Juventudes e lazer: Discutindo direitos sociais em tempos de distanciamento social
Resumen
O presente trabalho visa expor os resultados da pesquisa realizada com jovens sobre o acesso ao lazer durante a pandemia, pela perspectiva de ser um direito social garantido pela Constituição de 1988 a toda população brasileira e pelo Estatuto da Juventude de 2013 aos jovens, mais especificamente. O interesse em olhar para a temática sobre juventudes e lazer, parte da análise de que o lazer pode ser considerado uma das principais dimensões das vivências juvenis na contemporaneidade, sendo fundamental para a elaboração de suas identidades, formação de valores, referências e na sua relação com o espaço público (MARTINS et al, 2014), o que reverbera na compreensão da cidadania e seu papel importante no reconhecimento como sujeito de direitos, para, assim, ampliar uma luta para efetiva obtenção deles.
No contexto pandêmico a rápida transmissão do novo coronavírus (SARS-CoV-2) exigiu a adoção de medidas não farmacológicas, que visavam a redução da velocidade da transmissibilidade do vírus. O distanciamento social, fechamento e restrições de locais públicos/coletivos estavam entre as principais estratégias de prevenção de contágio. Posto que o distanciamento social implicava na mobilidade urbana e na sociabilidade, o objetivo desse estudo foi refletir sobre o impacto dessa mudança de hábito na prática cotidiana do lazer para as juventudes brasileiras. A pesquisa, de abordagem qualitativa, foi realizada no período de abril do ano de 2021 e utilizou para coleta dos dados um formulário estruturado com 10 perguntas. Dentre os 98 jovens que participaram, 81,6% se encontram na faixa-etária entre 19 e 29 anos e 18,4% entre 15 e 18 anos, sendo 63,3% mulheres, 35,7% homens e 1% não-binário. Em sua maioria, os participantes disseram residir na Baixada Fluminense do Rio de Janeiro. Cabe a ressalva que 66,3% dos colaboradores responderam que costumam ter sempre momentos de lazer e 33,7% relataram que somente às vezes efetuam esse tipo de atividade. A principal forma de lazer apontada foi “Sair para passeios em lugares abertos”, onde se enquadram os parques naturais, as praias, os parques de diversão, praças públicas etc. Sendo assim, o distanciamento social impactou diretamente a principal forma de lazer de 51% dos jovens participantes da pesquisa. Considerando o lazer como uma necessidade humana e como dimensão da cultura, a vida monótona dentro de casa forçou o jovem a buscar novas formas de lazer. Os ambientes virtuais se tornaram os mais escolhidos dentro desse cenário, contudo, por ser algo que nem sempre é o que se prefere, os jovens percebem mudanças comportamentais nos seus dias, das quais destacam-se o desânimo, o estresse e o medo.
Outro resultado evidenciado na pesquisa foi o de descumprimento das medidas restritivas por esse público. Os jovens sentiam falta do contato direto, de estarem perto, de trocarem experiências de modo presencial e não somente através das telas, então, uma maneira que encontraram para tentar diminuir a saudade de amigos, foi justamente encontrando-os pessoalmente. Revela-se, assim, um paradoxo: Ao mesmo tempo que sabiam que não era seguro sair de casa para encontros pessoais, o faziam a fim de se manterem emocionalmente saudáveis. Se arriscavam em nome do lazer e da sociabilidade entre amigos, pois é algo tão imprescindível que não pode ser separado de seu cotidiano. Em razão disso, o aumento no número de jovens infectados e/ou hospitalizados por este vírus, agravaram o cenário e as consequências da conjuntura pandêmica. Trazemos assim, outro ponto importante nesta reflexão: O acolhimento da ideia de Necropolítica. Nesta perspectiva, a condução do controle da pandemia pelo Estado brasileiro revela a postura negacionista ou a minimização da gravidade da doença, o boicote aos protocolos de prevenção, a tentativa de deslegitimar a ciência, o movimento antivacina e o consequente aumento no número de mortes causadas pela Covid-19 e torna evidente a responsabilidade do poder político por quem morre e como se morre.
Este estudo ratificou também que o acesso ao lazer é atravessado por questões de classe e de território, posto que os participantes residem em localidades do Estado do Rio de Janeiro que são distantes dos grandes centros urbanos e possuem oferta menor ou reduzida de serviços de lazer e cultura, como cinema, teatro, centros culturais e museus. A fala de um jovem entrevistado ratifica a desigualdade de acesso ao lazer por uma questão de classe, pois seu baixo poder aquisitivo inviabiliza este acesso mesmo antes da pandemia, tendo piorado durante o período pandêmico: “Antes da pandemia, eu já não tinha o hábito de sair muito de casa, por não ter tempo, dinheiro e alguns outros empecilhos.” Dessa forma, considerando o avanço do neoliberalismo no governo brasileiro, com o desmonte de políticas públicas, fica evidente que a crise sanitária mundial agravou ainda mais as expressões da questão social, atingindo também a esfera do lazer.