COVID-19 e saúde mental:
desafios para o trabalho do Assistente Social
COVID-19
and mental health: challenges for the work of
Social Workers
Giselle Mara Cardoso da COSTA*
https://orcid.org/0000-0001-9827-4605
Carina Berta MOLJO**
https://orcid.org/0000-0002-0248-5617
Resumo: Este artigo, que tem
como objetivo refletir sobre os desafios colocados para o trabalho do
assistente social, inserido na equipe multiprofissional do Centro de Atenção
Psicossocial - Álcool e Outras Drogas (CAPS), do município de Juiz de Fora –
Minas Gerais, considerando o contexto da pandemia de COVID-19, baseou-se na
experiência de trabalho de uma das autoras, vivenciadas em 2020, refletido à
luz da revisão de literatura. Configurando-se como um relato de experiência,
realizado como uma pesquisa descritiva, aborda aspectos relacionados à Política
de Saúde Pública e Saúde Mental, contextualizando-os à situação de calamidade
pública. Além disso, aponta como o contexto desafiador propiciou mudanças
positivas para cumprir o papel de um CAPS na reabilitação psicossocial por meio
do esforço coletivo da equipe, mobilizada para garantir o cuidado assistencial
diante de situação excepcional.
Palavras-chave: Saúde Mental. Serviço Social. COVID-19.
Abstract: This
article reflects on the challenges posed to the work of social workers within
the multidisciplinary team at the Centre for Psychosocial Care - Alcohol and
Other Drugs (CAPS) in the municipality of Juiz de Fora - Minas Gerais within
the context of the COVID-19 pandemic. It was based on the work experience of
one of the authors in 2020, reflected upon in the light of a literature review.
Configured as a report of the experience, it addresses aspects related to
Public Health and Mental Health Policy, contextualizing them to the situation
of public calamity. It demonstrates how the challenging context prompted
positive changes in fulfilling the role of a CAPS in psychosocial
rehabilitation through the collective effort of the team, mobilised to
guarantee care under exceptional circumstances.
Keywords: Mental
Health. Social Work. COVID-19.
Submetido em: 30/1/2023. Revisto
em: 16/4/2023. Aceito em: 15/5/2023.
1 INTRODUÇÃO
E |
ste
artigo tem como objetivo refletir sobre os desafios colocados para o trabalho
do assistente social, inserido na equipe multiprofissional do Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS AD III) do município de Juiz de Fora[1], tendo como
ponto de partida as experiências vividas nesse espaço sócio-ocupacional,
mediadas pela análise teórica necessária para a compreensão da emergência em
saúde declarada em virtude da pandemia de COVID-19, doença causada pelo
coronavírus. Em janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alertou
para a alta transmissibilidade da doença, que já havia infectado pessoas em 19
países no mundo
(Dantas, 2020).
No
caso do Brasil, diante desse cenário, o Governo Federal estabeleceu medidas de
enfrentamento[2]
a serem adotadas, como isolamento social, suspensão de atividades coletivas,
restrição quanto à locomoção dentro e fora do país. Serviços foram fechados[3],
permanecendo apenas as atividades consideradas essenciais para atendimento às
necessidades da população, como saúde, segurança pública, assistência social e
comércio de suprimentos. A princípio, acreditava-se que tais medidas fossem
temporárias, porém, a crise sanitária continuou se estendendo no tempo. Apesar
de termos controlado o pior momento da pandemia, sobretudo pelas
descobertas e avanços, dentre eles, a produção e a distribuição de vacinas, a
COVID-19 persiste com suas variantes, o que demanda ainda estado de vigilância
(Stevanim, 2020).
O
Brasil registrou tragicamente, entre 2020 e 2023, o quantitativo de mais de 690
mil pessoas que não sobreviveram às complicações do contágio pelo vírus. A
campanha de vacinação contra a COVID-19 começou a ser implantada no Brasil em
janeiro de 2021, em meio a uma guerra mediática incentivada por um governo negacionista,
que buscava desinformar a população sobre a eficácia das vacinas, propondo
outras formas de combater o coronavírus, ainda que comprovadamente ineficazes.
O
contexto de isolamento, somado ao medo que gerava uma doença até então
desconhecida, assim como a falta de políticas públicas claras por parte do
governo federal, tudo isso causou sérios rebatimentos na saúde mental da
população, fazendo com que essa temática fosse colocada em destaque e
amplamente discutida em diversos meios de comunicação, nos ambientes acadêmicos
e nos de trabalho. Os espaços de saúde,
compostos por equipes multiprofissionais, incluindo o assistente social,
procederam à readequação de rotinas de trabalho para que fosse garantida a
proteção de usuários e profissionais. Dessa forma, este relato de experiência
busca resgatar elementos da rotina que precisou ser repensada, considerando as
novas demandas apresentadas e intervenções possíveis frente ao panorama que se
descortinava. Dentro desse
contexto, abordaremos os processos de trabalho do assistente social que tem, na
saúde mental, um de seus espaços sócio-ocupacionais.
Os
profissionais de Serviço Social, juntamente a outras categorias profissionais,
compuseram o que foi chamado de linha
de frente de serviços essenciais, aos quais não
foi permitido e possível praticar o isolamento social. Dentre os serviços
considerados essenciais, situa-se o CAPS, sendo este um "[...] componente especializado de referência no cuidado de pessoas em
intenso sofrimento psíquico e em dificuldades para o exercício integral de suas
vidas, cabendo-lhe o cuidado-acompanhamento à crise” (Silva; Dimenstein, 2014,
p. 33). Devido à pandemia, o CAPS AD
III – JF teve como desafio a produção e a oferta integral de atenção
psicossocial aos usuários, haja vista que diversas práticas incluídas nesse
esteio precisaram ser adaptadas ou suspensas. Foi preciso buscar formas de
enfrentamento da crise, momento em que se intensificaram leituras e reflexões
coletivas, bem como ações intersetoriais que foram situadas no cerne dos
recursos a serem utilizados, como o apoio matricial entre CAPS e Unidades
Básicas de Saúde (UBS), objetivando a garantia do direito à saúde aos usuários
dos serviços.
O
artigo encontra-se assim dividido: breve contextualização da saúde pública e
saúde mental no contexto da pandemia. Em seguida, detemo-nos nos processos de
trabalho do assistente social no CAPS e, finalmente, apresentamos algumas
considerações finais. Destacamos que se trata de uma pesquisa qualitativa,
descritiva e retrospectiva, tendo como recurso metodológico a revisão de
literatura científica e o relato de experiência, objetivando o aprofundamento
teórico acerca de situações que emergem na prática profissional (Gil, 2008).
Dessa forma, em consonância às normativas da Resolução nº 510, de 7 de abril de
2016, do Conselho Nacional de Saúde, esta pesquisa dispensa a submissão a
Comitê de Ética e ao uso de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
(Brasil, 2016).
O
relato de experiência é embasado na evocação de memórias pessoais à luz dos
registros produzidos pelo referencial teórico. A revisão de literatura foi
alicerçada em artigos, periódicos e materiais técnicos sobre saúde mental,
trabalho do assistente social e pandemia de COVID-19, utilizando-se,
principalmente, de fichamentos e resumos que haviam sido elaborados desde o
início da pandemia, tanto por interesse pessoal na temática quanto em função da
demanda do trabalho. Os materiais utilizados são de fontes impressas, meios
eletrônicos e recursos audiovisuais, haja vista ter havido uma vasta produção
de cursos, vídeos, palestras e as chamadas lives
- transmissões ao vivo pela internet, que geralmente reuniam especialistas
em diversos assuntos pertinentes à emergência em saúde pública.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO SOBRE A PANDEMIA DE
COVID-19 E SAÚDE PÚBLICA BRASILEIRA
A
pandemia chegou ao Brasil e encontrou um país marcado por profundas
desigualdades, acentuadas pelo neoliberalismo que, ao longo das últimas três
décadas, corroborou para o enfraquecimento dos direitos sociais, com o desfinanciamento de políticas públicas da Seguridade Social[4].
Entretanto, ao passo em que se deparou com nossas iniquidades, encontrou também
o Sistema Único de Saúde (SUS), cuja robustez possibilitou reafirmar sua
centralidade, importância e protagonismo no atendimento aos principais agravos
de saúde da população. Dessa forma, conforme apontou Santos (2020), ocorreu um
fato inédito: pela primeira vez, em relação ao SUS, “[...] não [se] converte o
setor privado em seu substituto desejável” (Santos, 2020, p. 3). Isso
porque ficou demonstrado que o SUS foi responsável por ter evitado uma
catástrofe ainda maior no país. Anteriormente e ao contrário, o pensamento neoliberal
defendia políticas de austeridade e privatizações, utilizando um discurso de
ataque ao SUS corroborado pela ênfase em seus impasses e precarização.
Garantido
a partir da Constituição Federal de 1988, o direito à saúde impõe
[...] ao poder público
uma série de tarefas, tais como a promoção de políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, também estabelecer
acesso universal e igualitário às ações e prestações nessa área (Ferri;
Marques; Mello, 2018, p. 46).
A
atenção em saúde mental no Brasil como política pública de Estado começou a ser
delineada a partir da Reforma Psiquiátrica Antimanicomial Brasileira, processo
localizado ao final da década de 1970 e tendo início da década de 1980, no bojo
do cenário de redemocratização do Brasil e de fortalecimento dos movimentos
sociais, como o da Reforma Sanitária (Gomes, 2017). Segundo Coe e Duarte (2017,
p. 80), “[...] emerge um novo modelo assistencial [...]” a partir da “[...]
crítica ao modelo assistencial dominante (prática) e ao paradigma psiquiátrico
hegemônico (teoria), expresso na ordem médica-psiquiátrica” (Coe; Duarte, 2017, p. 80). Nessa perspectiva, dois marcos legais são estruturantes
da Política de Saúde Mental no Brasil: a Lei nº 10.216/2001[5] e a
Portaria nº 3.088/2011[6].
Atualmente,
existem inúmeros desafios que se colocam na contramão dos preceitos
democráticos reformistas. Entre os anos de 2016 a
2019, diversos documentos normativos causaram modificações, caracterizando
retrocessos nas políticas de saúde mental, álcool e outras drogas. Houve,
também, precarização da Política Nacional da Atenção Básica (PNAB). Os ataques
e as precarizações que sofrem a política de saúde mental estão na mesma esteira
do desmonte do SUS e suas frentes. Em contrapartida, juntos também resistem na
defesa de um projeto de sociedade democrático, justo e solidário, no horizonte
da ampliação da cidadania e defesa de direitos.
2.2 CAPS AD: ESTRATÉGIAS, INVENÇÕES E INTERVENÇÕES
As dificuldades impostas pela pandemia de
COVID-19 trouxeram à tona o tema da saúde mental e a importância de se atentar
para o seu cuidado. Conforme apontou a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) (2020a),
o isolamento social trouxe sentimentos de medo, solidão, tristeza, angústia,
irritabilidade, desesperança, sintomas de ansiedade e depressão decorrentes do
afastamento da rede socioafetiva, impossibilidade de praticar ritos culturais,
tendência ao abuso de álcool e outras drogas. Também se alertou sobre o
possível aumento nos casos de suicídio durante a pandemia.
Agravantes como desemprego, aumento da
violência doméstica, precárias condições sanitárias e de moradia, dificuldade
de acesso a informações de qualidade, diagnóstico e tratamento afetaram a
população, impactando sobremaneira os mais pobres, as mulheres, as populações
periféricas, os indígenas, os pretos e pardos, as pessoas com baixa renda e
baixa escolaridade (Dominguez, 2021).
Alguns grupos foram considerados em
situação de maior “vulnerabilidade”, demandando atenção redobrada, tais como
crianças e adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, pessoas com doenças
crônicas, população em situação de rua, indivíduos ou grupos em situação de
violações de direitos e profissionais de saúde. Conforme Lima (2020) e Inter-Agency Standing Committe (IASC) (2020), a presença de
alguns fatores foi determinante para situar profissionais de saúde dentre os mais “vulneráveis” da população,
tais como: intensificação do trabalho, stress, manejo de casos graves, abrupto
afastamento de familiares pelo medo de contaminação, estigmatização por serem
potenciais vetores de transmissão, sentimento de insegurança e impotência,
maior exposição a riscos, hipervigilância e estado
constante de alerta.
No que tange aos serviços de saúde mental,
partindo da vivência no CAPS AD, ocorreram modificações em função da
excepcionalidade que o momento exigia, com maior regulação da porta de entrada,
rearranjo das formas de atendimento, suspensão das atividades coletivas, busca
de fortalecimento de articulações intersetoriais. Assim, foram adotadas escalas
de revezamento de equipes, havendo possibilidade de deslocamento de
profissionais para outros equipamentos, caso fosse necessário.
A Portaria nº 4.167, de 2 de julho de
2020 (Juiz de Fora, 2020), da Secretaria de Saúde do município de Juiz de Fora,
estabeleceu regras de funcionamento dos serviços de Atenção Ambulatorial
Especializada, com ações organizadas e uniformes, revisão de fluxos e linhas de
cuidado, estratificação de risco a ser realizada pela Atenção Primária e
encaminhamento aos CAPS apenas usuários com alto risco de agudização[7],
mediante matriciamento (Juiz de Fora, 2020). O Ministério
da Saúde (Chiaverini et al., 2011) explicitou
que o apoio matricial é um cuidado colaborativo entre a saúde mental e a
atenção primária, envolvendo uma equipe de apoio matricial e uma equipe de
referência, numa proposta de construção conjunta em saúde de forma
interdisciplinar e horizontal.
O CAPS AD III é um dispositivo da RAPS,
componente do SUS, situado na esteira do projeto de Reforma Psiquiátrica
brasileira, implementado como substituto das instituições hospitalares e
manicomiais que predominaram durante muitos anos no Brasil, marcadamente
conhecidas pelas “[...] regulares violações de direitos humanos” (Vasconcelos,
2017, p. 30). Possui funcionamento 24 horas[8],
conforme preconiza a Portaria nº 130/2012, e dispõe de equipe técnica
multiprofissional composta com assistentes sociais, psicólogos, técnicos de
enfermagem, enfermeiros, médicos clínicos e psiquiatras, podendo haver também
em seu quadro outras categorias profissionais (Brasil, 2012).
O cenário completamente novo para todos,
especificamente para a nossa equipe de trabalho, impôs a necessidade de nos
debruçarmos sobre o assunto, tendo sido necessária a busca por informações e
orientações técnicas, considerando a atualização constante do cenário na
pandemia. Dessa forma, acessamos diversos materiais elaborados por órgãos de
saúde pública, como a Fiocruz, Organização Panamericana de Saúde (OPAS), além
de cartilhas e orientações de secretarias estaduais e municipais de saúde.
Também foram necessárias instruções sobre
o uso correto de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e organização do
espaço para atender aos usuários em condições de segurança. Realizamos busca
ativa[9]
por telefone daqueles casos considerados mais graves, atendendo também a
usuários que entravam em contato relatando dúvidas, angústias e verbalizando a
falta do contato mais próximo com os profissionais de referência e com o espaço
físico institucional, palco de “[...] trocas materiais, sociais e afetivas” (Heidrich; Berndt, 2018, p. 146)
Essas readequações vieram ao encontro de
uma ação, iniciada no CAPS AD III em 2019, de repensar seus processos de
trabalho e rotinas[10].
Foi analisado o arranjo do serviço antes e durante a pandemia, bem como
planejamento de ações futuras, a partir de discussões internas e fundamentadas
nos estudos que estavam sendo realizados. Destacaram-se leituras de textos
estratégicos, tais como os de Garcia e Costa (2014)[11]
e Heidrich e Berndt (2018)[12].
Outros textos referentes a Projeto Terapêutico Singular e Registro de Ações em
Saúde Mental também foram abordados. Algumas medidas que resultaram dessas
reflexões permaneceram para além da conjuntura de calamidade pública e
trouxeram avanços importantes, principalmente para qualificação das práticas de
acolhimento e matriciamento.
A equipe, através de uma escuta
qualificada, atenta e cuidadosa, identifica e avalia a presença de fatores de
risco e de proteção, relacionados ao adoecimento e aos principais determinantes
do processo saúde-doença, bem como o padrão de uso da substância psicoativa –
se é um uso recreativo ou abusivo -, identificando suas necessidades, crenças,
rede de apoio, contexto social e familiar. A complexidade que envolve esse
processo faz com que seja essencial a articulação aos outros equipamentos da
rede pela qual esse usuário transita, com ênfase nas UBS. De forma não menos
relevante, apontamos a interlocução com os Centros de Referência em Assistência
Social (CRAS) e equipamentos de atendimento à população em situação de rua,
como as instituições de acolhimento para adultos que buscaram, junto ao CAPS,
articulação para discussão de casos e atendimentos compartilhados de usuários
em comum.
Identificar uma crise em saúde mental e
as formas de realizar o seu acolhimento e manejo perpassa um conjunto de
relações, demandando intervenções singulares, exigindo constante reflexão
(Garcia; Costa, 2014). Assim, buscar compreender os eventos críticos em saúde
mental é essencial para definição do público a ser referenciado ao CAPS, com o
direcionamento da assistência mais adequada de acordo com a demanda
apresentada, buscando garantir a (re)inserção social
na medida em que se promove o acesso aos demais pontos da RAPS. Como apontaram Heidrich e Berndt
(2018, p. 135)
[...] considerando a reforma psiquiátrica como um processo
social complexo que envolve não só o tratamento mas,
sobretudo, uma mudança paradigmática, não se pode pensar que o cuidado e as
mudanças fiquem enCAPSulados,
sendo os Caps espécies de oásis no deserto. [...]
Ainda,
É impossível pensar na reabilitação psicossocial a partir
de um único ponto de cuidado, e por isto a compreensão das redes sociais é fundamental
(Heidrich;
Berndt, 2018, p. 147).
Com a suspensão de atividades coletivas
durante a pandemia, somada ao processo interno de capacitação e qualificação da
porta de entrada, a equipe do CAPS AD pôde se dedicar ao maior planejamento e
execução de ações de apoio matricial[13],
identificando as UBS que deveriam ser priorizadas a partir dos territórios que
possuíam o maior número de casos e os mais complexos[14].
Isso foi possível também a partir da revisão e análise de prontuários,
elaborando, a partir de cada projeto terapêutico singular (PTS), as condutas
necessárias para melhor atendimento. A análise mais criteriosa dos casos, método
essencial para qualificar o acolhimento, foi sendo aprimorada para além do
contexto pandêmico, levando-nos também a pensar e planejar o momento de retorno
dos usuários.
A realização do matriciamento
de forma mais sistemática possibilitou maior aproximação entre as equipes, o
que pode ser observado até hoje pelo aumento da frequência de contatos
telefônicos entre os profissionais das UBS e do CAPS AD, numa via de mão-dupla
em que tanto se solicitam quanto se ofertam suporte
e orientações.
A partir do exposto, identifica-se que o
Caps AD III, enquanto dispositivo estratégico de reabilitação psicossocial,
dedicou-se a estabelecer ações pensadas em curto, médio e longo prazo, apesar
das incertezas quanto ao futuro que o momento trazia.
2.3 PROCESSOS DE TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA
SAÚDE MENTAL EM CONTEXTO PANDÊMICO
Conforme
explicitado, ser profissional de saúde em uma pandemia significou equilibrar-se
entre o compromisso com o atendimento à população e a própria fragilidade à
qual estava submetido. Diante do desconhecido e com todas as atenções voltadas
para emergência em saúde, diversas orientações começaram a ser produzidas e
veiculadas para definir atitudes e respaldar intervenções profissionais,
conforme já referido no item 2.2.
O
Conselho Federal de Serviço Social e os Conselhos Regionais de Serviço Social
(CFESS/CRESS), instâncias normatizadoras, fiscalizadoras e defensoras do
exercício profissional, também se dedicaram a respaldar a categoria. Dado o
início da pandemia, o CFESS
(2020) prontamente lançou uma Nota com orientações
acerca do compromisso profissional com as condições éticas e técnicas de seu
trabalho, respeitando as recomendações sanitárias e protocolos adotados.
A
discussão sobre a relação entre Serviço Social e situações de calamidade[15] pública
ainda é bastante incipiente (Avila; Mattedi; Silva,
2017). Produções com essa temática somariam contribuições ao exercício
profissional, principalmente daqueles que não estão familiarizados com o
assunto, tais como assistentes sociais inseridos no campo da Defesa Civil, por
exemplo. Entretanto, o assistente social possui uma formação generalista que o
capacita para intervir em diversos espaços sócio-ocupacionais de forma crítica
(Matos, 2020), tanto na assistência aos usuários quanto na gestão, assessoria e
pesquisa em políticas sociais. Na área da saúde, como esclareceu o CFESS (2010), as ações passam “[...] pela compreensão dos aspectos sociais,
econômicos, culturais que interferem no processo saúde doença e a busca de
estratégias para o enfrentamento destas questões” (Conselho Federal de
Serviço Social, 2010, p. 14).
Da
mesma forma, ao enfrentar uma pandemia, o profissional deve buscar compreender
seus condicionantes e consequências, reconhecendo-a como uma das expressões da
questão social. A partir dessa análise, podemos compreender, conforme apontado
pelo CFESS (2022), que calamidades públicas não se limitam a incidentes
naturais, mas ocorrem também devido a desigualdades inerentes à sociabilidade
capitalista e à forma como estamos vivendo e produzindo. Em relação ao
coronavírus, acredita-se que sua disseminação foi resultado da comercialização
de animais
(Christensen, 2022)[16]. Fatores
como degradação ambiental, desmatamento, ameaça aos ecossistemas e destruição
de habitats naturais, bem como a atividade pecuária para produção em larga
escala e as condições em que são mantidos os animais (aves, suínos e bovinos)
são elementos que potencializam o surgimento de doenças zoonóticas, a exemplo
do ebola e gripe aviária (Paim, 2020).
Em
situações de calamidade pública, coloca-se para a categoria profissional do
Serviço Social a tarefa de contribuir para a construção de respostas
qualificadas, assentadas nas dimensões ético-política, teórico-metodológica e
técnico-operativa, buscando se distanciar do imediatismo e de ações pontuais e
fragmentadas (Conselho Federal de Serviço Social, 2022). Assim, o assistente
social deve atuar também na perspectiva de promover articulação coletiva e
participação social para construção conjunta de respostas e alternativas.
No
CAPS AD, o assistente social trabalha como técnico de referência, desempenhando
funções comuns a toda equipe e juntamente a ela, conforme exposto no item 2.2,
bem como as de competência específica em matéria de Serviço Social, referentes
às suas atribuições privativas e atividades inerentes ao livre exercício da
profissão (Brasil, 2012). Conforme Silva e Duarte (2018, p. 124), “[...]
a/o assistente social na política de saúde se insere em processos de trabalho
amplos dos quais faz parte, ao invés de se alinhar a um único e exclusivo
processo de trabalho, compondo equipes multiprofissionais ou
interdisciplinares”.
As
expressões da questão social que perpassam a vida dos usuários que acessam os
serviços de saúde mental, especialmente em decorrência de agravos por uso
abusivo de álcool e outras drogas, são marcadas por precariedade das condições
de vida, renda e trabalho, fragilização ou rompimento de vínculos familiares,
ausência de rede de apoio, não acesso a recursos e violações de direitos, estigmas,
discriminações e exclusões. Tais questões devem ser compreendidas de forma mais
abrangente, haja vista que coadunam diferentes aspectos sociais, culturais,
políticos e econômicos. Conforme
Fazenda (2017),
o Serviço Social tem
um papel fulcral a desempenhar na melhoria da saúde mental das pessoas e das
populações, já que a sua intervenção se situa nos vários níveis dos
determinantes sociais: o dos indivíduos, o das redes sociais e das condições
sociais, econômicas e culturais (Fazenda, 2017, p. 213).
Para
uma intervenção junto à população, foi preciso, primeiramente, conhecer os
aspectos que configuravam a desigualdade social e econômica e as novas
expressões que emergiram de seu agravamento relacionadas, direta ou
indiretamente, à pandemia, identificando, no público atendido, as demandas
apresentadas e as necessidades que poderiam ser sanadas e/ou minimamente
acolhidas.
Entretanto,
é importante destacar que a pandemia de COVID-19 aprofundou as desigualdades
estruturais próprias da lógica de produção e reprodução do sistema capitalista.
Segundo Raichelis e Arregui (2021),
[...] a pandemia do
novo coronavírus não é responsável pela emergência da crise contemporânea, mas
certamente exacerbou os traços mais perversos de uma crise social de grandes
proporções, tornando mais tangíveis e mais visíveis processos que já estavam em
desenvolvimento. A ideia central de nosso argumento é que a crise sanitária
desnudou a forma pela qual o capitalismo vinha respondendo às suas crises há
cerca de quatro décadas, desde os anos 1970, como estratégia do capital para
reverter a queda tendencial das taxas de lucro, em um movimento estrutural de
superprodução e subconsumo (Raichelis; Arregui, 2021,
p. 139).
Mas,
diante da emergência do estado de calamidade pública, medidas tiveram que ser
tomadas de forma imediata e também no médio e longo
prazo. Dentre as demandas que precisaram de uma resposta imediata, estavam o
esclarecimento de dúvidas diversas apresentadas pela população atendida, sendo
necessário orientá-la acerca
de alterações de fluxos da rede, a realização de um mapeamento constante dos
equipamentos disponíveis para mobilizar recursos e identificar suporte de
saúde, de Assistência Social e apoio psicológico. Como apontou Matos (2020),
foi preciso também socializar informações previdenciárias e assistenciais,
direito de usuários e familiares, formas de proteção do vírus e medidas a serem
adotadas em caso de contágio. Para além de demandas assistenciais e ações em
equipe, o Serviço Social também possui um importante papel socioeducativo,
conforme os Parâmetros para Atuação dos Assistentes Sociais na Saúde:
As ações a serem
desenvolvidas pelos assistentes sociais devem transpor o caráter emergencial e
burocrático, bem como ter uma direção socioeducativa por meio da reflexão com
relação às condições sócio-históricas a que são submetidos os usuários e
mobilização para a participação nas lutas em defesa da garantia do direito à
Saúde (Conselho Federal de Serviço Social, 2010, p. 23).
Pautada
na abordagem da Redução de Danos[17] e na
defesa dos direitos humanos, o atendimento aos usuários que fazem uso de
substâncias psicoativas requer combater as formas de preconceito, deve
considerar as suas singularidades, escolhas e autonomia, não confundindo com
individualização das questões, mas contextualizando-as criticamente para não
incorrer na culpabilização e moralização dos sujeitos. Assim, também, não
culpabilizar o indivíduo não significa isentá-lo de sua corresponsabilidade na
construção de caminhos, estratégias e recursos que incidam na melhoria de suas
condições de vida.
O
profissional deve ir além da observação de limitações ou agravantes,
identificando também as potencialidades e as possibilidades, contribuindo
“[...] na operação de projetos de vida [...] nos processos de pertencimento e
de autonomia [...] articulando mecanismos de suportes sociais através do acesso
a direitos sociais; fortalecendo a participação social e política [...]” (Dias,
2018, p.5), lutando contra a discriminação e o preconceito e ressignificando o
lugar social de todos os cidadãos.
3 CONCLUSÃO
Os desafios impostos pela disseminação da
COVID-19 fizeram com que a equipe multiprofissional do CAPS AD III, além de
atender às demandas emergenciais, pudesse reorientar seus processos e rotinas de
trabalho, aperfeiçoando um modo de se fazer
que prevaleceu. Destacamos que, ainda que a equipe estivesse revendo os
processos e a rotina de trabalho desde 2019, a alteração do cotidiano profissional, ocorrida pelas exigências
próprias do novo normal em tempos de pandemia, mostrou a
necessidade de capacitação e reflexão crítica permanentes. Nesse contexto de
readequação, foi possível e necessário destinar tempo e recursos para um maior
aprofundamento teórico sobre a crise, articulado às experiências vivenciadas no
serviço, o que contribuiu para a qualificação do atendimento e da articulação
em rede, sobretudo via matriciamento, estreitando
laços entre CAPS e Atenção Primária, ainda que seja necessário que essa
articulação constantemente continue sendo aprimorada.
Um dos grandes desafios que enfrentamos
naquele período, que continua como desafio atual, é justamente o trabalho
articulado e colaborativo em rede entre as diferentes instâncias e instituições
que atendem à população com a qual trabalhamos.
Compreendendo a maior complexidade que
envolve a atenção em saúde mental, a pandemia significou uma ameaça à
continuidade da atenção, rompendo com as linhas de cuidado. Evidenciou-se como
o apoio matricial foi fundamental e inevitável frente aos desafios impostos pela
situação de calamidade pública. Ressalta-se a importância de manter
continuamente a interlocução via matriciamento na
perspectiva de que os usuários possam “[...] exercer sua cidadania e atingir
seu potencial de autonomia no território em que vivem” (Silva; Duarte, 2018, p.
120). Para isso, faz-se necessário apropriar-se mais dessa estratégia, buscando
sempre formas de qualificá-la e fortalecê-la.
Reafirmamos o assistente social como um
dos profissionais que muito contribui para a elaboração coletiva de respostas
ao enfrentamento dos principais agravos sociais e de saúde, haja vista a
formação crítica para análise e intervenção nas diferentes expressões da
questão social, além do compromisso ético expresso com a classe trabalhadora e
a defesa da liberdade e dos direitos humanos, indo ao encontro do que
preconizam as Reformas Sanitária e Psiquiátrica.
A composição de equipes
multiprofissionais e a troca de saberes na produção do cuidado em saúde
possibilitam a intervenção em múltiplos determinantes do processo saúde-doença,
o que contribui para a promoção do acesso aos mais diversos direitos que
incidem diretamente na qualidade de vida da população. Finalmente, sinalizamos
que, se não quisermos enfrentar novas pandemias, é preciso questionar não como
se expressam essas crises, mas quais são suas causalidades, contribuindo para a
construção coletiva de formas de sociabilidade na direção da efetivação dos
direitos humanos e da vida de todos, no horizonte do projeto profissional
crítico que vimos construindo há mais de 40 anos.
4 REFERÊNCIAS
AVILA, M. R. R.;
MATTEDI, M. A.; SILVA, M. S. DA. Serviço Social e desastres: campo para o
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Giselle Mara Cardoso da COSTA
Trabalhou na redação do artigo e revisão crítica.
Graduada
em Serviço Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) (2014).
Especialista em Serviço Social na modalidade Residência, no Hospital
Universitário da UFJF. Mestra em Serviço Social pela UFJF. Atuou em projeto
cultural de incentivo à leitura - LeiturAMA - como vice-coordenadora e contadora de histórias no período de
janeiro de 2014 a fevereiro de 2018, pela Ação em Movimentos Artísticos (AMA), em
Santos Dumont (MG). Atualmente é Assistente Social do Centro de Atenção
Psicossocial Álcool e outras Drogas - Caps AD do município de Juiz de Fora (MG).
Carina Berta MOLJO
Trabalhou na concepção e delineamento.
Graduada
em Serviço Social, Universidade Nacional de Rosário, Argentina (1992). Mestra
em Serviço Social (1998). Doutora em Serviço Social (2003). Pós-Doutora
em Serviço Social (2006) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pós-Doutorado
pela UFRJ (2018). Professora titular da Universidade Federal de Juiz de Fora
(UFJF), atua na Graduação e na Pós-graduação em Serviço Social. Coordenou o Programa
de Pós-graduação em Serviço Social da UFJF de 2012-2016. Desde maio de 2021 é
vice coordenadora do PPGSS/UFJF. Desde 2010 é Pesquisadora do CNPq PQ 2. Foi
membro da coordenação Nacional do GTP da ABEPSS Serviço Social, Fundamentos,
Trabalho e Formação Profissional por duas gestões (2014-2016 e 2017- 2018).
Atualmente é membro da comissão ampliada do GTP. Foi membro da Comissão
editorial da Revista Libertas de 2006 a 2009. Desde 2019, se desempenha como
editora Chefe da Revista Libertas. FSS/PPGSS/UFJF. Membro do Conselho editorial
do Selo Editorial do PPGSS/UFJF. Membro do Conselho Científico Internacional de
Pós-doutorado da Universidade Nacional de La Plata, Facultad
de Trabajo Social Argentina.
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* Assistente
Social. Mestra em Serviço Social. Técnica de Nível Superior – Assistente Social
no Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas – CAPS AD da
Prefeitura de Juiz de Fora. (PJF, Juiz de Fora, Brasil). Rua
Gilberto de Alencar, nº 26, Centro, Juiz de Fora, (MG), CEP.: 36015-470. E-mail: gis.cardoso23@gmail.com
** Assistente
Social. Doutora em Serviço Social. Professora Titular da Universidade Federal
de Juiz de Fora, Faculdade de Serviço Social, graduação e pós-graduação. (UFJF,
Juiz de Fora, Brasil). Rua José Lourenço Kelmer, São Pedro,
Juiz de Fora (MG), CEP.: 36036-900. Pesquisadora
do CNPq PQ 2. E-mail: carinamoljo@uol.com.br.
© A(s)
Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os
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e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial. O licenciante não pode revogar estes direitos
desde que você respeite os termos da licença.
[1] Conforme a Portaria nº 130,
de 12 de janeiro de 2012, os CAPS AD III são equipamentos de caráter
comunitário e aberto, previstos para atendimento integral a pessoas com
necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. Indicados
para municípios com população acima de 200 mil habitantes, devem funcionar de
forma ininterrupta, inclusive aos finais de semana e feriados. No município de
Juiz de Fora, o CAPS AD III é referência para uma população estimada em quase
600 mil habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2020),
pois é o único nessa modalidade. As atribuições à equipe de um CAPS AD III
sinalizam para a complexidade desse serviço que é essencial para cuidado e
proteção de usuários e familiares em situação de crise e maior gravidade.
[2] Lei nº 13.979, de 6 de
fevereiro de 2020, regulamentada pelo Decreto nº 10.282, de 20 de março de
2020, revogado em maio de 2022, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento
da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do
coronavírus responsável pelo surto de 2019 (Brasil, 2020a; 2020b).
[3] Dentre os setores
interrompidos pela pandemia, estão o comércio varejista, transporte aéreo,
atividades artísticas, festas e eventos, cinemas, restaurantes, academias, escolas,
hotéis, universidades etc.
[4] Pensado no esteio do processo de redemocratização do Brasil e
inaugurado pela Lei nº 8080, de 1990, o SUS, desde
seu nascimento, enfrentou inúmeros desafios impostos pelo receituário
neoliberalismo, como o recorrente discurso veiculado pela mídia desqualificando
as políticas públicas de Seguridade Social, bem como seu desfinanciamento
de forma mais ou menos incipiente, a exemplo a Desvinculação das Receitas da
União (DRU) (Behring, 2003). Ataques perversos continuam e o exemplo mais
recentemente é a Emenda Constitucional 95/2016, em que ficou estabelecido
o congelamento de gastos com saúde e educação
pelos próximos 20 anos (Teixeira; Pinho, 2018).
[5] Institui a Reforma
Psiquiátrica, redirecionando o modelo assistencial em saúde mental ao
preconizar a desinstitucionalização e a substituição aos (des)serviços manicomiais, para
equipamentos de base comunitária no horizonte do respeito aos direitos humanos
de usuários e familiares (Brasil, 2001).
[6] Institui a Rede de Atenção
Psicossocial (RAPS) no âmbito do SUS, para promover a articulação de diversos
pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental
e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (Brasil,
2011).
[7] De acordo com a Fiocruz (2020b), os casos prioritários para atendimento
na saúde mental na pandemia abarcavam: usuários com transtornos mentais graves;
usuários que apresentavam ideação ou tentativa de autoextermínio, crises de
abstinência de substâncias psicoativas, síndrome de dependência, quadros
psicóticos, situações agudas com risco ao usuário e a terceiros.
[8] Embora o CAPS AD III funcione de porta aberta,
não necessitando de encaminhamento e agendamento prévio para acessar o serviço,
muitos usuários chegam através das UBS, consideradas
porta de entrada do sistema de saúde, constituindo ponto fundamental da RAPS
para reabilitação psicossocial.
[9] Geralmente, os usuários
comparecem ao atendimento através de demanda espontânea ou encaminhamento de
outro setor. A busca ativa pode ser entendida como um movimento pró-ativo realizado pelo profissional em direção ao
usuário, para estabelecer, manter ou reestabelecer o vínculo e o cuidado, seja
através de visita domiciliar ou contato por telefone com os usuários, seus
familiares ou a rede.
[10]Destacamos a publicação de Raichelis e Arregui (2021) na qual analisam a nova
morfologia do trabalho, mostrando como as transformações no mundo do
trabalho impactam diretamente no trabalho do assistente social, entendendo-o
como trabalhador assalariado inserido na divisão sociotécnica do trabalho,
conforme já indicavam Iamamoto e Carvalho, em 1982. Em outro artigo, Raichelis (2018)
faz uma importante análise sobre o debate do trabalho e as diferentes
interpretações no campo marxista.
[11] A crise no cotidiano dos serviços de saúde mental: o
desafio de experimentar desvios e favorecer a potência inventiva.
[12] O processo de ‘alta’ sob a ótica do cuidado
psicossocial: análise a partir da experiência do CAPS Escola, em Pelotas (RS).
[13] Conforme já explicitamos, o
município de Juiz de Fora possui apenas um CAPS AD III. Dessa forma, algumas
ações de matriciamento não ocorriam de forma
sistemática e com agendas pré-estabelecidas, em virtude da demanda, com extensa
quantidade de UBS que precisariam ser acessadas em cada território, o que fez
com que não houvesse uma cultura de matriciamento entre
as UBS e o CAPS AD, diferentemente do que ocorre com outros Caps.
[14] O matriciamento
foi realizado via contato telefônico devido ao momento que exigia isolamento
social. Entretanto, o Ministério da Saúde (Brasil, 2011, p. 39) já havia
apontado que o uso de tecnologias de comunicação, como o telefone, poderia
otimizar o trabalho entre as equipes de UBS e CAPS, pela sua acessibilidade e
custo reduzido, sendo possível a partir do vínculo e da disponibilidade dos
profissionais.
[15] Conforme apontou o CFESS
(2022), “[...] nas situações de calamidades, é certo que as mais diversas
expressões da “questão social” já presentes nos territórios se ampliam e se
agudizam” (Conselho
Federal de Serviço Social, 2022, sem paginação). O Código de Ética do
Assistente Social traz em seu artigo 3º - alínea d - o dever do assistente
social de “[...] participar de programas de socorro à população em situação de
calamidade pública, no atendimento e defesa de seus interesses e necessidades”
(Conselho Federal de Serviço Social, [2012], p. 27) Tendo como objeto de seu trabalho
a questão social e a partir de um olhar crítico sobre
a realidade no horizonte da defesa dos direitos da classe trabalhadora, o
assistente social é um profissional capacitado técnica e eticamente para a construção
de respostas, intervenções e planejamento de ações juntamente à equipe
multiprofissional.
[16] De acordo com Christensen (2022), estudos publicados na revista Science concluíram que muito provavelmente
o mercado de frutos do mar, localizado na cidade de Wuhan, na China, foi o
epicentro do coronavírus, a partir do contato entre o homem e animais
infectados.
[17] A redução de danos, que “[...] engloba um conjunto de estratégias
dirigidas a pessoas que não conseguem ou não querem parar de consumir drogas
[...]” (Silveira, 2008, p. 8), significa “[...] ampliação nas possibilidades de
cuidado e de novos projetos de vida [...]” (Brasil, 2015, p. 43), buscando minimizar
problemas e agravos decorrentes do uso de substâncias psicoativas e reforçando
fatores de proteção (Brasil, 2015).