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Movimentos, frentes e coletivos sociais: permanências e atualizações

 

Movements, fronts, and social collectives: permanencies and updates

 

Mailiz Garibotti LUSA

Descrição: Ícone

Descrição gerada automaticamente https://orcid.org/0000-0002-6007-1383

Universidade Federal de Santa Catarina, Departamento de Serviço Social, Curso de Serviço Social,

Programa de Pós-Graduação em Serviço, Florianópolis, SC, Brasil

e-mail: mailiz.lusa@ufsc.br

 

Tiago MARTINELLI

Descrição: Ícone

Descrição gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0002-3496-0873

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Serviço Social, Curso de Serviço Social, Programa de Pós-Graduação em Política Social e Serviço Social, Porto Alegre, RS, Brasil

e-mail: timartinelli@yahoo.com.br

 

Resumo: O artigo trata da dinâmica de organização e atuação dos movimentos sociais em Porto Alegre/RS (Brasil), analisando suas demandas a fim de dar visibilidade às lutas sociais articuladas em defesa de direitos sociais. Discute os resultados de pesquisa exploratória, documental, com recorte amostral compreendido entre 2010 e 2019. A partir dessa identificação foi realizado o acompanhamento das atividades, a coleta de dados e a análise do material referente a 20 organizações coletivas. Nos resultados aponta-se que essas organizações se voltaram à elaboração de estratégias para cumprir seus propósitos; que as representações não tiveram suas atividades suspensas ou encerradas na pandemia, utilizando estratégias remotas. Conclui-se pela permanência e continuidade da luta e busca pela garantia dos direitos sociais por meio das articulações e ações realizadas.

Palavras-chave: Movimentos Sociais. Lutas Sociais. Serviço Social.

 

Abstract: The article deals with the dynamics of the organisation and actions of social movements in Porto Alegre/RS (Brazil). It analyses their demands to raise the visibility of social struggles allied in defence of social rights. It discusses the results of exploratory documentary research based on a sample taken from 2010 to 2019. Within this sample, activities were monitored and data collection and analysis of material relating to 20 collective organisations was undertaken. The results show that these organisations developed strategies to fulfil their purposes; that the representatives did not have their activities suspended or closed during the pandemic because they employed remote strategies. It is concluded that the struggle for the guarantee of social rights must continue and be maintained through the links and actions carried out.

Keywords: Social Movements. Social Struggles. Social Work.

 

O debate da pesquisa na cadência da realidade e das lutas

 

N

o curso da última década evidenciaram-se na conjuntura brasileira o recrudescimento do conservadorismo[1], o aguçamento da agenda neoliberal, o ataque às instituições, ao pacto democrático burguês dos anos 1980 e a ofensiva aos mais básicos direitos humanos e sociais. Seu curso inicial antecede ao golpe jurídico-midiático-parlamentar à presidenta Dilma Rousseff, sua continuidade caracteriza o governo ilegítimo de Temer, sua manifestação mais exacerbada numa face reacionária e violenta ocorre a partir das eleições de 2018, com o governo de Bolsonaro, e não cessa no atual terceiro governo Lula, ainda que sob nuances diferentes.

 

O cenário para a classe trabalhadora empobrecida — especialmente pretos e pretas, LGBTQIA+, de mulheres e de juventudes das periferias — foi ainda mais agravado com a eclosão da pandemia da COVID-19 entre 2020 e 2022. Nesse contexto de obscurantismo, é relevante discutir e dar visibilidade à atuação dos movimentos, frentes e coletivos sociais em suas lutas, pois antagonicamente eles materializaram estratégias cotidianas de resistência.

 

Neste ensaio são abordadas as renovadas formas de organização coletiva das lutas sociais, o que inclui tratar dos desafios que, insistentemente, fazem-se presentes e da atualização de suas pautas. Objetiva-se problematizar a permanência do horizonte emancipatório no quadro destas lutas, a fim de identificar sinais de fratura nos aportes estruturais da sociabilidade do capital. Um aspecto central é a garantia da apropriação dos debates tangentes ao processo de formação sócio-histórica brasileira, chave para compreensão dos movimentos sociais no Brasil.

 

Os dados que subsidiam a análise foram coletados em Porto Alegre[2] entre 2018 e 2020, a partir de pesquisa de tipo exploratória, documental e bibliográfica, e com utilização da análise de conteúdo, balizada pelo método do materialismo histórico e dialético. Tem relevância no aprofundamento do conhecimento sobre os movimentos sociais, mas também sobre as frentes e coletivos sociais que se apresentam como renovadas estratégias de composição das lutas, o que exigiu conhecer sua organização, estrutura, demandas e pautas articuladas à defesa de direitos sociais.

 

O recorte apresentado neste ensaio encontra-se alicerçado principalmente em estudiosos do tema na área do Serviço Social, como Duriguetto, Souza, Silva (2009) e Duriguetto, Montaño (2011), mas também em pesquisadoras das ciências sociais, como Gohn (1997, 2017). Foram realizadas buscas na Internet por meio de sites e páginas de redes sociais, bem como em panfletos, jornais e outras mídias disponibilizadas publicamente (de forma impressa e digital)[3]. Foi realizada pesquisa bibliográfica e documental com a definição da amostragem e do roteiro estruturado para coleta. A amostra foi formada pelas organizações do campo popular, em plena atividade no decênio pesquisado, com reivindicações vinculadas aos direitos humanos e sociais, logo, tangentes às políticas setoriais em que trabalham as/os assistentes sociais.

Optou-se pela técnica da análise de conteúdo como forma de melhor apreender os significados do objeto e melhor construir o conhecimento dele resultante. Foram identificadas as demandas dos movimentos, o que possibilita a proposição de estratégias de articulação entre universidade e movimentos, frentes e coletivos sociais.

 

Neste ensaio apresentam-se as particularidades da pesquisa, evidenciando que o caminho metodológico seguiu na cadência ritmada[4] das próprias lutas sociais. Na sequência, trata-se da agudização da crise, do adensamento da agenda neoliberal, do recrudescimento conservador e do papel do Serviço Social. Discorre-se sobre as lutas sociais em suas formas ampliadas de organização, evidenciadas nos espaços da vida social. Por fim, tecem-se considerações sobre a atualização da perspectiva de luta diante do cenário de reação conservadora, que implica em ameaças aos direitos sociais.

 

Agudização da crise e recrudescimento conservador: elementos para pensar as lutas, resistências e militâncias

 

Parte-se da concepção hegemônica no Serviço Social brasileiro de que “[...] movimento social caracteriza uma organização, com relativo grau de formalidade e de estabilidade, que não se reduz a uma dada atividade ou mobilização” (Duriguetto; Montaño, 2011, p. 264). Ora, um movimento social configura-se como um coletivo estruturado que resiste numa relação dialética de produção de interesses contraditórios e que, nesse processo, produz identidades e assume projetos societários que, no cotidiano, requisitam empreender lutas para resolução de demandas sociais específicas. Além disso, a estrutura presente nesse tipo de organização se expressa também na existência definida de liderança, bases e assessorias em sua organização. Com relação aos seus membros, considera-se que são militantes de uma causa, constituindo laços de pertencimento e identidade como grupo (Gohn, 2017), que vão conformando a malha do tecido social chamada de sociedade civil, espaço das lutas sociais (Duriguetto; Souza; Silva, 2009).

 

Logo, é na realidade que as lutas sociais vão constituindo-se a partir dos interesses contraditórios das classes fundamentais, que têm por objetivo a construção de projetos societários antagônicos. É nesta realidade, com esses sujeitos e no quadro dessas contradições que se encontra o Serviço Social. Trata-se de profissão inserida na divisão sociotécnica do trabalho, que vem se constituindo historicamente como área de pesquisa e de produção de conhecimento crítico, cuja “[...] reflexão interroga o que parece evidente (Yazbek, 2020, p. 13)”, tendo por referência o modus operandi do capitalismo dependente, de raízes coloniais. “Interrogações feitas à luz das transformações do sentido histórico e do lugar político [deste modus operandi] são sempre ponto de partida [...]” (Yazbek, 2020, p. 13), pois possibilitam “[...] a prospecção sobre o futuro, um olhar para frente sem indiferença” (Yazbek, 2020, 14).

 

Nomeadamente sobre o Serviço Social, considera-se a competência profissional, descrita na Lei nº 8.662/1993, de “[...] prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade” (Brasil, 1993, não paginado). Conforme o Código de Ética, isso deve ser feito de forma a “[...] apoiar e/ou participar dos movimentos sociais e organizações populares vinculados à luta pela consolidação e ampliação da democracia e dos direitos de cidadania [...]” (Brasil, 1993, não paginado), considerando como dever “[...] respeitar a autonomia dos movimentos populares e das organizações das classes trabalhadoras” (Brasil, 1993, não paginado).

 

Evidencia-se nesses preceitos legais a própria natureza interventiva da profissão, cujos fundamentos atuais da formação e do trabalho encontram-se no reconhecimento crítico da realidade. Assim, a concretude dessa dimensão necessariamente exige os aportes na realidade em sua totalidade dialética. Na particularidade brasileira, o conservadorismo[5] se intensificou nas últimas décadas, materializando-se nas diversas áreas da vida em sociedade, articulando-se a uma agenda neoliberal internacional que juntas produzem perdas de direitos duramente conquistados e extermínio de muitos sujeitos.

 

Forma-se uma força social heterogênea e prenhe de ideias que conformam uma espécie de ‘renascimento político conservador’, que por sua vez, visa restaurar valores tradicionais e idílicos. Assim, firma-se um solo fértil para a reprodução da exploração de classe, do racismo e do patriarcado, mediações estruturantes do capitalismo e traços constitutivos da formação social brasileira. [...] Resguardada no berço da ultradireita neoliberal, a empreitada conservadora lança mão de ideologias dominantes para naturalizar e reproduzir desigualdades e opressões (Cisne; Cantalice; Araujo, 2020, p. 308–309).

 

Tal processo marca a história presente, evidenciando a insígnia do capital nas relações sociais. A consequência direta da concentração de riqueza é a miséria da classe trabalhadora.

 

Quanto maiores a riqueza social, o capital em funcionamento, o volume e a energia de seu crescimento, portanto também a grandeza absoluta do proletariado e a força produtiva de seu trabalho, tanto maior o exército industrial de reserva. A força de trabalho disponível é desenvolvida pelas mesmas causas que a força expansiva do capital. A grandeza proporcional do exército industrial de reserva cresce, portanto, com as potências da riqueza. Mas quanto maior esse exército de reserva em relação ao exército ativo de trabalhadores, tanto mais maciça a superpopulação consolidada, cuja miséria está em razão inversa do suplício de seu trabalho. Quanto maior, finalmente, a camada lazarenta da classe trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior o pauperismo oficial. Essa é a lei absoluta geral, da acumulação capitalista (Marx, 1996, p. 274).

 

É nesse quadro estrutural, de contexto conjuntural, incluindo processos de lutas, que os movimentos sociais desenvolvem e assumem projetos, respostas e propostas aos problemas que enfrentam, bem como as causas amplas ou específicas a que resistem. Nesse processo histórico, tais sujeitos políticos vão adquirindo particularidades, sempre em profunda conexão com o que acontece na sociedade. É essa leitura na perspectiva da historicidade que possibilita, por exemplo, reconhecer que desde o período do Brasil Colônia houve organização coletiva, os quilombos, de caráter político, econômico e social, com fins específicos, que pode ser considerada uma das primeiras expressões de movimentos e lutas sociais. Fundamentado na experiência do movimento de rebeldia permanente organizado e dirigido pelos próprios escravizados durante o escravismo brasileiro, Moura (1989) denomina este processo de organização coletiva como ‘quilombagem.

 

No âmbito da historicidade das lutas sociais, em meados finais do século XX, setores das ciências sociais passam a diferenciar os movimentos sociais clássicos e aqueles a que chamará de novos movimentos sociais[6]. Os primeiros, caracterizados pela sua vinculação com a luta de classes, presente desde o estágio inicial do capitalismo industrial até a era dos monopólios, partiam da relação sempre desigual e explicitamente conflituosa imposta pela contradição capital-trabalho, centravam-se em ações de intervenção na esfera produtiva, buscando prejudicar a acumulação de capital e, consequentemente, o ciclo produtivo do sistema capitalista. Já os chamados novos movimentos sociais, surgem por volta da década de 1960, tendo seu período de maior desenvolvimento e expansão entre as décadas de 1970 e 1980 (Gonh, 1997). Caracterizam-se por reivindicar e ressaltar a luta de movimentos constituídos numa perspectiva que, necessariamente, não tem centralidade na discussão de classe, sendo por vezes complementares e em outras colocam-se em oposição aos movimentos de classe. Reclamam para si uma análise pluralista e culturalista, com enfoque nos sujeitos e na perspectiva individual das relações sociais, mesmo que se constituam enquanto sujeitos coletivos (Gonh, 1997; Duriguetto; Montaño, 2011).

 

Nesse sentido, pautam-se a partir de desdobramentos da questão social, que possui origem no processo de acumulação e reprodução do capital (Netto, 2001) e cujas particularidades na formação brasileira resultam do próprio cariz do capitalismo dependente, em profunda conexão latino-americana (Marini, 2005; Santos, 1971). Dentre essas especificidades da questão social, destaca-se o regime de trabalho com precária proteção social, pautado pela flexibilidade das relações e pelo baixo nível estrutural do mercado de trabalho, além dos elevados índices de desemprego e trabalho informal, que difere no capitalismo central.

 

Além da categoria ‘movimento social’, o debate conceitual vem propiciando condições para que categorias pouco abordadas, como ‘resistência’ e ‘militância’[7] ganhem visibilidade nos debates acadêmicos e dos movimentos sociais. Por isso, o maior desafio esteve em superar a falta de material em relação aos termos, buscando contribuir para o aprofundamento, sem o intuito de esgotá-las, mas fazendo provocações ao debate.

 

Resistência é um termo latente na atual conjuntura política, um período de constantes retrocessos, em que formas de resistência individuais e coletivas passam a eclodir e, em certos aspectos, a se sobressair. Elas se constituem diante de processos de imposição, dominação, exploração, mas também de transformação, localizando-se aqui um ponto de atenção.

 

O conceito de resistência aponta para a adoção de formas de defesa e de ação orientada por uma ideia central [...]. Uma atuação no campo da resistência política tem como objetivo mobilizar a sociedade (ou grupos dentro dela) [...] em torno de três pontos: a defesa e o exercício dos direitos; o enfrentamento da violência e do poder arbitrário; a retirada do consentimento ao governo ditatorial. [...]. O campo da resistência sempre se definiu em torno da convicção de uma correlação de forças adversas [...]. O segundo elemento definidor do conceito: a luta de resistência que ocorre quando se quebra o Estado de Direito e se rompem os princípios e valores que o organizam. Essa é uma luta que se forma em torno dos direitos, da legalidade, da justiça. Quem participa dela não o faz exclusiva ou prioritariamente em nome de uma bandeira ideológica ou de um projeto político partidário. Sua essência é a defesa da liberdade (Kehl, 2014, p. 342).

 

No contexto de agudização da crise e de recrudescimento conservador, por vezes, a resistência é tratada como processo espontaneísta, que submete a luta a uma posição reativa e defensiva, sem enfrentamento propositivo. Como consequência, é o opressor/oponente que dita o movimento e o ritmo do ‘combate’. É comum, no dialeto militante denominar essa prática de adesismo, do verbo ‘aderir’, com o intuito de caracterizar sujeitos coletivos que, de forma espontaneísta, aderem às demandas, gritos de ordem e pautas que surgem ao longo dos processos de luta sem relacioná-las à estrutura da realidade.

 

A natureza político-ideológica da organização determinará as características da militância e vice-versa, isso repercute na qualidade de suas ações. É a relação que há entre forma e conteúdo que manifesta a identidade da existência e da consciência da classe, uma não pode existir sem a outra. Mas, ao existirem juntas, uma carrega o ser da outra. A formação de uma é também a formação da outra (Bogo, 2010, p. 181).

 

Isso evidencia a importância do trabalho de análise estrutural da realidade a ser feito pelos coletivos, movimentos e organizações políticas. Trata-se de um trabalho de construção da crítica, a partir da raiz dos problemas, ou seja, da própria condição de explorado, concretizando-se a práxis revolucionária da conscientização, que requisita pensar a partir da própria realidade (Semeraro, 2009).

 

Para que isso ocorra o próprio processo de organização desses sujeitos coletivos deve desenvolver a dimensão da formação ideopolítica, capaz de incitar o processo de ultrapassagem do senso comum, para a consciência crítica, até que se possa atingir a consciência de classe (incluindo a passagem da ‘em si’ para a ‘per si’), lembrando que a “[...] noção de consciência é inseparável de uma certa compreensão da relação entre indivíduo e sociedade” (Iasi, 2014, p. 91). Logo, essa formação é essencial subsídio para ações e enfrentamentos coletivos.

 

Por fim, há que se dizer que “[...] a força de uma organização se localiza em dois polos: no nível da elaboração intelectual de sua militância e na capacidade de agir sobre a realidade” (Bogo, 2010, p. 187). Formação e ação andam dialeticamente articuladas, e, para tanto, são imprescindíveis os intelectuais orgânicos no quadro dos militantes[8]. “O modo de ser do novo intelectual não pode mais consistir na eloquência, motor exterior e momentâneo dos afetos, mas na inserção ativa na vida prática, como construtor, organizador [...] da técnica-trabalho, chega à técnica-ciência e à concepção humanista histórica” (Gramsci, 2004, p. 53).

 

É desde este lugar da relação entre militância, formação ideopolítica e ação que os movimentos sociais se colocam em processo de resistência frente ao recrudescimento conservador. Por isso, a “[...] importância da atuação do intelectual junto à sua classe na elaboração de uma nova concepção de mundo, no esclarecimento das relações antagônicas e das contradições profundas que perpassam a sociedade, bem como as novas formas possíveis para a sua superação” (Simionatto, 2004, p. 62).

 

Portanto, nesta sociabilidade, ante as expressões da questão social, exige-se dos movimentos acionar suas militâncias e intelectuais orgânicos a fim de construir resistências, mas, especialmente, projetos indicativos de outras sociabilidades.

 

Pautas emergentes, desafios permanentes: as lutas nos espaços da vida

 

A diversidade de organização encontrada faz com que se passe a denominar as expressões como lutas sociais ampliadas, as quais ocorrem nos múltiplos espaços da vida social, desde os ligados às demandas estruturais, como acesso à terra e à moradia, passando pela defesa da democracia, até os vinculados às demandas por direitos.

 

O momento político tem ocasionado o surgimento de uma nova dinâmica de organização coletiva para a luta. Possivelmente há quem não considere alguns grupos, coletivos, frentes e outras formas de militância e organização como lutas e movimentos sociais. Tanto a ocorrência dessas formas organizativas quanto a própria insipiência de caracterização teórica não são novos.

 

No período inicial da coleta das informações foram levantados 32 movimentos sociais, e destes incluídos 20 na amostra, de acordo com a área de luta. Foram considerados ‘movimentos sociais atuantes em Porto Alegre’ aqueles que mantêm atividades de organização interna somados à explicitação pública de atividades de lutas com pautas gerais, como a participação e a democracia, ou por pautas específicas, como pela criação de serviços e/ou pelo equipamento de atendimento às mulheres em situação de violência, ou contra a contrarreforma previdenciária. Preliminarmente alerta-se que foram incluídas no levantamento organizações que, segundo as conceituações tradicionais de movimentos e lutas sociais, não entrariam neste elenco, mas que foram consideradas no âmbito desta pesquisa. Foram utilizados materiais coletados durante as manifestações entre os meses de agosto de 2018 e junho de 2019, dentre os quais panfletos e folders de divulgação dos movimentos, incluindo identidade (linguagem visual ou escrita), reivindicações, redes sociais; e panfletos de divulgação/chamadas para atividades e atos, que incluíam pauta de reivindicações ou outras informações que foram utilizados na análise documental. Por último, foram consideradas também como fonte de informações as notícias veiculadas pela mídia tradicional e alternativa que tratavam sobre os movimentos e lutas sociais em Porto Alegre. Os dados resultantes constam no Quadro 1, a seguir.

 

Quadro 1 – Movimentos, frentes, coletivos de Porto Alegre e principal área de luta (2010–2019)

Denominação

Tipo

Principal área de luta

Movimento Nacional da População de Rua (MNPR)

Movimentos

Direitos Sociais

Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

Campesina

Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)

Territorial/Moradia

Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

Moradia

Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM)

Moradia

Movimento de Luta nos Bairros, Favelas e Vilas (MLB)

Territorial/Moradia

Movimento Escola Sem Mordaça

Frentes

Educação

Movimento por uma Universidade Popular (MUP)

Educação

Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde

Saúde

Frente pela Legalização do Aborto

Direitos das Mulheres

Frente em Defesa do Suas e da Seguridade Social

Seguridade Social

Frente Inter Antifascista

Cultura

Retomada Mbya Guarani

Indígena

Frente Quilombola

Quilombola

União da Juventude Comunista (UJC)

Coletivos

Juventude

Levante Popular da Juventude

Juventude

Coletivo LGBT Comunista

Direitos LGBT+

Movimento de Mulheres Olga Benário

Direitos das Mulheres

Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro

Direitos das Mulheres

Coletivo Negração

Étnico-Racial

Fonte: Dados da pesquisa (2019).

 

Desses movimentos evidenciou-se que o processo coletivo de reconhecimento e afirmação da identidade são determinantes na elaboração das pautas reivindicatórias. Restou explícita, ainda, a presença de reivindicações mais amplas, relacionadas a aspectos estruturais da sociedade, como o acesso à terra (urbana ou rural), e os decorrentes das necessidades sociais, como saúde, educação, moradia, lazer e trabalho. Uma atenção é necessária: a área das lutas e/ou reivindicações não definem o caráter dos movimentos como identitários ou economicistas (Gohn, 1997), pois tal caráter está muito mais ligado ao grau de consciência da articulação entre suas reivindicações e a estrutura societária.

 

No que tange à análise das principais pautas de luta, foram identificadas 75 requisições, que posteriormente foram agrupadas, resultando em 40 temas das lutas sociais. No conjunto dos temas foram consideradas, de um lado, a existência de relação entre eles e, de outro, as particularidades. São exemplos: a luta contra a redução da maioridade penal e contra o extermínio da juventude pobre e negra das periferias.

 

Quadro 2 – Pautas de luta em Porto Alegre (2010–2019)

Temas das pautas de luta em ordem alfabética

1.       Ampliação das licenças maternidade e paternidade e do período de estabilidade

2.      Apoio às atingidas/os por barragens

3.      Assistência Social

4.     Auditoria da dívida pública

5.      Contra a criminalização da pobreza e dos movimentos sociais

6.     Contra a redução da maioridade penal

7.      Contra o Estado burguês e os interesses capitalistas

8.     Contra o extermínio da juventude pobre e negra das periferias

9.     Contra opressões de classe, gênero, raça, sexo e etnia

10.    Cultura

11.     Defesa do serviço público, concursos e carreiras e contra todas as formas de privatização

12.    Defesa dos povos tradicionais

13.    Democracia, poder popular e revolução

14.    Democratização dos meios de comunicação

15.    Desenvolvimento das agroindústrias familiares

16.    Direito ao aborto legal

17.    Distribuição de renda

18.    Educação

19.    Efetivação do controle social democrático

20.   Em defesa dos movimentos sociais e da participação popular

21.    Equiparação salarial da mulher

22.   Esporte

23.   Extinção da Desvinculação das Receitas da União (DRU)

24.   Fim da violência contra a mulher

25.   Função e uso social da propriedade

26.   Melhoria das condições das penitenciárias femininas

27.   Moradia

28.   Pelo reconhecimento e respeito ao nome social

29.   Por lavanderias e restaurantes públicos

30.   Primazia das necessidades sociais sobre a rentabilidade econômica

31.    Produção de alimentos saudáveis

32.   Questão ambiental

33.    Reforma agrária

34.   Reforma tributária

35.   Reforma urbana

36.   Salários

37.   Saúde

38.   Seguridade social

39.   Trabalho digno, com boas condições e contra a precarização

40.   Universidade pública

Fonte: Dados da pesquisa (2019).

 

Foram identificadas três grandes áreas nas pautas, sendo que algumas tratam tanto de aspectos relativos à estrutura societária (24), quanto de aspectos concernentes à (re)produção social (22), ou alusivos às políticas públicas (62), por isso a totalização dos números supera o número de temas identificados anteriormente. É interessante perceber que preponderam as pautas relacionadas à defesa das políticas públicas, o que sinaliza a realidade de redução das responsabilidades estatais, de precarização na oferta dos serviços públicos e de ampliação das demandas sociais devido ao aumento da pauperização no País. Dentre as principais políticas públicas pautadas estão a saúde, a assistência social, a educação, a habitação, a cultura e a reforma agrária, que tem caráter estrutural.

 

Quanto à estrutura societária, destacam-se: as lutas contra o Estado burguês e os interesses capitalistas; a defesa da democracia, do poder popular e da revolução; a defesa dos movimentos sociais e da participação popular, bem como da efetivação do controle social democrático; pela democratização dos meios de comunicação; e pela primazia das necessidades sociais sobre a rentabilidade econômica, contrastando com a agenda neoliberal do Estado.

 

Destaca-se nesse processo a contribuição pós-moderna para o recrudescimento do conservadorismo, o que desafia as lutas sociais de perspectiva crítica e contestatória à ordem societária. Ela promove uma política fragmentada e localista, desqualificando sujeitos coletivos universais como partidos e sindicatos, enfraquecendo as lutas e contribuindo para uma cultura de passividade e conformismo. As lutas populares e as demandas por direitos são despolitizadas e burocratizadas e se adaptam às exigências do capital internacionalizado. A necessidade de uma abordagem crítica é evidente para responder aos desafios contemporâneos, mantendo a relevância da análise totalizante e da construção da ‘vontade coletiva’ (Simionatto, 2009).

 

Identificou-se também que predominam pautas que transversalizam os espaços urbanos e rurais (32), ainda que algumas delas se particularizem enquanto demandas específicas urbanas (1) e agrárias (8). Esse conjunto de pautas implica-se sob as diferentes finalidades dos movimentos sociais, cujas estratégias de enfrentamento são definidas a partir da direção ético-política que assumem. A análise demonstra as afinidades e as lutas ampliadas, sempre contemplando as especificidades e reivindicações de cada movimento social.

 

No outro lado das pautas emergentes, os movimentos apontam os desafios permanentes decorrentes da conjuntura política e econômica marcada pela repressão, pelo massacre e pela perseguição política no campo e na cidade, quais sejam: precarização das condições de trabalho; desmonte de políticas públicas; agressiva retirada de direitos e o consequente aprofundamento da desigualdade social; autoritarismo, ultraneoliberalismo e neofascismo; genocídio da juventude negra; criminalização da pobreza, materializada pela truculência policial; a retirada e a negação dos direitos sociais; estímulo ao ódio e ao preconceito às pessoas em situação de rua, taxando-as de criminosas e fomentando a agressão e a violência; repressão, fomentada por setores da mídia burguesa, das elites econômicas e de setores conservadores e reacionários; programa de governo que tipifica os movimentos de ocupação urbanas e rurais como terroristas; aparato policialesco de repressão do Estado; abandono por parte do poder público em relação aos projetos habitacionais e à reforma urbana, expresso, entre outras ações, pelos cortes de verbas nos programas habitacionais; rigidez da estrutura universitária; falta de recursos para capacitação e financiamento de projetos; privatização do Sistema Único de Saúde (SUS); ataque contra a autonomia das mulheres; desinformação generalizada da população; cercamento em território federal e isolamento de comunidade; ataque noturno com armas de fogo; ameaças aos pescadores e moradores; ameaças verbais.

 

Considerações finais: a atualização da perspectiva de luta

 

Este estudo foi orientado pela certeza da relevância e dos diversos motivos de pesquisar sobre os movimentos sociais. Em primeiro lugar, considerá-los objeto de atenção significa reconhecê-los como agentes políticos reais, com suas próprias dinâmicas, estruturas e pautas. Assim, conhecê-los a fundo é passo crucial para lidar com as questões por eles levantadas e discutir propostas de soluções, sejam elas nos marcos institucionais ou não. Em segundo lugar, ao estudá-los, cumpriu-se o papel de mapear politicamente as lutas hoje em exercício, o que serve como ‘base de dados’ do tempo presente. Por fim, mas não menos importante, investigações como essa levam para a academia as demandas das lutas, tornando-as conhecidas num espaço comumente desconectado com o mundo ‘fora dos muros’.

 

Nesse sentido, conhecer os movimentos e as lutas sociais, a fim de fortalecê-los para o enfrentamento à ordem capitalista ditada pela elite brasileira, historicamente conservadora, significa constituir outros processos coletivos junto aos trabalhadores, contribuindo para a articulação, mobilização e organização enquanto classe.

 

Diante do Estado burguês e repressor, os movimentos sociais mantiveram sua coerência e transparência nas suas ações. Assim, o estudo não expõe, mas dá visibilidade às reivindicações e contribuições que os movimentos sociais vêm trazendo ao conjunto de políticas sociais públicas, desde as reivindicações até as conquistas.

 

Notou-se que dentre as principais expressões de luta está a grande quantidade de organizações de juventude, explicitando a presença e o protagonismo desse setor da população brasileira nos processos de luta e mobilização dos últimos anos. Além disso, outra importante característica dos movimentos analisados é que a maioria (14) se identifica, do ponto de vista político-organizativo, como ‘coletivos’ e ‘frentes’, uma expressão da forma com que tais movimentos têm se organizado ante suas pautas e lutas.

 

Importante salientar que as medidas de segurança, as orientações sanitárias e o aguçamento da crise estrutural implicaram a criação de novas estratégias de luta no período pandêmico. Destacam-se as ações ou campanhas para prover alimentação, em oposição à negligência dos governos; a exigência de vacina; de condições habitacionais; de acompanhamento e debate junto aos trabalhadores, sobretudo aqueles e aquelas que foram assolados pela crise econômica e sanitária.

 

Por fim, as novidades em termos de lutas no decênio pesquisado apontam para a necessidade de creditação, a organização e a mobilização popular a partir de novas estratégias, a exemplo das torcidas organizadas, da articulação dos sindicatos e dos partidos de esquerda. Em período de aguçamento da crise e recrudescimento do conservadorismo, os movimentos sociais demonstraram mais uma vez a sua potência e a necessária força de mobilização.

 

Por último, para que verdadeiramente a pesquisa esteja na mesma cadência da realidade e das lutas sociais, é importante que ela esteja indissociada das atividades de ensino e de extensão. É dessa forma que ela se potencializa, ao passo que produz novos saberes coletivos decorrentes do surgimento de articulações com os sujeitos que se dedicam aos processos organizativos, sempre com atenção ao estabelecimento de diálogo permanente.

 

Referências

 

Barroco, M. L. da S. Direitos humanos, neoconservadorismo e neofascismo no Brasil contemporâneo. Serviço Social & Sociedade, são Paulo, n. 143, p. 12–21, jan./abr. 2022. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sssoc/a/zjrwPzBctDGqj84D74Vg4cv#. Acesso em: 14 maio 2022.

 

Bogo, Ademar. Identidade e luta de classes. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

 

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Mailiz Garibotti LUSA Trabalhou na concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados, na redação e revisão crítica do artigo, submissão e aprovação da versão a ser publicada.

Professora do Departamento e Curso de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Assistente Social pela UFSC. Doutora e mestre em Serviço Social pela PUC-SP. Pós-Doutora em Serviço Social pela UERJ. Coordenadora do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão Terra, Trabalho e Resistência do Departamento de Serviço Social (TTR-DSS-UFSC).

 

Tiago Martinelli Trabalhou na concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados, na redação e revisão crítica do artigo.

Professor do Departamento e Curso de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Política Social e Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Assistente Social pela UNISINOS. Doutor e mestre em Serviço Social pela PUC-RS. Coordenador do Grupo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Assistência Social, Movimentos Sociais e Sistemas de Proteção Social (GEPEASS/UFRGS).

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Editores responsáveis

Ana Targina Ferraz – Editora-chefe

Maria Lúcia Teixeira – Editora temática

 

 

Submetido em: 10/6/2024. Revisto em: 17/8/2024.  Aceito em: 9/10/2024.

 

 

 

Creative Common - by 4.0

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[1] O debate sobre a matriz ideológica do conservadorismo referenciada em Burke pode ser acompanhado em Souza (2016, p. 360–361): “No âmbito do debate estritamente político, o conservadorismo geralmente é associado às variadas posições contrárias aos avanços das pautas da esquerda. É implicado como conservador o indivíduo ou grupo político contrário, por exemplo, à luta pela universalização dos direitos e às demandas pela radicalização da democracia. [É] associada à adesão à ideologia do mercado, que envolve a defesa da mercantilização da vida social, até o combate aos direitos humanos. Nas instituições de produção de conhecimento, por outro lado, o conservadorismo é, [geralmente], tomado genericamente. O conteúdo [...] dessa corrente de pensamento e ação com frequência aparece fundido ao pensamento liberal”.

[2] O recorte territorial neste município justificou-se no reconhecimento do processo histórico porto-alegrense no âmbito das lutas e movimentos sociais, com reconhecimento nacional e internacional, sendo um dos marcos a experiência do Fórum Social Mundial (FSM), evento intercontinental com a primeira edição em PoA em 2001e algumas edições seguintes. Além disso, as contradições societárias presentes nesta capital produziram experiências que ganharam força e evidência nacional.

[3] A pesquisa documental fundamenta-se em fontes primárias, compostas por materiais que ainda não receberam um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados conforme os objetivos da pesquisa (Gil, 2016).

[4] Ao referir-se que o ‘caminho metodológico seguiu na cadência ritmada das próprias lutas sociais’, significa considerar o ‘ritmo’ em que os movimentos sociais acompanham a realidade sob diferentes conjunturas. Neste caso, o acompanhamento identificou regularidade, encadeamento e envolvimento autônomos dos sujeitos coletivos. O reconhecimento e respeito à processualidade das lutas constituiu-se como marco metodológico, que privilegia a própria função social da pesquisa, construindo conhecimentos a ‘partir dos’ sujeitos sociais.

[5] Alguns autores referem-se ao neoconservadorismo, tais como Barroco (2022) que define: “[...] o neoconservadorismo consiste na junção entre os valores do conservadorismo moderno e os princípios do neoliberalismo. Do conservadorismo clássico, preservam-se a tradição, a experiência, o preconceito, a ordem, a hierarquia, a autoridade, valorizando-se as instituições tradicionais, como a igreja e a família patriarcal” (Barroco, 2022, p. 13).

[6] Trata-se de tese difundida sobre os movimentos sociais, de que é representativa a obra de Maria da Glória Gohn. A referência a esta denominação não significa a concordância com a tese da inovação e, por conseguinte, sua classificação em velhos e novos movimentos, mas a referência ao período singular retratado nestes estudos. Para aprofundamento sugere-se recorrer à Duriguetto e Montaño (2011) e para a sua crítica sugere-se o acesso à Martins (2016) e Neves (2020).

[7] Partilha-se da proposição de se “[...] definir militância como metodologia para produzir ações coletivas a fim de intervir, ou interferir, nas normas sociais vigentes [...], prezando por relações horizontalizadas; operando em redes descentralizadas e autônomas; reconhecendo a pluralidade dos interesses” (Sales; Fontes; Yasui, 2018, p. 565).

[8] “[...] Intelectual orgânico não é simplesmente o intelectual do consenso, fórmula que por si mesma subtende e evoca por contraste uma noção ‘estatutária’, considerada mais íntima, mais autêntica, do intelectual como naturaliter portador de verdade, de ‘dissenso’, de ‘crítica’. Na verdade, em Gramsci, como a ideologia não é mera aparência ou dissimulação, ou falsa consciência, o intelectual orgânico não pode ser reconduzível [...] à mera vontade-capacidade de produzir consenso, mas toma corpo e adquire significado em uma peculiar função conectivo-organizativa: o consenso não é um efeito que se acresce, mas está incorporado, em formas sempre diferentes e que se renovam, naquela função de fundo” (Mezzina, 2017, p. 839).