Saúde mental e trabalho de jornalistas do
Tocantins durante a COVID-19
Mental health and work of journalists in Tocantins
during COVID-19
Neilson Batista BORGES
https://orcid.org/0009-0009-7484-6264
Governo do
Tocantins. Secretaria Estadual de Educação e Cultura,
Palmas, TO,
Brasil
e-mail: neilsondiantedotrono@hotmail.com
Liliam Deisy GHIZONI
https://orcid.org/0000-0002-1254-7455
Universidade Federal de
Santa Catarina, Departamento de Psicologia,
Curso de Psicologia,
Florianópolis, SC, Brasil
e-mail: liliam.ghizoni@ufsc.br
Resumo: O presente estudo teve por objetivo
investigar de que forma o contexto de trabalho durante a pandemia por COVID-19
afetou a saúde mental dos/das jornalistas do estado do Tocantins. Como método de análise
dos dados, foi utilizado o software Nvivo. A
análise dividiu-se em dois grandes blocos: Eixo Descritivo e Eixo Analítico. Assim,
constatou-se que a mudança de rotina e as estratégias de atuação para a
contenção do vírus foram um grande desafio no processo de trabalho desses
profissionais. O medo de contrair o vírus, de morrer ou transmiti-lo para seus
familiares foram sentimentos que ocasionaram muita perturbação mental, de
acordo com os entrevistados. Os atravessamentos vivenciados com relação às
condições de trabalho já intercorriam antes do período pandêmico, o que
enfraquece grandiosamente o exercício de sua profissão, a saúde mental, e
consequentemente a qualidade de vida desses profissionais.
Palavras-chave: COVID-19. Jornalismo. Pandemia. Saúde Mental.
Trabalho do Jornalista.
Abstract: This
study aimed to investigate how the work context during the pandemic affected
the mental health of Tocantins Journalists. As an analysis method COVID-19, Nvivo software was used. This analysis was divided into two
large blocks: Descriptive Axis and Analytical Axis. Thus, it was found that
changing routine and action strategies to contain the virus was a very
challenge in the work process of these professionals. The fear of contracting
the virus, of dying or transmitting it to family members, was a feeling that
caused a lot of mental disturbance among those interviewed. The obstacles
experienced in relation to working conditions already occurred before the
pandemic period. These greatly weaken the exercise of their profession, mental
health as well as the quality of life of these professionals.
Keywords: COVID-19. Journalism. Pandemic. Mental health. Journalist’s work.
1 Introdução
N |
este
artigo será apresentado o percurso da problematização, ou seja, de que forma o
contexto de trabalho dos/das jornalistas do Tocantins, durante a pandemia por
COVID-19, afetou sua saúde mental. Identificou-se que “[...] a sensação de isolamento social
como um dos fatores cruciais no adoecimento mental, desencadeia neles,
sentimentos de angústia, insegurança e medo, que quando não tratados
devidamente, podem se prolongar mesmo após o controle do vírus” (Faro et al.,
2020, p. 47).
Em meio a essa realidade, acrescenta-se a atuação
profissional dos/das jornalistas, e sua ampla cobertura realizada nos veículos
de comunicação social, sobre os impactos da pandemia por COVID-19 no dia a dia
da população, com hospitais em superlotação, boletins epidemiológicos com
números alarmantes de incidência de casos e óbitos, além de denúncias de
corrupção, desemprego, fome e inflação (Lobo, 2021). Ressalta-se, ainda, as
campanhas educativas de combate ao vírus, vacinas, entre outros, podendo
sobrecarregar-se mental e emocionalmente frente a essas informações, e
influenciando quem irá consumir a produção final desse conteúdo midiático - os
espectadores (Noblat, 2021).
Desse
modo, a organização do trabalho de diversos grupos ocupacionais sofreu
profundas alterações quanto à jornada de trabalho, realização de horas extras e
ritmo de trabalho (Cueto, 2020). A exploração do trabalhador, diante de
uma precarização sem limites, resulta em uma perversidade do ponto de vista
social, que se acentuou com a pandemia por COVID-19 (Antunes, 2020a; Lucca,
2020).
O
que se vê é uma captura, não só do saber fazer dos trabalhadores, mas também a
sua disposição intelectual-afetiva, composta para cooperar com a lógica da
valorização, do pensar proativamente, inclusive encontrar soluções antes dos
problemas acontecerem (Alves, 2011; Antunes, 2020b). Assim, é um desafio
para a humanidade contemporânea dar sentido ao trabalho humano, tornando a vida
do trabalhador também dotada de sentido (Antunes; Braga, 2015).
Diante disso, percebe-se a influência
direta no processo de adoecimento mental, uma vez que o trabalho pode ser visto
como um fator determinante e social de saúde e adoecimento juntamente com
outros fatores, como educação e habitação, que impactam na qualidade de vida da
população de forma geral (Federação Nacional dos
Jornalistas, 2020).
Os/as
jornalistas são indivíduos que necessitam de subjetividade para lidarem com as
notícias. Seu processo produtivo envolve variáveis que não estão prontas e
disponíveis em cartilhas e nem tão pouco são desenvolvidas de imediato (Lobo,
2021). Esses profissionais lidam com demandas cada vez mais pesadas, impostas
pela inovação estrutural do trabalho, por novas tecnologias e pela necessidade
de estarem sempre atualizando o público. Esse perfil, o de ser multitarefas, se
tornou exigência nas empresas e na estruturação de suas equipes, o que colabora
para o estresse (Silva; Heloani, 2007).
Durante a
pandemia, o trabalho dos/das jornalistas se expandiu do trabalho na redação, na
rua, em casa e em todas as situações de forma intensificada. A própria pandemia
por COVID-19 se configurou em um cenário propício ao adoecimento mental
(Reimberg, 2020).
Ainda sobre
o universo de trabalho nesse contexto, destaca-se que empresas foram orientadas
a indicarem o trabalho remoto aos seus trabalhadores, isto é, as atividades
executadas em casa. Isso ocorreu com alguns jornalistas, principalmente os que
atuavam em redações, outros continuaram expostos aos riscos de contaminação,
pois foram obrigados a transmitir notícias in loco, geralmente nos locais onde
havia pessoas acometidas pela doença (Casero-Ripollés,
2021).
Os desafios da profissão são múltiplos e variam desde a
própria precarização dos vínculos empregatícios até os baixos salários, as
longas horas de trabalho, além da exigência de diversas habilidades nesse tipo
de atuação (Andrade; Assis, 2018).
Dessa forma, a atuação jornalística teve que assumir uma
postura de linha de frente em meio ao combate da pandemia por COVID-19. As
exigências por notícias sobre a crise sanitária mundial aumentaram as pressões
psicológicas sobre esses trabalhadores. A redução de receita das empresas de
jornalismo também os colocou sob o risco de demissão. O que os obrigou – em
alguns casos – a aceitarem uma jornada de trabalho ainda maior com um salário
reduzido. Esse acontecimento foi mais expressivo entre as mulheres jornalistas,
tendo em vista que, no Brasil, elas atuam mais que os homens (Andrade; Assis, 2018).
Assim, independente de gênero, este estudo apresenta um
mapeamento investigativo sobre como o contexto de trabalho pode ter afetado a
saúde mental dos/das jornalistas do estado do Tocantins durante a pandemia por
COVID-19. Especificamente buscou-se: avaliar
como o trabalho dos/das jornalistas do Tocantins, nos anos iniciais da pandemia
por COVID-19 (no período de março de 2020 a dezembro de 2023), afetou sua saúde
mental; analisar as condições de trabalho dos/das
jornalistas do Tocantins durante a pandemia por COVID-19 e se estas afetaram
sua saúde mental; discutir como os jornalistas do Tocantins lidaram com as relações
institucionais de gênero em sua jornada de trabalho durante a pandemia por COVID-19.
2 Metodologia
Foi
realizada uma pesquisa de campo, com a utilização de um roteiro de entrevista
semiestruturada e individual. Participaram seis jornalistas do Tocantins, sendo
três do sexo masculino e três do sexo feminino, com representação específica,
diversificada e intencional de ser um/uma jornalista de cada área de atuação:
TV, Rádio, Web, Impresso, Assessoria e Docência. O critério de inclusão foi
terem atuado ininterruptamente de março de 2020 a dezembro de 2023. Para
acessar os participantes adotou-se a estratégia de bola de neve.
As
entrevistas aconteceram de forma presencial, individual e todos os
participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O áudio
foi gravado e posteriormente transcrito na íntegra para o word. Cada entrevista
durou aproximadamente 1 hora e 30 minutos. Nesse estudo, foram tomados todos os
cuidados éticos e o projeto foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisas com
Seres Humanos da Universidade Federal do Tocantins, com protocolo de nº: 6.453.287.
As entrevistas foram importadas para o software
Nvivo versão 14,
individualmente, em formato Doc. O processo de análise consistiu na utilização
de ferramentas próprias desse software (análise automática de temas / nuvens de palavras / análise de cluster e análise automática de
sentimento) (Lage, 2011), como também no processo de codificação das
respostas nos eixos temáticos: saúde mental, condições de trabalho e relações
institucionais de gênero, na pandemia por COVID-19.
3 Resultados e Discussões
3.1
Identificação de temas e seus subtemas
Com a análise automática de tema
apresenta-se essa tabela ordenada alfabeticamente em cada código principal.
Tabela
1 - Temas e subtemas nas entrevistas
Códigos secundários |
||
colegas |
colegas da
cbn |
pelas colegas |
colegas jornalistas |
tenho colegas |
|
demais
colegas |
teve
colegas |
|
outros colegas |
vários colegas |
|
jornal |
colegas
jornalistas |
jornalista
independente |
era jornalista |
jornalista na pandemia |
|
jornal
daqui |
mulher
jornalista |
|
jornal impresso |
relação ao jornalismo |
|
jornal na
casa |
rádio
jornalismo |
|
jornal popular |
sendo jornalista |
|
jornalismo
contribua |
sou
jornalista |
|
jornalismo existe |
só jornalista |
|
jornalismo
profissionalmente |
tivemos
jornalistas |
|
jornalismo sozinho |
tornei jornalista |
|
jornalista
da prefeitura |
trabalho
no jornal |
|
jornalista exaustivo |
tristeza no jornalismo |
|
jornalista
homem |
vaga no
jornal |
|
mulher |
cinegrafista mulher |
mulher lá |
era mulher |
mulher na
redação |
|
gestora mulher |
mulher vai |
|
mulher
branca |
relação à
mulher |
|
mulher da redação |
sobrecarga da mulher |
|
mulher
fala |
talvez
mulher |
|
mulher jornalista |
trabalho da mulher |
|
Pandemia |
ano da
pandemia |
jornalista
na pandemia |
chegada da pandemia |
nessa pandemia |
|
combate à
pandemia |
pandemia
dentro |
|
conta da pandemia |
pandemia desse período |
|
contexto
da pandemia |
pandemia
na cbn |
|
câncer na pandemia |
pandemia teve |
|
elemento
da pandemia |
período da
pandemia |
|
filho na pandemia |
processo da pandemia |
|
impacto da
pandemia |
época da
pandemia |
|
independente da pandemia |
pandemia desse período |
|
período |
era
naquele período |
período da
pandemia |
nesse período |
período pandêmico |
|
num
período |
||
pessoas |
aquelas pessoas |
pessoas na universidade |
duas
pessoas |
pessoas
naquela hora |
|
houve pessoas |
querendo pessoas |
|
naquelas
pessoas |
seis
pessoas |
|
outras pessoas |
tendo pessoas |
|
pelas
pessoas |
tinha
pessoas |
|
político |
ato político |
poder político |
cargo
político |
política
pública eficiente |
|
componente político |
políticas internas |
|
contexto político |
político
desonesto |
|
gestão política |
processo político |
|
imprensa
política |
questão
política |
|
interesses políticos |
recurso político |
|
lado
político |
||
trabalho |
atribuo ao trabalho |
trabalho jornalístico |
autonomia
no trabalho |
trabalho
junto |
|
bom trabalho |
trabalho motorista |
|
confiar no
trabalho |
trabalho
mudanças |
|
relação ao trabalho |
trabalho na assessoria |
|
trabalho
bacana |
trabalho
no ambiente |
|
trabalho convencional |
trabalho no jornal |
|
trabalho
da mulher |
trabalho
num edifício |
|
trabalho desenvolvido |
trabalho possível |
|
trabalho
discute |
trabalho
salubre |
|
trabalho essencial |
trabalho vivencia |
|
trabalho
habitual |
tratado no
trabalho |
|
trabalho intelectual |
Em uma análise mais específica,
destrincha-se a distribuição dos temas entre os entrevistados. Os resultados se
referem à quantidade ou proporção de trechos ou frases presentes em cada um dos
temas para cada um dos entrevistados.
Tabela 2 - Tabela com a
distribuição dos temas entre os entrevistados
Temas |
Docente
de Jornalismo |
Jornalista
de Assessoria |
Jornalista
de Impresso |
Jornalista
de Radio |
Jornalista
de TV |
Jornalista
de Web |
colegas |
2 |
4 |
0 |
7 |
1 |
0 |
jornal |
0 |
10 |
19 |
3 |
4 |
5 |
mulher |
0 |
7 |
6 |
2 |
2 |
1 |
pandemia |
3 |
7 |
8 |
2 |
1 |
1 |
período |
0 |
10 |
2 |
1 |
0 |
2 |
pessoas |
6 |
2 |
3 |
1 |
2 |
2 |
político |
1 |
8 |
7 |
0 |
2 |
0 |
trabalho |
0 |
14 |
6 |
1 |
3 |
1 |
3.2 Frequências das palavras do conteúdo analisado
Com o intuito de obter uma representação
visual da frequência e importância das palavras nas entrevistas, adotou-se a
ferramenta Nvivo. Desse modo, percebe-se a relevância
temática entre todos os participantes, apresentada na tabela 3.
Tabela
3 - Frequência de palavras das respostas dos
participantes
Palavra |
Contagem |
Percentual
ponderado (%) |
Palavras similares |
jornalista |
417 |
2,54 |
jornal, jornalismo, jornalista, jornalistas |
trabalho |
279 |
1,70 |
trabalha, trabalha', trabalhada, trabalhador, trabalham, trabalhamos,
trabalhando, trabalhar, trabalhava, trabalhavam, trabalhávamos, trabalhei,
trabalho, trabalho', trabalhos, trabalhou |
mulher |
97 |
0,59 |
mulher, mulheres |
casa |
89 |
0,54 |
casa, casadas, casado, casei, caso, casos,
casou |
pessoas |
89 |
0,54 |
pessoais, pessoas |
falou |
86 |
0,52 |
fala, falam, falando, falar, falaram, falava, falei, falo, falou |
pandemia |
85 |
0,52 |
pandemia |
vacina |
75 |
0,46 |
vacina, vacinação, vacinada, vacinadas, vacinado, vacinados,
vacinando, vacinar, vacinas, vacinei, vacinou |
colegas |
67 |
0,41 |
colega, colegas |
assessoria |
65 |
0,4 |
assessoria |
A nuvem de palavras representa os
termos mais presentes nas respostas dos entrevistados. As palavras estão
relacionadas à temática geral da pesquisa, o trabalho dos/das jornalistas
durante o período da pandemia. As palavras mais presentes foram: jornalista,
trabalho, mulher, casa e pessoas.
Figura
1 – Nuvem de Palavras por frequência
Nessa primeira análise, pôde-se observar uma tendência de
homogeneidade no conteúdo.
Todos os entrevistados apresentaram
similaridades significativas nas palavras, como pode ser observado pelos
valores do Coeficiente de Pearson[1]
na tabela 4.
Tabela
4 - Coeficiente de Pearson dos Clusters
Caso A |
Caso B |
Coeficiente
de correlação de Pearson |
Jornalista de Radio |
Jornalista
de Assessoria |
0,88 |
Jornalista de Web |
Docente de Jornalismo |
0,86 |
Jornalista de Web |
Jornalista de TV |
0,85 |
Jornalista de Web |
Jornalista de Assessoria |
0,85 |
Jornalista de Web |
Jornalista de Radio |
0,85 |
Jornalista de Assessoria |
Docente de Jornalismo |
0,83 |
Jornalista de TV |
Docente de Jornalismo |
0,83 |
Jornalista de TV |
Jornalista de Impresso |
0,83 |
Jornalista de Web |
Jornalista de Impresso |
0,82 |
Jornalista de TV |
Jornalista de Assessoria |
0,81 |
Jornalista de Radio |
Docente de Jornalismo |
0,80 |
Jornalista de TV |
Jornalista de Radio |
0,79 |
Jornalista de Impresso |
Docente de Jornalismo |
0,79 |
Jornalista de Impresso |
Jornalista de Assessoria |
0,78 |
Jornalista de Radio |
Jornalista de Impresso |
0,78 |
Na imagem do dendograma,
apresentada na figura a seguir, é possível visualizar dois agrupamentos entre
os entrevistados.
Figura
2 - Cluster dos entrevistados
Dessa forma, os destaques com mais
similaridades são entre: jornalista de Assessoria e jornalista de Rádio (0.88),
jornalista de Web e docente de Jornalismo (0.86). A jornalista de TV está mais
próxima de similaridade da de Web e do docente do que dos demais. O jornalista
de Impresso está mais próximo dos conteúdos dos jornalistas de Assessoria e
Rádio. Nesse caso, por se tratar de valores muito próximos e todos com alta
significância, as diferenças entre os clusters é pouco acentuada.
3.4 Eixos Analíticos
3.4.1 A saúde
mental dos/das jornalistas do Tocantins que atuaram nos anos iniciais da
pandemia por COVID-19
Na análise das questões referentes ao “objetivo
específico 1: que visou avaliar como o trabalho dos/das jornalistas do
Tocantins, nos anos iniciais da pandemia por COVID-19 (nos períodos de março de
2020 a dezembro de 2023), afetou sua saúde mental” apresenta-se a figura a seguir.
Figura
3 - Árvore de palavras de saúde mental
A adoção de medidas sanitárias, que visavam proteger
esses profissionais de uma contaminação, tornou-se um debate comum entre os/as
jornalistas e a empresa. Assim, foi comum o aumento do estresse motivado pela
fadiga e pelo medo de adquirir a doença e transmiti-la aos seus entes queridos,
no lar. A exposição ao vírus, no intuito de levar ao público as informações
necessárias sobre a pandemia, fez com que muitos jornalistas desenvolvessem
síndromes, principalmente pelo medo de serem demitidos e, assim, em alguns
casos, até aceitaram a redução salarial (Taiba;
Santos; Coqueiro, 2022).
E aí
isso na pressão do jornalismo para noticiar dados atualizados constantemente
sobre a proliferação do vírus da COVID-19 na pandemia, isso nos consome e aí a
gente, Ah, OK, eu estou preocupado com a sua saúde mental, mas cadê o
equipamento para que a minha saúde mental não, não bugue, né? (jornalista de TV).
Para além da pandemia por COVID-19, a rotina de trabalho do/da jornalista é permeada
frequentemente pela exposição a diferentes fatores de risco psicossocial, tais
como o convívio com situações de forte impacto emocional, a premência do tempo,
a pressão dos editores-chefes pelo fechamento da pauta e a competição, entre
outros (Taiba; Santos; Coqueiro, 2022, p. 95).
Como chamar os resultados desse ataque à
saúde mental? O cansaço , o medo de contrair o vírus da COVID-19 e morrer no
retorno do remoto. Uma quase alergia ao se pensar no trabalho presencial
novamente. Enquanto ele era a única opção, vamos lá, após passar a haver
outras opções. É desesperante para mim, é desesperante (docente de Jornalismo).
Vale ressaltar, que as expressões com mais proximidade visualizadas nas
frases são: correr o risco, falta de tempo, abalou o emocional e me fez
questionar muito a minha vida. São expressões que sempre denotam a preocupação
ou até a falta de amparo ao profissional.
Tabela
5 - Sentimento sobre a saúde mental
N |
% |
|
Muito negativo |
41 |
27% |
Moderadamente negativo |
61 |
40% |
Moderadamente positivo |
36 |
26% |
Muito positivo |
12 |
8% |
Observa-se, nesta tabela, a
predominância de frases com conotação negativa. Somando as negativas, têm-se
102 frases. As positivas somam 48 frases. As referências em trechos negativos
são mais que o dobro das referências positivas. Neste sentido corroboram
algumas falas.
- Negativo:
A questão assim, talvez a
frustração de não ver de repente chegar a todo mundo aquele resultado que eu
imaginava, pois devido a necessidade dos recursos tecnológicos para se manter a
comunicação no período pandêmico e com isso conter a proliferação do vírus, nem
todos tinham acesso a esses recursos e com isso há essa integração e
comprometimento (docente de Jornalismo).
Por esse motivo, os/as jornalistas tiveram no contexto
pandêmico, o grande desafio de se apropriarem ao máximo de recursos
tecnológicos que facilitassem sua comunicação, porém, em diversas situações,
muitos desses profissionais atuaram de forma limitada, por não possuírem
condições financeiras para dispor de recursos para a execução de seu trabalho,
até mesmo devido a suas limitações salariais (Lima, 2022).
Passei por uma situação uma vez,
duas situações muito difíceis na minha vida profissional como jornalista.
Passei por uma situação em que uma chefe ela me humilhava todos os dias devido
à pressão para constante atualização das notícias sobre a COVID-19 no primeiro
ano da pandemia (2020) (jornalista de Assessoria).
Assim, no assédio moral, ocorre a
desqualificação em função do trabalho, com situações de humilhações verbais,
isolamento do profissional de suas reais funções, bem como a redução de tarefas
para inibir sua atuação profissional (Andrade; Assis, 2018).
Eu ouvia isso direto de um colega [...]
me sentia muito mal, tipo, invalidava todo o esforço de todo mundo, ainda mais
na pressão absurda para cobertura e atualização das notícias sobre a COVID-19,
na pandemia (jornalista de Web).
Na pandemia por COVID-19, a
intensa competição pelo furo de reportagem e pela primazia da notícia entre
os/as jornalistas, fez com que o clima rivalizado, vivenciado nessa categoria
profissional desde sempre, se intensificasse, passando muitas vezes por cima da
própria ética profissional (Lobo, 2021).
- Positivo:
Só que eu não me deixo abater,
simplesmente eu faço o seguinte: eu faço o meu trabalho com excelência, eu
procuro entregar um bom trabalho, mas em compensação eu estou estudando para
outra área, pois devido a minha atuação como assessor na pandemia ter sido
esgotante, desejo muito em breve migrar para outra profissão (jornalista de Assessoria).
Compreende-se, que nesse contexto,
o tema saúde mental é muito frágil. O assédio moral definido como toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se “[...]
sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos escritos que possam trazer
danos à personalidade, a dignidade ou a integridade física e psíquica de uma
pessoa coagindo-a a se sentir ameaçada ou degradada em seu ambiente de trabalho
[...]” (Andrade; Assis, 2018, p. 2), foi identificado na fala da
entrevistada, a seguir.
[...] De assédio
moral, bastante, principalmente de um chefe me tirando o vídeo, porque eu
estava eu aumentei o peso e ele falou não, você não serve. Uma vez eu não
tinha ninguém, para apresentar o jornal da manhã, pois, nesse dia todas as
apresentadoras estavam com medo de vir apresentar o jornal e contraírem a
COVID-19, ainda em 2020. Eu precisei substituir e ele falou assim, não venha
com os braços à mostra porque os seus braços estão muito gordos. Coisas desse
sentido já, já passei bastante (jornalista de TV).
Desse modo, a pressão
pela constante atualização de notícias referentes à pandemia por COVID-19, foi
um fator desencadeador de grande estresse e ansiedade
vivenciado pelos jornalistas nesse contexto, o que afetou inclusive sua
autoestima, confiança e produtividade, trazendo assim a sensação e o sentimento
de insegurança e descrédito com relação a sua competência profissional (Reimberg, 2020).
No período inicial da
pandemia em 2020, o home office fez isso comigo, me esgotou porque eu perdi
totalmente a noção do tempo, era 24 horas por dia em função da cobertura sobre
a COVID-19 (jornalista de TV).
Lima (2022)
enfatizou que a modalidade Home Office se iniciou antes da pandemia, no
intuito de proporcionar ao trabalhador uma administração a contento de seu
cotidiano laboral. O que se viu foi o esgotamento dos/das jornalistas
participantes.
Eu tenho muitas
sensações de vazio. Mau humor nem tanto, mas a sensação de achar que eu não
dou conta de fazer as coisas assim. Solidão [...] (jornalista de Web).
Dessa
forma, ao refletir sobre a saúde mental dos indivíduos e todo o contexto social resultante da pandemia
por COVID-19, identifica-se que “[...] a sensação de isolamento social,
desencadeia nos mesmos, sentimentos de angústia, insegurança e medo, que quando
não tratados devidamente, podem se prolongar, mesmo após o controle do vírus”
(Faro et al., 2020, p. 47).
Além disso, sobre a violência no
desempenho da profissão, Andrade
e Assis (2018) conceituam como sendo todo o exercício de força
contra um trabalhador que causa ou não danos físicos ou o abuso verbal e
o bullying, que resultam
em abalos psicológicos e emocionais. Neste aspecto, houve relatos de humilhações no
ambiente de trabalho e até de ameaças à vida dos entrevistados e suas famílias,
por temas abordados em suas reportagens.
Nesse contexto, houve ameaça de pessoas ligarem para minha
família, de me ameaçarem de ligarem para mim tentando proibir a matéria ou
tentando oferecer dinheiro para uma matéria não sair. Em 2020 no ápice da
pandemia por COVID-19, isso aconteceu bastante (jornalista de Impresso).
Isso é tão sério que eu não esqueci [...]. Eu tinha vontade
de fazer um programa de rádio e só quem fazia o programa era ela [chefe]. Eu
fazia o texto para ela divulgar as notícias nesse programa de rádio (jornalista
de Assessoria).
Essas situações expõem a precariedade vivenciada nesse
universo laboral, agravado no período pandêmico, pois muitos dos profissionais,
para não ficarem desempregados, se submeteram a essas condições, estando muitas
vezes de mãos atadas para não perderem seu emprego. Dessa forma, a saúde mental
foi quem pagou essa conta, e em alguns casos, com danos irreversíveis (Andrade;
Assis, 2018).
3.4.2 As
condições de trabalho dos/das jornalistas do Tocantins durante a pandemia por
COVID-19
A árvore de palavras, da figura a seguir, apresentou
as palavras que apareceram junto às citações sobre o ambiente de trabalho dos
entrevistados. Dessa forma, foi desenvolvido o objetivo específico 2, que
visou analisar as condições de trabalho dos/das jornalistas do Tocantins
durante a pandemia por COVID-19 e se afetaram sua saúde mental.
Figura
4 - Árvore de palavras do ambiente de trabalho
De modo em geral, os temas próximos ao ambiente de
trabalho se referem às condições físicas e estruturais dos locais, e foram
vistos de modo positivo entre os entrevistados. Observou-se pouca diferença
entre os sentimentos positivos e negativos.
Tabela 6 - Sentimento sobre
as condições de trabalho
N |
% |
|
Muito negativo |
23 |
13% |
Moderadamente negativo |
69 |
39% |
Moderadamente positivo |
64 |
36% |
Muito positivo |
20 |
11% |
- Positivo:
Nós temos um
ambiente de trabalho muito bom, tá? Nós temos
equipamentos modernos, nós temos um ambiente de trabalho salubre e nós temos
diálogos, nós nos comunicamos, nós discutimos pautas. [...] Lá é muito bom,
mesmo com a correria infernal que foi no ano de 2020, ano inicial da pandemia
por COVID-19 e incertezas de um futuro vitorioso, na luta pela sobrevivência,
nesse contexto (jornalista de
Assessoria).
Como já referido, Lobo (2021) enfatiza
que os/as jornalistas são indivíduos que necessitam
de subjetividade para lidarem com as notícias. Seu processo produtivo envolve
variáveis que não estão prontas e disponíveis em cartilhas e nem tão pouco
desenvolvidas de imediato. Esses profissionais lidaram na pandemia com demandas
cada vez mais pesadas, impostas pela inovação estrutural desse trabalho, por
novas tecnologias e pela necessidade de estarem sempre atualizando o público
(Silva; Heloani, 2007).
Mas depois que
terminou esse período, como houve maior aproximação com os colegas de trabalho
e com a chefia mais próxima, melhorou mais a comunicação (jornalista de Assessoria).
Com as campanhas de
intensificação da vacinação no segundo semestre de 2021, o retorno do remoto
para o presencial se tornou um processo menos estressante. Principalmente para
os/as jornalistas, que mesmo sendo categoria profissional atuante na linha de frente
da cobertura e divulgação das notícias sobre a pandemia por COVID-19, não
receberam a vacina junto com os profissionais da saúde, no primeiro momento,
tendo suas vidas expostas constantemente ao risco da contaminação. Com o
retorno, a interação presencial foi um fator de grande relevância na
produtividade do trabalho em equipe (Lobo, 2021).
Eu me considero feliz
sendo jornalista, [...] embora tenha essas funções [...] [de] supervisão, que
eu fico até o fechamento do jornal, eu sou um repórter, todos os dias eu
escrevo, no período pandêmico de forma em geral, esse processo foi esgotador (jornalista de Impresso).
A pandemia por
COVID-19 ocasionou, na rotina de trabalho dos/das jornalistas, situações
estressantes e desgastantes, deixando-os psicologicamente fragilizados,
principalmente pelas pressões por grande produtividade em curto espaço de
tempo. Porém, um fator positivo a se pensar, nesse processo, foi que muitos dos
jornalistas esgotados nesse contexto, atuaram também pelo gosto da profissão,
dessa forma, “[...] a sensação prazerosa e exitosa nos resultados alcançados,
trouxe certo equilíbrio sobre o desgaste incalculável vivenciado nesse
contexto” (Reimberg, 2020, p. 58).
- Negativo:
Não por causa da
pandemia, mas ela tornou isso muito mais forte, a gente tem uma outra sociedade
hoje para mim, a grande força da docência sempre foi estar junto com os alunos
e a ideia do estar junto hoje é muito diversa, mesmo estando junto no mesmo ambiente,
há uma distância muito grande (docente de
Jornalismo).
A alegria, a
tristeza, esses sentimentos de frustração estão muito ligados no jornalismo, no
sentido de apuração. [...] durante um ano, acho que nossa chefia veio aqui uma
vez, o resto fomos nós expostos ao vírus e ao medo da morte, como se ela nos
perseguisse constantemente. Essa foi a sensação que tive de 2020 até 2022,
mesmo com a chegada da vacinação (jornalista de
Impresso).
Os entrevistados acima enfatizam que apresentaram,
em algum momento de sua carreira, o sentimento de deixá-la, mas é algo que não
ocorre mais no presente. De modo geral estão satisfeitos com o cargo que ocupam
hoje e a maioria não demonstrou interesse em mudar de profissão.
3.4.3 As
relações institucionais de gênero dos jornalistas do Tocantins durante a
pandemia por COVID-19
Neste último objetivo específico
discutiu-se como os jornalistas do Tocantins lidaram com as relações
institucionais de gênero em sua jornada de trabalho durante a pandemia por COVID-19.
Tabela
7 - Frequência de palavras
Palavra |
Contagem |
Percentual
ponderado (%) |
Palavras similares |
mulher |
91 |
4,32 |
mulher, mulheres |
trabalho |
39 |
1,85 |
trabalha, trabalhando, trabalhar, trabalhava, trabalhei, trabalho |
jornalistas |
31 |
1,47 |
jornal, jornalismo, jornalista, jornalistas |
filhos |
23 |
1,09 |
filha, filho, filhos |
pandemia |
21 |
1,00 |
pandemia |
casa |
19 |
0,90 |
casa, casadas, caso, casos, casou |
cuidar |
17 |
0,81 |
cuidado, cuidados, cuidando, cuidar |
colegas |
16 |
0,76 |
colega, colegas |
homem |
13 |
0,62 |
home, homem |
homens |
13 |
0,62 |
Homens |
chefe |
12 |
0,57 |
chefe, chefes, chefia |
vejo |
12 |
0,57 |
Vejo |
volta |
12 |
0,57 |
volta, voltar, volto, voltou |
falo |
11 |
0,52 |
fala, falam, falando, falar, falei, falo |
pouco |
11 |
0,52 |
poucas, pouco |
repórter |
11 |
0,52 |
repórter, repórteres |
sentido |
11 |
0,52 |
senti, sentido, sentir, sentiu |
diferença |
11 |
0,52 |
diferença, diferenças, diferenciada, diferenciado |
relação |
10 |
0,47 |
Relação |
geral |
9 |
0,43 |
Geral |
A nuvem de palavras a
seguir contempla questões sobre relações de gênero, especificamente mulheres, e
observam-se palavras associadas como: casa, filhos, exemplo, homem, colegas,
chefe e relação.
Figura
5 - Nuvem de palavras das questões sobre relações de gênero
No Jornalismo, as
mulheres protagonizam uma disparidade de atuação bem maior que os homens e as
situações de entraves são vivenciadas constantemente em seu universo laboral,
simplesmente pelo fato de serem mulheres em atuação (Andrade; Assis, 2018).
Figura
6 - Árvore de palavras mulheres
Os termos
que aparecem nas frases, que contêm a expressão as mulheres, discorrem sobre
como estas estão conquistando cada vez mais espaço, buscam mais conhecimento,
são mais organizadas, porém, são mais desrespeitadas e questionadas. Na análise
de sentimento foram encontradas 56 frases negativas e 29 positivas. As questões
de relações de gênero não são vistas como positivas entre os participantes.
Tabela
8 - Sentimento sobre as relações de
gênero
N |
% |
|
Muito negativo |
19 |
22% |
Moderadamente negativo |
37 |
44% |
Moderadamente positivo |
22 |
26% |
Muito positivo |
7 |
8% |
Nessa
análise, é perceptível o grande desafio das mulheres na conquista de seu espaço
no mercado de trabalho, pois mesmo com os avanços alcançados, elas ainda lidam
com muitas barreiras para se estabelecerem nesse espaço já conquistado (Solon;
Araújo; Rodrigues; Nunes, 2020).
Tabela
9 - Sentimento entre homens e
mulheres
Homem (3) |
Mulher (3) |
|||
|
N |
N % |
N |
% |
Negativo |
7 |
37 62 |
19 |
76 |
Positivo |
3 |
23 38 |
6 |
24 |
Na
distinção dessa análise entre homens e mulheres, pode-se observar, pela tabela
acima, que as diferenças não são tão relevantes. Para os dois grupos a
concentração está na percepção negativa, porém, sendo maior para as mulheres.
As ponderações dos entrevistados foram sobre a sobrecarga das mulheres
que realizam, além do trabalho remunerado na sua área de atuação, atividades em
casa e cuidam de pessoas da sua família.
A sobrecarga da
mulher, ela já é maior no dia a dia e na pandemia (jornalista de Impresso - Homem).
Têm as crianças, é
muito diferente e o homem assim, na minha percepção, continuou tudo igual.
Agora a mulher, tanto é que a gente teve colega aqui que teve neném na pandemia
e quando voltou, não conseguiu mais trabalhar
(jornalista de TV - Mulher).
4 Considerações
Finais
Diante dos resultados obtidos, e
retomando os objetivos deste estudo, chegou-se às seguintes considerações: no primeiro objetivo, que visou
avaliar como o trabalho dos/das jornalistas do
Tocantins, nos anos iniciais da pandemia por COVID-19 (nos períodos de março de
2020 a dezembro de 2023), afetou sua saúde mental, percebeu-se que a mudança de
rotina e as estratégias de atuação para a contenção do vírus, foram um grande
desafio no processo de trabalho desses profissionais. O medo de contrair o
vírus, de morrer ou transmiti-lo para seus familiares foram sentimentos que
ocasionaram muita perturbação mental aos entrevistados.
Além
disso, se a rotina de trabalho desses profissionais já era esgotante antes da
pandemia, nos períodos mais intensos isso se multiplicou de forma incalculável,
pois o Home Office, como medida de proteção e segurança para os
profissionais, teve seus prós e contras. Os prós foram: mais segurança ao poder
trabalhar em casa de forma isolada e segura, como também dispor de certo conforto
propiciado nesse ambiente, entre outros.
Já os
contras indicaram que essa modalidade de trabalho os colocou em uma situação em
que sua chefia, em muitos casos e de forma abusiva, extrapolou todos os limites
possíveis na exigência e no cumprimento da carga horária. Isso fez com que
esses profissionais, de forma esgotante, se submetessem a um ritmo de trabalho adoecedor, de praticamente 24 horas de atuação, para que
produzissem constante atualização das notícias sobre a pandemia por COVID-19. A
consequência dessa sobrecarga de trabalho diária trouxe uma acentuada
desorientação de tempo e rotina fora desse contexto, entre outros prejuízos.
Assim, todo esse processo inicial de readequações exigido para a contenção do
vírus, trouxe danos gravíssimos à saúde mental dos/das jornalistas, em grande
parte, independentemente do local onde atuavam.
No
segundo objetivo, que visou analisar as condições de trabalho dos/das
jornalistas do Tocantins durante a Pandemia por COVID-19, e se essas afetaram
sua saúde mental, percebeu-se, a partir do conteúdo apresentado, que esses
atravessamentos vivenciados com relação às condições de trabalho, são
anteriores á pandemia, pois nas falas de alguns
entrevistados foi exposto que, em certas experiências, o profissional recebia
apenas o salário e tinha que arcar do próprio bolso para obter as ferramentas e
os equipamentos necessários para execução de seu trabalho. Os participantes
relataram sensação de pânico ao realizarem coberturas jornalísticas em locais
com aglomerações.
No
terceiro e último objetivo, que discutiu como os jornalistas do Tocantins lidaram com as
relações institucionais de gênero em sua jornada de trabalho durante a pandemia
por COVID-19, foi enfatizado que, quando o assunto é gênero, essa questão já se
discutia anteriormente ao período pandêmico, pois a mulher, independentemente
de sua classe profissional, se encontra sempre em um processo de busca e luta
por seu espaço no mercado de trabalho; o peso e a cobrança moral e social sobre
ela é muito grande, simplesmente pelo fato de ser mulher, independentemente da
sobrecarga de papéis e funções que ela exerça em sua vida.
Desse modo, o percurso alcançado para o desfecho deste
artigo, nos leva a percepção de que o contexto de trabalho dos/das jornalistas,
não só no Tocantins, mas de forma geral, é permeado por uma série de
atravessamentos (discutidos inclusive no material bibliográfico encontrado e
utilizado, de pesquisas executadas em outros contextos de cultura, território,
de períodos anteriores à pandemia, com ênfase e coerência no assunto), que
enfraquecem grandiosamente o exercício de sua profissão. Esses atravessamentos
interferem não só na saúde mental como também na qualidade de vida desses
profissionais.
Assim, diante dessas situações enfatizadas, como apresentar
estratégias necessárias para lidar com essas questões? É possível, diante
dessas fragilidades institucionais, estabelecer uma relação de equilíbrio e
limites entre contratado e contratante? Afinal de contas, esses profissionais
precisam trabalhar para manter seu sustento.
Caso haja essas possibilidades, de que forma isso seria
firmado? É possível propor um acordo trabalhista que beneficie ambas as partes?
Tanto o empregado como o empregador? Desse modo, acredita-se que, diante desse
cenário frágil e adoecedor, essa seria a primeira
estratégia preventiva para o autocuidado: estabelecer uma comunicação assertiva
no ato da contratação com o contratante, refletindo e avaliando em conjunto
sobre os limites e possibilidades que propiciem o bem-estar a ambas as partes.
É claro que diante desses entraves, os detentores do poder sempre terão a
vantagem. É complexo prosseguir nessa reflexão, pois diante da necessidade de
trabalhar, na maioria das vezes, os profissionais acabam vendendo sua vida e
saúde mental (Reimberg, 2020).
As estratégias individualizadas também são importantes: ter
uma rotina diária saudável de alimentação, de exercícios, de sono, de lazer, de
leitura, de construir relacionamentos saudáveis, de manter os cuidados com a
saúde etc. Mas na organização do trabalho, o que de fato vai mudar? Talvez
esses questionamentos justifiquem as limitações no desenvolver desta pesquisa.
Vale ressaltar, que mesmo a pesquisa se utilizando de
entrevistas com apenas seis jornalistas, o conteúdo extraído e analisado foi
suficiente e coerente para cumprir o percurso proposto, estando presente nas
reflexões discutidas de acordo com a bibliografia levantada.
Seria presunçoso pressupor que essa questão enfatize certo
desinteresse dos pesquisadores da comunicação em produzir pesquisas
direcionadas a essa temática? Se sim, por quê? Por não ser relevante, ou por
que diante dessas questões trabalhistas não se tem muito o que fazer? Ou pelo
fato de a pandemia trazer à tona essas questões com uma proporção gigantesca? O
fato é que o contexto precarizado de trabalho dos/das jornalistas,
independentemente das limitações apresentadas nesse estudo, de ser no período pandêmico
ou não, existe a necessidade de pesquisas/estudos com discussões mais
profundas, porém, cautelosas, sobre como esse contexto pode afetar a saúde
mental desses profissionais.
A classe profissional precisa se posicionar para mudar essa
realidade e produzir mais reflexões que possam servir para conscientizá-la
sobre a importância de vivenciar o exercício profissional em um universo
laboral que propicie não o adoecimento, mas a possibilidade de vivenciá-lo de
forma saudável e equilibrada, não responsabilizando o trabalhador pela sua
saúde/doença, mas sim analisando os processos de trabalho e a organização em
que ele se insere, visando mudanças promotoras de saúde.
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Neilson Batista
BORGES
Trabalhou na concepção e delineamento, análises e interpretações do estudo,
redação do artigo e aprovação da versão a ser publicada.
Mestre em Comunicação e Sociedade
pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), especialista em Educação especial
e inclusiva (Faveni), especialista em Atendimento
Educacional especializado e salas de recursos multifuncionais (Faveni), especialista em Psicologia Social (UNIP/GO), especialista
em psicologia comunitária pela Unileya. Psicólogo
(CEULP/ULBRA). Atua como psicólogo na Secretaria Estadual de Educação e
Cultura- SEDUC em Palmas – TO. No CNPQ participa do Grupo de Pesquisa Trabalho
e Emancipação.
Liliam Deisy GHIZONI Trabalhou na concepção
e delineamento, nas interpretações dos dados, na revisão crítica e na aprovação
da versão a ser publicada. Doutora em
Psicologia Social, do trabalho e das Organizações pela Universidade de Brasília
(UnB), Professora na Universidade Federal do Tocantins (UFT) até abril de 2024,
atualmente professora na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
Departamento de Psicologia. Líder do Grupo
de Pesquisa Trabalho e Emancipação.
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Editoras responsáveis
Ana Targina Ferraz –
Editora-chefe
Maria Lúcia Teixeira Garcia – Editora Temática
Submetido em: 24/4/2024. Revisto em: 6/8/2024.
Aceito em: 4/10/2024.
Este é um artigo publicado em acesso
aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons
Attribution, que permite uso, distribuição e
reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original
seja corretamente citado. |
[1] O
coeficiente de Pearson é um coeficiente que é empregado para mensurar em escala
métrica a correlação entre duas variáveis. Seus valores variam de -1 a 1 onde o
resultado mais próximo de -1 indica uma correlação negativa e quanto mais
próximo de 1 mais forte é essa correlação (Figueiredo; Silva, 2009).