O ethos da vida teórica e a necessidade metafísica

O espírito livre nietzscheano entre Schopenhauer, Voltaire, Montaigne e Descartes

Autores

  • William Mattioli Universidade Federal do Rio de Janeiro

DOI:

https://doi.org/10.47456/en.v15i1.45160

Palavras-chave:

Necessidade metafísica, Espírito livre, Ciência, Método

Resumo

O trabalho que se segue analisa os contornos gerais da concepção do espírito livre nietzscheano na transição do período de juventude ao período intermediário de sua obra. Nesse momento, a figura do espírito livre aparece como expressão de um ideal de vida filosófica caracterizada pelo ethos científico, motivada pela busca metódica da verdade e pelo contentamento com o mundo das coisas humanas; um ideal encarnado em figuras como Montaigne, Voltaire e Descartes, cada um deles representando um aspecto dessa forma de vida filosófica enaltecida por Nietzsche. A proposta do artigo é reconstruir, do ponto de vista da sua biografia intelectual, os principais elementos desse momento de transição. Primeiramente, analiso a adesão do jovem Nietzsche à tese da necessidade antropológica da metafísica, tal como ela aparece em Schopenhauer e Lange, tendo em vista identificar, na sequência, uma mudança importante concernente aos critérios de legitimação de crenças. O ponto central do argumento diz respeito à revisão de uma posição metafilosófica. No período de juventude, Nietzsche parece defender que a filosofia deve estar primariamente orientada à dimensão prática da nossa existência, e sua tarefa deve ser a de possibilitar a atribuição de um significado ético-metafísico ao nosso engajamento com o mundo e com a cultura. No final da década de 1870, essa posição é revista. Em Humano, demasiado humano, Nietzsche entende que os empreendimentos filosóficos não devem estar primariamente orientados para a prática, mas sim para a teoria, para a busca da verdade. É a tensão entre as motivações por trás do engajamento na vida filosófica e nas virtudes intelectuais que ela carrega que o artigo pretende apresentar através das personagens de Voltaire, Montaigne e Descartes, mapeando essas motivações a partir da influência de cada um deles.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

William Mattioli, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Professor do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Referências

ARALDI, C. Nietzsche, o cínico e o espírito livre. Um ensaio de crítica imanente. Estudos Nietzsche, v. 9, n. 2, p. 78-94, 2018.

BILATE, D. «Les nouvelles Lumières» et l’attitude voltairienne chez Nietzsche. In: Charles, S.; Pujol, S. (org.) Voltaire philosophe. Regards croisés. Amalivre: Paris, 2017.

BRUSOTTI, M. Die Leidenschaft der Erkenntnis. Philosophie und ästhetische Lebensgestaltung bei Nietzsche von Morgenröthe bis Also sprach Zarathustra. Berlin/New York: de Gruyter, 1997.

CAMPIONI, G. Nachweis aus Voltaire, Correspondence (1832) zitiert in: Arthur Schopenhauer, Briefe (1863). Nietzsche-Studien, 37, 2008, p. 268.

CAMPIONI, G. Nietzsche e o espírito latino. Trad. Vinícius de Andrade. São Paulo, Edições Loyola, 2016.

CORTEZ, R. Disciplina, legislação e velocidade: uma análise do ideal de vida filosófica. Estudos Nietzsche, v. 12, n. 2, p. 110-140, 2021.

D'IORIO, P. Nietzsche na Itália: a viagem que mudou os rumos da filosofia. Trad. Joana Angélica d'Avila Melo. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

FAUSTINO, M. A ‘grande libertação’ e a doutrina nietzschiana da saúde: A ‘grande saúde’ nos prefácios a Humano, demasiado humano. Estudos Nietzsche, v. 9, n. 2, p. 20-39, 2017.

HAN-PILE, B. Aspectos transcendentais, compromissos ontológicos e elementos naturalistas no pensamento de Nietzsche. Cadernos Nietzsche, 29, p. 163-220, 2011.

HELLER, P. Von den ersten und letzten Dingen. Studien und Kommentar einer Aphorismenreihe von Friedrich Nietzsche. Berlin/New York: de Gruyter, 1972.

JANZ, C. P. Friedrich Nietzsche: uma biografia, volume I: infância, juventude, os anos em Basileia. Trad. Markus A. Hediger. Petrópolis: Vozes, 2021.

JULIÃO, J. N. As considerações de Nietzsche sobre o Renascimento. Rio de Janeiro: Via Veritas, 2023.

JULIÃO, J. N. Para uma interpretação nietzschiana do Renascimento. Estudos Nietzsche, v. 15, n. 1, 2024.

KANT, I. Crítica da razão pura. Trad. Fernando Costa Mattos. Petrópolis: Vozes, 2015.

LANGE, F. A. Geschichte des Materialismus und Kritik seiner Bedeutung in der Gegenwart. Iserlohn: J. Baedeker, 1866.

LOPES, R. Ceticismo e vida contemplativa em Nietzsche. 2008. 573f. Tese (Doutorado em Filosofia) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008.

LOPES, R. Há espaço para uma concepção não moral da normatividade prática em Nietzsche? Notas sobre um debate em andamento. Cadernos Nietzsche, n. 33, p. 89-134, 2013.

MACEDO, I. Nietzsche, Wagner e a época trágica dos gregos. São Paulo: Annablume, 2006.

MATTIOLI, W. O paradoxo das causas finais: Schopenhauer leitor da “Crítica do juízo teleológico”. Revista de Filosofia Aurora, v. 30, n. 49, p. 205-235, 2018.

MATTIOLI, W. Ontologia e ciência na crítica de Nietzsche à metafísica em Humano, demasiado humano. Kriterion, n. 145, p. 231-259, 2020.

MATTIOLI, W. Schopenhauer and the Two Orders of Purposiveness in the World. Voluntas, v. 12, Ed. Especial: Schopenhauer e o pensamento universal, p. 01-16, 2021a.

MATTIOLI, W. Perfeccionismo e realismo moral em Nietzsche. Estudos Nietzsche, v. 12, n. 2, p. 77-109, 2021b.

MATTIOLI, W. Redenção na aparência e consolo metafísico: as duas ordens de justificação da existência em O nascimento da tragédia. Cadernos Nietzsche, v. 44, n. 3, p. 111-142, 2023.

MEDRADO, A. Ciência e liberdade de espírito. Uma leitura de Humano, demasiado humano. Outramargem: revista de filosofia, n. 1, 2014, p. 25-45.

MÉTAYER, G. Nietzsche et Voltaire. Paris: Flammarion, 2011.

MÉTAYER, G. A República dos gênios. Cadernos Nietzsche, v. 38, n. 2, 2017, p. 149-176.

MÉTAYER, G. Da liberdade do espírito. Estudos Nietzsche, v. 13, n. 2, p. 174-194, 2022.

MONTAIGNE, M. Ensaios. Livro III. Trad. Rosemary Costhek Abílio. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

NIETZSCHE, F. Digitale Kritische Gesamtausgabe (eKGWB). Disponível em: http://www.nietzschesource.org/#eKGWB

NIETZSCHE, F. O nascimento da tragédia. Trad. J. Guinsburg. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.

NIETZSCHE, F. Sobre verdade e mentira no sentido extramoral. São Paulo: Hedra, 2007.

NIETZSCHE, F. Sobre a utilidade e a desvantagem da história para a vida. São Paulo: Hedra, 2017.

NIETZSCHE, F. Schopenhauer como educador: considerações extemporâneas, 3. parte. Trad. Giovane Rodrigues e Tiago Tranjan. São Paulo: Mundaréu, 2018.

NIETZSCHE, F. Humano, demasiado humano. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

NIETZSCHE, F. Humano, demasiado humano II. Opiniões e sentenças diversas; O andarilho e sua sombra. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

NIETZSCHE, F. Aurora. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

PAULA, W. O “sentido da vida” em Schopenhauer e Nietzsche. Cadernos de Filosofia Alemã, v. 29, n. 1, p. 47-64, 2024.

PONTON, O. Nietzsche – Philosophie de la légèretè. Berlin/New York: de Gruyter, 2007.

PRANGE, M. Wagner, (Wilhelm) Richard. Verbete in: O léxico de Nietzsche. Trad. Ernani Chaves et al. São Paulo: Edições Loyola, 2014.

QUELOZ, M. Nietzsche’s English Genealogy of Truthfulness. Archiv für Geschichte der Philosophie, v. 103, n. 2, 2021, p. 341-363.

RÉE, P. A origem dos sentimentos morais. Trad. André Itaparica e Clademir Araldi. São Paulo: Editora Unifesp, 2018.

RETHY, R. The Descartes Motto to the first edition of Menschliches, Allzumenschliches. Nietzsche-Studien, 5, 1976, p. 289-297.

RICCARDI, M. Der faule Fleck des Kantischen Kritizismus. Erscheinung und Ding an sich bei Nietzsche. Basel: Schwabe, 2009.

SALAQUARDA, J. Nietzsche und Lange. Nietzsche-Studien, 7, 1978, p. 236-253.

SALAQUARDA, J. Der Standpunkt des Ideals bei Lange und Nietzsche. Studi Tedeschi, XXII, 1, 1979, p. 133-160.

SANTOS, O. A. R. Natureza e dinâmica de valores na filosofia do espírito livre de Nietzsche. 168f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011.

SCHMIDT, J. Kommentar zu Nietzsches Die Geburt der Tragödie. Berlin / Boston: Walter de Gruyter, 2012.

SCHOPENHAUER, A. O mundo como vontade e representação. Tomo I. Trad. Jair Barboza. São Paulo: Ed. Unesp, 2005.

SCHOPENHAUER, A. O mundo como vontade e representação. Tomo II. Trad. Jair Barboza. São Paulo: Ed. Unesp, 2015.

STACK, G. Lange and Nietzsche. Berlin: de Gruyter, 1983.

VIVARELLI, V. Nietzsche und die Masken des freien Geistes: Montaigne, Pascal und Sterne. Würzburg: Königshausen und Neumann, 1998.

Downloads

Publicado

08-08-2024

Edição

Seção

Artigos