Movimentos, frentes e
coletivos sociais: permanências e atualizações
Movements, fronts, and social collectives: permanencies and updates
Mailiz Garibotti
LUSA
https://orcid.org/0000-0002-6007-1383
Universidade
Federal de Santa Catarina, Departamento de Serviço Social, Curso de Serviço
Social,
Programa
de Pós-Graduação em Serviço, Florianópolis, SC, Brasil
e-mail: mailiz.lusa@ufsc.br
Tiago MARTINELLI
https://orcid.org/0000-0002-3496-0873
Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Serviço Social, Curso de Serviço
Social, Programa de Pós-Graduação em Política Social e Serviço Social, Porto
Alegre, RS, Brasil
e-mail: timartinelli@yahoo.com.br
Resumo: O artigo trata da
dinâmica de organização e atuação dos movimentos sociais em Porto Alegre/RS
(Brasil), analisando suas demandas a fim de dar visibilidade às lutas sociais
articuladas em defesa de direitos sociais. Discute os resultados de pesquisa
exploratória, documental, com recorte amostral compreendido entre 2010 e 2019.
A partir dessa identificação foi realizado o acompanhamento das atividades, a
coleta de dados e a análise do material referente a 20 organizações coletivas.
Nos resultados aponta-se que essas organizações se voltaram à elaboração de
estratégias para cumprir seus propósitos; que as representações não tiveram
suas atividades suspensas ou encerradas na pandemia, utilizando estratégias
remotas. Conclui-se pela permanência e continuidade da luta e busca pela
garantia dos direitos sociais por meio das articulações e ações realizadas.
Palavras-chave:
Movimentos
Sociais. Lutas Sociais. Serviço Social.
Abstract: The article deals with the dynamics of the organisation and actions of
social movements in Porto Alegre/RS (Brazil). It analyses their demands to
raise the visibility of social struggles allied in defence of social rights. It
discusses the results of exploratory documentary research based on a sample
taken from 2010 to 2019. Within this sample, activities were monitored and data
collection and analysis of material relating to 20 collective organisations was
undertaken. The results show that these organisations developed strategies to
fulfil their purposes; that the representatives did not have their activities
suspended or closed during the pandemic because they employed remote
strategies. It is concluded that the struggle for the guarantee of social
rights must continue and be maintained through the links and actions carried
out.
Keywords: Social Movements. Social Struggles. Social Work.
O debate da pesquisa na cadência da
realidade e das lutas
|
N |
o
curso da última década evidenciaram-se na conjuntura brasileira o
recrudescimento do conservadorismo[1], o
aguçamento da agenda neoliberal, o ataque às instituições, ao pacto democrático
burguês dos anos 1980 e a ofensiva aos mais básicos direitos humanos e sociais.
Seu curso inicial antecede ao golpe jurídico-midiático-parlamentar à presidenta
Dilma Rousseff, sua continuidade caracteriza o governo ilegítimo de Temer, sua
manifestação mais exacerbada numa face reacionária e violenta ocorre a partir
das eleições de 2018, com o governo de Bolsonaro, e não cessa no atual terceiro
governo Lula, ainda que sob nuances diferentes.
O
cenário para a classe trabalhadora empobrecida — especialmente pretos e pretas,
LGBTQIA+, de mulheres e de juventudes das periferias — foi ainda mais agravado
com a eclosão da pandemia da COVID-19 entre 2020 e 2022. Nesse contexto de
obscurantismo, é relevante discutir e dar visibilidade à atuação dos
movimentos, frentes e coletivos sociais em suas lutas, pois antagonicamente
eles materializaram estratégias cotidianas de resistência.
Neste
ensaio são abordadas as renovadas formas de organização coletiva das lutas
sociais, o que inclui tratar dos desafios que, insistentemente, fazem-se
presentes e da atualização de suas pautas. Objetiva-se problematizar a
permanência do horizonte emancipatório no quadro destas lutas, a fim de
identificar sinais de fratura nos aportes estruturais da sociabilidade do
capital. Um aspecto central é a garantia da apropriação dos debates tangentes
ao processo de formação sócio-histórica brasileira, chave para compreensão dos
movimentos sociais no Brasil.
Os
dados que subsidiam a análise foram coletados em Porto Alegre[2]
entre 2018 e 2020, a partir de pesquisa de tipo exploratória, documental e
bibliográfica, e com utilização da análise de conteúdo, balizada pelo método do
materialismo histórico e dialético. Tem relevância no aprofundamento do
conhecimento sobre os movimentos sociais, mas também sobre as frentes e
coletivos sociais que se apresentam como renovadas estratégias de composição
das lutas, o que exigiu conhecer sua organização, estrutura, demandas e pautas
articuladas à defesa de direitos sociais.
O
recorte apresentado neste ensaio encontra-se alicerçado principalmente em
estudiosos do tema na área do Serviço Social, como Duriguetto,
Souza, Silva (2009) e Duriguetto, Montaño
(2011), mas também em pesquisadoras das ciências sociais, como Gohn (1997, 2017). Foram realizadas buscas na Internet por
meio de sites e páginas de redes sociais, bem como em panfletos, jornais e
outras mídias disponibilizadas publicamente (de forma impressa e digital)[3].
Foi realizada pesquisa bibliográfica e documental com a definição da amostragem
e do roteiro estruturado para coleta. A amostra foi formada pelas organizações
do campo popular, em plena atividade no decênio pesquisado, com reivindicações
vinculadas aos direitos humanos e sociais, logo, tangentes às políticas
setoriais em que trabalham as/os assistentes sociais.
Optou-se
pela técnica da análise de conteúdo como forma de melhor apreender os
significados do objeto e melhor construir o conhecimento dele resultante. Foram
identificadas as demandas dos movimentos, o que possibilita a proposição de
estratégias de articulação entre universidade e movimentos, frentes e coletivos
sociais.
Neste
ensaio apresentam-se as particularidades da pesquisa, evidenciando que o
caminho metodológico seguiu na cadência ritmada[4]
das próprias lutas sociais. Na sequência, trata-se da agudização da crise, do
adensamento da agenda neoliberal, do recrudescimento conservador e do papel do
Serviço Social. Discorre-se sobre as lutas sociais em suas formas ampliadas de
organização, evidenciadas nos espaços da vida social. Por fim, tecem-se
considerações sobre a atualização da perspectiva de luta diante do cenário de
reação conservadora, que implica em ameaças aos direitos sociais.
Agudização
da crise e recrudescimento conservador: elementos para pensar as lutas,
resistências e militâncias
Parte-se
da concepção hegemônica no Serviço Social brasileiro de que “[...] movimento
social caracteriza uma organização, com relativo grau de formalidade e de
estabilidade, que não se reduz a uma dada atividade ou mobilização” (Duriguetto; Montaño, 2011,
p. 264). Ora, um movimento social configura-se como um coletivo estruturado que
resiste numa relação dialética de produção de interesses contraditórios e que,
nesse processo, produz identidades e assume projetos societários que, no
cotidiano, requisitam empreender lutas para resolução de demandas sociais
específicas. Além disso, a estrutura presente nesse tipo de organização se
expressa também na existência definida de liderança, bases e assessorias em sua
organização. Com relação aos seus membros, considera-se que são militantes de
uma causa, constituindo laços de pertencimento e identidade como grupo (Gohn, 2017), que vão conformando a malha
do tecido social chamada de sociedade civil, espaço das lutas sociais (Duriguetto; Souza; Silva, 2009).
Logo,
é na realidade que as lutas sociais vão constituindo-se a partir dos interesses
contraditórios das classes fundamentais, que têm por objetivo a construção de
projetos societários antagônicos. É nesta realidade, com esses sujeitos e no
quadro dessas contradições que se encontra o Serviço Social. Trata-se de
profissão inserida na divisão sociotécnica do trabalho, que vem se constituindo
historicamente como área de pesquisa e de produção de conhecimento crítico,
cuja “[...] reflexão interroga o que parece evidente (Yazbek, 2020, p. 13)”,
tendo por referência o modus operandi do capitalismo dependente, de
raízes coloniais. “Interrogações feitas à luz das transformações do sentido
histórico e do lugar político [deste modus operandi] são sempre ponto de
partida [...]” (Yazbek, 2020, p. 13), pois possibilitam “[...] a prospecção
sobre o futuro, um olhar para frente sem indiferença” (Yazbek,
2020, 14).
Nomeadamente
sobre o Serviço Social, considera-se a competência profissional, descrita na
Lei nº 8.662/1993, de “[...] prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais
em matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa dos
direitos civis, políticos e sociais da coletividade” (Brasil, 1993, não
paginado). Conforme o Código de Ética, isso deve ser feito de forma a “[...] apoiar
e/ou participar dos movimentos sociais e organizações populares vinculados à
luta pela consolidação e ampliação da democracia e dos direitos de cidadania [...]”
(Brasil, 1993, não paginado), considerando como dever “[...] respeitar a
autonomia dos movimentos populares e das organizações das classes
trabalhadoras” (Brasil, 1993, não paginado).
Evidencia-se
nesses preceitos legais a própria natureza interventiva da profissão, cujos
fundamentos atuais da formação e do trabalho encontram-se no reconhecimento
crítico da realidade. Assim, a concretude dessa dimensão necessariamente exige
os aportes na realidade em sua totalidade dialética. Na particularidade
brasileira, o conservadorismo[5] se
intensificou nas últimas décadas, materializando-se nas diversas áreas da vida
em sociedade, articulando-se a uma agenda neoliberal internacional que juntas
produzem perdas de direitos duramente conquistados e extermínio de muitos
sujeitos.
Forma-se uma força
social heterogênea e prenhe de ideias que conformam uma espécie de ‘renascimento
político conservador’, que por sua vez, visa restaurar valores tradicionais e
idílicos. Assim, firma-se um solo fértil para a reprodução da exploração de
classe, do racismo e do patriarcado, mediações estruturantes do capitalismo e
traços constitutivos da formação social brasileira. [...] Resguardada no berço
da ultradireita neoliberal, a empreitada conservadora lança mão de ideologias
dominantes para naturalizar e reproduzir desigualdades e opressões (Cisne;
Cantalice; Araujo, 2020, p. 308–309).
Tal
processo marca a história presente, evidenciando a insígnia do capital nas
relações sociais. A consequência direta da concentração de riqueza é a miséria
da classe trabalhadora.
Quanto maiores a
riqueza social, o capital em funcionamento, o volume e a energia de seu
crescimento, portanto também a grandeza absoluta do proletariado e a força
produtiva de seu trabalho, tanto maior o exército industrial de reserva. A
força de trabalho disponível é desenvolvida pelas mesmas causas que a força
expansiva do capital. A grandeza proporcional do exército industrial de reserva
cresce, portanto, com as potências da riqueza. Mas quanto maior esse exército
de reserva em relação ao exército ativo de trabalhadores, tanto mais maciça a
superpopulação consolidada, cuja miséria está em razão inversa do suplício de
seu trabalho. Quanto maior, finalmente, a camada lazarenta da classe
trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior o pauperismo
oficial. Essa é a lei absoluta geral, da acumulação capitalista (Marx, 1996, p. 274).
É
nesse quadro estrutural, de contexto conjuntural, incluindo processos de lutas,
que os movimentos sociais desenvolvem e assumem projetos, respostas e propostas
aos problemas que enfrentam, bem como as causas amplas ou específicas a que
resistem. Nesse processo histórico, tais sujeitos políticos vão adquirindo
particularidades, sempre em profunda conexão com o que acontece na sociedade. É
essa leitura na perspectiva da historicidade que possibilita, por exemplo,
reconhecer que desde o período do Brasil Colônia houve organização coletiva, os
quilombos, de caráter político, econômico e social, com fins específicos, que
pode ser considerada uma das primeiras expressões de movimentos e lutas
sociais. Fundamentado na experiência do movimento de
rebeldia permanente organizado e dirigido pelos próprios escravizados durante o
escravismo brasileiro, Moura (1989) denomina este processo de organização
coletiva como ‘quilombagem’.
No
âmbito da historicidade das lutas sociais, em meados finais do século XX,
setores das ciências sociais passam a diferenciar os movimentos sociais
clássicos e aqueles a que chamará de novos movimentos sociais[6].
Os primeiros, caracterizados pela sua vinculação com a luta de classes,
presente desde o estágio inicial do capitalismo industrial até a era dos
monopólios, partiam da relação sempre desigual e explicitamente conflituosa
imposta pela contradição capital-trabalho, centravam-se em ações de intervenção
na esfera produtiva, buscando prejudicar a acumulação de capital e,
consequentemente, o ciclo produtivo do sistema capitalista. Já os chamados
novos movimentos sociais, surgem por volta da década de 1960, tendo seu período
de maior desenvolvimento e expansão entre as décadas de 1970 e 1980 (Gonh, 1997). Caracterizam-se por
reivindicar e ressaltar a luta de movimentos constituídos numa perspectiva que, necessariamente, não tem centralidade na discussão de
classe, sendo por vezes complementares e em outras colocam-se em oposição aos
movimentos de classe. Reclamam para si uma análise pluralista e culturalista,
com enfoque nos sujeitos e na perspectiva individual das relações sociais,
mesmo que se constituam enquanto sujeitos coletivos (Gonh, 1997; Duriguetto;
Montaño, 2011).
Nesse
sentido, pautam-se a partir de desdobramentos da questão social, que possui
origem no processo de acumulação e reprodução do capital (Netto, 2001) e cujas particularidades na formação
brasileira resultam do próprio cariz do capitalismo dependente, em profunda
conexão latino-americana (Marini, 2005; Santos, 1971).
Dentre essas especificidades da questão social, destaca-se o regime de trabalho
com precária proteção social, pautado pela flexibilidade das relações e pelo
baixo nível estrutural do mercado de trabalho, além dos elevados índices de
desemprego e trabalho informal, que difere no capitalismo central.
Além
da categoria ‘movimento social’, o debate conceitual vem propiciando condições
para que categorias pouco abordadas, como ‘resistência’ e ‘militância’[7]
ganhem visibilidade nos debates acadêmicos e dos movimentos sociais. Por isso,
o maior desafio esteve em superar a falta de material em relação aos termos,
buscando contribuir para o aprofundamento, sem o intuito de esgotá-las, mas
fazendo provocações ao debate.
Resistência
é um termo latente na atual conjuntura política, um período de constantes
retrocessos, em que formas de resistência individuais e coletivas passam a
eclodir e, em certos aspectos, a se sobressair. Elas se constituem diante de
processos de imposição, dominação, exploração, mas também de transformação,
localizando-se aqui um ponto de atenção.
O conceito de
resistência aponta para a adoção de formas de defesa e de ação orientada por
uma ideia central [...]. Uma atuação no campo da resistência política tem como
objetivo mobilizar a sociedade (ou grupos dentro dela) [...] em torno de três
pontos: a defesa e o exercício dos direitos; o enfrentamento da violência e do
poder arbitrário; a retirada do consentimento ao governo ditatorial. [...]. O
campo da resistência sempre se definiu em torno da convicção de uma correlação
de forças adversas [...]. O segundo elemento definidor do conceito: a luta de
resistência que ocorre quando se quebra o Estado de Direito e se rompem os
princípios e valores que o organizam. Essa é uma luta que se forma em torno dos
direitos, da legalidade, da justiça. Quem participa dela não o faz exclusiva ou
prioritariamente em nome de uma bandeira ideológica ou de um projeto político
partidário. Sua essência é a defesa da liberdade (Kehl, 2014, p. 342).
No
contexto de agudização da crise e de recrudescimento conservador, por vezes, a
resistência é tratada como processo espontaneísta, que submete a luta a uma
posição reativa e defensiva, sem enfrentamento propositivo. Como consequência,
é o opressor/oponente que dita o movimento e o ritmo do ‘combate’. É comum, no
dialeto militante denominar essa prática de adesismo, do verbo ‘aderir’, com o
intuito de caracterizar sujeitos coletivos que, de forma espontaneísta, aderem
às demandas, gritos de ordem e pautas que surgem ao longo dos processos de luta
sem relacioná-las à estrutura da realidade.
A natureza
político-ideológica da organização determinará as características da militância
e vice-versa, isso repercute na qualidade de suas ações. É a relação que há
entre forma e conteúdo que manifesta a identidade da existência e da
consciência da classe, uma não pode existir sem a outra. Mas, ao existirem
juntas, uma carrega o ser da outra. A formação de uma é também a formação da
outra (Bogo,
2010, p. 181).
Isso
evidencia a importância do trabalho de análise estrutural da realidade a ser
feito pelos coletivos, movimentos e organizações políticas. Trata-se de um
trabalho de construção da crítica, a partir da raiz dos problemas, ou seja, da
própria condição de explorado, concretizando-se a práxis revolucionária da
conscientização, que requisita pensar a partir da própria realidade (Semeraro, 2009).
Para
que isso ocorra o próprio processo de organização desses sujeitos coletivos
deve desenvolver a dimensão da formação ideopolítica, capaz de incitar o
processo de ultrapassagem do senso comum, para a consciência crítica, até que
se possa atingir a consciência de classe (incluindo a passagem da ‘em si’ para
a ‘per si’), lembrando que a “[...] noção de consciência é inseparável
de uma certa compreensão da relação entre indivíduo e sociedade” (Iasi, 2014, p. 91). Logo, essa formação é essencial
subsídio para ações e enfrentamentos coletivos.
Por
fim, há que se dizer que “[...] a força de uma organização se localiza em dois
polos: no nível da elaboração intelectual de sua militância e na capacidade de
agir sobre a realidade” (Bogo, 2010, p. 187). Formação e ação andam dialeticamente
articuladas, e, para tanto, são imprescindíveis os intelectuais orgânicos no
quadro dos militantes[8].
“O modo de ser do novo intelectual não pode mais consistir na eloquência, motor
exterior e momentâneo dos afetos, mas na inserção ativa na vida prática, como
construtor, organizador [...] da técnica-trabalho, chega à técnica-ciência e à
concepção humanista histórica” (Gramsci, 2004, p.
53).
É
desde este lugar da relação entre militância, formação ideopolítica e ação que
os movimentos sociais se colocam em processo de resistência frente ao
recrudescimento conservador. Por isso, a “[...] importância da atuação do
intelectual junto à sua classe na elaboração de uma nova concepção de mundo, no
esclarecimento das relações antagônicas e das contradições profundas que
perpassam a sociedade, bem como as novas formas possíveis para a sua superação”
(Simionatto, 2004, p. 62).
Portanto,
nesta sociabilidade, ante as expressões da questão social, exige-se dos movimentos acionar suas militâncias e intelectuais
orgânicos a fim de construir resistências, mas, especialmente, projetos
indicativos de outras sociabilidades.
Pautas
emergentes, desafios permanentes: as lutas nos espaços da vida
A
diversidade de organização encontrada faz com que se passe a denominar as
expressões como lutas sociais ampliadas, as quais ocorrem nos múltiplos espaços
da vida social, desde os ligados às demandas estruturais, como acesso à terra e
à moradia, passando pela defesa da democracia, até os vinculados às demandas
por direitos.
O
momento político tem ocasionado o surgimento de uma nova dinâmica de
organização coletiva para a luta. Possivelmente há quem não considere alguns
grupos, coletivos, frentes e outras formas de militância e organização como
lutas e movimentos sociais. Tanto a ocorrência dessas formas organizativas
quanto a própria insipiência de caracterização teórica não são novos.
No
período inicial da coleta das informações foram levantados 32 movimentos
sociais, e destes incluídos 20 na amostra, de acordo com a área de luta. Foram
considerados ‘movimentos sociais atuantes em Porto Alegre’ aqueles que mantêm
atividades de organização interna somados à explicitação pública de atividades
de lutas com pautas gerais, como a participação e a democracia, ou por pautas
específicas, como pela criação de serviços e/ou pelo equipamento de atendimento
às mulheres em situação de violência, ou contra a contrarreforma
previdenciária. Preliminarmente alerta-se que foram incluídas no levantamento
organizações que, segundo as conceituações tradicionais de movimentos e lutas
sociais, não entrariam neste elenco, mas que foram consideradas no âmbito desta
pesquisa. Foram utilizados materiais coletados durante as manifestações entre
os meses de agosto de 2018 e junho de 2019, dentre os quais panfletos e folders
de divulgação dos movimentos, incluindo identidade (linguagem visual ou
escrita), reivindicações, redes sociais; e panfletos de divulgação/chamadas
para atividades e atos, que incluíam pauta de reivindicações ou outras
informações que foram utilizados na análise documental. Por último, foram
consideradas também como fonte de informações as notícias veiculadas pela mídia
tradicional e alternativa que tratavam sobre os movimentos e lutas sociais em
Porto Alegre. Os dados resultantes constam no Quadro 1, a seguir.
Quadro 1 – Movimentos, frentes,
coletivos de Porto Alegre e principal área de luta (2010–2019)
Denominação
|
Tipo |
Principal área de
luta |
Movimento Nacional da População de Rua (MNPR)
|
Movimentos |
Direitos
Sociais |
Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)
|
Campesina |
|
Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto (MTST)
|
Territorial/Moradia |
|
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
|
Moradia |
|
Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM)
|
Moradia |
|
Movimento de Luta nos Bairros, Favelas e Vilas (MLB)
|
Territorial/Moradia |
|
Movimento Escola Sem Mordaça
|
Frentes |
Educação |
Movimento por uma Universidade
Popular (MUP)
|
Educação |
|
Frente Nacional Contra a Privatização
da Saúde
|
Saúde |
|
Frente pela Legalização do Aborto
|
Direitos das Mulheres |
|
Frente em Defesa
do Suas e da Seguridade Social
|
Seguridade Social |
|
Frente Inter Antifascista
|
Cultura |
|
Retomada Mbya Guarani
|
Indígena |
|
Frente Quilombola
|
Quilombola |
|
União da Juventude Comunista (UJC)
|
Coletivos |
Juventude |
Levante Popular da Juventude
|
Juventude |
|
Coletivo LGBT Comunista
|
Direitos
LGBT+ |
|
Movimento de Mulheres Olga Benário
|
Direitos
das Mulheres |
|
Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro
|
Direitos
das Mulheres |
|
Coletivo Negração
|
Étnico-Racial |
Fonte: Dados da pesquisa
(2019).
Desses
movimentos evidenciou-se que o processo coletivo de reconhecimento e afirmação
da identidade são determinantes na elaboração das pautas reivindicatórias.
Restou explícita, ainda, a presença de reivindicações mais amplas, relacionadas
a aspectos estruturais da sociedade, como o acesso à terra (urbana ou rural), e
os decorrentes das necessidades sociais, como saúde, educação, moradia, lazer e
trabalho. Uma atenção é necessária: a área das lutas e/ou reivindicações não
definem o caráter dos movimentos como identitários ou economicistas (Gohn, 1997), pois tal caráter está muito mais ligado ao
grau de consciência da articulação entre suas reivindicações e a estrutura
societária.
No
que tange à análise das principais pautas de luta, foram identificadas 75
requisições, que posteriormente foram agrupadas, resultando em 40 temas das
lutas sociais. No conjunto dos temas foram consideradas, de um lado, a
existência de relação entre eles e, de outro, as particularidades. São
exemplos: a luta contra a redução da maioridade penal e contra o extermínio da
juventude pobre e negra das periferias.
Quadro 2 – Pautas de luta em Porto
Alegre (2010–2019)
|
1. Ampliação das
licenças maternidade e paternidade e do período de estabilidade 2. Apoio às
atingidas/os por barragens 3. Assistência Social 4. Auditoria da dívida
pública 5. Contra a
criminalização da pobreza e dos movimentos sociais 6. Contra a redução da
maioridade penal 7. Contra o Estado
burguês e os interesses capitalistas 8. Contra o extermínio
da juventude pobre e negra das periferias 9. Contra opressões de
classe, gênero, raça, sexo e etnia 10. Cultura 11. Defesa do serviço
público, concursos e carreiras e contra todas as formas de privatização 12. Defesa dos povos
tradicionais 13. Democracia, poder
popular e revolução 14. Democratização dos
meios de comunicação 15. Desenvolvimento das
agroindústrias familiares 16. Direito ao aborto
legal 17. Distribuição de
renda 18. Educação 19. Efetivação do
controle social democrático 20. Em defesa dos
movimentos sociais e da participação popular 21. Equiparação
salarial da mulher 22. Esporte 23. Extinção da
Desvinculação das Receitas da União (DRU) 24. Fim da violência
contra a mulher 25. Função e uso social
da propriedade 26. Melhoria das
condições das penitenciárias femininas 27. Moradia 28. Pelo reconhecimento
e respeito ao nome social 29. Por lavanderias e
restaurantes públicos 30. Primazia das
necessidades sociais sobre a rentabilidade econômica 31. Produção de
alimentos saudáveis 32. Questão ambiental 33. Reforma agrária 34. Reforma tributária 35. Reforma urbana 36. Salários 37. Saúde 38. Seguridade social 39. Trabalho digno, com
boas condições e contra a precarização 40. Universidade
pública |
Fonte: Dados da pesquisa (2019).
Foram
identificadas três grandes áreas nas pautas, sendo que algumas tratam tanto de
aspectos relativos à estrutura societária (24), quanto de aspectos concernentes
à (re)produção social (22), ou alusivos às políticas
públicas (62), por isso a totalização dos números supera o número de temas
identificados anteriormente. É interessante perceber que preponderam as pautas
relacionadas à defesa das políticas públicas, o que sinaliza a realidade de
redução das responsabilidades estatais, de precarização na oferta dos serviços
públicos e de ampliação das demandas sociais devido ao aumento da pauperização no
País. Dentre as principais políticas públicas pautadas estão a saúde, a
assistência social, a educação, a habitação, a cultura e a reforma agrária, que
tem caráter estrutural.
Quanto
à estrutura societária, destacam-se: as lutas contra o Estado burguês e os
interesses capitalistas; a defesa da democracia, do poder popular e da
revolução; a defesa dos movimentos sociais e da participação popular, bem como
da efetivação do controle social democrático; pela democratização dos meios de
comunicação; e pela primazia das necessidades sociais sobre a rentabilidade
econômica, contrastando com a agenda neoliberal do Estado.
Destaca-se
nesse processo a contribuição pós-moderna para o recrudescimento do
conservadorismo, o que desafia as lutas sociais de perspectiva crítica e
contestatória à ordem societária. Ela promove uma política fragmentada e
localista, desqualificando sujeitos coletivos universais como partidos e
sindicatos, enfraquecendo as lutas e contribuindo para uma cultura de
passividade e conformismo. As lutas populares e as demandas por direitos são
despolitizadas e burocratizadas e se adaptam às exigências do capital
internacionalizado. A necessidade de uma abordagem crítica é evidente para
responder aos desafios contemporâneos, mantendo a relevância da análise
totalizante e da construção da ‘vontade coletiva’ (Simionatto,
2009).
Identificou-se
também que predominam pautas que transversalizam os
espaços urbanos e rurais (32), ainda que algumas delas se particularizem
enquanto demandas específicas urbanas (1) e agrárias (8). Esse conjunto de
pautas implica-se sob as diferentes finalidades dos movimentos sociais, cujas
estratégias de enfrentamento são definidas a partir da direção ético-política
que assumem. A análise demonstra as afinidades e as lutas ampliadas, sempre
contemplando as especificidades e reivindicações de cada movimento social.
No
outro lado das pautas emergentes, os movimentos apontam os desafios permanentes
decorrentes da conjuntura política e econômica marcada pela repressão, pelo
massacre e pela perseguição política no campo e na cidade, quais sejam:
precarização das condições de trabalho; desmonte de políticas públicas;
agressiva retirada de direitos e o consequente aprofundamento da desigualdade
social; autoritarismo, ultraneoliberalismo e
neofascismo; genocídio da juventude negra; criminalização da pobreza,
materializada pela truculência policial; a retirada e a negação dos direitos
sociais; estímulo ao ódio e ao preconceito às pessoas em situação de rua,
taxando-as de criminosas e fomentando a agressão e a violência; repressão,
fomentada por setores da mídia burguesa, das elites econômicas e de setores
conservadores e reacionários; programa de governo que tipifica os movimentos de
ocupação urbanas e rurais como terroristas; aparato policialesco de repressão
do Estado; abandono por parte do poder público em relação aos projetos
habitacionais e à reforma urbana, expresso, entre outras ações, pelos cortes de
verbas nos programas habitacionais; rigidez da estrutura universitária; falta
de recursos para capacitação e financiamento de projetos; privatização do Sistema
Único de Saúde (SUS); ataque contra a autonomia das mulheres; desinformação
generalizada da população; cercamento em território federal e isolamento de
comunidade; ataque noturno com armas de fogo; ameaças aos pescadores e
moradores; ameaças verbais.
Considerações finais: a atualização da
perspectiva de luta
Este
estudo foi orientado pela certeza da relevância e dos diversos motivos de
pesquisar sobre os movimentos sociais. Em primeiro lugar, considerá-los objeto
de atenção significa reconhecê-los como agentes políticos reais, com suas
próprias dinâmicas, estruturas e pautas. Assim, conhecê-los a fundo é passo
crucial para lidar com as questões por eles levantadas e discutir propostas de
soluções, sejam elas nos marcos institucionais ou não. Em segundo lugar, ao
estudá-los, cumpriu-se o papel de mapear politicamente as lutas hoje em
exercício, o que serve como ‘base de dados’ do tempo presente. Por fim, mas não
menos importante, investigações como essa levam para a academia as demandas das
lutas, tornando-as conhecidas num espaço comumente desconectado com o mundo
‘fora dos muros’.
Nesse
sentido, conhecer os movimentos e as lutas sociais, a fim de fortalecê-los para
o enfrentamento à ordem capitalista ditada pela elite brasileira,
historicamente conservadora, significa constituir outros processos coletivos
junto aos trabalhadores, contribuindo para a articulação, mobilização e
organização enquanto classe.
Diante
do Estado burguês e repressor, os movimentos sociais mantiveram sua coerência e
transparência nas suas ações. Assim, o estudo não expõe, mas dá visibilidade às
reivindicações e contribuições que os movimentos sociais vêm trazendo ao
conjunto de políticas sociais públicas, desde as reivindicações até as
conquistas.
Notou-se
que dentre as principais expressões de luta está a grande quantidade de
organizações de juventude, explicitando a presença e o protagonismo desse setor
da população brasileira nos processos de luta e mobilização dos últimos anos.
Além disso, outra importante característica dos movimentos analisados é que a
maioria (14) se identifica, do ponto de vista político-organizativo, como ‘coletivos’
e ‘frentes’, uma expressão da forma com que tais movimentos têm se organizado
ante suas pautas e lutas.
Importante
salientar que as medidas de segurança, as orientações sanitárias e o aguçamento
da crise estrutural implicaram a criação de novas estratégias de luta no
período pandêmico. Destacam-se as ações ou campanhas para prover alimentação,
em oposição à negligência dos governos; a exigência de vacina; de condições
habitacionais; de acompanhamento e debate junto aos trabalhadores, sobretudo
aqueles e aquelas que foram assolados pela crise econômica e sanitária.
Por
fim, as novidades em termos de lutas no decênio pesquisado apontam para a
necessidade de creditação, a organização e a mobilização popular a partir de
novas estratégias, a exemplo das torcidas organizadas, da articulação dos
sindicatos e dos partidos de esquerda. Em período de aguçamento da crise e
recrudescimento do conservadorismo, os movimentos sociais demonstraram mais uma
vez a sua potência e a necessária força de mobilização.
Por
último, para que verdadeiramente a pesquisa esteja na mesma cadência da
realidade e das lutas sociais, é importante que ela esteja indissociada das
atividades de ensino e de extensão. É dessa forma que ela se potencializa, ao
passo que produz novos saberes coletivos decorrentes do surgimento de
articulações com os sujeitos que se dedicam aos processos organizativos, sempre
com atenção ao estabelecimento de diálogo permanente.
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Mailiz Garibotti LUSA Trabalhou na
concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados, na redação e
revisão crítica do artigo, submissão e aprovação da versão a ser publicada.
Professora
do Departamento e Curso de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em
Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Assistente
Social pela UFSC. Doutora e mestre em Serviço Social pela PUC-SP. Pós-Doutora
em Serviço Social pela UERJ. Coordenadora do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão
Terra, Trabalho e Resistência do Departamento de Serviço Social (TTR-DSS-UFSC).
Tiago Martinelli Trabalhou na
concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados, na redação e revisão
crítica do artigo.
Professor
do Departamento e Curso de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em
Política Social e Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Assistente Social pela UNISINOS. Doutor e mestre em Serviço Social
pela PUC-RS. Coordenador do Grupo de Estudos, Pesquisas e Extensão em
Assistência Social, Movimentos Sociais e Sistemas de Proteção Social
(GEPEASS/UFRGS).
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Editores responsáveis
Ana Targina Ferraz –
Editora-chefe
Maria Lúcia Teixeira – Editora temática
Submetido
em: 10/6/2024. Revisto em: 17/8/2024. Aceito em: 9/10/2024.
|
Este é um artigo publicado em acesso
aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons
Attribution, que permite uso, distribuição e
reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original
seja corretamente citado. |
[1] O
debate sobre a matriz ideológica do conservadorismo referenciada em Burke pode
ser acompanhado em Souza (2016, p. 360–361): “No âmbito do debate estritamente
político, o conservadorismo geralmente é associado às variadas posições
contrárias aos avanços das pautas da esquerda. É implicado como conservador o
indivíduo ou grupo político contrário, por exemplo, à luta pela universalização
dos direitos e às demandas pela radicalização da democracia. [É] associada à
adesão à ideologia do mercado, que envolve a defesa da mercantilização da vida
social, até o combate aos direitos humanos. Nas instituições de produção de
conhecimento, por outro lado, o conservadorismo é, [geralmente], tomado
genericamente. O conteúdo [...] dessa corrente de pensamento e ação com
frequência aparece fundido ao pensamento liberal”.
[2] O
recorte territorial neste município justificou-se no reconhecimento do processo
histórico porto-alegrense no âmbito das lutas e movimentos sociais, com
reconhecimento nacional e internacional, sendo um dos marcos a experiência do
Fórum Social Mundial (FSM), evento intercontinental com a primeira edição em
PoA em 2001e algumas edições seguintes. Além disso, as contradições societárias
presentes nesta capital produziram experiências que ganharam força e evidência
nacional.
[3] A pesquisa
documental fundamenta-se em fontes primárias, compostas por materiais que ainda
não receberam um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados
conforme os objetivos da pesquisa (Gil, 2016).
[4] Ao referir-se que o ‘caminho
metodológico seguiu na cadência ritmada das próprias lutas sociais’, significa
considerar o ‘ritmo’ em que os movimentos sociais acompanham a realidade sob
diferentes conjunturas. Neste caso, o acompanhamento identificou regularidade,
encadeamento e envolvimento autônomos dos sujeitos coletivos. O reconhecimento
e respeito à processualidade das lutas constituiu-se como marco metodológico,
que privilegia a própria função social da pesquisa, construindo conhecimentos a
‘partir dos’ sujeitos sociais.
[5]
Alguns autores referem-se ao neoconservadorismo, tais como Barroco (2022) que
define: “[...] o neoconservadorismo consiste na junção entre os valores do
conservadorismo moderno e os princípios do neoliberalismo. Do conservadorismo
clássico, preservam-se a tradição, a experiência, o preconceito, a ordem, a
hierarquia, a autoridade, valorizando-se as instituições tradicionais, como a
igreja e a família patriarcal” (Barroco, 2022, p. 13).
[6]
Trata-se de tese difundida sobre os movimentos sociais, de que é representativa
a obra de Maria da Glória Gohn. A referência a esta denominação não significa a
concordância com a tese da inovação e, por conseguinte, sua classificação em
velhos e novos movimentos, mas a referência ao período singular retratado
nestes estudos. Para aprofundamento sugere-se recorrer à Duriguetto e Montaño
(2011) e para a sua crítica sugere-se o acesso à Martins (2016) e Neves (2020).
[7]
Partilha-se da proposição de se “[...] definir militância como metodologia para produzir
ações coletivas a fim de intervir, ou interferir, nas normas sociais vigentes [...],
prezando por relações horizontalizadas; operando em redes descentralizadas e
autônomas; reconhecendo a pluralidade dos interesses” (Sales; Fontes;
Yasui, 2018, p. 565).
[8]
“[...] Intelectual
orgânico não é simplesmente o intelectual do consenso, fórmula que por si mesma
subtende e evoca por contraste uma noção ‘estatutária’, considerada mais
íntima, mais autêntica, do intelectual como naturaliter portador de
verdade, de ‘dissenso’, de ‘crítica’. Na verdade, em Gramsci, como a ideologia
não é mera aparência ou dissimulação, ou falsa consciência, o intelectual
orgânico não pode ser reconduzível [...] à mera vontade-capacidade de produzir
consenso, mas toma corpo e adquire significado em uma peculiar função
conectivo-organizativa: o consenso não é um efeito que se acresce, mas está
incorporado, em formas sempre diferentes e que se renovam, naquela função de
fundo” (Mezzina, 2017, p. 839).