Challenges in supporting the principles of the anti-asylum fight
Gabriela Fernandes Chaves LIRA*
https://orcid.org/0000-0001-7099-4504
Andreia de OLIVEIRA**
https://orcid.org/0000-0001-8759-059X
Resumo: O presente artigo apresenta um
estudo sobre o campo da saúde mental e o movimento de remanicomialização
presente na sociedade brasileira. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica e
análise documental, a fim de identificar campos de tensões e disputas nas
políticas de saúde mental do país, no período 2016-2022. Os resultados
indicaram um cenário de políticas públicas vinculadas à Reforma Psiquiátrica Brasileira
e à Luta Antimanicomial. Por outro lado, observam-se medidas de remanicomialização, defendidas pelo setor privatista no
país, com expansão da contrarreforma psiquiátrica e de propostas de saúde
mental direcionadas aos interesses dos setores privado e filantrópico. Esse
quadro demanda o fortalecimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira e da Luta
Antimanicomial, alinhado às lutas sociais dos trabalhadores e a uma
sociabilidade com democracia e liberdade.
Palavras-chave: Saúde
Mental. Contrarreforma Psiquiátrica. Reforma Psiquiátrica. Luta Antimanicomial.
Abstract: This article is a study on the field of mental health and
the re-asylum movement in Brazil. Bibliographical research and documentary
analysis was conducted to identify
areas of tension and dispute in the country’s mental health policies for the
period 2016-2022. Results identify a situation in which public policies are
linked to Brazilian Psychiatric Reform. There are, however, re-asylum measures,
defended by the private sector, with the expansion of psychiatric
counter-reform and mental health proposals aimed at the interests of the
private and philanthropic sectors. This demands the strengthening of Brazilian
Psychiatric Reform and the Anti-Asylum Fight, aligned with the social struggles
of workers and a democratic and free society.
Keywords: Mental Health. Psychiatric Counter-reform. Psychiatric Reform. Anti-asylum Fight.
Submetido em: 30/1/2023. Aceito em: 21/5/2023.
Introdução
N |
o decurso da institucionalização e
implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), as medidas de ajuste do modelo
neoliberal interpelaram diretamente as mudanças do SUS, incluso as
transformações no campo da saúde mental. Se por um lado a presença dos
parâmetros do modelo manicomial, privatista e curativo-hospitalocêntrico se
perpetuaram, por outro, ações de saúde mental — vinculadas ao campo da Reforma
Psiquiátrica Brasileira — conseguiram galgar avanços no campo antimanicomial,
com adoção de normativas legais, advento de serviços substitutivos, fomento à participação
popular e disseminação teórico-política de um saber-fazer crítico e radical
(Amarante, 2007).
A aprovação
da Lei Federal nº 10.216/2001, a Lei da Reforma Psiquiátrica (Brasil, 2001),
foi um patamar decisivo no marco regulatório da questão, ao traçar
possibilidades para compor o paradigma da atenção psicossocial. Essa atenção
ocorreria por meio de uma rede de serviços territoriais, de base comunitária,
de preservação da autonomia e do cuidado em liberdade. Contudo, no Projeto de
Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira (PL 3657/1989), previa-se a extinção
progressiva dos hospitais psiquiátricos[1]
— proposta não completamente efetivada no sequenciamento desse projeto no
formato de instrumento legal (Lei federal nº 10.216/2001), pois se dá sobre os
próprios limites da institucionalidade do capital.
Apesar dos
significativos ganhos normativo-legais e operacionais, fruto de ampla
participação social brasileira, tais mecanismos não conseguiram estancar o
avanço e expressividade dos interesses de lucratividade do capital privado para
com a saúde mental da população. Isso se mostra, por exemplo, a partir do
expressivo crescimento da indústria farmacêutica no âmbito do fomento aos
medicamentos psicotrópicos, de forma associada ao crescimento de diagnósticos em
saúde mental, cuja confluência incide diretamente no campo da psiquiatria
tradicional, em detrimento dos alinhamentos à Reforma Psiquiátrica Brasileira,
como já apontaram Dias e Muhl (2020).
Na esfera
das forças antagônicas, a contrarreforma psiquiátrica passa a ser engendrada
enquanto um processo sociopolítico e cultural complexo, no qual a sobreposição
da ideologia neoliberal e conservadora — fortalecida no Brasil pela ascensão de
setores da extrema direita na gestão pública — incide no rompimento com os
propósitos da Reforma Psiquiátrica Brasileira e da Luta Antimanicomial. Tal
ruptura ocorreria mediante a exaltação de diferentes estratégias manicomiais,
que apresentam características segregacionistas, mercantis e conservadoras
(Costa; Mendes, 2020).
Denomina-se
contrarreforma a complexificação dos interesses econômicos na produção e
reprodução social capitalista, em um processo de obstrução do acesso à saúde, a
fim de responder ao interesse do mercado e secundarizar/inviabilizar a saúde
enquanto direito humano universal. O caráter contrarreformista
do Estado brasileiro se expressa por meio de medidas de privatização, sub ou desfinanciamento do SUS. Segundo Coutinho (2012), a
contrarreforma não representa o novo, pois se caracteriza pela preponderância
da conservação do velho, em face das parcas novidades. Na política de saúde
mental, a restauração das práticas manicomiais, repressoras e privatistas é
marca significativa de um processo contrarreformista.
Nesse
sentido, corrobora-se o entendimento de Costa e Mendes (2020) de que a
contrarreforma psiquiátrica neoliberal revigora o subfinanciamento, a remanicomialização e a mercantilização da saúde mental, em
especial nos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro (2016-2022). Apesar deste
fenômeno ser anterior a 2015, a contrarreforma psiquiátrica adquire novos
contornos no período em questão, mediante o acirramento das medidas
neoliberais, de austeridade e conservadoras. A reatualização do conservadorismo
na política de saúde mental vem conjugada à perspectiva manicomialista,
sob a retórica de que é essencial fortalecer instituições asilares, desfinanciar serviços substitutivos e reinserir novos
manicômios no centro do cuidado, pela via do hibridismo, em que o
propósito não é a substituição, mas a complementação dos serviços manicomiais.
O
acirramento dessas medidas contrarreformistas, a
partir de 2016, ocorre na conjuntura de aderência de governos ao processo
obscurantista, dominante na saúde mental. Entretanto, esses elementos de cunho contrarreformistas são potencializados a partir da
interrupção do processo democrático no país, com o golpe parlamentar no mandato
da Presidenta Dilma Rousseff, em 2016, e com a instalação de medidas de
contingenciamento, a exemplo da Emenda Constitucional nº 95/2016.
Compreende-se, assim, que tanto os movimentos
de perspectiva antimanicomial, vinculados à Reforma Psiquiátrica Brasileira,
quanto as iniciativas da contrarreforma psiquiátrica são forças coexistentes,
pois se tratam de processos em continuidade, e não de
fenômenos estanques ocorridos em um período (Lira, 2021). Nessa direção, o
objetivo principal deste estudo é identificar e analisar as principais
inflexões da política pública de saúde mental brasileira, no contexto das
modificações introduzidas no país, sobretudo no período 2016-2022, com realce
para a expansão das medidas contrarreformistas e de remanicomialização, e apresentar o seu contraponto, ou
seja, os movimentos de luta e resistência emergentes nessa seara. Este trabalho
busca enfatizar os distintos projetos em disputa nas políticas públicas de
saúde mental, sejam aqueles vinculados às propostas da Reforma Psiquiátrica
Brasileira e da Luta Antimanicomial, ou iniciativas associadas ao projeto
privatista e de remanicomialização.
Trata-se, portanto, de pesquisa descritiva e
exploratória, de abordagem qualitativa, de base bibliográfica e complementada
por análise documental. O
levantamento bibliográfico, não exaustivo, buscou uma apreensão
analítico-crítica do objeto de estudo. Foram selecionadas referências centrais
à construção do campo da luta antimanicomial e da atenção psicossocial, em
diálogo com outros teóricos do campo da saúde mental que adotam um caminho de
análise crítica, sobretudo sob bases marxistas e marxianas.
Na análise
documental, foram consultados instrumentos do marco legal regulatório e
institucional, em especial do órgão federal de saúde do país, buscando
identificar o percurso da política pública de saúde mental e as inflexões contrarreformistas[2]. Para tanto, usa-se como aporte da pesquisa
documental a Lei Federal nº 10.2016/2001 (Brasil, 2001); o documento Saúde
Mental em Dados, de 2015, sobre a política de saúde mental e de álcool e
drogas do Ministério da Saúde (Brasil, 2015); e o Painel de Saúde Mental,
para a análise de dados a partir de 2015 (Desinstitute;
Weber, 2021).
A análise
das propostas contrarreformistas de remanicomialização foi embasada em dois documentos (sem
excluir outras normativas legais): as Diretrizes para um modelo de atenção
integral à saúde mental no Brasil, apresentadas em 2020 pela Associação
Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com a Associação Médica Brasileira
(AMB), Conselho Federal de Medicina (CFM), Federação Nacional dos Médicos
(FENAM), Associação Brasileira de Impulsividade e Patologia Dual (Abipd) e Sociedade Brasileira de Neuropsicologia (SBNp) (Associação Brasileira de Psiquiatria, 2020); e o Edital
de Chamamento Público nº 03/2022 do Ministério da Cidadania (Brasil, 2022).
Os dois documentos contemplam questões da complexificação do campo da saúde
mental, álcool e outras drogas; das tensões inerentes à saúde mental como
objeto da saúde pública; e da interconexão da saúde mental com segurança,
criminalização e higienização.
O estudo a respeito das forças de
resistência aos avanços contrarreformistas na saúde
mental e o exame de setores de enfrentamento dos ataques à Reforma
Psiquiátrica, deram-se por análise documental do discurso oficial, produzido
por organizações e movimentos sociais antimanicomiais sediados em território
brasileiro, com incidência relevante no campo da Saúde Mental e da Luta
Antimanicomial. Foram acessadas e consultadas páginas do acervo documental das
seguintes organizações e movimentos sociais antimanicomiais: Movimento Nacional
da Luta Antimanicomial (MNLA), Rede Internúcleos da
Luta Antimanicomial (Renila) e Associação Brasileira
de Saúde Mental (Abrasme). Embora haja uma gama de
movimentos componentes desse campo, as três organizações acima foram avaliadas
para os propósitos deste artigo em razão da exequibilidade.
Dimensões
da contrarreforma psiquiátrica, seus protagonistas e atores sociais
O projeto contrarreformista, de cunho
regressivo e remanicomializador, caminha entrelaçado aos
retrocessos introduzidos nas políticas sociais e no SUS, como o desfinanciamento intensificado, o sucateamento da rede
pública de serviços, as privatizações e o privilegiamento do mercado. Tais
aspectos são realçados, no presente estudo, pela identificação de dimensões
expressivas do aceleramento da contrarreforma psiquiátrica, a saber: modificação
por dentro, como medida para melhorar a atenção em saúde mental, por meio de
ampliação financeira e privilegiamento de serviços de bases asilares, como
Hospital psiquiátrico e Comunidades Terapêuticas (CTs);
retórica de uma readequação do hospital psiquiátrico com humanização no
atendimento; modelo híbrido, conjugando serviços substitutivos e asilares como
parte complementares de uma mesma rede atenção em saúde mental; e prevenção de doenças
mentais[3]
segundo a ótica higienista.
A
materialização de tais dimensões ocorre mediante diferentes estratégias e
envolve vários sujeitos políticos, assim como identificado em análise do
documento Diretrizes para um modelo de atenção integral à saúde mental no
Brasil (Associação Brasileira de Psiquiatria, 2020). O documento contempla
explícita valorização dos hospitais psiquiátricos, em detrimento dos serviços
substitutivos. A perspectiva manicomializadora se
identifica não apenas no teor dos discursos, mas é acolhida materialmente em
órgãos estratégicos do poder executivo. Um exemplo é o citado Edital de
Chamamento Público nº 03/2022 do Ministério da Cidadania (Brasil, 2022),
com vistas à seleção, em ambiente hospitalar, de projetos de cuidado,
tratamento e reinserção social de pessoas com necessidades decorrentes do
uso de substâncias psicoativas. O chamamento visibiliza a Nova Política
Nacional sobre Drogas, oficializada no Decreto 9.761/2019 (Brasil, 2019),
revoga a legislação sobre redução de danos e considera como única abordagem a
abstinência, sobretudo por meio do tratamento em CTs.
Ademais, um
conjunto de normativas legais e operacionais da chamada Nova Política de Saúde
Mental indica uma tendência contrarreformista e remanicomializadora, a exemplo da Resolução nº 32/2017 da
Comissão Intergestores Tripartite (CIT) (Brasil,
2017a) e da Portaria nº 3.588/2017 (Brasil, 2017b) do Ministério da Saúde que,
ao argumento de fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) induzem,
contraditoriamente, ao desmonte da Rede, ao incluir o Hospital Psiquiátrico no
rol de serviços da RAPS.
A análise
do Edital de Chamamento Público nº 03/2022 do Ministério da Cidadania
(Brasil, 2022) e das Diretrizes para um modelo de atenção integral à saúde
mental no Brasil (Associação Brasileira de Psiquiatria, 2020) possibilitou identificar
alguns eixos temáticos de apreensão e expressividade, em termos do modo de
constituição dos processos de contrarreforma psiquiátrica, sob o auspício do modelo
manicomial, com destaque para quatro tendências assinaladas na sequência.
· Hipervalorização
do Hospital Psiquiátrico — nesta tendência, é endossado que a
fragilidade na atenção em saúde mental advém da retirada do hospital
psiquiátrico como elemento central, o que geraria impactos no sucateamento da
rede e no déficit dos serviços de saúde mental. Não são considerados, nessa
análise, a falta de investimentos e o histórico de desfinanciamento
dos serviços substitutivos em prol do modelo de internação psiquiátrica,
imposto historicamente na seara asilar-manicomial. A tendência de valorização acentuada
do hospital psiquiátrico, de abordagem individual, biologicista,
medicamentosa e socialmente restritiva, apresenta-se de forma conivente ao
projeto privatista manicomial, de bases conservadoras.
· Atribuição
do aumento do nível de suicídio, do crescimento da população em situação de rua
e do encarceramento das pessoas em sofrimento à redução dos leitos de hospitais
psiquiátricos — tal tendência busca criar uma relação de causa e efeito, no
intuito de ignorar a estrutura capitalista geradora de intenso sofrimento com
sua lógica produtivista e mercantil, além de desconsiderar o adoecimento
ocasionado pelo internamento em instituições asilares-manicomiais.
· Reforço à
relação causal entre crise e internação psiquiátrica — a tendência
de defesa da “nova política de saúde mental”, adotada a partir de 2017,
é enfocada como modernizadora em relação à RAPS, a partir da (re)inclusão dos manicômios.
· Perspectiva
proibicionista em relação ao uso de drogas — esta tendência contempla
uma visão moralista em que se atribui relações causais ao uso de drogas, sem
levar em conta a estrutura, os processos e o contexto. Denota uma concepção
higienista de cuidado,
Os dois
documentos apresentam falácias (Brasil, 2022; Associação Brasileira de
Psiquiatria, 2020), como, por exemplo, a indicação de que uma desassistência
seria decorrente de menor investimento em hospitais psiquiátricos, por meio de
comparativos entre o Brasil e outros países. Essa afirmativa contrapõe os
resultados de estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (World Health Organization, 2020), no qual o reflexo da incipiência no
cuidado em saúde mental, em anos recentes, estaria relacionado a um maior
investimento em hospitais psiquiátricos do que em serviços substitutivos (World
Health Organization, 2020).
Para
corroborar a contraposição da informação elencada no Edital de Chamamento
Público nº 03/2022 do Ministério da Cidadania (Brasil, 2022), o relatório
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, 2021) aponta maior
investimento de recursos em CTs no campo da Política
Sobre Drogas. O valor monetário-financeiro exorbitante destinado à área de
serviços que contém (como direcionamento) a perspectiva asilar-manicomial
corrobora o enraizamento desse caráter técnico-assistencial, o qual adquire
predomínio e capilaridade com o financiamento da lógica psiquiatrizante.
A remanicomialização: sobreposição dos interesses do mercado
e do conservadorismo na atenção em saúde mental
As práticas
reatualizadoras do conservadorismo e remanicomialização, no país, ganham guarita em um arcabouço
legal ancorado em um projeto privatista manicomial, sobretudo a partir de 2016,
a partir da chamada Nova Política de Saúde Mental (Cruz; Gonçalves; Delgado,
2020). As alterações normativo-legais e operacionais indicam aumento da
alocação de recursos financeiros destinados ao custeio de serviços
asilares-manicomiais e diminuição de suporte para serviços de base territorial,
conforme consta na Portaria nº 2.434/2018 do Ministério da Saúde (Brasil,
2018), com redução no número de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),
suspensão temporária do financiamento em 2018 e desabilitação de alguns
serviços (Desinstitute; Weber, 2021).
Desde a
promulgação da Lei nº 10.216/2001, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica
Brasileira (Brasil, 2001), não havia sido identificada, até então, falta de
priorização e de investimentos nos CAPS nos níveis observados no período
2018-2020, na gestão do governo Jair Bolsonaro, expresso sobretudo na baixa
expansão, construção e habilitação desses serviços.
Faz-se
necessário repensar não apenas a forma de ver os processos de sofrimento, mas
buscar rever toda a superestrutura em que o sofrimento está calcado, e a forma pela
qual a estrutura se coloca diante do sofrimento. Assim, torna-se possível
questionar premissas de reforço a centralidade da lógica do capital no trato
com a saúde mental, a exemplo do tratamento por meio do trabalho, do consumo e
do encaixe em padrões estabelecidos (Passos, 2015; 2018).
Outrossim,
conceber uma saúde mental racializada, de modo a
identificar as nuances da sua história e a intrínseca relação entre manicômios
e racismo, é compreender as bases que dão sustentação aos manicômios, as quais se
fortalecem nos moldes do higienismo neoliberal. Fanon
(2020) já apontava a relação entre colonização e hospital psiquiátrico,
demonstrada até o período atual, com base em relatos contidos em inspeções do
Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT, 2007)[4].
Ou seja, sabe-se quem mais sofre e quem mais é afetado pela lógica manicomial.
No intuito
de sintetizar a conformação da contrarreforma psiquiátrica, como também a
transitoriedade na relação público versus privado, foram elencadas, no estudo,
quatro dimensões interrelacionadas e interdependentes, identificadas por meio
da análise documental e bibliográfica, e inseridas na sequência.
· Dimensão
privatista — o fomento às intuições privadas e filantrópicas visa favorecer
convênios e termos de parcerias com modelos manicomiais, com o agravamento do
quantitativo de 70% dos hospitais psiquiátricos serem constitutivos da rede
privada. Além disso, as Comunidades Terapêuticas recebem valores que poderiam
estar sendo investidos em serviços priorizadores do
direito de escolha. Entretanto, as CTs estão
enraizando a lógica de asilamento, do não respeito à
liberdade individual e do desmonte da perspectiva de redução de danos, com
vistas à imposição da abstinência (Conselho Federal de Psicologia; Mecanismo
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura; Conselho Nacional do Ministério
Público; Ministério Público do Trabalho, 2020).
· Dimensão
conservadora — é reafirmada por meio de normativas de favorecimento do
manicômio, de inserção dos hospitais psiquiátricos e Comunidades Terapêuticas
no centro da RAPS e de supressão do orçamento de serviços substitutivos. Tal
dimensão conserva, também, a ordem que legitima o racismo, a colonização, o
machismo e diversas concepções violentas.
· Dimensão
manicomial — se pauta por enaltecer os manicômios e suas práticas como
inovadoras. Destaca-se como exemplo desta dimensão a apresentação da Nota
Técnica nº 11/2019, na qual o eletrochoque é direcionado como possibilidade de tratamento,
denominado de eletroconvulsoterapia, fortemente
defendido pela Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, no período.
Outro exemplo da dimensão manicomial pode ser referido à Associação Brasileira
de Psiquiatria, responsável pela edição da Revista Debates em Psiquiatria
Clínica, com artigos em defesa da eletroconvulsoterapia
como prática para o cuidado de pessoas em sofrimento psíquico grave
(Associação Brasileira de Psiquiatria, 2011). Além desse ponto, a ABP tem se colocado
não apenas de modo favorável, mas tem pautado grande parte das latências contrarreformistas. Na defesa das “novas diretrizes para o
cuidado em saúde mental”, reapresentada em 2020, a ABP propôs revogação de
portarias fundamentais na consolidação da Reforma Psiquiátrica Brasileira
(Associação Brasileira de Psiquiatria, 2020). Esse fato demonstra o alinhamento
da entidade, em desajuste aos preceitos de uma saúde mental vinculada à luta
antimanicomial.
· Dimensão
repressora — a lógica manicomial demonstra o caráter repressor desta
dimensão, no uso de suas forças hegemônicas para legitimar o encarceramento da
população. Como exemplo, cita-se a Portaria 69/2020 do Ministério da Cidadania,
que “[...] aprova recomendações gerais para a
garantia de proteção social à população em situação de rua, inclusive
imigrantes, no contexto da pandemia do novo Coronavírus, COVID-19 [...]”
(Brasil, 2020, n.p.) e insere as Comunidades Terapêuticas como lugar central no
atendimento à população em situação de rua (Brasil, 2020). O fomento à lógica
moral religiosa, contraponto a laicidade do Estado, apresenta-se como
indicativo da dimensão repressora, com a definição da abstinência como única
linha de cuidado, e com exclusão da política de redução de danos do campo
álcool e outras drogas.
No entanto, essas quatro dimensões não se apresentam de modo estanque,
linear e tampouco apartadas umas das outras. Ao contrário, trata-se de um amálgama
de ação imbricada, o qual impacta diretamente no movimento remanicomializador,
no sentido de fortalecer o campo asilar-manicomial.
Da Reforma
Psiquiátrica à contrarreforma remanicomializadora:
tensões e disputas nos governos de austeridade do período 2016-2022
Em
contraposição à remanicomialização e sobreposição dos
interesses privados e conservadores, há também, na atenção em saúde mental,
lutas sociais por meio da mobilização orgânica de sujeitos políticos,
defensores dos princípios norteadores e fundantes
da proposta de um modelo de atenção de base antimanicomial, territorial, sob a
primazia do direito humano à saúde, da autonomia e do exercício da cidadania (Vasconcelos,
2016).
Na
sociedade capitalista, tanto o Estado como as políticas sociais apresentam um
caráter contraditório que mobiliza, simultaneamente, interesses opostos na
sociedade, com respostas diferentes, dependendo do poder de incidência de cada
lado opositor (Behring; Boschetti, 2011). Desse modo, não se trata apenas de
uma mediação estratégica no interior do capitalismo, mas de um amalgamado com a
classe dominante, a qual incorpora as reivindicações da classe trabalhadora,
quando se trata do interesse do capital.
A saúde
mental, por ser um campo contraditório, está compreendida entre aqueles que se
organizam e lutam pela defesa intransigente da vida, das existências e de outra
sociedade, confluindo pela luta antimanicomial, enquanto um outro campo se
alinha ao projeto manicomial privatista e conservador, o qual contribui para
corroboração do processo de contrarreforma psiquiátrica (Vasconcelos, 2016).
Dessa maneira, o ambiente de luta, em consolidação na saúde mental, está
transposto por segmentos que estão pautando e construindo, concomitantemente,
uma reforma psiquiátrica no país, de concepção antimanicomial.
Não
obstante, é preciso considerar o caráter contraditório das políticas de saúde
mental, pois esse campo mobiliza, ao mesmo tempo, interesses opostos — os quais
podem, conforme a correlação de forças presentes, caminhar em direção às
propostas da Reforma Psiquiátrica, ou, de forma contrária, fortalecer um
projeto contrarreformista, conservador e de
manutenção do status quo sob a condição de exploração. Desse modo, o
fortalecimento do campo antimanicomial torna-se fundamental para construir o
rompimento dessa estrutura. Basaglia (1979) aponta para a perspectiva de
superação dos manicômios, a partir da mobilização da classe trabalhadora. Tal mobilização
abrangerá sindicatos, partidos de esquerda e lutas populares, a fim de alcançar
esses objetivos. Essa correlação de forças ocorre em razão da composição das
políticas sociais no Estado Burguês, que variam entre governos progressistas a
governos conservadores.
Na
constituição da saúde mental, o campo da contra-hegemonia
psiquiátrica foi fundamental para a continuidade do modelo calcado na Reforma
Psiquiátrica, ainda que pairando sob constantes ameaças. Essa conformação
mobiliza interesses antagônicos, com respostas distintas, e que dependem do
poder de incidência de cada campo e do cenário ideológico-político do momento.
Vasconcelos (2016), a partir de uma análise de conjuntura, assinala que a
formação social do país tem, como premissa, a manutenção de hierarquias. Nessa
ótica, são demonstrados dois campos: revolucionário e conservador. O campo
revolucionário se alinha às lutas em defesa da democratização do país, com
valorização do poder popular e da participação social, e contribui para
impulsionar a Luta Antimanicomial. O campo conservador representa os interesses
do capital e inibe os avanços possíveis, favorecendo o desmonte das políticas
sociais. Este último campo está composto pela seara de lucratividade a partir
da saúde-doença, que se manifesta em seguros privados, clínicas de internação
compulsória, setores de produção de psicofármacos e similares.
Observa-se
assim que, no campo manicomial, enraízam-se os segmentos representantes da
psiquiatria tradicional e das Comunidades Terapêuticas, os quais têm postulado
vários posicionamentos favoráveis a um caráter conservador, rígido e
positivista das práticas de saúde. Por outro lado, no campo antimanicomial, os
movimentos sociais, coletivos, associações constroem campos de resistência e
pautam a superação da lógica manicomial, muitas vezes associada a uma crítica
radical da sociedade. Todavia, no âmbito dos movimentos sociais, as
contradições também se fazem presentes, há dissensos, e nem sempre se caminha
coesivamente.
Os dois
campos aqui debatidos são permeados por contradições, encontram-se inseridos em
cenários intensos de correlação de forças e se pautam pelas suas diferentes
linhas e percepções no que diz respeito à saúde mental. Enquanto o campo
manicomial está focado no objeto doença, o campo antimanicomial busca a
produção de maneira ampliada e voltada à reinvenção da vida.
Elaborou-se
um quadro-síntese das disputas centrais em que se concentram os dois campos,
manicomial e antimanicomial, as quais se aguçam em um cenário de contrarreforma
psiquiátrica (Quadro 1). Os informes foram apreendidos com base em distintos
documentos normativos, legais e institucionais, expressos no âmbito desses dois
segmentos em estudo.
Quadro 1 - Síntese
das disputas entre o campo manicomial e o campo antimanicomial, identificadas
na política pública de saúde mental no contexto do SUS. Brasil, 1990-2022
Elementos destacados |
Campo manicomial |
Campo antimanicomial |
Objeto do cuidado adotado
no campo |
Doença mental |
Saúde mental, compreendida
enquanto produção social da vida |
Caracterização do modelo
de saúde mental adotado |
Modelo assistencial
biomédico, curativo-hospitalocêntrico, de bases fundantes na psiquiatria
tradicional, no uso predominante de procedimentos de concepção não
integradora e por vezes considerados obsoletos, a exemplo da eletroconvulsoterapia |
Modelo assistencial
psicossocial, de base comunitária, territorial, voltado à preservação da
autonomia, ao cuidado em liberdade às pessoas em sofrimento |
Concepção de saúde do
modelo de saúde mental adotado |
Privatização e
mercantilização da saúde |
Saúde como política
pública de acesso universal, de direito do cidadão e de responsabilidade do
Estado |
Concepção de cuidado do
modelo de saúde mental adotado |
Patologização da vida,
periculosidade e risco social |
Fortalecimento do cuidado
em liberdade e promoção dos direitos |
Paradigma do campo |
Proibicionista, criminalizador e moralista |
Antiproibicionista e de
redução de danos |
Definição dos sujeitos
usuários do cuidado em saúde mental |
Sujeitos políticos em
defesa da contrarreforma remanicomializadora |
Sujeitos políticos em
defesa da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, associada a outras
lutas sociais por projetos societários contra-hegemônicos |
Fonte: Elaboração própria.
Em tempos
de avanço da contrarreforma psiquiátrica, no decorrer dos quais o
conservadorismo se apropria dos espaços, das políticas e das dimensões da vida,
as tensões se acirram entre o campo manicomial e antimanicomial; entretanto,
suas pautas e concepções ocorrem entrelaçadas à conjuntura macrossocial.
Medidas de austeridade fiscal, desinvestimento em políticas sociais, esvaziamento
dos espaços de participação popular — sobretudo com a ceifa democrática marcada
no ano de 2016
pelo golpe parlamentar — geram impactos específicos
no âmbito da saúde mental.
As disputas
no interior da sociedade interferem diretamente no fortalecimento ou
fragilização da Luta Antimanicomial e da Reforma Psiquiátrica. Como sinaliza
Passos (2015; 2018), é preciso compreender tais disputas dentro dos próprios
limites impostos pelas determinações sociais do processo saúde e doença. Desse
modo, pensar a luta antimanicomial apenas no campo da redução das desigualdades
é limitar o que se objetiva com a superação da lógica manicomial, pois um novo
quadro de igualdade deve ser construído como reivindicação da classe
trabalhadora. Essas posturas já demonstram a existência de divergências dentro
do próprio movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira, ora por caminharem
numa ótica reformista, ora por rumarem à revolução.
Por essas
razões, a luta antimanicomial não está findada, pois carece de constante
construção. Em meados do período 2016-2022, o campo da hegemonia psiquiátrica
tradicional tem se validado no país, no sentido de recosturar as possibilidades
do retorno aos manicômios. Essas disputas se acirram a depender da conjuntura,
uma vez que não se trata de um processo mecanicista. As narrativas do
saber-poder, próprias da classe dominante, apropriam-se do campo da saúde
mental para se apropriar das perspectivas desse campo. Nesse sentido, o polo
das mobilizações sociais reivindica a superação de tais narrativas, a partir da
consolidação do discurso popular de um cuidado pautado na emancipação humana.
As
manifestações do movimento antimanicomial em tempos de acirramento da contrarreforma
Diante do
cenário em que expressivos desmontes impactam no campo da saúde mental, a
mobilização social demonstra sua relevância perante esses retrocessos.
Segmentos historicamente organizados no país em defesa de uma saúde mental mais
ampliada têm buscado e apresentado estratégias com vistas ao enfrentamento e
enraizamento da perspectiva manicomial.
Seguindo
essa lógica, foi possível observar a existência de uma movimentação do campo
progressista, buscando seguir o curso de continuidade da proposta da Reforma
Psiquiátrica Brasileira. Vasconcelos (2010) discorre sobre as rupturas
ocorridas dentro da movimentação progressista antimanicomial, e aponta o modo
que essas dissonâncias se direcionaram para cisões, sobretudo na composição da
Rede Internúcleos da Luta Antimanicomial e do
Movimento Nacional da Luta Antimanicomial. No entanto, foi possível perceber,
no ano demarcado para este estudo, uma perspectiva mais concentrada em defesa
da Reforma Psiquiátrica Brasileira.
Outro
exemplo da movimentação progressista antimanicomial foi observado em dezembro
de 2017, no contexto de uma efusão do conservadorismo na já mencionada Nova
política de saúde mental. Naquela conjuntura, o campo antimanicomial buscou
reafirmar, por meio da comemoração de 30 Anos de Carta de Bauru (em
relação ao documento redigido em evento que ocorreu em Bauru (SP), em dezembro
de 1987), a relevância em defesa do lema Por uma Sociedade Sem Manicômios,
além de apontar o desfavorecimento às normativas contrarreformistas.
Em anos subsequentes
a 2017, os segmentos antimanicomiais permaneceram a pautar, a construir e a
desenvolver ações demarcatórias da posição contrária à reafirmação de
movimentos de cunho manicomial, tais como a ABP. Em 2020, primeiro ano da
pandemia da Covid-19, foi pautada a revogação de portarias com desdobramentos
contra a proposta da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Esse movimento, conduzido
sobretudo pela movimentação progressista antimanicomial e popularmente
conhecido como revogaço, teve ações desenvolvidas no
país, e se caracterizou como marca expressiva ao contraponto da proposta manicomialista conservadora (Lira, 2021).
Segue
abaixo uma síntese demonstradora dos apontamentos das confluências dos
movimentos antimanicomiais progressistas, analisados no período de acirramento
da contrarreforma:
· defesa do
lema Por uma Sociedade sem Manicômios, de subsídio à construção de
caminhos para reafirmação e validação também da reforma psiquiátrica
antimanicomial no Brasil;
· contraponto
à imposição da abstinência pautada na nova política sobre drogas;
· adoção de
categorias críticas para pautar a contrarreforma — olhar ampliado e não
endógeno da saúde mental;
· contrariedade
às figuras que reafirmam historicamente a centralidade dos manicômios.
Por
intermédio do conteúdo das premissas citadas, torna-se possível perceber a
coexistência perene entre reforma e contrarreforma, com suas modulações
específicas em cada contexto. Porém, esses movimentos reiteram a constante
investida do campo antimanicomial, no sentido de estancar retrocessos que
acompanham, historicamente, as conquistas alcançadas no âmbito da saúde mental.
Conclusão
A
trajetória das políticas públicas de saúde mental no Brasil tem a marca da luta
dos movimentos sociais, organizados em defesa de uma sociedade sem manicômios,
fundamentados no reconhecimento da liberdade e da democracia. Em contrapartida,
forças contrárias às propostas da Reforma Psiquiátrica Brasileira não deixaram
de exercer pressão para beneficiar o setor privado e filantrópico, sobretudo no
período 2016-2022. Tais setores e segmentos opositores vêm se articulando e
ganhando expressividade, especialmente nos espaços institucionais estratégicos
no Executivo e Legislativo, com forte direcionamento da política de saúde
mental aos interesses dos setores privado e filantrópico, caracterizando-se o
que se denomina de contrarreforma psiquiátrica.
O estudo
sugere a existência de diferentes elementos que compõem a contrarreforma
psiquiátrica, com realce para a reatualização do conservadorismo, por meio da
retomada de modelos e práticas considerados superados cientificamente,
reinseridos, porém, sob uma roupagem de modernização e de boa prática
psiquiátrica. Pode-se citar, como exemplo, as medidas de humanização do
hospital psiquiátrico, com embasamento a partir da proposta do modelo híbrido,
em que se busca manter os hospitais psiquiátricos, apenas por meio da sua
reatualização, da modificação por dentro e da prevenção de doenças mentais
pela ótica higienista.
A
organização sociopolítica dos movimentos sociais de base antimanicomial, em
defesa do projeto da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial, exige
compreender a política pública de saúde mental na interrelação com as
contradições na sociedade capitalista, como produtora e reprodutora das formas
de manicômios. Ou seja, a luta antimanicomial exige entrelaçar o debate da
saúde mental à determinação social do processo saúde-doença, às complexidades
das dimensões da vida em sociedade, e à própria constituição do Estado na
sociedade capitalista.
Contudo, há
que fortalecer a Luta Antimanicomial e a Reforma Psiquiátrica Brasileira,
alinhadas as lutas sociais das classes trabalhadoras, em busca de construir uma
sociabilidade sem nenhum tipo de manicômio e segregação, com radicalidade da
democracia e da liberdade, a fim de que todas as pessoas possam usufruir das
potencialidades da vida.
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Gabriela
Fernandes Chaves LIRA Trabalhou na concepção,
delineamento, análise, interpretação dos dados e na redação do artigo.
Assistente
Social. Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Política Social pelo
Programa de Pós-graduação em Política
Social (PPGPS) da Universidade de Brasília (UnB). Professora Substituto no
Departamento de Serviço Social da Universidade de Brasília (UnB). Grupo de
Estudo e Pesquisa em Saúde, Sociedade e Política Social – GEPSaúde/CNPq.
Campus Darcy Ribeiro, Asa Norte, Brasília (DF), CEP.: 70910-900. E-mail:
<gabriela_fernandesc@hotmail.com>. Este artigo é resultado de reflexões e
discussões feitas a partir da dissertação de mestrado da autora.
Andreia
de OLIVEIRA Trabalhou na concepção,
revisão crítica e na aprovação da versão a ser publicada. Assistente Social.
Doutora em Serviço Social. Professora Associada do Departamento de Serviço
Social e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade de
Brasília (UnB). Grupo de Estudo e Pesquisa em Saúde, Sociedade e Política
Social – GEPSaúde/CNPq.
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* Assistente Social. Mestre em Política Social Grupo de Estudos e
Pesquisa em Saúde, Sociedade e Política Social. (UnB, Brasília (DF), Brasil).
Campus Darcy Ribeiro, Asa Norte, Brasília (DF), CEP.: 70910-900. E-mail:
gabriela_fernandesc@hotmail.com.
** Assistente Social. Doutora em Serviço Social. Professora
Associada do Departamento de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em
Política Social da Universidade de Brasília. (UnB, Brasília (DF), Brasil).
Grupo de Estudos e Pesquisa em Saúde, Sociedade e Política Social. Campus Darcy
Ribeiro, Asa Norte, Brasília (DF), CEP.: 70910-900. E-mails:
andreiaoliveirasus@gmail.com; andreiao@unb.br.
© A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial. O licenciante não pode revogar estes direitos desde que você respeite os termos da licença.
[1] Segundo a Lei da Reforma
Psiquiátrica (Brasil, 2001), a internação é preconizada como último recurso.
Contudo, desde a primeira década do século XXI, têm sido identificadas
normativas fomentadoras da internação em instituições de saúde
asilar-manicomial, adotadas como primeiro recurso, a exemplo da Portaria nº 3.588/2011 do Ministério da
Saúde (Brasil, 2011) e Resolução nº 32/2017 da Comissão Intergestores
Tripartite (CIT). Destaca-se que luta antimanicomial não significa luta anti-internação, portanto, compreende-se a necessidade da
internação, como forma de cuidado, nos espaços referidos à perspectiva da
atenção psicossocial, na categoria de serviços substitutivos.
[2] Entende-se
que manifestações contrarreformistas já se
expressavam desde a instituição da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS),
conforme Portaria nº 3.088/2011 do Ministério da Saúde (Brasil, 2011), com
sinalizações para o campo manicomial ao prever a inserção das comunidades
terapêuticas (CTs) no rol de serviços contemplados na
RAPS. Essas reações se aprofundaram nos governos de Michel Temer e Jair
Bolsonaro, com o aceleramento das contrarreformas e das medidas neoliberais e
conservadoras.
[3] Aqui o termo doença mental
é empregado como crítica ao uso dessa categoria, a qual é utilizada
hegemonicamente pelos setores da psiquiatria tradicional, de modo a reforçar a patologização das vivências e a compreensão do sofrimento
de maneira restritiva.
[4] O Mecanismo
Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) foi instituído pelo Estado
brasileiro em 2007, em compromisso assumido com a Organização das Nações Unidas
(ONU). O órgão foi regulamentado pela Lei federal nº 12.847/2013 e se compõe de
especialistas independentes (peritos) com acesso às instalações de privação de
liberdade (centros de detenção, estabelecimento penal, hospital psiquiátrico,
abrigo de pessoa idosa, instituição socioeducativa ou centro militar de
detenção disciplinar). Constatadas violações, elaboram-se relatórios para as
devidas providências.