Privatização das políticas sociais, avanço do
conservadorismo,
desafios para o serviço social
Jeane Andréia
Ferraz SILVA*
O tema desta edição da Revista Argumentum
recoloca o debate sobre a privatização das políticas sociais, o avanço do
conservadorismo e os desafios para o Serviço Social no contexto do Novo Arcabouço Fiscal (NAF), um marco na política
econômica do primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luis
Inácio Lula da Silva (2023-2026) e de continuidade do ajuste estrutural no
Brasil.
O
ajuste estrutural desde os anos 1990 integra um conjunto de proposições e
recomendações, de caráter econômico e político-institucional, dos organismos
financeiros multilaterais como o Banco Mundial, o Banco Internacional para a
Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), entre as quais
destaca-se: a abertura comercial e financeira da economia para capitais financeiros nacionais e
internacionais e grupos vinculados à exportação/importação de bens e serviços; a
desregulamentação (flexibilização) do mercado e das relações de trabalho; a
liberalização dos mercados e diminuição de poder (político e econômico) do
Estado-nação; a
retração estatal na área social, com restrição/corte dos gastos públicos para
conter o déficit fiscal e gerar superávit primário; a privatização de serviços
públicos e estatais e, a desnacionalização de empresas públicas, com
transferência para o capital privado transnacional.
Conforme
aponta Evilásio Salvador em seu artigo nesta edição: o “[...] NAF está inserido
no contexto de ajuste fiscal permanente que marca a economia brasileira, a
partir da década 1990. Ao mesmo tempo em
que os rentistas das dívidas são beneficiados com a política fiscal e
monetária, as políticas sociais sofreram fortes impactos dos instrumentos de
ajuste fiscal adotados desde então: desvinculação de recursos destinados
obrigatoriamente a áreas como Saúde e Educação [...], Lei de Responsabilidade
Fiscal e desonerações tributárias, cujos resultados são contrarreformas
previdenciárias e trabalhistas, mercantilização e privatização de políticas
sociais, subfinanciamento das políticas sociais, em especial da seguridade
social (previdência, assistência social e saúde) (Salvador, 2024, p. 16).
A
compreensão dos impactos do NAF nas políticas sociais e na vida da classe
trabalhadora brasileira ainda requer estudos/pesquisas das diversas áreas de
conhecimento e, particularmente do Serviço Social. Entretanto, observamos a
manutenção do tripé das políticas sociais no Brasil pós 1990 como a
privatização, descentralização (desconcentração) e focalização; ampliação das
parcerias público/privado (prioridade de repasse de recursos para organizações
da sociedade civil, fundações); prioridade de programas de transferência de
renda em detrimento de serviços e ações contínuas de políticas sociais. Enfim,
a continuidade do ajuste fiscal articulado com políticas sociais precárias
realizadas também sob condições e relações de trabalho precárias e
flexibilizadas.
Assim o
objetivo desta edição é debater sobre o NAF, analisando seus rebatimentos na
concepção, na gestão e no financiamento das políticas sociais e no próprio
Serviço Social, já que a política
social é uma mediação fundamental do exercício profissional no âmbito das
relações entre as classes e destas com o Estado no enfrentamento das múltiplas
expressões da questão social.
Nesta
direção, os artigos apresentados neste primeiro número da Revista Argumentum de 2024, contribuem para o aprofundamento sobre
o NAF, fundo público e sobre o debate das políticas sociais na
contemporaneidade e sua materialidade no trabalho profissional de diversas
áreas e, particularmente do Serviço Social.
Esperamos
que tenham uma boa leitura e que nestes tempos possamos fortalecer a nossa
perspectiva coletiva seja em nossos estudos/pesquisas, assim como em nossa
intervenção na realidade.
*
Assistente social. Doutora em Serviço
Social. Professora adjunto do Departamento de Serviço Social e do Programa de
Pós-Graduação em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo. (Ufes,
Vitória, Brasil). Av. Fernando Ferrari, n° 514, Goiabeiras,
Vitória (ES), CEP. 29075-910.
E-mail: jeaneandreiaferraz@gmail.com.