artigo teve como procedimentos metodol�gicos: a pesquisa documental sobre as normativas referentes ao aborto; pesquisa bibliogr�fica sobre os tr�s pa�ses com os descritores �elei��es� e �aborto�; an�lise dos di�rios de campo das visitas realizadas na Argentina e no Uruguai; e observa��o participante no Brasil nos movimentos sociais, a exemplo da Rede de Assistentes Sociais pelo Direito de Decidir e a Frente Nacional contra a Criminaliza��o de Mulheres e pela Legaliza��o do Aborto.

 

1 A legaliza��o do aborto no Uruguai

 

No Uruguai a legisla��o que regulava a quest�o do aborto datava de 1938, permitindo-o nos casos em que a mulher estivesse com problemas econ�micos, risco de sa�de ou gestante em decorr�ncia de estupro. Ainda que fosse uma lei antiga, foi pouco implementada. Desde a reabertura pol�tica, em meados de 1980, o movimento feminista uruguaio foi impulsionando a plataforma pela legaliza��o do aborto, com v�rias iniciativas junto ao parlamento (JOHNSON et al., 2011). Pode-se identificar tr�s momentos hist�ricos no que se refere ao processo de luta pela legaliza��o do aborto no pa�s (MATOS, 2021).

 

         O primeiro foi a legaliza��o do aborto em qualquer per�odo gestacional, entre 1934 e 1938, de acordo com o C�digo Penal da �poca. Essa medida fez com que o pa�s fosse o segundo no mundo a legalizar o aborto, atr�s apenas da Uni�o das Rep�blicas Socialistas Sovi�ticas (URSS) que o fez em 1920. No entanto, tal medida teve pouco efeito porque o Minist�rio da Sa�de uruguaio proibiu a sua realiza��o nos seus servi�os.

         O segundo momento foi a luta liderada pelos movimentos feministas uruguaios pela legaliza��o do aborto desde a reabertura pol�tica, e o papel estrat�gico da Portaria 369/2004 do Minist�rio da Sa�de P�blica. A portaria tratava do assessoramento para a maternidade segura e medidas de prote��o materna frente ao aborto provocado em condi��es de risco, instituindo a consulta de assessoria pr� e p�s aborto nos servi�os de sa�de. Apesar de existir, a portaria foi pouco implementada, mas possibilitou que no Hospital Pereira Rossel, o maior do pa�s e campo de est�gio da Universidade de La Rep�blica, tornasse o aborto uma realidade.

Em 2007, o presidente Tabar� V�zquez vetou os itens referentes � legaliza��o do aborto no �mbito da Lei de Sa�de Sexual e Reprodutiva (Lei 18.426/2008) aprovada pelo Congresso Nacional. Mas, ao sancionar o restante da Lei, foi incorporado o conte�do da Portaria 369/2004, que possibilitou a realiza��o de capacita��es no pa�s sobre a quest�o do aborto.

Ap�s o veto do presidente Tabar� V�zquez, em 2008, a agenda da legaliza��o do aborto se adensou. Ocorreram muitas mobiliza��es populares nas ruas contra veto e a favor da descriminaliza��o do aborto. Na campanha eleitoral seguinte, o candidato da mesma coliga��o Frente Ampla, Jos� Mujica, se comprometeu a homologar a Lei da Interrup��o Volunt�ria da Gravidez, caso o Congresso Nacional a aprovasse.

         O terceiro momento foi a promulga��o em outubro de 2012 da Lei 18.987, que permitiu a interrup��o volunt�ria da gravidez at� a d�cima-segunda semana de gesta��o. Esse prazo � estendido para 14 semanas quando a gravidez for em decorr�ncia de estupro, e pode at� ser maior o prazo em caso de risco de morte ou de algumas anomalias fetais que sejam incompat�veis com o desenvolvimento da vida. O procedimento � considerado sem interesse comercial, n�o podendo ser mercantilizado. Dirigido �s pessoas que gestam uruguaias ou residentes h� mais de um ano (exceto em casos de estupro) no pa�s.

 

O processo de legaliza��o e descriminaliza��o do aborto no Uruguai sinaliza a import�ncia de se ter representantes no parlamento alinhados com as lutas dos movimentos feministas, al�m de um presidente da Rep�blica que tenha compreens�o da garantia de direitos sem atrel�-los a aspectos moralizantes e religiosos, com alian�as tamb�m do campo progressista, assim como a a��o do Estado isenta de liga��es diretas com a igreja. Quest�o que nos indica a import�ncia da laicidade do Estado de fato. No Uruguai, desde 1906 foi decretada a retirada dos crucifixos de todos os hospitais p�blicos e, no ano seguinte, as refer�ncias a Deus e aos Evangelhos no juramento dos parlamentares.

 

1 A legaliza��o do aborto na Argentina

 

Na Argentina o aborto era regulado pelo C�digo Penal de 1921, que s� o permitia em caso de risco de sa�de ou morte da mulher e em decorr�ncia de estupro, neste �ltimo caso se a mulher fosse considerada incapaz. Durante a ditadura militar (1976-1983) foi promulgada uma legisla��o complementar que permitia o aborto apenas se a situa��o de sa�de fosse grave, e em caso de estupro seria exigido um registro na pol�cia, e tamb�m a aprova��o do representante legal da pessoa considerada incapaz. Na reabertura pol�tica, a referida legisla��o complementar foi sustada. No entanto apenas em 2012, numa decis�o da Suprema Corte conhecida como �Fallo F.A.L.�, foi decidido que o acesso ao aborto em caso de estupro era um direito para todas as mulheres, n�o sendo necess�rio o registro judicial da viol�ncia e cabendo ao Estado a cria��o de protocolos para o atendimento nos servi�os de sa�de. Ainda assim, tal qual outros v�rios pa�ses da Am�rica Latina e Caribe, por vezes, o protocolo era negligenciado e/ou levava muitas mulheres e meninas, mesmo em casos de estupro, a sofrer nova viol�ncia, quando judicializassem o caso para acessar um direito j� previsto, tanto sob o aspecto de reviver os traumas provocados pelo ato, como por se depararem com uma gravidez em est�gio avan�ado, diante da morosidade do sistema de sa�de e do poder judici�rio (CARBAJAL, 2009; AROSTEGUY, 2018).

 

No dia 30 de dezembro de 2020, na Argentina, foi aprovada a legaliza��o do aborto, resultado da luta dos movimentos feministas alinhados com diversos setores da sociedade que defendem os direitos das mulheres e compreenderam a import�ncia da defesa da pauta.

 

Giselle Carino (2020), ativista pelos direitos sexuais e reprodutivos e colunista do El Pa�s, em entrevista a Felipe Betim, estabelece uma forte rela��o entre os movimentos feministas e a luta pela democracia e pelos direitos humanos ap�s a ditadura argentina. Quando ocorre um encontro de gera��es reunidas sob a campanha do �len�o verde�, colocando lado a lado filhas e netas das Abuelas de Plaza de Mayo, h� uma uni�o entre a juventude e sua luta da gera��o atual com aquelas que enfrentaram governos para encontrar suas filhas/os e netas/os raptados ou nascidos em cativeiro durante o per�odo mais violento da ditadura militar na Argentina.

 

A Lei n� 27.610 afirma que toda pessoa gestante poder� ter acesso ao aborto gratuito e seguro no sistema de sa�de at� a 14� semana de gesta��o (por sua livre escolha) e por tempo indeterminado (para as pessoas gr�vidas em decorr�ncia de estupro ou que estejam correndo risco de morte). Para que o procedimento se realize � necess�rio que a pessoa assine um consentimento informado. Tal consentimento � uma express�o dos princ�pios de autonomia das pessoas e concentra confidencialidade, privacidade e acesso � informa��o. A lei estabelece que o procedimento deve ocorrer no prazo de dez dias a partir de seu requerimento nos servi�os de sa�de (ARGENTINA, 2021).

 

Diante do exposto, cabe registrar que a vit�ria sem margem para questionamento � fruto de a��es bem-sucedidas de mobiliza��o nacional que vinham ocorrendo nos �ltimos anos, mas seu processo organizativo � mais longo, origina-se desde a luta pela reabertura democr�tica no in�cio dos anos 1980 e na defesa dos direitos humanos. Em suma, vem de um fortalecimento da luta das mulheres e do avan�o dos feminismos no mundo, com saldos organizativos importantes. Vem tamb�m da rela��o entre os movimentos sociais, as entidades de classe, as ativistas e defensores/as dos Direitos Humanos e profissionais da sa�de, al�m de espa�os de forma��o que unem a academia e a sociedade civil.

 

3 A criminaliza��o do aborto no Brasil na contracorrente da �mar� verde�

 

Assim como na Argentina e o Uruguai, o Brasil tem por muito tempo convivido com a discuss�o da legaliza��o do aborto pautada pelos movimentos feministas, com uma legisla��o restritiva que sequer � garantida em todo o territ�rio nacional (como era no Uruguai e na Argentina) e tendo como cen�rio, quando expandida para a sociedade, discursos a favor e contra arregimentados por setores conservadores, que utiliza a posi��o individual para interditar o debate na esfera p�blica.

 

No entanto, diferente da realidade argentina e uruguaia em que no per�odo de elei��es a pauta do aborto � assumida pelos candidatos eleitos e apoiada por boa parte da popula��o, no Brasil a retomada da discuss�o sobre o aborto tr�s polaridades programadas, como ocorreu nas elei��es de 2022 em que se viu tentativas de negar a necessidade da sua legaliza��o.

Nesse contexto teve bastante expressividade na m�dia, em abril de 2022, a fala de Lu�s In�cio da Silva, ainda pr�-candidato a presidente, que verbalizou ser contra o aborto, por�m compreendia que se trata de quest�o de sa�de p�blica, pois muitas mulheres t�m morrido[2] (LULA..., 2022).

 

Ainda que no primeiro debate entre presidenci�veis, realizado em 28/08/2022, o tema dos direitos das mulheres tenha tido centralidade, apenas o candidato Jair Bolsonaro se referiu ao aborto, dizendo ser contr�rio, assim como expressou abertamente em outras ocasi�es em seu material de campanha.

 

No encerramento do primeiro debate do segundo turno, realizado em 16/10/2022, quando estavam presentes apenas os que, desde o in�cio eram os principais candidatos, Bolsonaro, mesmo sem qualquer questionamento sobre os direitos das mulheres ou mesmo sobre aborto � mas depois de ter falado bastante que o pa�s � crist�o e defender a liberdade religiosa, leia-se a liberdade das igrejas autodenominadas crist�s � reafirmou ser contr�rio � legaliza��o do aborto.

 

Tal assunto voltou no �ltimo debate, em 28/10/2022, desta vez resgatado pelo candidato Lula, ao questionar Bolsonaro que sempre se diz contra o aborto, mas teria dito na d�cada de 1990, que era favor�vel a p�lula do aborto como m�todo de controle de natalidade. Bolsonaro disse que n�o se lembrava, mas que deveria ter se referido � p�lula do dia seguinte. Ambos os candidatos afirmaram ser contra o aborto (BRITO, 2022). De qualquer forma, dois dias antes da elei��o mais concorrida desde a reabertura, que elegeu Lula, a pauta do aborto se fez presente na fala dos dois candidatos, ainda que pela nega��o desse direito, pautada superficialmente e indiretamente relacionada com a quest�o do controle de natalidade.

 

A fala origin�ria de Lula, ainda em campanha, corrobora com dados e estudos que apontam para a quest�o de sa�de p�blica. A problem�tica persiste em decorr�ncia de abortamentos em cl�nicas clandestinas que n�o ofertam os procedimentos adequados, ou em lugares inapropriados, e at� mesmo quando ocorre de maneiras inusitadas, o que tem causado sequelas irrevers�veis em quem as praticam sem o devido acompanhamento.

 

Nesse sentido, considerando o contexto das elei��es presidenciais de 2022, � evidenciada a discuss�o instaurada de forma mais contundente a partir de 2010 no que diz respeito a pauta dos movimentos feministas em defesa da amplia��o das permiss�es legais e descriminaliza��o do aborto. Afinal, em 2010, houve uma forte mobiliza��o por parte do alto clero da Igreja Cat�lica, com circula��o de carta aberta apelando a popula��o brasileira para n�o votar na candidata Dilma Rousseff por ela ter mencionado o aborto em um de seus discursos. Na ocasi�o, Dilma declarou que a sua posi��o pessoal era contra o aborto, mas que enquanto Presidente da Rep�blica ela n�o poderia deixar de enfrentar, colocando a discuss�o no �mbito da quest�o de sa�de p�blica (TRAJANO, 2010). No entanto, em virtude da repercuss�o, a candidata recuou e encaminhou carta �s igrejas crist�s se colocando contr�ria a interrup��o da gravidez e que se eleita n�o tomaria medidas que modificassem a legisla��o nesse sentido, nem executaria a��es que afrontam a fam�lia (GALLI; ROCHA, 2014). Fato que expressa o poder das institui��es religiosas na condu��o do debate sobre a legaliza��o e descriminaliza��o do aborto no Brasil. Pr�ticas que v�o totalmente de encontro � nossa condi��o de pa�s laico.

 

Mas, em que pese o assunto n�o ser tratado com a necess�ria urg�ncia pelos poderes pol�ticos, os dados da criminaliza��o do aborto s�o alarmantes. Destes, ressaltamos que no per�odo entre 2008 e 2017, em m�dia 250 mil mulheres foram hospitalizadas por ano em decorr�ncia de complica��es por pr�tica de abortos inseguros, sendo 685 mulheres por dia, uma a cada dois minutos.Tal realidade custou 500 milh�es de reais por ano ao Sistema �nico de Sa�de (SUS) com os atendimentos de complica��es em decorr�ncia de abortos ilegais. Este valor decantado significa 13.700 reais por dia e 570 reais por hora (DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017; COLUCCI, 2018).

 

Os dados expressam uma parte da realidade do aborto no pa�s, uma vez que re�nem apenas informa��es daquelas pessoas que precisaram recorrer � uma emerg�ncia de sa�de do SUS, isto �, nem os abortos bem-sucedidos nem as v�timas fatais que sequer chegam ao SUS est�o contabilizados nesta equa��o. Trata-se de uma comprova��o de que, independentemente da condi��o de ilegalidade no Brasil, � um problema de sa�de p�blica gerado em virtude da clandestinidade na realiza��o dos procedimentos (sejam por terceiros ou autoprovocados) e pela aus�ncia de uma pol�tica de planejamento familiar que n�o seja de repress�o e controle dos corpos.

 

4 Express�es do conservadorismo no Brasil no trato do tema do aborto

 

Ao analisar a conjuntura no Cone Sul, em especial os pa�ses que aqui destacamos, Argentina e Uruguai, podemos perceber que o Brasil vem se colocando na contram�o das conquistas que v�m se dando em rela��o � tem�tica da legaliza��o e descriminaliza��o do aborto, com uma intensifica��o do neoconservadorismo no pa�s.

 

Barroco (2015) discute a exist�ncia do neoconservadorismo, um pensamento pol�tico que emerge a partir da d�cada de 1970 que tem como ideologia, associado ao neoliberalismo, reatualizar � por meio da intensifica��o de vigil�ncia e controle da classe trabalhadora � os seus valores.

 

No Brasil h� um componente a mais, a partir da mesma d�cada, que � a crise da Teologia da Liberta��o da Igreja Cat�lica e o avan�o das religi�es neopentecostais, abrindo o caminho para o aprofundamento de uma alian�a religiosa e conservadora no campo do poder pol�tico.

O neoconservadorismo, enquanto pensamento pol�tico de manuten��o da ordem, alinha-se com o modo de produ��o vigente, opondo-se aos movimentos de cunho revolucion�rio. Podemos compreender que a partir do momento que os movimentos feministas pautam um tema que vai de encontro a essa moral constru�da historicamente por meio das institui��es tidas como tradicionais, a exemplo da igreja e da fam�lia � ele acaba contribuindo para o questionamento dessas enquanto tal. Por isso esses movimentos n�o s�o aceitos, pois seriam elementos desintegradores desse ideal de fam�lia crist�, uma das bases morais do conservadorismo.

 

A partir disso, podemos considerar a pauta da legaliza��o do aborto enquanto progressista, pois quando aprovada garante a autonomia �s mulheres em quest�es que perpassam a defesa e os cuidados de seus corpos. E, consequentemente, retirando autoridade de institui��es tidas como sagradas de conduzir a vida das mulheres, por meio de manuten��o e fortalecimento do status quo que, tamb�m fortalece o sistema pol�tico e econ�mico calcado em princ�pios patriarcais, mis�ginos, excludentes e expropriadores dos direitos e das subjetividades dos sujeitos.

 

Ap�s o golpe jur�dico-parlamentar e midi�tico de 2016, vivenciado pela presidenta Dilma Rousseff, seguindo a conjuntura de crise pol�tica e econ�mica no pa�s, com impacto nas pol�ticas p�blicas j� em curso � �poca, houve intensifica��o na derrocada de direitos sociais, em especial nos que s�o dirigidos para pessoas pobres e negras. Dentre esses desmontes destacamos aqui os que s�o voltados para as mulheres, em especial os que envolvem a sa�de sexual e reprodutiva. � nesta dire��o que se expressam os enfrentamentos contr�rios � descriminaliza��o e legaliza��o do aborto.

 

Vale acrescentar que os movimentos feministas podem ser considerados pertencentes ao de mulheres de forma mais ampla, e o contr�rio n�o ocorre necessariamente, pois entre os temas que t�m demarcado a diferen�a entre esses dois movimentos � a discuss�o sobre o aborto (PIMENTEL; VILELA, 2012). Portanto, a luta pela legaliza��o e descriminaliza��o do aborto tem incisivamente ocorrido no �mbito dos movimentos feministas, muitos destes formados inclusive por uma ala progressista da Igreja Cat�lica conhecida como Cat�licas pelo Direito de Decidir, que tem se articulado com organiza��es da sociedade civil que pautam a defesa e a garantia dos direitos das mulheres. A exemplo dessas parcerias, h� o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), que realiza estudos sistem�ticos das proposi��es parlamentares que envolvem o campo dos direitos sexuais e reprodutivos, e tamb�m a Frente Nacional contra a Criminaliza��o de Mulheres e pela Legaliza��o do Aborto, que tem fortalecido o engajamento tanto dentro do Brasil quanto com pa�ses da Am�rica Latina que j� vivenciaram o processo de mobiliza��o das bases, a exemplo da Argentina.

 

Nessa perspectiva � que precisamos situar as decis�es, que por vezes v�m sendo discutidas e aprovadas no �mbito do Legislativo brasileiro, o espa�o que supostamente re�ne representantes da popula��o brasileira, incluindo mulheres, meninas e pessoas que gestam. Fato � que n�o existe uma articula��o parlamentar em defesa da descriminaliza��o do aborto. Enquanto isso cresce a cada dia as bancadas religiosas contr�rias � sa�de sexual e reprodutiva (DIP, 2018).

 

Ao contr�rio, vemos a forma��o de uma articula��o contr�ria ao aborto sendo concretizada desde 2003. Referimos ao lan�amento em 2019 da Frente Parlamentar Mista Contra o Aborto e em Defesa da Vida, que se autodetermina a miss�o de �[...] colocar-se em guerra junto ao povo que eles representam, de maneira a reconstruir a Cultura da vida e promover, sob qualquer circunst�ncia, a defesa e a dignidade da vida humana desde a concep��o at� a morte natural� (C�MARA DOS DEPUTADOS, 2019).

 

Concordamos com Biroli, Mariano e Miguel (2017) �[...] que o debate na pol�tica institucional brasileira, seja nas campanhas eleitorais, seja no parlamento, tem tomado a forma de uma ofensiva conservadora, que tem em muitos casos � e cada vez mais � se tornado uma atua��o retr�grada [...]� (BIROLI; MARIANO; MIGUEL, 2017, p. 231) por vezes impactando nas conquistas que ocorreram tanto no campo da legisla��o como das pol�ticas p�blicas.

 

Isso tem implicado no avan�o de pautas conservadoras e no arquivamento de pautas progressistas no sentido de discutir a legaliza��o e a descriminaliza��o do aborto no pa�s, sendo alimentado como prevalentes discursos como direito � vida e dogmas religiosos (BIROLI; MARIANO; MIGUEL, 2017; DIP, 2018). Portanto, � de suma import�ncia de a pauta da legaliza��o do aborto acompanhar tamb�m o debate para as elei��es no Legislativo, bem como das indica��es ao Poder Judici�rio, uma vez que esses entes t�m tido extrema relev�ncia nessa discuss�o junto ao Poder Executivo.

 

O Brasil tem ficado a margem da chamada �mar� verde� que toma a Am�rica Latina, na qual pa�ses como Chile, Col�mbia, Argentina, Uruguai e M�xico t�m conseguido, por meio da press�o popular, pautar em suas casas legislativas a necessidade de legaliza��o e descriminaliza��o do aborto. Como exemplo do retrocesso brasileiro podemos citar o caso vivenciado pela menina de apenas 10 anos, gr�vida ap�s quatro anos sendo v�tima de estupro por familiar, em 2020. O caso chamou muito a aten��o devido a tentativa de negar � menina o direito ao aborto, e �s v�rias viol�ncias perpetradas contra a v�tima e sua fam�lia, inclusive por membros do governo Bolsonaro (2019-2022), por meio da a��o da ministra da Mulher, da Fam�lia e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que interveio para impedir a realiza��o do procedimento, arregimentando inclusive setores conservadores para fortalecer a a��o. Essa situa��o foi amplamente abordada na m�dia, tendo sido recuperada em 2022, em decorr�ncia de novos casos similares no Brasil (MENINA..., 2022).

 

Podemos afirmar que o neoconservadorismo que se expressa nas institui��es, reflete o campo da representa��o na pol�tica que existe no pa�s. Nesse sentido, quando nos deparamos com representa��es pol�ticas que desenvolvem a��es no sentido de fortalecer e aprofundar a manuten��o da ordem vigente, precisamos considerar que s�o express�es do que est� em evid�ncia na sociedade e que v�o nortear esse campo da pol�tica, esse tamb�m embebido de a��es e decis�es neoconservadoras que legitimam a repress�o aos/�s trabalhadores/as e criminalizam os movimentos sociais, descredibilizando-os perante a sociedade, a exemplo dos movimentos feministas, tidos como um dos principais inimigos da pauta que se autointitula em defesa da vida.

 

Todavia, � importante ressaltar que os movimentos feministas t�m crescido no Brasil como em todo o mundo. As campanhas �n�o � n�o� e �MeToo (�Eu Tamb�m�) contr�rias � viol�ncia sexual e aos feminic�dios tamb�m tiveram for�a. As brasileiras foram �s ruas contr�rias aos projetos de lei que buscavam restringir ainda mais o aborto legal, criminalizar profissionais e impedir a comercializa��o de p�lulas contraceptivas de emerg�ncia. Assim como foram incisivas em momentos pol�ticos importantes contra o golpe que destituiu a presidenta eleita Dilma Rousseff (PT), em 2016, e no contexto das elei��es de 2018 quando organizaram o maior protesto (conhecido como #EleN�o) contr�rio ao candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro.

 

Aproxima��es conclusivas

 

Os estudos sobre a legaliza��o do aborto apontam para diferentes processos, que derivam da correla��o de for�as em cada pa�s. Por exemplo, na Col�mbia a legaliza��o se deu por decis�o da Corte Constitucional em 2022. No caso da Argentina e do Uruguai se deu por meio de vota��o de lei no Congresso Nacional, ainda assim nesses dois �ltimos h� pequenas diferen�as, no Uruguai o projeto se originou do parlamento e na Argentina foi enviado pela Presid�ncia da Rep�blica.

 

Em todos os processos sempre se percebe uma polariza��o entre a legaliza��o e a sua criminaliza��o, que busca tensionar as decis�es sejam do parlamento, da justi�a ou da popula��o em geral. Por ser pol�mico, no Brasil n�o costuma ser assumido como bandeira pol�tica nas elei��es. No entanto, na Argentina e no Uruguai a defesa da legaliza��o do aborto foi uma proposta assumida por determinadas candidaturas e por isso se faz necess�rio compreender o porqu� dessa particularidade.

 

Neste artigo buscamos analisar a realidade brasileira em di�logo com processos eleitorais ocorridos no Uruguai e na Argentina, buscando indagar por que nos pa�ses vizinhos p�de ser abordado o compromisso com a legaliza��o do aborto e no Brasil tal assunto tendeu a ocorrer na dire��o contr�ria, afirmando a sua criminaliza��o. Essa realidade nega todas as pesquisas que afirmam que o aborto no Brasil � um problema de sa�de p�blica. Isso sem contar o desrespeito � liberdade das mulheres e pessoas que gestam.

 

Ainda que n�o se queira transpor as realidades do Uruguai e da Argentina para o Brasil, n�o se pode negar a proximidade cultural com esses pa�ses hermanos: territ�rio geogr�fico cont�guo, mesmo processo de coloniza��o, ditaduras militares promovidas pelo grande capital, l�nguas oficiais pr�ximas, pa�ses da periferia capitalista etc. Entretanto, se existe uma unidade, mas n�o uma identidade entre esses pa�ses, precisamos captar as suas particularidades. Nessa dire��o que buscamos pensar em poss�veis respostas � pergunta: quais foram os motivos que levaram o Uruguai e a Argentina a legalizarem o aborto?

 

                 A compreens�o da laicidade do Estado como uma realidade e consequentemente uma menor influ�ncia da hierarquia das religi�es nas decis�es no �mbito do Estado.

                 A amplia��o do di�logo com outros sujeitos sobre o impacto da criminaliza��o do aborto � destacadamente profissionais da sa�de � redimensionando, com isso, o n�mero de defensores/as dessa pauta.

                 A realiza��o de debates e conversas sobre o aborto a partir da realidade que realmente acontece e n�o abstratamente, pautada na falsa polariza��o entre ser contra ou favor�vel. Pois, enquanto se fica na abstra��o, se ignora, por exemplo, o impacto da criminaliza��o na vida de mulheres e pessoas que gestam, bem como a maioria da popula��o desconhece o quanto � corriqueiro, infelizmente, o atendimento a abortamentos incompletos e suas sequelas, nos servi�os de sa�de.

                 A constru��o de amplos movimentos e atos massivos favor�veis a legaliza��o do aborto.

                 Investimento para que segmentos comprometidos com os direitos sexuais e reprodutivos ocupem cargos no poder legislativo e executivo.

                 Press�o junto ao parlamento para a import�ncia da agenda da legaliza��o do aborto.

 

Com essas observa��es levantadas n�o queremos dar conta da totalidade do processo de luta no Uruguai e na Argentina, at� porque existem particularidades entre eles, mas trazer alguns elementos significativos que podem contribuir para agenda da legaliza��o do aborto no Brasil.

 

Tempos de elei��es s�o momentos de afirma��o e constru��o de projetos de governos que se alinham com determinados projetos de sociedade (e consequentemente de projetos econ�micos), que tamb�m influem na moralidade. Nesse contexto de disputas, cabe-nos buscar esperan�a e inspira��o nos pa�ses, a exemplo da Argentina e Uruguai, que inicialmente com uma legisla��o pr�xima ao que hoje � permitido no Brasil, usaram de estrat�gias assertivas para arregimentar a sociedade e pautar no contexto eleitoral a quest�o do aborto, com isso ganhando for�a e apoio dos presidentes eleitos.

 

Experi�ncias como a da Argentina e Uruguai, sinalizam para pa�ses como o Brasil que � preciso um movimento coletivo e estrat�gias que considerem a realidade brasileira quanto � legaliza��o e descriminaliza��o do aborto. Isso implica construir um discurso que n�o esbarre na indaga��o de ser a favor ou contra o aborto, mas que leve em considera��o o impacto que a criminaliza��o do aborto causa em diversos setores da sociedade e na vida, bem como no direito de escolha de milhares de mulheres, meninas e pessoas que gestam. Uma pol�tica p�blica que n�o criminalize pessoas pela pr�tica do aborto e que atenda de forma digna �quelas que recorrem a esse direito � urgente.

 

A luta dos movimentos feministas e da sociedade na Argentina e no Uruguai para a legaliza��o do aborto nos ensina que � poss�vel avan�ar, conquistar e manter direitos, mesmo diante de cen�rios neoconservadores regidos por valores morais e dogm�ticos que influenciam as decis�es pol�ticas contr�rias ao avan�o das pautas progressistas. Portanto, resistir e lutar por direitos sexuais e reprodutivos plenos para as mulheres e pessoas que gestam s�o estrat�gicas de enfrentamento a esta onda conservadora que tem pairado sobre corpos, g�neros e sexualidades nos pa�ses latino-americanos, os quais vivem em constantes avan�os e retrocessos. A experi�ncia coletiva e o interc�mbio com outras realidades podem nos fazer mais fortes na luta para a garantia e a concretiza��o da liberdade e dos direitos humanos das mulheres, meninas e pessoas que gestam.

 

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Maur�lio Castro de MATOS Trabalhou na concep��o, no delineamento, na an�lise, reda��o, revis�o e normatiza��o.

Graduado em Servi�o Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1996). Mestre em Servi�o Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2000). Doutor em Servi�o Social pela Pontif�cia Universidade Cat�lica de S�o Paulo (2009), com est�gio de pesquisa no exterior no Instituto Superior Miguel Torga, em Coimbra, Portugal. P�s-doutor em Pol�ticas Sociais pela Universidade de Bras�lia (2018). Professor Associado da Faculdade de Servi�o Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Atualmente � bolsista de produtividade do CNPq e procientista da UERJ.

 

Franciele da Silva SANTOS Trabalhou no delineamento, na an�lise, reda��o, revis�o e normatiza��o.

Graduada em Servi�o Social pela Universidade Estadual da Para�ba (2013). Mestra em Servi�o Social pela Universidade Estadual da Para�ba (2017). Especialista em Aten��o B�sica e Sa�de da Fam�lia, modalidade Resid�ncia Multiprofissional pelo Programa de Resid�ncia Multiprofissional de Jaboat�o dos Guararapes-PE (2020). Doutoranda em Servi�o Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professora substituta de Servi�o Social na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).

 

Tatianny de Souza de ARA�JO Trabalhou no delineamento, na an�lise, reda��o, revis�o e normatiza��o.

Graduada em Servi�o Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2020). Mestranda em Servi�o Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Servidora p�blica federal da sa�de.

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* Assistente Social. Doutor em Servi�o Social. Professor Associado da Faculdade de Servi�o Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. (UERJ, Rio de Janeiro, Brasil). Rua S�o Francisco Xavier, 524, bl. D, sl.9002, Pavilh�o Jo�o Lyra Filho, Maracan�, Rio de Janeiro (RJ), CEP.: 20550-013. Bolsista de produtividade do CNPq e Procientista da UERJ. E-mail: mauriliomatos@gmail.com.

** Assistente Social. Mestra em Servi�o Social. Doutoranda em Servi�o Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professora substituta de Servi�o Social na Universidade Federal de Campina Grande. (UFCG, Campina Grande, Brasil). BR-230- Rodovia Governador Ant�nio Mariz, Km 466,5- BR 230, Fazenda Cez�rio, Campina Grande (PB), CEP.: 58.800-000. E-mail: francielesilvasantos22@gmail.com.

*** Assistente Social. Mestranda em Servi�o Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. (UERJ, Rio de Janeiro, Brasil). Rua S�o Francisco Xavier, 524, bl. D, sl.9002, Pavilh�o Jo�o Lyra Filho, Maracan�, Rio de Janeiro (RJ), CEP.: 20550-013. Servidora P�blica Federal da Sa�de. E-mail: tatianny.s.a@gmail.com.

 

� A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra est� licenciada sob os termos da Licen�a Creative Commons Atribui��o 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial.O licenciante n�o pode revogar estes direitos desde que voc� respeite os termos da licen�a.

[2]N�o foi a primeira interven��o de Lula sobre o assunto. Em 2008, na abertura da 11� Confer�ncia Nacional de Direitos Humanos, disse: �N�o se trata de ser contra ou a favor. Trata-se de n�s discutirmos com muita franqueza que � uma quest�o de sa�de p�blica. Se perguntarem para mim, eu j� disse abertamente: eu sou contra [...]� eQuantas madames v�o fazer aborto, at� em outro pa�s, e as pobres morrem na periferia dos grandes centros urbanos?� (MONTENEGRO, 2008, n�o paginado).