Crtica radical e antirracismo: um debate urgente
para o Servio Social brasileiro
Radical
criticism and anti-racism: an urgent debate for Brazilian Social Services
Iara Vanessa Fraga de SANTANA*
Universidade Estadual
do Cear, Curso de Servio Social, Centro de Estudos Sociais Aplicados,
Fortaleza, CE, Brasil.
E-mail: iara.santana@uece.br
https://orcid.org/0009-0001-3718-2739
Tales Willyan Fornazier MOREIRA
Universidade Federal
dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Curso de Servio Social,
Departamento de
Cincias Humanas e Sociais, Tefilo Otoni, MG, Brasil.
e-mail: taleswf@live.com
https://orcid.org/0000-0002-9191-7820
Introduo
C |
onforme evidenciado por Souza (2024)[1], h em curso no Brasil contemporneo
uma intensa disputa poltica e terica em torno do debate das relaes
tnico-raciais e do antirracismo, em que comparecem trs principais tendncias
na disputa pela hegemonia do debate: i) a perspectiva
liberal, a-crtica ao capital, calcada no individualismo e reprodutora da
lgica da sociedade de classes, que aponta como sada para o racismo o
empreendedorismo negro / afroempreendedorismo, a representatividade nos espaos
de poder[2] e a construo de uma elite negra; ii)
a de vis culturalista, puramente
essencialista, que reivindica um afrocentrismo
apartado das determinaes estruturais de classe como forma de negao ao
eurocentrismo[3], clamando por uma frica a-histrica e
idlica[4] e; iii) a perspectiva crtica, que tem como caracterstica central a relao
estrutural entre raa-etnia e classe, antirracismo e anticapitalismo.
Frente a esse cenrio de disputas que
se coloca nesse campo, reafirmar o mtodo e a perspectiva indissocivel entre
classe e raa-etnia, antirracismo e anticapitalismo, condio sine qua non para avanarmos na crtica
radical ao racismo e para a superao do capitalismo com todas suas opresses
e violncias estruturais. Esta se refere a uma tarefa histrica que se coloca
para ns de maneira central no tempo presente, cuja prpria dinmica da
realidade e o movimento da histria nos convoca a realizarmos as necessrias costuras da vida[5] e construirmos mediaes no plano
terico e poltico que mirem para um horizonte estratgico revolucionrio e
humanamente emancipado. Em outros termos, mediaes que nos permitam construir
uma sociedade anticapitalista, livre de explorao/opresso e desracializada[6].
Nesse movimento, urgente tambm
reconhecermos as trajetrias dos povos indgenas e comunidades tradicionais que
sobreviveram sculos de colonizao-escravido. Suas histrias, memrias e
saberes historicamente expropriados e invisibilizados, podem tambm apontar
caminhos possveis para o enfrentamento ao racismo. nos corpos-territrios
desses povos que a ganncia pelo lucro capitalista encontra a fonte de riquezas
desde o processo de acumulao primitiva at a atual fase de acumulao. E esse
contexto gerador de diversas expresses da questo social, atravessa os
variados espaos scio-ocupacionais do Servio Social, nos convidando,
portanto, a conhecer essa realidade para transform-la.
As reflexes seguintes esto divididas
em dois tpicos que evidenciam a necessidade de o Servio Social realizar as
crticas e autocrticas necessrias para o real enfrentamento ao racismo. O
primeiro realiza aproximaes iniciais sobre os territrios de povos indgenas
e comunidades tradicionais, a partir da relao raa-etnia-territrio-luta de
classes, enfatizando a necessidade de avanarmos na construo de conhecimentos
para o exerccio profissional junto a esses territrios. O segundo trata do antirracismo
no Servio Social, registrando os importantes avanos construdos pela
profisso, em especial nos ltimos anos, mas tambm evidenciando os
significativos desafios que ainda comparecem nesse campo e que urge superarmos,
rumando a construo de uma sociedade sem racismo.
Dilogos desde os territrios de povos e comunidades
tradicionais
Na cadncia acelerada deste tempo em
que as relaes sociais constitutivas de racismo alcanaram reconhecimento,
ocupando desde as prateleiras das corporaes mundiais at as bibliotecas
comunitrias, h de se ter cautela.
Essas resultam dos sculos de movimentao do povo negro e indgena, que
tem incio ainda nas expropriaes coloniais, seguida da travessia do
atlntico. As revoltas, insurgncias, aquilombamentos e greves fincaram as
razes dos movimentos negro e indgena na construo do antirracismo. Mesmo com
a morte, o apagamento, o roubo e a apropriao da cincia produzida por esses
povos, conseguiram ecoar alm-mar vestgios que subsidiaram as anlises em
torno da questo tnico racial.
Essas se avolumaram nos marcos do
movimento negro e indgena na segunda metade do sculo XX e possibilitaram
ramificaes diversas que ora rompem, ora reproduzem as contradies da
sociedade classes. E talvez, ou inclusive por isso, possvel encontrar nas
fraes da classe trabalhadora, respostas para o enfrentamento ao racismo que
se conectam com a multiplicidade dos nveis de alienao aos quais estamos
imersos(as). A ttulo de exemplo, apesar de escassas, podemos observar
candidaturas de indgenas alinhadas com a extrema direita que explicitamente
declaram guerra aos territrios originrios. Ou, ainda, publicaes e projetos
que enaltecem o poder de negros(as) mesmo que sejam alguns(mas) poucos(as) ,
que venceram e chegaram ao topo, via empreendedorismo e fora de vontade.
Nessa esteira, ocupamos o trecho
advindo dos acmulos do Servio Social renovado, cujo mtodo [...] permanece
mudando ou muda permanecendo (Bagli, 2006, p. 81). H de se evidenciar que as
reprodues equivocadas de um marxismo ortodoxo no mbito do Servio Social
brasileiro, retardaram a construo de uma prxis antirracista na profisso e
ainda possvel encontrarmos nos
dias atuais anlises sob essas sombras.
Nesse processo de crtica e autocrtica
levantamos: quem de ns durante a formao ouviu referncia primeira greve
geral urbana de trabalhadores(as), ocorrida no ano de 1857, liderada por
negros(as) de ganho? Ou, sobre a greve de jangadeiros em 1881, com a
fundamental mobilizao de mulheres, que paralisou o transporte de negros(as)
escravizados(as) dos navios negreiros para a terra? Ambas duraram semanas,
desestabilizaram a economia de transio do escravismo para o capitalismo, mas
no ganharam as folhas de leituras nas nossas graduaes.
Porm, como [...] no caminho da luz
todo mundo preto [...][7] e [...] a viva contradio
apresenta-se no novo que se constri, no velho que se destri e, sobretudo,
naquilo que se reconstri, seja sobre novas ou antigas formas [...] (Bagli,
2006, p. 81), alinhamos essas reflexes a um exerccio coletivo de tessitura do
enfrentamento ao racismo numa perspectiva da crtica radical sociabilidade
capitalista que, por sua vez, tambm racista e patriarcal.
Ao girarmos as velas do barco,
escolhemos rumar para o dilogo com a realidade antiga e atual dos povos
indgenas e comunidades tradicionais, buscando identificar contribuies para a
luta antirracista, pois so esses grupos populacionais que permanecem sendo os
principais alvos da necessidade de lucratividade do capital.
No primeiro momento, de acumulao
primitiva, as metrpoles europeias exploraram os bens da natureza que eram
cultivados, zelados e socializados pelos povos originrios na
latinoamrica. chamada de
primitiva [...] porque constitui a pr-histria do capital e do modo de
produo que lhe corresponde (Marx, 2013, p. 514).
A princpio, os cercamentos e a
expulso violenta das populaes camponesas no hemisfrio norte, depois o
extermnio e escravizao das populaes originrias ao sul. Assim, os quase
quatrocentos anos de escravido indgena e negra banhou de sangue e suor a
histria deste pas. Por essa razo, [...] a transformao da frica [e
Amrica Latina grifo nosso] numa reserva para a caa comercial de
peles-negras caracteriza a aurora da era da produo capitalista. Esses
processos idlicos constituem momentos fundamentais da acumulao primitiva
(Marx, 2013, p. 533).
Digamos que essa juno riquezas naturais x povos originrios
(sejam das Amricas ou da frica), foi fundamental para a formao da economia
brasileira que vivemos hoje, reveladora da questo racial e agrria no
resolvidas. Prado Jr. (1961) rompe com os escritos sobre o Brasil feudal e nos auxilia a compreender esse lugar do pas
inserido na dominao da burguesia europeia. Apesar dos seus estudos terem como
ponto de partida a chegada dos portugueses com suas estratgias de ocupao
desconsiderando os povos que j se encontravam aqui , contribui para
entendermos esse lugar do Brasil dependente e subalternizado.
Cultiva-se a
cana como se extrai o ouro, como mais tarde se plantar o algodo ou caf:
simples oportunidade do momento, com vistas para um mercado exterior longnquo,
um comrcio estvel e precrio sempre. [...] a colonizao no se orienta no
sentido de constituir uma base econmica slida e orgnica, isto , a
explorao racional e coerente dos recursos do territrio para satisfao das
necessidades materiais da populao que nela habita (Prado Jr., 1961, p. 67).
O extrativismo, as grandes monoculturas
nos sistemas de sesmarias, alterando a diversidade de algumas biomas
brasileiros, bem como a minerao, so expresses do capitalismo que recria
mtodos de colonizao (Souza, 2024). Ainda no que se refere as reflexes aqui
tecidas sobre terra e territrios tnicos, tambm cabe destacar que Prado Jr.
(1961) no reconhece a subalternizao das populaes racializadas negras e
indgenas como essencial para a realizao desse projeto capitalista e
patriarcal de extermnio. Ao contrrio, defende em seus escritos a tese da
mestiagem, sugerindo inclusive em algumas passagens a superioridade e evoluo
dos colonos europeus em detrimentos daqueles(as).
A outra funo
do escravo, ou antes da mulher escrava, instrumento de satisfao das
necessidades sexuais de seus senhores e dominadores, no tem um efeito menos
elementar. No ultrapassar tambm o nvel primrio e puramente animal do
contato sexual, no se aproximando seno muito remotamente da esfera
propriamente humana do amor, em que o ato sexual se envolve de todo um complexo
de emoes e sentimentos to amplos que chegam at a fazer passar para o
segundo plano aquele ato que afinal lhe deu origem (Prado Jr., 1961, p. 115).
Em dilogo com esse autor, Gonzalez
(1984) tece profundas crticas e nos convida a pensar um Brasil verdadeiramente
dos de baixo, a partir de uma
histria que no nega o estatuto de
sujeito humano s populaes negras e indgenas. Tratados sempre como
objetos. At mesmo como objeto de saber. por a que a gente compreende a
resistncia de certas anlises que, ao insistirem na prioridade da luta de
classes, se negam a incorporar as categorias de raa e sexo. Ou seja, insistem
em esquec-las (Gonzalez, 1984, p. 232). Essa concepo equivocada que trata
classe como mera abstrao e desconsidera sua diversidade, expresso daquele
marxismo ortodoxo, que tambm racista e sexista.
Dito isso, oportuno destacar as
expropriaes contemporneas na certeza de que [...] a violncia a parteira
de toda a sociedade velha que est prenhe de uma sociedade nova (Marx, 2013,
p. 821). Nesta fase do desenvolvimento veloz do capitalismo, em busca de
recomposio das taxas de lucratividade a fim de sair de mais uma crise, os
bens comuns da natureza tm sido a principal estratgia. A chamada destruio criativa da terra e de outros
bens comuns como os minrios, a gua, o ar e at o sol, vem sendo fundamental
para acumulao de capitais, haja vista serem meios de produo doados pela natureza e no demandarem
grandes investimentos em capital constante (Harvey, 2011, p. 151).
Montanhas inteiras so cortadas ao meio medida que minerais so extrados,
criando cicatrizes de pedreiras nas paisagens, com fluxos de resduos em
crregos, rios e oceanos; a agricultura devasta o solo e, por centenas de
quilmetros quadrados, florestas e matos so erradicados acidentalmente como
resultado da ao humana, enquanto a queima das florestas na Amaznia,
consequncia da ao voraz e ilegal de pecuaristas e produtores de soja, leva
erosao da terra (Harvey, 2011, p.151).
Por estabelecerem uma relao
diferenciada daquela com a natureza, esses bens comuns se encontram melhor
mantidos nas terras e territrios dos povos e comunidades tradicionais e, por
isso, esses voltam a ser os principais alvos de acumulao na contemporaneidade.
De acordo com o Decreto 6.040/2007 (BRASIL, 2007)[8],
essas populaes so constitudas por:
[...] grupos
culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas
prprias de organizao social, que ocupam e usam territrios e recursos
naturais como condio para sua reproduo cultural, social, religiosa,
ancestral e econmica, utilizando conhecimentos, inovaes e prticas gerados e
transmitidos pela tradio; II - Territrios Tradicionais: os espaos
necessrios a reproduo cultural, social e econmica dos povos e comunidades
tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporria,
observado, no que diz respeito aos povos indgenas e quilombolas,
respectivamente, o que dispem os arts. 231 da Constituio e 68 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias e demais regulamentaes (Brasil, 2007,
no paginado).
No esteio dos processos de resistncia
desses povos e comunidades tradicionais, estes tambm conquistaram a criao do
Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), a partir do
Decreto n 8.750, de 9 de maio de 2016 (BRASIL, 2016). Ocupam assento no CNPCT
povos indgenas, quilombolas, ciganos, povos de terreiro de matriz africana,
pescadores(as) artesanais, extrativistas, extrativistas costeiros e marinhos,
caiaras, faxinalenses, benzedeiros(as), raizeiros(as), geraizeiros(as), caatingueiros(as),
vazanteiros(as), veredeiros(as), apanhadores(as) de flores sempre vivas,
pantaneiros(as), ribeirinhos(as) e comunidades de fundos e fechos de pasto.
De acordo com o Relatrio sobre os
Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais do Conselho Nacional dos Direitos
Humanos (CNDH) do ano de 2018, esses territrios vivenciam diversas violaes
de direitos realizadas pelo capital com amparo do Estado. Resultante da
realizao de misses em alguns dos territrios distribudos em todo o pas, o
relatrio ao passo que visibiliza as particularidades do modo de vida desses
povos e comunidades, a exemplo das prticas de sade realizadas por parteiras,
benzedeiras e raizeiras, tambm denuncia a ameaa de continuidade de suas
histrias.
A experincia
de povos e comunidades tradicionais com seus territrios implicam tambm em um
sentimento de pertencimento a um lugar, nutrido pela memria do seu processo de
ocupao, incluindo eventos e pessoas de um passado comum; pelo apego
paisagem em que nasceram e se criaram os membros da comunidade, ao longo de
geraes; pela familiaridade adquirida com o lugar e cada um dos seus elementos
materiais e simblicos (Brasil, 2018, p. 21).
H uma tendncia de os processos de
expropriao alcanarem a vida em sua totalidade, alm da terra e do territrio
(natureza fundiria), os bens de uso comum, a partir do trabalho e, por sua
vez, o conhecimento produzido[9]. Esses processos incidem tambm sobre
as relaes culturais, tradies, sobre conquistas sociais como o direito
sade e educao, por exemplo, crescentemente privatizados (Fontes, 2010).
Kopenawa; Bruce (2015) nos faz recordar
que o ensino sobre a demarcao das terras e dos territrios adveio do homem branco. Assim, [...] a
demarcao, diviso de terra, traar fronteira costume de branco, no do
ndio. Brasileiro ensinou a demarcar terra indgena, ento a gente passamos a
lutar por isso (Kopenawa; Bruce, 2015, p. 36), destacando a juno questo
racial e agrria.
O Mapa de Conflitos: Injustia
Ambiental e Sade no Brasil da Fundao Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgado em
2024, identificou 297 conflitos no ano de 2010 e, at o momento, somam-se 640
situaes de injustia ambiental que envolvem, principalmente, a violncia e
expropriao dos megaprojetos do capital contra territrios de povos e
comunidades tradicionais, ou de periferias e ocupaes urbanas. Tal realidade
reafirma a leitura de totalidade e no recortada da diviso social e racial do
trabalho, uma vez que a luta de classes no Brasil determinada tambm pela
origem tnico-racial dos(das) trabalhadores(as) desde o incio. Portanto, so
aquelas populaes com suas riquezas naturais[10]
que permanecem sendo exploradas, evidenciando o racismo ambiental.
O Relatrio do Conselho Indigenista
Missionrio (CIMI), lanado em julho de 2024 com dados de 2023, anuncia as consequncias
de quatro anos de governo anti-indgena
e os poucos e lentos avanos do atual governo que criou o Ministrio dos Povos
Indgenas. De acordo com o levantamento realizado, foi identificado a continuidade de altos ndices de
violncia contra indgenas e a ocorrncia de muitos conflitos e invases aos
territrios tradicionais. As expropriaes realizadas nesses territrios,
tambm podem ser compreendidas a partir das contribuies de Pankararu (2022).
Esse
cenrio deletrio no muda quando miramos os territrios quilombolas. Estudo
recente realizado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e a Coordenao Nacional
das Comunidades Quilombolas (CONAQ) (Oviedo;
Lima; Sousa, 2024) afirma que 98% dos quilombos
reconhecidos (so 485) esto ameaados por obras de infraestrutura,
requerimentos minerrios e por sobreposies de imveis particulares. A
incidncia de obras de infraestrutura corresponde a 57,9% totalizando 286
territrios quilombolas, impactando 1.931.583,9 ha (Oviedo; Lima; Sousa, 2024).
Essa realidade se apresenta no
cotidiano do trabalho das(os) assistentes sociais de diversas formas e nos
variados espaos scio-ocupacionais, o que nos impe conhecer para transformar,
necessariamente rompendo com prticas racistas.
Os brancos nos
chamam de ignorantes apenas porque somos gente diferente deles. Na verdade, o
pensamento deles que se mostra curso e obscuro. No consegue se expandir e se
elevar, porque eles querem ignorar a morte. [...] por isso que suas palavras
ficam to ruins e emaranhadas. No queremos mais ouvi-las. Para ns, a poltica
outra coisa. So as palavras de Omama e dos xapiri que ele nos deixou. So as
palavras que escutamos no tempo dos sonhos e que preferimos, pois so nossas
mesmo. Os brancos no sonham to longe quanto ns. Dormem muito, mas s sonham
consigo mesmos (Kopenawa; Bruce, 2015, p. 37).
Dialogar com o conhecimento produzido
ancestralmente por indgenas, quilombolas, quebradeiras de cco, comunidades de
fundo de pasto, de terreiro, pescadores(as) e tantas outras, pode ser uma das
estratgias indispensveis para a construo de uma prxis radicalmente
antirracista, a qual pressupe o enfrentamento ao capitalismo, considerando a
relao entre terra-raa/etnia-classe.
O antirracismo no Servio Social brasileiro: rupturas e
permanncias
No mbito do Servio Social brasileiro,
o debate tnico-racial e do antirracismo tambm tem se colocado como uma das
questes mais candentes nesta quadra histrica, haja vista todo o processo de
construo em torno desse debate, protagonizado h dcadas por assistentes
sociais negras e, em especial, pela centralidade que a discusso tem ganhado na
agenda poltica das entidades profissionais, ampliando expressivamente o debate
na categoria a partir dos meados da ltima dcada[11]
(Moreira, 2024).
Cabe mencionar, desse modo, que as
perspectivas terico-polticas em disputa presentes no interior dos movimentos
antirracistas e da sociedade em geral, tambm encontram eco na profisso, sendo
necessrio, portanto, apreender o Servio Social articulado ao movimento da
histria (Iamamoto, 2019), uma vez que a dinmica do real incide diretamente
nos processos de formao e trabalho profissional, no sendo possvel
conceb-lo a partir de uma perspectiva ensimesmada, como se fosse uma ilha isolada da sociedade.
Considerando que a profisso e seus
agentes so parte e expresso desse processo mais amplo, e que tambm comparece
no debate da categoria perspectivas polticas e tericas diversas, esse cenrio
nos exige ainda mais coerncia e radicalidade com o mtodo para a apreenso da
realidade em uma perspectiva de totalidade histrica, recusando concepes
liberais, conservadoras, antimarxistas, culturalistas, essencialistas e
pautadas na poltica identitria[12]. imprescindvel, portanto,
avanarmos nessa direo radical, sobremaneira, nesse momento estratgico de
ampliao do debate na profisso, tendo em vista que:
Estamos em um
cenrio decisivo em relao aos rumos do debate tnico-racial e do antirracismo
na profisso, uma vez que a virada na
agenda poltica das entidades contribuiu para um avano expressivo da discusso
nos espaos de formao e trabalho profissional, mas, ao mesmo tempo, comparece
nesse processo tanto movimentos de adeso
formal, quanto de adeso real ao
antirracismo. Exatamente por isso, compreendemos que nessa contradio tambm
residem as possibilidades histricas de superao da adeso formal ao
antirracismo, tendo como base os acmulos construdos pela profisso nesse
campo (Moreira, 2024, p. 50).
Esse processo em curso de enraizamento do antirracismo na profisso, permeado
de desafios e desencontros terico-polticos, deve impulsionar coletivamente a categoria profissional a
avanar nesse debate, a partir dos seus fundamentos, at mesmo porque, sendo o
racismo um elemento estrutural e ordenador da sociedade capitalista, ele no
apenas uma expresso, mas determinao que estrutura a prpria questo social,
portanto, condicionante de todas suas refraes (Assis, 2022).
Deste modo, sendo a questo social a
razo de ser da profisso (Netto, 2001) e considerando a funcionalidade do
racismo para o sistema de explorao/dominao capitalista, este no se trata
de um debate temtico, reduzido ao campo culturalista e identitrio ou, ainda, uma responsabilidade de
pesquisadores(as), estudantes e militantes negros(as), indgenas e quilombolas,
ao contrrio: avanar radicalmente nesse debate refere-se a um imperativo
compromisso tico-poltico de todos(as) aqueles(as) que acreditam e se colocam
na defesa intransigente da direo emancipatria do projeto tico-poltico.
Ao mesmo tempo que esse debate tem
ganhado expressiva amplitude na profisso, ele continua sendo um ponto de
tenso, disputas e falsos antagonismos, como se houvesse oposio entre
raa-etnia e classe, antirracismo e anticapitalismo. Por isso, compreendemos
que [...] ou a categoria profissional incorpora essa discusso, dando relevo
ao tema a partir de uma perspectiva terico-crtica, ou deixar que esse debate
seja realizado de forma a-histrica e descolada das mltiplas determinaes
histricas e materiais (Rocha, 2014, p. 304).
Nesse nterim, cabe ressaltar que se h
inmeros equvocos terico-polticos no que se refere s tendncias presentes
no campo do antirracismo que disputam a hegemonia do debate tnico-racial,
cujas sombras se alastram na profisso, na mesma medida, h de se reconhecer
tambm os limites e desencontros histricos em relao a leitura do racismo que
ocorreu no interior da esquerda marxista e que influenciou o Servio Social
brasileiro.
Portanto, para a efetiva superao
destes dilemas, tambm necessrio um permanente
movimento de autocrtica por
parte da profisso, pois, sob a influncia da esquerda marxista tradicional[13], o debate do racismo foi tratado por
dcadas no Brasil (e reproduzido pelo Servio Social)[14] como algo de menor importncia,
meramente identitrio, ps-moderno ou, ainda, como um desvio burgus que
fragmenta a classe (Farias, 2017).
Desse modo, concordamos que:
Sem o mergulho
na formao social concreta, as anlises de classes no Brasil imprimiram um
racismo epistemolgico, ao ocultar uma realidade de luta dos/as negros/as feita
contra a explorao capitalista e as suas resultantes. Mesmo as anlises
marxistas e marxianas reforaram o racismo epistemolgico, por raramente
contriburem com anlises que, fundadas nas particularidades e determinaes da
formao social brasileira, dessem conta do nvel de explorao a que estavam
submetidos/as os/as trabalhadores/as negros/as (Martins, 2017, p. 276).
Esta reflexo extremamente relevante
e tambm deve mobilizar setores marxistas, em especial a esquerda marxista
tradicional, a realizarem uma autocrtica honesta acerca da leitura sobre as
relaes tnico-raciais no Brasil, tendo em vista que a leitura hegemnica da
esquerda marxista no pas, sobremaneira durante o sculo XX, foi influenciada
por uma viso economicista, etapista e alheia prpria realidade brasileira,
relegando a luta contra o racismo assim como outras lutas anti opresses a
segundo plano, como se fosse descolada da luta de classes (Moreira, 2024).
No sem motivos, que apenas muito
recentemente o Servio Social vem consolidando um entendimento coletivo de que a classe no mera abstrao, ao
contrrio, ela determinada e atravessada pela condio tnico-racial, de
gnero, sexualidade, territrio e gerao. Em se tratando da particularidade
brasileira, a maioria da populao negra, constituda de pretos(as) e
pardos(as)[15], sendo este tambm o contingente da
classe trabalhadora mais impactado pelo processo destrutivo do capital. Dessa
maneira,
Constata-se que
tal superao, passa necessariamente, pela compreenso do movimento das
classes, uma vez que o servio social busca a perspectiva da totalidade
histrica. Assim, o debate da profisso engloba o enfrentamento das diferentes
formas de opresses e explorao de classe, no como fenmenos isolados ou
ocasionais, mas como parte inerente da
origem e reproduo da lei geral de acumulao capitalista em seus diferentes
momentos e particularidades scio-histricas, onde o racismo precisa ser
compreendido como elemento estrutural desta sociedade (Elpidio, 2020, p.
523, grifos nossos).
Sendo assim, urge avanarmos no debate tnico-racial e do antirracismo numa
perspectiva radical, compreendendo que o racismo, enquanto desdobramento dos
processos de colonialismo e escravismo, historicamente, se coloca como pilar
essencial da explorao e dominao capitalista, desde os tempos de acumulao
primitiva. Assim, necessrio compreendermos o racismo como elemento
determinante e constitutivo da sociedade capitalista, como este se dinamiza em
nossa particularidade scio-histrica e estrutura as relaes de produo e
reproduo social.
Algumas consideraes
Os apontamentos que aqui fizemos
resultam de intensos dilogos, incidncias polticas e trabalho profissional
com as populaes negras perifricas, bem como com povos indgenas e
comunidades tradicionais. As reflexes ora apresentadas expressam tambm
anlises tecidas coletivamente no cho do enfrentamento dirio ao racismo no
mbito do Servio Social, mas tambm fora dele. Essa caminhada, por vezes to
desafiadora e desanimadora, encontra firmeza, sentido e nimo quando recordamos
do nosso compromisso histrico com nossos(as) ancestrais que j miravam um
horizonte de justia e liberdade.
Nessa direo, precisamos combater, com
a mesma firmeza e radicalidade, tanto os setores liberais, conservadores,
antimarxistas, ps-modernos e essencialistas presentes no interior das lutas
antirracistas, que negam as determinaes estruturais da sociedade capitalista
e a relao entre raa-etnia e
classe, antirracismo e anticapitalismo. Mas, tambm, os setores que reproduzem
a lgica da esquerda marxista tradicional, que no so capazes de ultrapassar
uma mera revoluo formal-abstrata, pois desconsideram a determinao
tnico-racial na composio da classe trabalhadora que, na realidade
brasileira, possui centralidade (Farias, 2017).
Portanto, registramos que nenhuma
dessas perspectivas nos serve para avanarmos na superao radical dessa
sociedade, estruturada pelo racismo, pelo sexismo e pela violncia colonial,
que funciona como uma verdadeira mquina de moer corpos negros, indgenas e de
tantas outras comunidades que tradicionalmente mantm sociabilidades
resistentes ao modelo capitalista secularmente imposto.
Referncias
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Iara Vanessa Fraga de Santana
Assistente
Social (UECE). Doutora em Servio Social (UFPE). Mestra em Desenvolvimento
Territorial da Amrica Latina e Caribe (ENFF/UNESP-So Paulo). Especialista em
Direitos Sociais do Campo/Residncia Agrria (UFG) e em Gesto de Polticas
Pblicas em Raa e Gnero (UNB). Docente do curso de Servio Scoial da
Universidade Estadual do Cear (UECE). Integrande do Laboratrio de Pesquisas e
Estudos em Servio Social (LAPESS) e do Mestrado Acadmico em Servio Social
(MASS/UECE). Compe a Diretoria Executiva do Instituto Terramar e a Articulao
Antinuclear do Cear.
Tales Willyan Fornazier Moreira
Assistente Social (UFTM). Doutor e
Mestre em Servio Social (PUC/SP). Docente do curso de Servio Social da
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Lder do
GEFEPSS UFVJM - Grupo de Estudo e Pesquisa: Fundamentos, Formao e Exerccio
Profissional em Servio Social (DGP-CNPq). Membro do Ncleo de Estudos
Afro-Brasileiros e Indgenas (NEABI) da UFVJM. Membro da coordenao colegiada
da Rede Mineira de Grupos de Estudos sobre os Fundamentos do Servio Social (ReMGEFSS).
Compe a Frente Nacional de Assistentes Sociais no Combate ao Racismo.
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A(s) Autora(s)/O(s)
Autor(es). 2024. Acesso Aberto. Esta obra est licenciada sob os termos da
Licena Creative Commons Atribuio 4.0 Internacional
(https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR), que permite
copiar e redistribuir o material em qualquer suporte ou formato, bem como
adaptar, transformar e criar a partir deste material para qualquer fim, mesmo
que comercial. O licenciante no
pode revogar estes direitos desde que voc respeite os termos da licena
[1] Nos referimos ao primoroso texto da
autora Cristiane Luiza Sabino de Souza, intitulado A disputa em torno do debate racial no Brasil: teoria e mtodo para o
avano da perspectiva crtica, publicado nesta edio da Revista
Argumentum, n. 2 de 2024.
[2] Compreendemos que em uma sociedade
profundamente racista e desigual, a representatividade cumpre sim um papel de
significativa relevncia, quando aliada a um projeto poltico comprometido com
o fim do racismo e do capitalismo. Do contrrio, a mera representatividade por
ela mesma, que refora a ideia de negros/as ou indgenas no topo acaba to
somente sendo funcional ao capital, no se expressando em nenhuma mudana
concreta na vida das populaes negras e indgenas, pois no representa um
projeto coletivo, mas individual.
[3] Conforme aponta Souza (2024), esse
movimento fundamental para a crtica ao colonialismo, contudo, no pode
ocorrer de maneira superficial, a-histrica, reduzida ao campo da cultura e das
epistemologias sem fazer a crtica radical ao capitalismo, e o que tem
prevalecido nesse campo uma crtica esvaziada ao eurocentrismo.
[4] Souza (2024) tambm menciona que essa
perspectiva culturalista, ao apartar raa-etnia e classe visto que negam toda
contribuio do marxismo por ser eurocntrico e no apresentar nenhuma
contribuio para este debate , ao no apreender a complexidade dos desafios
vivenciados pelas populaes negras (que vivem na sociedade de classes, cujo
sistema capitalista cria e recria suas estratgias coloniais de dominao) e ao
se ater to somente dimenso cultural e epistemolgica, no refletindo sobre
as contradies reais que os povos africanos vivenciam sob a gide destrutiva
do neocolonialismo/imperialismo, acaba por reproduzir uma concepo metafsica
de negritude, culminando tambm numa perspectiva a-histrica e romantizada de
frica.
[5] Referncia msica Costura da Vida, de Srgio Perer (2019),
grande msico, artista mineiro e uma referncia importante na resistncia
contra o racismo.
[6] Como afirma Almeida (2019), num
sentido revolucionrio, a afirmao da raa feita to somente para que um dia
possamos super-la. Deste modo, fundamental termos ntido que nossa luta,
numa dimenso radical, deve se direcionar para a superao da noo de raa,
visto que esta foi construda historicamente para justificar a explorao, a
violncia, a desumanizao, o genocdio e a barbrie. Foi com base nesta
construo que as populaes negras e indgenas passaram a ser tratadas como outros, isto , como sub-humanos e
inferiores.
[7] Referncia ao trecho da msica
Principia (2029), do rapper e compositor brasileiro, Emicida.
[8] Esse decreto
institui a Poltica Nacional de Desenvolvimento Sustentvel dos Povos e
Comunidades Tradicionais.
[9] Sobre isso encontramos a relevante
afirmativa no Relatrio do CNDH (Brasil, 2018): Povos e comunidades
tradicionais tm sistemas prprios de conhecimento sobre a realidade, que
refletem suas experincias histricas e territoriais e contribuem para o manejo
da vida em todas as suas dimenses materiais e simblicas, que incluem o sagrado.
Os sistemas de conhecimentos tradicionais indicam outras formas de estar no
mundo, com potencial para renovar o pensamento e ampliar os repertrios de
saberes e fazeres na construo de solues para os novos desafios da
contemporaneidade, sejam os desafios socioambientais ou aqueles relativos
convivncia com respeito diferena e valorizao da diversidade (Brasil,
2018, p. 21).
[10] Comumente a literatura nomeia de recursos naturais, ou riquezas naturais, o que muitos povos indgenas e comunidades tradicionais chamam de me terra, pachamama. As guas, as florestas e os demais bens comuns da natureza so considerados organismos vivos e sacralizados para muitos desses povos. Em razo disso fazemos este destaque, pois os significados e sentidos da natureza so radicalmente diferenciados.
[11] Destacamos
aqui algumas das mais importantes e emblemticas construes deste perodo
recente: a Campanha de gesto do Conjunto CFESS-CRESS (trinio 2017-2020) Assistentes
Sociais no Combate ao Racismo; a construo dos Subsdios para o debate
sobre a Questo tnico-Racial na Formao em Servio Social e do documento As
cotas na psgraduao: orientaes da ABEPSS para o avano do debate, ambos
pela ABEPSS (binio 2017-2018); a construo da Plataforma Antirracista no site
da ABEPSS e a realizao da pesquisa A insero da educao para as relaes
tnico-raciais no mbito da ps-graduao na rea de Servio Social nos ltimos
cinco anos (2017-2022), tambm realizadas pela ABEPSS (binio 2021-2022); o
espraiamento dos Comits Antirracistas nos CRESS e a construo do Comit
Antirracista do CFESS, em 2023, bem como a publicao da Resoluo CFESS n.
1.054/2023, de 14 de novembro de 2023, que estabelece normas vedando condutas
de discriminao e/ou preconceito tnico-racial no exerccio profissional do/a
assistente social. Alm desses marcos no mbito das entidades representativas,
destacamos a criao da Frente Nacional de Assistentes Sociais no combate ao
racismo (2020) e da Articulao Brasileira de Servio Social e Povos Indgenas
(2021).
[12] Para maior aprofundamento sobre a
poltica identitria, sugerimos a leitura de Haider (2019).
[13] Nos referimos aqui ao debate realizado
por Farias (2017). Em linhas gerais, trata-se de uma esquerda que, sob a
influncia stalinista, j nasceu degenerada no Brasil, contaminando e
hegemonizando o pensamento da esquerda brasileira at a dcada de 1960.
[14] Nessa direo, importante mencionar
a discusso realizada por Matilde Ribeiro (2004), quando a autora destaca que
mesmo com todos avanos conquistados no processo de renovao profissional, as
relaes tnico-raciais acabaram sendo invisibilizadas no contexto das anlises
de classe. Se, de um lado, temos o VI Congresso Brasileiro de Assistentes
Sociais (CBAS) de 1989 como um marco histrico central para o debate das
relaes raciais na profisso e registros de assistentes sociais negras(os)
que desde a dcada de 1940 participavam dos movimentos raciais e feministas e
estavam nas trincheiras de denncia ao racismo , isso no foi suficiente para
que esse debate fosse incorporado coletivamente
no processo de renovao do Servio Social. Ao evidenciar isso, no estamos
querendo fornecer a munio ao inimigo(a) para fortalecer perspectivas
a-histricas e/ou que recusam todas as imprescindveis conquistas do Servio
Social renovado, ao contrrio, nossa inteno sinalizar que os desafios,
disputas e desencontros terico-polticos em relao a esse debate so
histricos na profisso (a princpio, pela influncia da esquerda marxista
tradicional que reproduzia uma concepo de que a luta contra o racismo
enfraqueceria a luta contra o capitalismo, como se fossem lutas opostas e, no
tempo presente, perspectivas que negam a sociedade de classes e as
contribuies do marxismo), mas se acirram de maneira significativa nesta
quadra histrica, tendo em vista o movimento de enraizamento desta discusso no
Servio Social brasileiro, de maneira ininterrupta, h quase uma dcada
(Moreira, 2024).
[15] De acordo com o IBGE (2022), a
populao negra representa 55,9% da populao brasileira. Mais informaes
disponveis em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6408.