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Combate à Tortura e Serviço Social: aproximações ao debate

Social Services and combating torture: approaches to the debate

Ionara dos Santos FERNANDES

Descrição: Ícone Descrição gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0001-6060-7697

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Centro de Ciências Sociais,

Faculdade de Serviço Social, Curso de Serviço Social, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

E-mail: ionara.fernandes@uerj.br

Fábio do Nascimento SIMAS

Descrição: Ícone Descrição gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0001-6079-9887

Universidade Federal Fluminense, Escola de Serviço Social, Curso de Serviço Social, Niterói, RJ, Brasil

E-mail: fabiosimas@id.uff.br

João Rafael da Conceição DIAS

Descrição: Ícone Descrição gerada automaticamentehttps://orcid.org/0000-0003-3485-826X

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Centro de Ciências Sociais,

Faculdade de Serviço Social, Curso de Serviço Social, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

E-mail: jonh.unirio@gmail.com

Resumo: O presente artigo objetiva problematizar a relação do Serviço Social brasileiro com a política de prevenção e combate à tortura no país. O percurso expositivo debate aspectos históricos e políticos da tortura no Brasil e as formas de enfrentamento a partir da atuação profissional com ênfase nos espaços de privação de liberdade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, elaborada a partir de estudo bibliográfico e análise documental dos relatórios produzidos pelo primeiro equipamento da política de prevenção e combate à tortura do país. Conclui-se que a produção sobre o tema da tortura no Serviço Social é escassa e aponta-se estratégias de intervenção política e profissional para a categoria.

Palavras-chave: Tortura. Política de Prevenção e Combate à Tortura. Serviço Social.

Abstract: This article problematises the relationship between Brazilian social services and the national policy for preventing and combating torture. With an emphasis on the deprivation of liberty, it discusses historical and political aspects of torture in Brazil and its confrontation by means of professional action. This is qualitative research drawn from bibliographical study and documentary analysis of reports produced by the first team responsible for the national policy for the prevention and combating of torture. It concludes that academic output on the topic of torture in social work is scarce. Political and professional intervention strategies for the category are also highlighted.

Keywords: Torture. Policy to prevent and combat torture. Social Work.

Introdução

Atortura é considerada uma das piores formas de violência contra o ser humano e suas práticas correspondem à intensa imposição de dor física e psicológica contra seres sociais orbitadas por relações econômicas e políticas que, na particularidade brasileira, recebem contornos próprios em razão da formação social do país.

Interpretada como uma das ações mais degradantes da violência coercitiva do Estado, a tortura é executada com mais frequência contra os segmentos criminalizáveis da classe trabalhadora1. Considera-se que o debate contemporâneo da profissão, tanto em sua produção teórico-metodológica, quanto nos espaços de organização política do Serviço Social brasileiro sobre este tema é ainda escasso.

A partir desta constatação preliminar, o objetivo deste artigo é problematizar o tema do enfrentamento à tortura a partir do Serviço Social brasileiro em sua atuação profissional. Ao compreender que o direito internacional considera que a tortura é uma violência praticada por agentes públicos ou outras pessoas em suas funções públicas e sobretudo nos locais de detenção do Estado, se dará ênfase na atuação profissional nos espaços de privação de liberdade.

Deste modo, o artigo está dividido em duas partes. A primeira contextualiza a dinâmica da tortura no Brasil contemporâneo para seguidamente fazer breves considerações da atuação do Serviço Social nas instituições de privação de liberdade e da produção teórico-política sobre esses temas, propondo o adensamento do Serviço Social brasileiro ao debate sobre o enfrentamento à tortura a partir das dimensões que envolvem o campo profissional.

Breves aspectos jurídicos, históricos, políticos e sociais da tortura

Não há um consenso no meio acadêmico sobre a conceituação da tortura, sendo sua definição baseada fundamentalmente nos âmbitos jurídicos. Em geral, os sujeitos que se debruçam para discutir as práticas de torturas recuperam a concepção de “tortura” da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (UNCAT, sigla em inglês) aprovada em 1984. O Brasil ratificou a UNCAT através do Decreto Nº40/1991, assegurando, portanto, a seguinte redação sobre o conceito:

Para os fins da presente Convenção, o termo ‘tortura’ designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram (Brasil, 1991, não paginado).

A definição de tortura da UNCAT significa uma síntese de dissensos e consensos a partir da conjuntura da Guerra Fria, descolonização de África/Ásia e enfraquecimento das ditaduras civil-militares no Cone Sul cuja participação de organizações e movimentos de Direitos Humanos tiveram um relevante papel (Anistia Internacional, 2002). Na definição mundial de tortura se reconhece um sujeito, um objeto e uma (ou mais) finalidade. A tortura é fundamentalmente uma prática estatal, realizada por um agente do estado (ou outrem por procuração). O objeto é um sujeito ou um grupo de sujeitos. E ela não se trata de um fim em si, mas um mecanismo de obtenção de um produto ou resultado, portanto, é uma atividade-meio para alcançar uma finalidade.

O ponto mais controverso da UNCAT é a possibilidade de a tortura não ser considerada quando aplicada por sanções legítimas ou decorrentes delas pelos países, cuja interpretação jurisprudencial do direito internacional se refere especialmente às aplicações das penas de prisão. Neste sentido, podemos afirmar que há uma ligação umbilical entre o aprisionamento a as práticas de tortura e maus-tratos. Vale destacar que a tortura se encontra no rol dos crimes contra a humanidade a partir do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional de 1998 e ratificado pelo Brasil em 2002.

Se, por um lado, a tortura fora considerada uma prática legal e instituída como procedimento pelo modo de produção feudal e Estado Absolutista europeu, sua proibição nas legislações se deu a partir dos processos revolucionários burgueses e sua racionalidade penal moderna. O direito burguês proíbe formalmente a tortura para praticá-la largamente em seus calabouços, a que reproduz a lógica da igualdade formal para justificar a desigualdade real (Simas, 2024). Portanto, o debate sobre a tortura não pode ser desvinculado da violência de Estado.

Em solo brasileiro, a existência do Estado se instaura no processo de colonização, parte e expressão da acumulação primitiva do capital na Europa. Expropriando os bens comuns, eliminando os povos originários e sequestrando e escravizando os povos africanos, os colonizadores aplicaram formas de dominação a partir do aprisionamento, da punição e do castigo, com registros que retratam o amontoamento de pessoas desde o translado, no navio negreiro, o acesso limitado à alimentação e cuidados em saúde, mutilação dos corpos, espancamentos e violências sexuais, todas variações da tortura (Stanchi, 2023), realizada por organizações comerciais com permissão estatal.

Durante a colonização, o Estado, por via do Direito, garantiu a escravização dos povos africanos e o genocídio dos povos originários, constituindo um conjunto de práticas violentas, que forjam a naturalização da punição doméstica e da vingança pública e privada como formas de resolução de conflitos no país. O justiçamento com as próprias mãos, por exemplo, trata-se de uma herança colonial, na medida em que “[...] a formação sócio-histórica do Brasil é forjada na utilização da tortura como um expediente regular de controle” (Fernandes, 2022, p. 284).

A transição do período colonial ao capitalismo dependente reforça a tortura como parte do Estado brasileiro: a criação da Guarda Real Policial (1809), forma antecessora das polícias. O início lento e gradual da constituição do trabalho livre e a explosão da “questão social” no Segundo Reinado são as bases materiais para a criminalização do considerado vadio (Código Criminal de 1830) e a construção da primeira penitenciária do país (Casa de Correção da Corte, instituída no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, entre 1834 e 1850). Importante destacar que em nossa primeira Constituição de 1824 há a abolição da tortura e penas cruéis cujos atos proibitivos não incluía a população escravizada.

A transferência da senzala para o cativeiro público, denominado de prisão, penitenciária, cadeia, presídio ou afins, é um processo que acompanha a utilização da tortura como prática naturalizada (não por acaso é no próprio século XIX que começam as notícias de superlotação nas unidades prisionais do Brasil). A naturalização é inclusive entre os próprios agentes do Estado, cujo exemplo emblemático culminaria, no início do século XX, na Revolta da Chibata.

A abolição formal da escravidão, sem acompanhar um processo de reforma agrária e outras políticas de reparação às práticas de terror cometidos contra os povos negros e indígenas, resultou em um processo de criminalizações primárias, que envolviam a sua cultura e modos de produção da vida social, e, auxiliada por uma campanha eugênica e de uma política imigratória de brancos praticamente se constituiu como base material e ideológica para a criação de territórios favelizados, que, no século XX, se tornariam objeto de controle do Estado por parte das polícias para fins de práticas de tortura e genocídio, especialmente de jovens negros e indígenas.

Essas informações, no entanto, não são as mais utilizadas quanto à abordagem temática da tortura no Brasil. É no marco de meados do século XX que as práticas de tortura ganham centralidade e visibilidade no país2. Em 1964, o Brasil sofreu um golpe empresarial-civil-militar, instaurando a ditadura mais longa da sua história, que durou entre 1964 e 1985. Esse período foi marcado pelo uso da tortura contra opositores políticos, trazendo grande visibilidade e rejeição social a essas práticas no país. As violências perpetradas durante essa época são amplamente consideradas repugnantes e inadmissíveis.

Durante a redemocratização, a partir de 1985, a repulsa à tortura se tornou uma questão central nos movimentos de defesa dos direitos humanos, impulsionada sobretudo por organizações de sobreviventes da tortura ditatorial e familiares das vítimas. Com a consolidação desses movimentos, o enfrentamento à tortura começou a ser pautado do ponto de vista social, jurídico e político, focando no direito à memória, justiça e reparação às vítimas.

Foi nesse contexto, após intensas lutas e a criação de normativas nacionais e internacionais, que o combate à tortura em espaços de privação de liberdade para presos considerados comuns3 também começou a ganhar força no direito internacional. Entretanto, novas formas de tortura foram construídas durante o regime democrático. Dauris Rejali (2007) identifica como tortura limpa, as práticas de tortura que não deixam hematomas. Essas práticas de tortura passam a ser entendidas como parte da gestão e do controle daquela força de trabalho excedente, racializada e aprisionada, causando o menor estranhamento possível, permitindo que novos ritos se expandam dentro de uma aura justificável de produção limpa da tortura.

Dentro desse contexto, o Brasil, como um Estado democrático forjado no capitalismo dependente, desenvolveu seu entendimento sobre direitos humanos nos limites do desenvolvimento desigual e combinado (Fernandes, 2006). Nesse cenário, o país executa, justifica e sofistica as práticas de tortura durante a democracia, perpetuando as distinções raciais herdadas da colonização.

Apontamentos estruturados dentro de uma perspectiva humanista criaram a própria prisão em detrimento dos castigos corporais e resultaram na condenação mundial da tortura. No entanto, essa mesma perspectiva também desenvolveu tecnologias de tortura que operam em uma espécie de escala do sofrimento, um gradiente da dor (Asad, 1997). Assim, surgiu um parâmetro para determinar a dor infligida ao outro, diferenciando entre dor aceitável e dor excessiva e exorbitante. Com isso, determinadas experiências de violência e a produção de dor e sofrimento tornaram-se aceitáveis. Esse cálculo utilitário da dor, como parâmetro na sociedade moderna e democrática, regula uma espécie de dor e sofrimento admissível. O movimento de expansão e redução do gradiente da dor na tortura moderna constrói-se a partir da figura do inimigo (Asad, 1997).

A construção do inimigo no Brasil tem raízes na herança escravocrata, onde a força de trabalho negra e indígena foi estigmatizada, senão dizimada, e relegada às favelas e prisões. Esses espaços são mais propensos a ações policiais que, por sua legitimação social, tornam aceitáveis o uso da violência e a produção de dor e sofrimento delas provenientes. Essa aceitação gradativa da tortura é endossada por discursos públicos em nome da defesa da democracia burguesa.

O Brasil aprovou a lei que tipifica o crime de tortura no ano de 1997 (Lei Nº 9455). Simas (2024) aponta problemáticas em relação a esse marco legal como seu caráter eminentemente penal e ampliação de sua abrangência ao agente privado, o que tem demonstrado na prática um processo de descaracterização dos princípios contidos na UNCAT e a desresponsabilização do agente público. Destaca-se ainda, no âmbito nacional no enfrentamento à tortura: as inspeções e denúncias de organismo internacionais; atuação de organizações/movimentos sociais; a aprovação pelo Estado brasileiro de Ações Integrais para o Combate à Tortura e Violência Institucional, bem como de uma coordenação nacional vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos; a instalação das Comissões da Verdade e a aderência do Estado brasileiro ao Protocolo das Nações Unidas para Prevenção à Tortura (OPCAT) com a instalação de comitês e mecanismos com essa finalidade.

O Serviço Social em espaços ocupacionais de privação de liberdade e o enfrentamento à tortura

O Serviço Social tem lócus privilegiado na atuação preventiva e combativa à tortura. A profissão tem desempenho reconhecido em espaços ocupacionais de privação e restrição de liberdade, além de ocupar outros ambientes com potencial atuação nessa esfera. Assistentes sociais são profissionais de atendimento direto às pessoas no sistema prisional, no sistema socioeducativo, nos (ainda existentes) hospitais psiquiátricos, nas comunidades terapêuticas, nos acolhimentos institucionais e nas instituições de longa permanência para idosos - espaços de privação de liberdade, ainda que uns metamorfoseiam-se por proteção social.

No entanto, assistentes sociais que também atuam no Tribunal de Justiça, Ministério Público, Defensoria Pública, Delegacias de Polícia, Hospitais, Centro de Atendimento Psicossocial, Conselhos Tutelares, Escolas, Centro de Referência Especializado em Assistência Social, Organizações Não Governamentais, em favelas ou com egressos da privação de liberdade, ou seja, assistentes sociais que atuam em qualquer instituição, serviço ou política também são profissionais relevantes no combate e prevenção à tortura4.

Essa relevância é reconhecida no próprio Código de Ética de Assistentes Sociais como um dever profissional:

Denunciar, no exercício da Profissão, às entidades de organização da categoria, às autoridades e aos órgãos competentes, casos de violação da Lei e dos Direitos Humanos, quanto a: corrupção, maus tratos, torturas, ausência de condições mínimas de sobrevivência, discriminação, preconceito, abuso de autoridade individual e institucional, qualquer forma de agressão ou falta de respeito à integridade física, social e mental do/a cidadão/cidadã (Conselho Federal de Serviço Social, 1993, grifos nossos).

A instituição não é mero condicionante ao trabalho profissional: ela organiza o trabalho de assistentes sociais, que não se materializa em um processo próprio de trabalho, mas como parte e expressão de um trabalho coletivo. O que significa compreender que os torturadores são colegas de trabalho. E, portanto, cumprir o dever de denunciar práticas de tortura significa tendencialmente denunciar um sujeito próximo, com que se estabelece algum tipo de convivência.

A autonomia relativa da/o assistente social é potente para apreender as dinâmicas das práticas de torturas nos espaços ocupacionais. O atendimento direto ao usuário é o ápice da autonomia profissional. Um processo de entrevista que não se reduza a obtenção de dados mecanicamente para fins de cumprimento dos quesitos administrativos ou judiciais, pode se transformar em um momento de construção de confiança e fortalecimento de vínculo que abra margem para uma abordagem mais ampla do cotidiano vivenciado pelo indivíduo atendido, incluindo potenciais diálogos sobre práticas de tortura pelos agentes do estado e práticas de resistências pelos usuários.

O acesso ao usuário no espaço em que se localiza a pessoa privada de liberdade, como celas, galerias, leitos, quartos etc., para a realização deste atendimento direto é uma forma não apenas de observar in loco a realidade do usuário, mas igualmente uma forma de prevenção e combate à tortura. Inclusive, essa perspectiva comparecia nas funções designadas ao Serviço Social de um dos principais juristas brasileiro, partícipe da elaboração do atual Código Penal Brasileiro, Roberto Lyra:

O Serviço Social constitui o melhor instrumento para assistência às famílias dos delinquentes e de suas vítimas, para efetivar e proteger a readaptação dos egressos condicionados ou definidos, para evitar a reincidência e crimes cometidos contra os criminosos a pretexto de puni-los (Costa, 1950, p. 135, grifos nossos).

Uma pesquisa documental nos relatórios produzidos pelo Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura do Rio de Janeiro (MECPT/RJ)5 entre 2011 e 2023, órgão pioneiro da política de prevenção e combate à tortura no Brasil, revelou dados significativos sobre o Serviço Social nos espaços de privação de liberdade e a tortura, que diz das relações e condições de trabalho, inadequações éticas e técnicas e de reivindicações das pessoas privadas de liberdades em relação ao atendimento profissional.

O estudo também revelou que a precariedade no atendimento técnico, incluindo o Serviço Social, foi reconhecida como uma das principais demandas da população prisional, manifestada por meio de motins, greves de fome e depredação de locais destinados a esses serviços.

[...] Informou que os presos não haviam aceitado o café­ da ­manhã e almoço, que a unidade teria problemas como todas as outras, como carência de vestuário para o preso, atendimento social, jurídico e médico (Rio de Janeiro, 2015b, p. 5, grifos nossos)

O atendimento do Serviço Social às famílias das pessoas privadas de liberdade é uma demanda constante. As implicações dessa ausência são múltiplas: desconhecimentos de trâmites, especialmente de benefícios como visita periódica ao lar; crianças sem registro de nascimento ou sem o reconhecimento de paternidade; dependentes sem auxílio-reclusão; companheiros/as sem visita íntima; etc.

Na particularidade de mulheres privadas de liberdade, a situação é aterrorizante:

Muitas reclamando de ausência de atendimento social e dificuldade de contato com a família. As mulheres que têm filhos em abrigo dizem não receber notícias e algumas não têm certeza do paradeiro (Rio de Janeiro, 2015a, p. 11, grifos nossos).

O ambiente cruel e degradante destinado às pessoas privadas de liberdade, como mecanismo histórico de persuasão, se estende em maior ou menor grau aos profissionais técnicos do sistema prisional, como os/as assistentes sociais. As condições de trabalho são por excelência violadoras dos direitos profissionais. Há até falta de armários e os poucos existentes não têm chaves para preservação das fichas sociais das pessoas atendidas por esses setores. Segundo os documentos do MEPCT/RJ, as salas de atendimento são pequenas, quando existem, e apresentam problemas relacionados à privacidade e ao sigilo profissional, que são direitos e deveres éticos da/o profissional. A falta de salas maiores para atendimentos em grupo e a dificuldade de mobilidade das pessoas em privação de liberdade, justificada pela ausência de segurança ou pela falta de profissionais para conduzi-las, também inviabilizam a utilização desse instrumento profissional.

A sala destinada para o trabalho é muito pequena para a presença de uma profissional e uma estagiária. [...] O atendimento ao interno é realizado por uma pequena fresta na parede, gradeada, onde o interno permanece num corredor onde circulam outros internos e profissionais, o que presume a inadequada estrutura por não permitir o sigilo profissional necessário ao atendimento. Além disso, o armário que contém as fichas sociais dos internos, com registro de atendimento e acompanhamento dos casos não é trancado, podendo qualquer pessoa ter acesso ao mesmo. Para além do uso da sala na parte superior da unidade, a equipe foi ao local onde as famílias são atendidas. O atendimento é semelhante ao do interno, através de uma parede vazada, com uma grade, onde a assistente social fica sentada na parte interna da unidade e a família em pé na parte externa. Não há qualquer possibilidade de sigilo profissional, pois além da grande fila de familiares que se forma, a atuação da profissional é ao lado da custódia, o que faz com que sua atividade seja acompanhada por um inspetor a todo o momento. Segundo a assistente social, não há possibilidade de qualquer outro tipo de atividade com as famílias, a não ser atendimentos pontuais, pois as mesmas não têm acesso à sala do serviço social (Rio de Janeiro, 2011, p. 20, grifos nossos).

No sistema socioeducativo, a intervenção de assistentes sociais com adolescentes e suas famílias aparenta ser ainda mais problemática, segundo os relatórios do MEPCT/RJ. Há atendimentos pontuais realizados apenas para a elaboração de relatórios e pareceres que, em algumas situações, indicam a manutenção da privação de liberdade. Além disso, são observadas práticas omissivas em relação à produção de tortura.

Igualmente houve muitos relatos sobre atraso nos relatórios, havendo um caso que merece destaque. Ao que nos foi contado houve desfazimento de uma das equipes da unidade e quando realocados para outras equipes técnicas, um dos adolescentes estava próximo ao período de envio do relatório para reavaliação de medida, e quando este perguntou a técnica sobre o parecer dela sobre o mesmo, ela lhe informou que ‘não tem porque te pôr na rua, não te conheço’ (Rio de Janeiro, 2021a, p. 17, grifos nossos).

Em um caso de violência sexual noticiado pela grande mídia em 2021, o MEPCT/RJ destacou em seu relatório a omissão da equipe técnica em denunciar a situação aos órgãos de proteção externos à unidade.

[...] percebemos que não há consenso entre a equipe técnica quanto à permanência exclusiva de profissionais femininas no ambiente, bem como percebemos que as narrativas de uma profissional presente corroboram para o processo de culpabilização das vítimas. Inclusive, ousamos dizer que é a partir de alguns discursos que ouvimos de parte da equipe técnica, que as adolescentes vêm conformando esse cenário de enfrentamento entre elas e atribuição das violências às colegas e não ao agressor (Rio de Janeiro, 2021b, p. 10).

Ilude-se o/a profissional de Serviço Social que considera todas essas dinâmicas institucionais como condicionantes do trabalho. A profissão é uma especialização do trabalho coletivo, inserida em processos de trabalho. As relações e condições de trabalho, os recursos disponíveis, o acesso aos usuários são parte e expressão da organização do trabalho no interior daqueles (e outros) espaços ocupacionais para permitir a obtenção de produtos do trabalho previamente constituídos pelos empregadores. Produtos, portanto, que lhes são estranhos e têm domínio sobre os trabalhadores.

Como trabalhador/a assalariado/a, o/a assistente social está submetido/a às relações de trabalho de exploração e alienação, como vínculo de trabalho precário, que podem constrangê-lo/a, dificultando a denúncia da tortura acolhida por depoimento de terceiros ou presenciada pessoalmente. Diversos podem ser os ônus funcionais, como ameaça, transferência de setores e locais, até a demissão. O risco à integridade física e mental é iminente, tendo em vista que os sujeitos que torturam são, em geral, agentes do estado em cumprimento de Segurança Pública, com acesso à material bélico.

Uma possibilidade de evitar a omissão é realizar denúncias anônimas. É importante notificar os órgãos competentes, como o Ministério Público e os Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura, fornecendo informações precisas sobre a situação, como data, horário, identificação dos suspeitos e detalhes do ocorrido.

Outra forma de exposição envolve a documentação técnica de assistentes sociais, especialmente aquela para fins de subsidiar decisões judiciais. Redigir no documento, ainda que seja um documento individual, uma avaliação do processo de precariedade da arquitetura da unidade de privação de liberdade, os impactos da superlotação, o acesso limitado à saúde, à educação, à alimentação e à água, as condições de trabalho profissional e os indicativos de agressão física e psicológicas são dados de extrema relevância para qualificar a compreensão das variações de tortura que ocorrem em escala coletiva e individual (Fernandes, 2021), incidindo assim na prevenção e o combate à tortura.

Desse modo, a profissão tem contribuições na prevenção e combate à tortura a partir da dimensão técnico-operativa. No entanto, as outras dimensões constitutivas, teórico-metodológica e a ético-política, do trabalho profissional têm igualmente potenciais contributivos.

No que refere à dimensão teórico-metodológica, durante o processo de formação profissional, raramente se encontram intervenções acadêmicas sobre o assunto nos currículos, seja no formato de disciplina optativa ou eletiva e menos ainda com teor de disciplina obrigatória. Também é restrita a difusão de conteúdos em formatos de aulas, palestras, cursos, pesquisa, extensão, seminários e similares6.

Em termos de produção de conhecimento, nossa orientação metodológica deu ênfase às produções dos últimos Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (2022), Encontro Nacional de Pesquisadores/as em Serviço Social (2022) e Encontro Nacional de Política Social (2023), considerados os principais eventos acadêmicos do Serviço Social, apenas três trabalhos foram identificados (um em cada evento) em que se utilizava a expressão tortura. Todos foram do mesmo autor principal (Simas, et al., 2022; Simas; Marques; Conceição, 2002; Simas, 2023).

Das seis revistas científicas de maior conceito no Serviço Social, com avaliação Qualis A1, obteve-se o seguinte resultado: na Revista Argumentum, cinco artigos localizados. No entanto, apenas um tratava do tema (Fernandes, 2021b) na Revista Katálysis, dois artigos foram identificados. Um tratava especificamente do tema (Fernandes, 2022) e um utilizava termo similar e o conteúdo tinha relação com a temática (Kilduff; Silva, 2019); na Revista de Políticas Públicas, identificou-se dois artigos, um tratava especificamente do tema (Fernandes, 2023), e o outro não fazia uso do termo de fato, por fim, nas revistas Serviço Social & Sociedade, Temporalis e O Social em Questão e Em Pauta não foram identificados nenhum artigo com essa expressão no dispositivo de busca por títulos de seus sites. Utilizou-se a busca da palavra tortura no tópico de busca de todas as edições digitais das referidas publicações.

Ao considerar tais levantamentos, frisa-se a necessidade de fomentar no âmbito profissional a produção teórica da temática da tortura. É notório que no campo de atuação do Serviço Social há uma multiplicidade de temas que se inserem à profissão, contudo, o tema da tortura com a gravidade da sua forma e que permeia espaços institucionais merece atenção nas instâncias formativas, sobretudo a partir de seu debate inserido na contribuição à crítica da violência de Estado, tanto em sua totalidade quanto em suas diversas manifestações. Aliada a esta proposta, deve-se adensar o debate na crítica radical ao aprisionamento enquanto sistema produtor de tortura, especialmente destinado à força de trabalho excedente e racializada.

Na dimensão ético-política, merece destaque a histórica campanha Serviço Social, Memórias e Resistências contra a Ditadura que reuniu depoimentos de assistentes sociais que lutaram contra a ditadura empresarial-militar e sofreram tortura do Estado Brasileiro7.

Entende-se que deve se estimular na dimensão ético-política da profissão a participação em espaços diversos de controle social democrático e movimentos sociais que problematizam a tortura institucional com destaque para as Frentes pelo Desencarceramento e os movimentos de familiares, vítimas e sobreviventes dos espaços de privação de liberdade.

Outro relevante espaço de inserção são os Sistemas Nacional e Estaduais de Prevenção e combate à Tortura, onde se constituem os Comitês e Mecanismos com esta finalidade no país. Os Comitês de representação institucional estão em 23 estados e ainda é incipiente a participação dos conselhos profissionais nestes espaços, contando somente o CRESS do Rio de Janeiro e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) em âmbito nacional. Trata-se de um desafio para as instâncias de organização política a participação nestes espaços.

No âmbito do Conjunto CFESS-CRESS a partir das deliberações em seus encontros nacionais no primeiro ano de cada gestão, percebe-se considerável retração desta temática: se em 2014 a palavra “tortura” esteve presente em cinco deliberações, em 2017 duas deliberações sobre tortura foram remanejadas para Bandeiras de Luta8, e sequer houve menções sobre o tema nos encontros de 2020 e 20239.

Entendemos ainda que o Serviço Social pode contribuir na prevenção e combate à tortura minimamente de mais três formas: nas políticas de memória e verdade; na reparação e atendimento às vítimas da violência de Estado; e na formulação de campanhas de combate à tortura nas diversas políticas públicas onde a profissão se envolve.

Considerações finais

O texto buscou abordar o papel do Serviço Social na prevenção e combate à tortura em espaços de privação de liberdade, destacando que os assistentes sociais têm um papel relevante em diversas instituições, incluindo sistema prisional, socioeducativo, hospitais, entre outros, onde atuam diretamente com pessoas privadas de liberdade. O código de ética da profissão estabelece o dever de denunciar violações dos direitos humanos, incluindo casos de tortura.

No entanto, a atuação das assistentes sociais enfrenta desafios, como a subordinação às relações de trabalho com vínculos precários, que podem dificultar a denúncia de casos de tortura. Em espaços de privação de liberdade, os torturadores são frequentemente colegas de trabalho, o que torna o processo de denúncia desgastante física e mentalmente para os profissionais.

Por outro lado, buscamos demonstrar também a importância da denúncia anônima e da documentação técnica dos assistentes sociais para subsidiar decisões judiciais e revelar dados alarmantes sobre as condições de trabalho dos profissionais e as condições desumanas enfrentadas pelos indivíduos privados de liberdade, incluindo falta de sigilo nos atendimentos, alternativas relevantes para o exercício profissional.

Além disso, apontamos para algumas práticas omissivas na intervenção profissional no que se refere ao enfrentamento à tortura, além de produção acadêmica incipiente sobre o tema. E nesse sentido, ressaltamos ainda que a ausência do Serviço Social em espaços de privação de liberdade pode potencializar o uso de práticas de tortura como forma de controle, evidenciando a importância da presença e atuação dos assistentes sociais nesses ambientes para a prevenção e combate à tortura.

O ano de 2024 nos faz recordar os 60 anos do golpe empresarial-civil-militar sofrido no Brasil e as práticas de tortura a ele inerentes ao longo de duas décadas de atuação, mas, por outro lado, também marca os 40 anos da Convenção Tortura Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes das Nações Unidas, quando o mundo direcionava o seu olhar para estratégias de enfrentamento às práticas de tortura. Um momento salutar e urgente para o Serviço Social empreender esforços em uma agenda teórico-metodológica, técnico-operativa e ético-política quanto a compreensão sobre as práticas de tortura e o movimento de construção, consolidação e ampliação da política de prevenção e combate à tortura no país.

Referências

Anistia Internacional. Combatendo a tortura: manual de atuação. Londres: Amnesty International Publication, 2003.

Asad, T. On torture, or cruel, inhuman, and degrading treatment. In: Kleinman, A.; Das, V.; Lock, M. (orgs.). Social Suffering. Berkeley: University of California Press, p. 285-308, 1997.

Brasil. Decreto nº 40, de 15 de fevereiro de 1991. Promulga a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradante. Brasília (DF), 1991. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0040.htm. Acesso em: 4 out. 2024

Conselho Federal de Serviço Social. Código de Ética Profissional do Assistente Social. Brasília (DF): CFESS, 1993. Disponível em: https://www.cfess.org.br/arquivos/CEP_CFESS-SITE.pdf. Acesso em: 4 out. 2024

Conceição, J. R. Quatro notas introdutórias acerca da (s) (in)segurança (s) pública (s) e Serviço Social. In: Encontro Nacional de Pesquisadores/as em Serviço Social, 17., Rio de Janeiro, 2022. Anais [...]. Rio de Janeiro, 2022. Disponível em: https://periodicos.ufes.br/abepss/article/view/22528/15025. Acesso em: 4 out. 2024

Costa, A. D. Teorias e práticas penitenciárias. Condensação, em forma de dicionário, das obras completas do Prof. Roberto Lyra. Pesquisa e classificação de Armando Dias da Costa. Revista Brasileira de Criminologia, Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, Edição Especial, ano 4, n. 13, out./dez. 1950. Acervo da Fundação Biblioteca Nacional.

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Stanchi, M. Memórias abolicionistas: genealogia decolonial da tortura no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2023.

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Ionara dos Santos Fernandes Trabalhou na concepção, análise dos dados e redação do artigo.

Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Pós-doutorado em Sociologia realizado na Universidade de São Paulo. Professora Adjunta da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FSS/UERJ). Pesquisadora associada ao Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP) e ao Núcleo de Extensão e Pesquisa em Direitos Humanos, Infância, Juventude e Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (NUDISS/UFF).

Fabio do Nascimento Simas Trabalhou na concepção, análise dos dados e redação do artigo.

Doutor em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor Adjunto da Escola de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense. Coordenador do Núcleo de Extensão e Pesquisa em Direitos Humanos, Infância, Juventude e Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (NUDISS/UFF). Representante do Conselho Federal de Serviço Social no Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

João Rafael da Conceição Dias Trabalhou na concepção, análise dos dados e redação do artigo.

Doutorando em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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Editoras responsáveis

Silvia Neves Salazar– Editora-chefe

Maria Lúcia Teixeira Garcia – Editora

Submetido em: 4/10/2024. Revisto em: 14/2/2025. Aceito em: 18/3/2025.

Agência financiadora

Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ).

Creative Common - by 4.0 Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado.

Argum., Vitória, v. 17, p. 1-13, e-46308, 2025.  ISSN 2176-9575


  1. Entende-se como segmentos criminalizáveis da classe trabalhadora aqueles majoritariamente compostos pelo pauperismo com destaque para a população negra, pobre, residente em favelas e periferias. São também criminalizáveis em determinadas conjunturas, sujeitos e/ou grupos que se opõem ou se insurgem contra a ordem vigente (Simas, 2024).↩︎

  2. Não se pode esquecer do Estado Novo e suas práticas de tortura com presos políticos e a população carcerária. Presos políticos, como Luiz Carlos Prestes e Graciliano Ramos, relatam torturas em unidades penais dirigidas por Victorio Caneppa, diretor da Penitenciária Central do Distrito Federal e amigo de Filinto Muller.↩︎

  3. Há vasta produção sobre o aprisionamento da ditadura civil-militar brasileira no qual se estabelece a dicotomia entre os presos políticos e presos comuns. Para fins deste trabalho entende-se que toda prisão é uma prisão política, tanto no que se refere à construção social de determinadas condutas que se caracterizariam como crime no direito penal quanto aos grupos/classes que seriam criminalizados vide a seletividade penal operada pelo Estado burguês.↩︎

  4. Para uma interessante captura das dinâmicas das violências no/do capitalismo, especialmente as realizadas pelo Estado brasileiro, e os impactos no trabalho de assistentes sociais em diferentes espaços ocupacionais, como escolas, unidades de emergências, unidades básicas de saúde, instituições de segurança pública e equipamentos de assistência social, conferir Conceição (2022).↩︎

  5. O MEPCT/RJ é um órgão público, criado pela Lei fluminense Nº5778/2010, com competência para monitorar todos os espaços de privação de liberdade em todo o estado, desde 2011. Em sua atuação, os trabalhadores do MEPCT/RJ realizam visitas, sem aviso prévio, nas unidades de privação de liberdade. O processo se constitui em algumas etapas: entrevista inicial com a direção seguida por entrevistas com as pessoas privadas ou restritas de liberdade, vistorias de todo o estabelecimento, entrevista com profissionais das equipes técnicas; inclusive, em alguns relatórios, há o registro de entrevista com assistentes sociais. Concluída a fiscalização in loco, o MEPCT/RJ elabora um relatório com recomendações, que é público.↩︎

  6. Essas assertivas são baseadas na realidade das Escolas e Faculdades públicas e presenciais do Estado do Rio de Janeiro, conforme levantamento realizado nos projetos político-pedagógicos disponíveis em seus sítios eletrônicos. Em nível nacional, tendo por base as Diretrizes Gerais para o curso de Serviço Social da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS), inexiste qualquer referência à tortura, sequer à violência. Um termo mais próximo poderia ser situado: a dominação; porém, trata-se de um conceito amplo, que, mesmo na tradição marxista, tem diversos significados.↩︎

  7. A campanha foi fruto de uma deliberação do 41º Encontro Nacional do Conjunto CFESS-CRESS. Em 2014, no 43º Encontro, houve uma mesa-redonda com cinco depoimentos de assistentes sociais. Em 2016, no 15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, houve uma exposição sobre o projeto, em forma de painéis. E em 2017 a brochura foi publicada com dezenas de depoimentos.↩︎

  8. Documento político aprovado no 44º Encontro Nacional CFESS-CRESS que expressa, de forma sistematizada, as principais pautas e compromissos defendidos coletivamente pelas e pelos assistentes sociais no Brasil, organizados em torno da defesa da profissão, da seguridade social e dos direitos humanos.↩︎

  9. Os documentos estão disponíveis em: https://www.cfess.org.br/documento?DocumentoSearch%5Bid_documento_categoria%5D=8.↩︎