Geoeconomia política do
conhecimento e os desafios para a
internacionalização da pós-graduação
The political geoeconomics
of knowledge and the challenges facing the
internationalisation of graduate
studies
Roberto LEHER*
https://orcid.org/0000-0002-5063-8753
Maria Rosimary Soares dos SANTOS**
https://orcid.org/0000-0001-5886-8003
Introdução
E |
m espaços
destinados ao desenvolvimento do conhecimento não é possível xenofobia e
nacionalismos chauvinistas. Uma das primeiras experiências históricas de irradiação
geoeconômica e política do conhecimento, o complexo da biblioteca e do museu de
Alexandria (Século III a.C.), não teria sido possível sem reunir as mentes mais
brilhantes da época a despeito de nacionalidades; tampouco pode ser
desvinculada de seu lugar econômico e político: naquele contexto, Alexandria
era o celeiro de grande parte do mundo, força econômica advinda da expansão
territorial realizada no período de Alexandre. Hodiernamente, a geoeconomia
política do conhecimento pode ser assim sumarizada: a influência cultural, científica
e tecnológica está relacionada à posição do país no sistema mundial de poder do
capital-imperialismo (Fontes, 2010).
O mais
ambicioso e grandioso intento cultural até então forjado, prenuncia práticas
que conformaram a concepção moderna da universidade. O museu de Alexandria “previa
atrair os melhores cientistas e escritores da época para aquele lugar ermo na
periferia do nada”. Nas imaginativas palavras de Irene Vallejo (2022, p. 45),
“A biblioteca se abria para a vastidão do mundo exterior. Incluía as obras mais
importantes de outras línguas, traduzidas para o grego”. Para isso, foi preciso
reunir uma comunidade de sábios, “De cada povo se recrutavam sábios que, além
de dominar a própria língua, conheciam perfeitamente o grego” (Vallejo, 2022,
p. 41). Conhecimentos de outros povos foram organizados, sistematizados,
abrangendo obras de tempos diferentes, textos cuneiformes foram traduzidos
vertendo para o grego as tradições babilônias, assim como foram elaborados
tratados sobre a Índia.
Encarregado
da organização da biblioteca, Demétrio de Faleros
criou a base do moderno sistema de classificação de livros a partir das
contribuições de Aristóteles, dedicando sua vida ao “[...] esforço para unir
pedaços dispersos do universo e formar um conjunto dotado de sentido. Uma
arquitetura harmoniosa frente ao caos [...]. O refúgio onde protegemos tudo
aquilo que tememos esquecer. A memória do mundo” (Vallejo, 2022, p. 49). A
biblioteca foi uma forma de exercício de hegemonia a partir da impressionante e
violenta campanha militar alexandrina, possibilitando a ampliação da zona de
influência do grego para novas regiões da Europa, África e Asia.
Nada disso
é estranho às noções de globalização, de imperialismo e de soft power. Com as campanhas militares, Alexandria despontou
como um lugar simbólico de poder, tanto por sua determinante influência
econômica, como pela magnitude de sua política cultural. O museu de Alexandria
liderado por Ptolomeu “[...] tornou-se uma das instituições mais ambiciosas do
helenismo, uma versão primitiva dos nossos centros de pesquisa, universidades e
laboratórios de ideias” (Vallejo, 2022, p. 56).
Isso não
elide a importância das formas de engajamento institucional de uma dada universidade
nem, tampouco, os esforços nacionais em ciência e tecnologia. Entretanto, a
eficácia das mesmas depende do enfrentamento aos determinantes da modernização
reflexa (Ribeiro, 1969) e da heteronomia cultural (Fernandes, 2008) que
parametrizam as chamadas universidades de classe mundial. As assimetrias
mundiais são reproduzidas por rankings, métricas e perfis que
realimentam a heteronomia. Como no conto de Perrault,
Cinderela, somente um pé de tamanho compatível pode calçar o sapatinho de
cristal. Os indicadores privilegiados não se coadunam com as características e
desafios das universidades latino-americanas.
1
Geoeconomia política do conhecimento
Vinte e
cinco Séculos se passaram desde o apogeu de Alexandria. Desde então, o centro
de gravidade do poder mundial mudou de lugar várias vezes. As universidades
europeias foram constituídas guardando semelhanças com o grandioso projeto
alexandrino, a exemplo do esforço de reunir em um uma única comunidade pessoas
devotadas ao conhecimento, abertas, de diferentes modos, às interações com
outros povos e instituições, tanto pela mobilidade de cientistas, professores e
estudantes, como pela constituição de bibliotecas abertas ao mundo e pela
tradução de obras de referência.
As
universidades estão entre as raras instituições sociais que sobreviveram há
mais de mil anos de história. Encontram sua força na produção de conhecimento e
nos processos de formação muitas vezes em conflito com os poderes
estabelecidos. Entretanto, desde os primórdios da revolução industrial, as
instituições situadas nos países com maior peso manufatureiro e com maior acumulação
primitiva de capital estabeleceram vínculos estreitos com a classe burguesa
emergente. A partir da virada dos Séculos XVIII para o XIX, estiveram cada vez
mais imbricadas com as contingências e especificidades das revoluções
burguesas. Não é possível ignorar o significado da criação das grandes Écoles e o movimento de reforma napoleônica das
universidades francesas no ingresso da então agrária França na dinâmica da
revolução industrial. O vigor das grandes universidades estadunidenses não está
desvinculado do deslocamento do poder mundial para este país. Igualmente, o
recente salto científico e tecnológico chinês é indissociável da conformação
geoeconômica e política da China no sistema mundial de poder.
O exame do
peso específico dos países e universidades que lideram a geoeconomia política
do conhecimento corrobora a tese de que a influência cultural, científica e
tecnológica possui fortes nexos com as particularidades de suas revoluções burguesas
e, no caso da URSS e China, de suas revoluções socialistas. A concepção de
autonomia universitária das instituições napoleônicas possui características
distintas da concebida por Humboldt na universidade de Berlim; as relativamente
tardias universidades de pesquisa estadunidenses embora influenciadas por
Berlim, logo assumiram feições distintas em virtude da crescente influência
empresarial e de investimentos militares.
No último Século, os Estados Unidos da América (EUA) receberam importantíssimos
quadros que tiveram de sair da Alemanha. Até 1932,
a Alemanha havia ganho 33 dos 100 prêmios Nobel de ciência. Entre os que
tiveram de sair do país, destacam-se os físicos Albert Einstein, Erwin Schrödinger e Max
Born, o bioquímico Hans Krebs. Mas existe um outro lado cinzento:
milhares de outros cientistas e técnicos que tiveram papel relevante no uso da
ciência no nazismo, especialmente na indústria militar e até mesmo em experimentos
humanos, também foram recebidos pelos EUA no final da guerra[1].
A geoeconomia
política do conhecimento configura verdadeiros centros de atração, a partir dos
quais o grosso da produção científica e tecnológica vem gravitando. Os EUA são
a maior potência científica e tecnológica, o maior centro de atração de ‘cérebros’
e de captação de recursos por meio de taxas estudantis; a China é a principal
potência emergente, assumiu a liderança em áreas tecnológicas sensíveis e
implementou agressiva política de formação de novos cientistas nos principais
centros e laboratórios do mundo para alcançar níveis ainda maiores de soberania
tecnológica; a Alemanha, Grã-Bretanha e França seguem como potências científicas
e tecnológicas em diversas áreas industriais estratégicas. Embora
policêntricas, as novas Alexandrias estão em acelerada
reacomodação. E a América Latina e a África não estão no centro dinâmico desse
movimento.
1.1 EUA,
ciência e tecnologia e poder mundial
Um dos principais
indicadores do poder de um país nos processos de conhecimento científico,
tecnológico e de inovação é a quantidade de patentes relevantes. A
regulamentação mais abrangente e restritiva da propriedade intelectual foi o Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS)
estabelecido em 1994 pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Justamente quando
a ideologia da globalização e, nela, da sociedade do conhecimento estavam em
voga, foi firmado um acordo extremamente favorável às corporações e aos países
detentores de patentes estratégicas que restringiu o acesso de conhecimentos
imprescindíveis para a humanidade por longos períodos, incluindo até mesmo
domínios considerados públicos como o código genético.
Os EUA
estão na liderança mundial das patentes IP5 (Intellectual Property) que reúnem as patentes registradas nos
Escritórios Europeu, do Japão, da Coréia, da República Popular da China e dos
Estados Unidos. O país segue ampliando seu domínio, passando de 220.245 (2015)
para 269.418 (2019), com destaque para big data, cyber segurança, ciências
biológicas, saúde digital, inovação energética. A mesma tendência é verificada
nas publicações científicas. Em 2011: 476,1 mil; 2019: 538,3 mil, especialmente
em áreas como energia, inteligência artificial e robótica, nanotecnologia,
materiais, eletrônica e ótica, sendo que 40% das publicações contaram com coautoria
estrangeira, taxa acima da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) (34%). Nos EUA, estão em atividade 1.43 milhão de
pesquisadores. Considerando os novos doutores (2017), 64% pertencem as áreas
das ciências e engenharias e 34% são estrangeiros (Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021).
Após a
crise de 2009 e 2012, os gastos em Ciência e Tecnologia (C&T) e em Pesquisa
e Desenvolvimento (P&D) aumentaram de modo relevante: de 2,68% do Produto
Interno Bruto (PIB) em 2012 para 3.08% em 2019, com destaque para indústria
farmacêutica, informática, eletrônica e ótica, aeroespacial e serviços
industriais. Os dispêndios em ciência e tecnologia nos EUA cresceram (em
paridade de poder de compra) de US$ 450 bilhões em 2010 para mais de US$ 600
bilhões em 2019. É preciso realçar uma particularidade que distingue o país.
Considerando os gastos em P&D, a maior parte dos investimentos é manejada
pelo setor produtivo (70%), 22% pelo governo Federal e apenas 3.6% nas
universidades (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021). Em que pese o elevado percentual de exportações de produtos com
alto grau de tecnologia, este perdeu espaço para a China, caindo de 29% em 2008
para 19,1% em 2019. No que se refere aos gastos Federais (2018), predominam
recursos do Departamento de Defesa (US$ 52 bilhões) e de Saúde (US$ 36,9
bilhões). A National Science Foudation (NSF)
responsável pelos financiamentos de projetos não diretamente militares ou
relacionados ao setor produtivo, o montante foi significativamente menor, US$
6,3 bilhões (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura, 2021).
Os indicadores
confirmam a proeminência estadunidense na ciência mundial, mas não como ciência
aberta. A magnitude dos investimentos sob controle do setor produtivo e a
enorme escala dos gastos militares não se coadunam com a cooperação
internacional horizontal e solidária. Os
acordos e convênios internacionais com este país se referem ao sistema
universitário financiado pelo NSF no qual a ordem de grandeza de recursos é de
menor vulto e em que persistem muitas restrições à livre circulação do
conhecimento.
1.2 China: mudanças no poder global
A China
alterou seu lugar no sistema mundial de poder após alcançar imensa participação
na economia mundial (2o PIB mundial), sobretudo com produtos de
maior valor agregado. Recentemente, o país assumiu espaços de liderança universitária.
Criou um ranking influente em todo mundo (Ranking da Universidade Jiao Tong, de Xangai) e impulsionou a coalizão das
Universidades do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Suas
universidades despontam nos estudos internacionais sobre tecnologias
estratégicas, como inteligência artificial, robótica, biotecnologia, energia,
nanotecnologia, materiais, optoeletrônica. Essas conquistas não seriam
possíveis sem a força econômica, populacional, tecnológica, militar do
país. A prioridade conferida ao
desenvolvimento C&T e de P&D em novas matrizes energéticas, mudanças
climáticas e sua ênfase no multilateralismo projeta as universidades chinesas
no mundo.
O país
ampliou seus gastos em pesquisa de US$ 135 bilhões em 2008 para mais de US$ 440
bilhões em 2018 (Organisation for Economic Co-Operation and Development, 2021). Ao lado dos EUA, lidera a produção
científica mundial, crescendo 150% em apenas seis anos (644,6 mil em 2019,
24,5% do total de publicações) (Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura, 2021). Os dois países são responsáveis
atualmente por 45,6% das publicações científicas mundiais.
A
distribuição mundial de patentes IP5 em 2019 é ilustrativa: a China foi
responsável por 29,3%, os EUA, por 20%, o Japão por 18,4%, a União Europeia por
14.4%, a Coréia por 10,4% e os demais países do G-20, entre os quais o Brasil,
por ínfimos 0,4%. (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021). A China conta com 1.87 milhão de pesquisadores, assumindo lugar
de novo polo de poder científico mundial, por sua formação de quadros em âmbito
planetário, patentes e complexificação das cadeias produtivas. A força de
internacionalização da C&T deste país está solidamente assentada em bases
nacionais, diferente de países que seguem passivamente a modernização reflexa.
1.3 Brasil:
fazendo a ciência à contrapelo
No período
de substituição das importações e, especialmente, de provimento da infraestrutura
necessária para o capitalismo monopolista na ditadura empresarial-militar (1964-1985),
o país ampliou de modo substantivo seu desenvolvimento tecnológico em domínios
como indústria aeroespacial, agronomia, energia, telecomunicações, siderurgia,
engenharia civil pesada, no segmento de autopeças da indústria automobilística,
segmentos que alicerçaram a vertiginosa expansão da pós-graduação nas
universidades públicas. No período entre 1950 e 1980 promoveu o deslocamento de
quadros para universidades dos EUA e da Europa para formar novos doutores em
áreas prioritárias para a economia e para a geoeconomia política do conhecimento
e que, posteriormente, vieram a liderar os programas de pós-graduação e os
departamentos de P&D das empresas estatais. No início dos anos 1960 o país
possuía pouco menos de 50 programas de mestrado e doutorado, em 1985 o total já
ultrapassava 1100 programas. Neste período também a industrialização ganhou
corpo em áreas estratégicas, conferindo ao país a liderança industrial da
América Latina.
A fragilidade
dos fundamentos da autonomia científica e tecnológica do país no capitalismo
dependente ficou evidente na crise da dívida de 1982. Os Programas de Ajuste
Estrutural do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial (BM)
abriram as vias para o sistema de acumulação neoliberal. Desde então, está em
curso um processo de descomplexificação das cadeias produtivas e de ampliação
do setor de commodities. Com efeito, em 2016, a taxa de produtos de alta
tecnologia nas exportações de produtos manufaturados foi de 14,3%, em 2018 foi
de 13% (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021). Atualmente, o grosso das exportações do país é de produtos de
baixo ou modesto conteúdo tecnológico e isso se reflete nos gastos em pesquisa.
A tendência
de queda nos investimentos em P&D das indústrias de transformação repercute
na queda do número de empresas de serviços que possuem nexo com P&D: 1.682
firmas em 2014 para 1.394 firmas em 2017. Houve forte redução do número de
pesquisadores e dirigentes técnicos da área envolvidos na P&D industrial:
105,4 mil em 2015 para 89.7 mil em 2017. Isso explica o baixo índice de
patentes IP5, estagnadas entre 2015 (1211) e 2018 (1276). O número de pesquisadores acadêmicos segue
crescendo, mas em patamar baixo considerando a população: em 2015: 61 mil; em
2017, 66 mil (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021).
Nos últimos
cinco anos, o país vem conhecendo um encolhimento sistêmico das áreas de
C&T e de P&D. O Brasil reduziu seus dispêndios no setor,
passando de US$ 30 bilhões em 2013 para um patamar inferior a US$ 25 bilhões em
2018. Os gastos federais despencaram de US$ 4,23 bilhões em 2015 para US$ 3,17
bi em 2018. Somando todos os dispêndios, empresas, educação superior e governo
a queda foi de US$ 41,3 bi em 2015 para US$ 34.9 em 2017 (Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2021),
ano em que a mãe de todas as medidas de austeridade começou a ter
vigência (Emenda Constitucional - EC 95/2016). A guerra cultural do governo
Bolsonaro agravou o problema. O orçamento do principal suporte para a
infraestrutura da pesquisa, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Ciência e da
Tecnologia (FNDCT) não reembolsável encolheu de US$ 600 milhões em 2014 para
irrisórios US$ 115 milhões em 2021.
A despeito
das agruras orçamentárias e da aspereza da guerra cultural praticada pelo
governo Bolsonaro (Leher, 2021), a produção científica na forma de artigos
segue crescendo: entre 2011 e 2019, o total passou de 49,3 mil para 74,3 mil.
As publicações contam com relevante coautoria estrangeira (34%), especialmente
EUA, Reino Unido, Alemanha, Espanha e França, embora, em geral, os brasileiros
figurem como quarto ou quinto colaborador (Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura, 2021).
Nas duas
últimas décadas, os governos progressistas latino-americanos buscaram ampliar
as estratégias de integração e cooperação tecnológicas. Existem associações de
universidades latino-americanas como a Associação de Universidades do Grupo de
Montevidéu, assim como organismos sub-regionais como o Instituto Internacional da Unesco para a Educação Superior na América
Latina e Caribe, a União das Nações Sul-Americanas, o Mercado Comum do
Sul que, entretanto, dependem da correlação de forças dos governos da região.
Muitas instituições participam do movimento internacional em prol da ciência
aberta, (Declaração de Budapeste[2])
que pode servir de emolumento para o fortalecimento de políticas
horizontais de cooperação internacional. Ademais, no interior do próprio campo
acadêmico está em curso relevante interação entre grupos de pesquisa e unidades
acadêmicas, possibilitando, inclusive, cotutelas e dupla diplomação.
Entretanto, no que tange à aplicação do conhecimento na economia e no
enfrentamento dos grandes problemas nacionais, a cooperação ainda é incipiente
e, como visto a seguir, as diretrizes e métricas de internacionalização
reproduzem as assimetrias da geoeconomia política do conhecimento.
2 Reprodução
das assimetrias: rankings
Os rankings
de universidades instauram uma hierarquia na esfera de influência e prestígio
mundial das instituições. As que estão no topo atraem mais estudantes de alto
poder aquisitivo e de excelente desempenho, professores de prestígio e recursos
em agências públicas e privadas nacionais e internacionais. É por meio das
agências de rankings que a internacionalização de uma instituição
universitária é conhecida. Entre as mais destacadas, Times Higher
Education (THE), Quacquarelli Symonds World
University Rankings (QS), Academic Ranking of World Universities (ARWU) da Shanghai Jiao
Tong University’s Institute of Higher Education. Nestes, nenhuma instituição brasileira está entre as 100 melhores do
mundo: os EUA emplacam 27 no QS e 38 no THE; o Reino Unido possui 17 no QS e 11
no THE, a China 6 em ambos os rankings. Apenas a Universidade de São Paulo
(USP) está entre as 200 no QS (115), mas não no THE. A despeito da excelência e
da relevância das universidades públicas brasileiras, estas não se encaixam nos
critérios de modo virtuoso; ainda assim, perseguem febrilmente um melhor lugar
nos pelotões de frente dos rankings. Com isso, a pertinência com os
problemas nacionais, a história das instituições, as flutuações políticas e econômicas
nacionais são desvalorizadas. Um dos corolários da metodologia dos rankings
é a incorporação da crença de que o lugar alcançado por cada uma das
instituições depende exclusivamente do esforço intramuro, abstraindo a
existência de determinantes mais amplos.
Frequentemente, os debates ignoram os critérios utilizados pelos
rankings. Um exemplo é ilustrativo: examinando a metodologia[3] do Ranking de Xangai (ARWU) é possível
constatar que este considera todas as universidades que possuem Prêmios
Nobel, Medalhas Fields, Pesquisadores Altamente Citados ou artigos publicados
na Nature ou Science. No total, mais de 2.000 universidades são
classificadas e as 1.000 melhores são publicadas. A posição da universidade
considera o peso de estudantes e docentes que receberam os prêmios Nobel e
Fields (30% do conceito final). Isso significa que países que não possuem ganhadores
recentes estão disputando apenas 70% dos pontos. A publicação em duas revistas,
Nature e Science compõem outros 20% da avaliação. A metade da
avaliação é constituída de prêmios Nobel, Fields e citações de artigos em duas
revistas. Como a qualidade é comparativa, para cada indicador a instituição com
índice mais alto recebe uma pontuação de 100 e a pontuação das outras instituições
é calculada como uma porcentagem da pontuação máxima. A concentração de prêmios
Nobel cria uma forte assimetria: Harvard (50), Oxford (55), Princeton (49),
Johns Hopkins (29) (até 2019). A
metodologia de cálculo exacerba a desigualdade, pois não basta ser excelente; é
preciso alcançar percentual elevado de indicadores de instituições que já
ocupam a liderança do ranking. A utilização da mesma
métrica para aferir a influência internacional dos países a partir dos rankings
apaga contrastes marcantes. Os EUA possuem 400 prêmios Nobel, o Reino Unido
possui 138, a Alemanha 111, a França 71[4].
O Brasil não possui nenhum laureado e conquistou uma medalha Fields, Arthur
Ávila, brasileiro, atualmente naturalizado francês.
Mesmo no
quesito em que o Brasil é competitivo, nas publicações internacionais, a
focalização em duas revistas, como Nature e Science, não
contempla a presença da pesquisa brasileira, por exemplo, no setor de
agricultura, nas humanidades, nas ciências sociais e nas artes, temas não
priorizados pelas mencionadas revistas. Ademais, em editorial, a revista Nature
conclamou a não se utilizar o fator de impacto como avaliação dos artigos nela
publicados. Em 2004, por exemplo, 89% das citações que remetiam aos seus
artigos eram gerados por somente 25% de seus artigos (Gingras,
2016).
Como
salienta Gingras (2016), a bibliometria é crucial
para o estudo da dinâmica das ciências. Entretanto, a excessiva mensuração das
citações vem assumindo características preocupantes para a ciência. De fato, no
contexto neoliberal, especialmente no final dos anos 1990, o indevido uso
instrumental da bibliometria ignorou que a diversidade de publicações entre as
áreas é imensa. No caso das humanidades ¾ das publicações são na forma de
livro, enquanto na física 80% são em revistas; nas ciências biomédicas e nas ciências
da natureza o número médio de autores passou de 2 em 1960 para 6 em 2014; o
percentual de publicações com mais de um autor, em 2014, foi de 95% nas
biomédicas, de 92% nas ciências da natureza e engenharias, de 70% nas sociais e
de 12% nas humanidades. Em virtude da geoeconomia política do conhecimento a
rede de colaborações (especialmente os dois primeiros autores) está basicamente
concentrada no G7. A adoção das métricas dos rankings é um procedimento
estranho à vida universitária.
Ademais, as
principais agências de mensuração das citações têm assumido inequívoco objetivo
mercantil. O Institute for Scientific Information (ISI) foi fundado em
1959. Em 1963, o ISI passou a elaborar o Science Citation Index (SCI). O
SCI foi adquirido em 1993 pela Thompson Reuters alcançando a receita de US$
13 bilhões. Em 2013, a Thompson Reuters adquiriu a Avedas.
Em 2016, a Clarivate Analytics
adquiriu a Thompson Reuters e, em claro processo monopólico, comprou, em 2021,
por US$ 5,3 bilhões a ProQuest, até então concorrente
da Web of Science (já adquirida em 2017 pela Clarivate).
O grosso da classificação e dos registros científicos está sob inequívoco
controle monopólico.
3 Internacionalização
nos PNPG e Mobilidade estudantil
A institucionalização da Pós-Graduação (PG)
no Brasil foi um dos primeiros atos da ditadura empresarial-militar, por meio
do Parecer nº 977/65 (Parecer Sucupira). Este
não fez nenhuma tergiversação sobre suas intenções: construir um sistema à
imagem e semelhança do sistema estadunidense, considerado um exemplo a ser seguido. O
I Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG) (Brasil, 1975), apresentado em julho
de 1975, buscou operacionalizar esse
objetivo já pavimentado pela reforma universitária de 1968 referenciada na modernização
reflexa a que se refere Darcy Ribeiro (1969). O II (1982-1985) e o III
PNPG (1986-1989) avançaram na institucionalização da pós-graduação no país. No
II Plano, a palavra intercâmbio aparece uma única vez para afirmar que a “[...] pesquisa original não é o único
mecanismo de capacitação e aperfeiçoamento no magistério [...]” (Brasil, 1982,
p. 179), mas sim, a “[...] atualização permanente por meio do acompanhamento
das publicações especializadas mais recentes e da participação em congressos,
seminários, encontros e intercâmbios [...]” (Brasil, 1982, p. 179) e por meio da avaliação.
A crise econômica mundial e nacional
dos anos de 1980 impôs reordenamentos das bases produtivas dos países
capitalistas dependentes com repercussões nas instituições produtoras de
C&T. Desde então, é possível encontrar proposições como a defesa da
diversificação das fontes de financiamento e a maior flexibilidade nas estruturas
dos cursos. Contudo, propugna o “[...] reforço aos programas de cooperação
técnica internacional que se destinem a viabilizar o intercâmbio de docentes e
pesquisadores com os seus pares de instituições do exterior [...]” (Brasil,
1986, p. 206).
No III PNPG, a internacionalização não
estava relacionada a projetos de desenvolvimento econômico e social, nem
tampouco a políticas que fortalecessem a soberania científica e tecnológica do
país. De modo peculiar, a internacionalização passou ser concebida como uma
variável chave e definitiva do prestígio do pesquisador, do grupo, do centro ou
da instituição, normalmente aferida por indicadores ‘privados’ discutidos na
seção anterior.
A internacionalização ganha maior
centralidade e passa a compor o núcleo sólido da política dos PNPG 2005-2010 e
2011-2020. Neste último, está expresso que as universidades e seus programas de
pós deverão ser “[...] cobrados por sua inserção internacional ou pela
capacidade de oferecer cursos de padrão internacional” (Brasil, 2010, p. 128).
Nessa direção, a classificação dos programas nos níveis de excelência - 6 e 7 -
terá como “[...] parâmetros de avaliação, a comparação com programas
internacionais considerados de referência” (Souza, 2018, p. 97). O exame da
internacionalização e da cooperação internacional no capítulo 11 do Plano
associa a consolidação da pós-graduação “[...] com o crescimento da ciência
brasileira, expressa sobretudo pelos progressos na produção científica, aferida
pela publicação de artigos em periódicos de circulação internacional indexados”
(Brasil, 2010, p. 223). A focalização nos indicadores de publicações leva a Capes
a propugnar que em termos de médias de citações de artigos científicos mostram
o Brasil à frente dos demais países do BRICS (Brasil, 2010) (o que é verdade em
áreas específicas, como nos estudos de arboviroses, Zika, por exemplo, e em áreas
agrícolas determinadas), ignorando a complexidade da geoeconomia política do
conhecimento: enquanto o Brasil passou a condição de exportador de commodities
brutas para a China, este país exporta para o Brasil produtos de elevado valor
agregado.
Como a internacionalização nos PNPG não
possui nexos orgânicos com ações relativas à geoeconomia política do conhecimento,
os critérios de avaliação focalizam parte do problema, mas ocultam as questões
mais relevantes e axiais. A agenda da mobilidade estudantil, por exemplo,
salienta os fluxos de entrada e saída, instituições, áreas e países, variáveis
que iluminam parte do problema, mas de modo descontextualizado vis-à-vis à
referida geoeconomia política. Em
virtude do fim da gratuidade (ou da elevação abrupta das taxas) e da crise de
endividamento estudantil, muitas universidades estadunidenses e da Grã-Bretanha,
por exemplo, possuem uma política profissionalizada de captação de estudantes
estrangeiros, em geral acompanhada de um forte setor de marketing. Sem
estes estudantes, as instituições sequer podem custear a folha de pagamento de
seus docentes e técnicos e administrativos. Em países que asseguram a
gratuidade, a variável comercial da mobilidade não é relevante. Importa mais a
existência de medidas horizontais de reciprocidade e de conexões entre grupos
de pesquisa e programas de graduação e pós-graduação; cotutelas, reconhecimento
recíproco de títulos e duplas diplomações; estímulo de direcionamento de
estudantes para áreas estratégicas a serem consolidadas no país que envia
estudantes, a exemplo da China.
Uma das principais medidas em prol da
internacionalização durante a vigência do PNPG (2011-2020) foi o Edital no
41/2017 que instituiu o Programa Institucional de Internacionalização – Capes PrInt, com o objetivo de selecionar “Projetos Institucionais
de Internacionalização de Instituições de Ensino Superior ou de Institutos de
Pesquisa”. Das 82 instituições que foram aprovadas na avaliação documental e
passaram pela análise de mérito e ranqueamento das propostas, apenas 36
obtiveram aprovação final, predominando universidades federais do Sudeste e
Sul, apenas quatro estaduais (as três do estado de São Paulo e a Universidade
do Estado do Rio de Janeiro), as Pontifícias Universidades Católicas de São Paulo
e do Rio de Janeiro. A grande maioria das instituições é do eixo Sudeste-Sul (Brasil,
2017), demonstrando a ausência de objetivos nacionais. Desde o lançamento do Capes-PrInt foi expressamente recomendado que o programa visava
aprendizado com centros mais avançados, e, por isso, países da América Latina,
África, Sul da Ásia ou de países Europeus como Portugal e Espanha não seriam
bem avaliados. As orientações desconsideraram que a internacionalização não
pode ignorar a centralidade dos problemas nacionais e, no plano mundial, dos
problemas dos povos, como os desafios das mudanças climáticas, da soberania e da
segurança alimentar, das novas pandemias e da superação de manifestações
racistas e de outras discriminações, assim como da desigualdade social planetária.
Está evidente que sequer as conclusões
e recomendações finais do PNPG 2011-2020 (Brasil, 2010) foram efetivadas após a
EC 95/2016. No governo Bolsonaro, os cortes orçamentários das universidades e
da ciência foram motivados pela guerra cultural, objetivando extirpar o próprio
campo científico da cena histórica brasileira (Leher, 2021).
Conforme a Unesco (2022), em
2019 mais de 6 milhões de estudantes estavam matriculados no ensino superior
fora do seu país de cidadania. EUA, Austrália, Reino Unido, Alemanha,
Rússia, Canadá
e França juntos receberam mais de 50% de todos os estudantes internacionais do
mundo, sendo que um terço de todos os estudantes internacionais estudavam em
somente três destinos anglófonos: Estados Unidos, Australia e Reino Unido. Os estudantes asiáticos representaram
mais do que 50% dos estudantes internacionais. O maior número de estudantes foi
proveniente da China, Índia e Coréia do Sul. Em 2019, o Brasil recebeu 21.803
estudantes do ensino superior – porém não como clientes, pois a grande maioria
destes estudantes, africanos e latino-americanos, está matriculada em
instituições públicas – e enviou 81.719 ao exterior. Dados referentes ao fluxo
líquido de estudantes em mobilidade internacional em 2019, para o Brasil, foi
de -59.916 (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2022).
Conclusão – Internacionalização dialógica para
superar a heteronomia cultural
Como
a grande maioria da pesquisa no Brasil é realizada nas universidades em conexão
direta com a pós-graduação, é inevitável que o tema da internacionalização
esteja nela centralizado. Não casualmente, os PNPG vêm conferindo crescente magnitude
à internacionalização e, atualmente, somente programas com expressivos indicadores
de internacionalização alcançam conceitos 6 e 7 da Capes.
O
problema principal dessa crescente relevância dos indicadores de internacionalização
é descontextualização da temática e de suas métricas. A desconsideração da
geoeconomia política do conhecimento está na raiz do problema, pois ignora as
robustas evidências de que a ascensão dos países e de suas instituições
universitárias e científicas no âmbito mundial depende de estratégias que ou
estiveram inscritas em revoluções burguesas – como são os casos clássicos da
França, Alemanha, EUA e Coreia –, ou no bojo de revoluções socialistas com suas
peculiaridades, como foram os casos da URSS e, mais recentemente, da China. Sem
políticas econômicas e de desenvolvimento social autopropelidas esses países
não teriam se movido no sistema de Estados que conforma o imperialismo e, com
isso, dificilmente teriam logrado alavancar de modo impetuoso suas instituições
universitárias projetando-as no âmbito mundial.
Os
nexos entre os centros de conhecimento e a geoeconomia política são conhecidos
pelo menos desde o apogeu da biblioteca e do museu de Alexandria, experiência
em que sobressai o empenho de desenvolver as instituições de conhecimento
articuladas a estratégias de reposicionamento geoeconômico e político. Com
efeito, a geoeconomia política permite identificar diferenças de escala da base
científica e tecnológica entre os países que somente podem ser superadas com a
transformação das forças produtivas e das relações de produção incorporando
conhecimento nas cadeias produtivas. Isto exige o aporte de grandes montantes
orçamentários no sistema de ciência e tecnologia, requalificação profunda da
infraestrutura das universidades e, no caso do setor produtivo, forte indução
estatal, inclusive com recursos não reembolsáveis para as áreas estratégicas
(energia, complexo industrial da saúde, agroecologia, transporte, segurança na
internet etc.).
A nervura
central do presente texto objetiva salientar que a internacionalização das
universidades é indissociável das revoluções burguesas e dos projetos de futuro
empreendidos pelos blocos de poder. Ignorar essas mediações é uma forma de
negacionismo sobre o significado do sistema de Estados que conforma o
imperialismo atual. É inequívoco que os
indicadores dos rankings são congruentes com as práticas já
estabelecidas nos países do núcleo hegemônico, notadamente os EUA que lideram
com folga o topo da hierarquia universitária mundial. Os principais critérios
dos rankings estão em conformidade com as forças centrípetas que posicionam
o país no sistema de Estados.
Essa
hierarquia está sendo desafiada pela China que estabeleceu como projeto
nacional a inovação tecnológica em áreas estratégicas e que, por isso,
constituiu uma política nacional de formação de pessoal altamente qualificado
nas universidades públicas de modo articulado com o envio de quadros para
diversas universidades do mundo, desenvolveu engenharia reversa, fomentou indústrias
de alta tecnologia, capitalizou seus centros de pesquisa e suas universidades.
A força econômica está alicerçando o país que, inclusive, lidera coalizões
importantes como a das universidades do BRICS, atua de modo protagônico em
coalizões como o Painel Internacional de Mudanças Climáticas, entre
outros.
As
experiências brasileiras possuem lastros virtuosos com as relações acadêmicas
internacionais, mas são frágeis pelas bases heterônomas de tais interações. Até
os anos 1960, o grosso da pesquisa avançada era auspiciada por fundações
estadunidenses. A seguir, na ditadura, o fomento foi dirigido pelos imperativos
do capitalismo monopolista. Após a crise da dívida de 1982, o país vem sofrendo
forte descomplexificação de suas cadeias produtivas. Por isso, mais do que
associar a internacionalização da pós-graduação aos problemáticos rankings,
uma estratégia exitosa de internacionalização deveria estar ancorada em
projetos nacionais, no fortalecimento do sistema de ciência e tecnologia, e na
centralidade das instituições universitárias e de C&T. São os países que
asseguram instituições dotadas de adequada infraestrutura, autonomia
universitária, dedicação exclusiva, carreira atraente e assistência estudantil
que podem servir de plataforma para a interação horizontal e dialógica com
outros países, instituições e áreas de conhecimento. O modelo de ilhas de
excelência ancoradas em instituições frágeis ignora que pés de barro não se
sustentam por muito tempo.
O
pressuposto fundamental é o compromisso com os problemas e os desafios da
humanidade, colocando em relevo a pertinência da colaboração internacional como
parte de um esforço da nação – e das políticas de Estado – em prol da soberania
e da solidariedade internacional frente a um sistema mundial que, como apontado
no artigo, reproduz desigualdades, assimetrias, corrói a soberania dos povos e
realimenta as bases do capitalismo dependente e da heteronomia cultural.
É
crucial que as políticas de fomento à internacionalização tenham linhas
definidas capazes de fortalecer as particularidades da C&T e da P&D. O
aporte de recursos e fomento para os setores produtivos (P&D) deve estar
inserido nas políticas industriais, ainda que em diálogo com as universidades.
Os recursos e os meios estatais de fomento à ciência, tecnologia, cultura e
arte não podem estar fagocitados pela lógica da P&D. Tais movimentos são
negativos para as universidades que podem ser debilitadas em suas funções de
pesquisa e processos de ensino e aprendizagem comprometidos com os desafios dos
povos e com os problemas lógicos e epistemológicos da ciência contemporânea e,
ao mesmo tempo, igualmente negativos para a P&D que deve estar inscrita nas
estratégias produtivas e de realização das mercadorias.
O compromisso
com os dilemas da humanidade requer ações que permitam modificar a correlação
de forças na geoeconomia política do conhecimento. O compartilhamento de laboratórios
e a mobilidade estudantil, de docentes e de técnicos e administrativos, entre
países dispostos a fortalecer a interação horizontalizada e de fato dialógica é
um movimento político que possui raízes nas experiências dos povos. O esforço
para que a Unesco pudesse ser um espaço de cooperação educacional, cultural e
científica projetou bases de futuro, mas a correlação de forças não permitiu
sua efetivação a partir dos anos 1970. Também o movimento da Nova Ordem Econômica
Mundial preconizou o compartilhamento do conhecimento entre os povos,
iniciativa que foi interrompida de modo draconiano com o acordo do TRIP-OMC.
O
mundo está diante de oportunidades extraordinárias. Já não restam dúvidas de
que sem esforços planetários será impossível enfrentar pandemias, mudanças
climáticas, a fome e a desigualdade social que nutre o espectro do fascismo no
Século XXI. As universidades brasileiras estão preparadas e ávidas por novas
práticas de internacionalização que consubstanciem uma nova geoeconomia política
do conhecimento fundamentada no valor de que o conhecimento comprometido com o
bem-viver não pode estar aprisionado pela mercantilização e pela militarização
da ciência.
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Acesso em: 12 fev. 2023.
____________________________________________________________________________________________
Roberto LEHER Trabalhou a
concepção e o delineamento do artigo.
Professor Titular da
Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro na linha Estado, Trabalho e Movimentos Sociais. Doutor
em Educação pela Universidade de São Paulo (1998). Desenvolve pesquisa em políticas
públicas em educação. Atua no Coletivo de Estudos em Marxismo e Educação (COLEMARX).
Pesquisador do CNPq, Cientista de Nosso Estado (FAPERJ) e colaborador da Escola
Nacional Florestan Fernandes. Reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(julho de 2015 a julho de 2019).
Maria Rosimary Soares
dos SANTOS Trabalhou na análise e interpretação dos dados.
Possui graduação em Ciências
Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (1992), mestrado em Ciência
Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (1996), doutorado em
Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2007) com
pós-doutorado na Universidad Nacional de San Martim -
Argentina e na Universidade Federal do Rio de Janeiro (2010) e Universidade
Federal do Pará (2018-2019). Atualmente é professora Associada da Universidade
Federal de Minas Gerais. Coordenadora da Linha de Políticas Públicas em
Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação - Conhecimento e Inclusão
Social (08/2019 a 08/2021).
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* Professor Titular. Doutor em Educação. Docente da Faculdade
de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. (UFRJ, Rio de Janeiro,
Brasil). Avenida Pasteur, n. 250, Urca, Rio de Janeiro, CEP.: 22290-250. E-mail:
robertoleher@fe.ufrj.br.
** Professora
Associada. Doutora em Educação. Docente da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG, Belo Horizonte, Brasil). Av. Presidente Antônio Carlos, n. 6627, Belo
Horizonte, CEP.: 31270-901. E-mail: m.rosimary@gmail.com.
© A(s) Autora(s)/O(s) Autor(es). 2023 Acesso Aberto Esta obra está licenciada sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo que comercial. O licenciante não pode revogar estes direitos desde que você respeite os termos da licença.
[1] Operação
Paperclip: programa secreto de inteligência dos Estados Unidos no qual mais de 1600 cientistas, engenheiros
e técnicos alemães que atuaram na Alemanha nazista foram levados para os Estados Unidos para trabalhar no governo, entre 1945 e 1959 (Operação
Paperclip, 2023, não paginado).
[4] WORLD POPULATION REVIEW. Nobel Prizes by Country 2023. Califórnia, ©2023.
Disponível em: https://worldpopulationreview.com/country-rankings/nobel-prizes-by-country.
Acesso em: 12 fev. 2023.