A arte de Nilson Camizão

Cláudio Luiz Zanotelli

Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
claudio.zanotelli@ufes.br 

O escultor capixaba Nilson Camizão em seu atelier em meio à mata de Manguinhos se revela como um artista sublime da escultura, essa arte que “conserva” um momento, uma atmosfera, um ar do tempo de quando foi feita, independente do tempo que passa, tal a Jovem Annais sentada em um banco que segura um globo terrestre ou O homem que grita, com braços e pernas em movimento e “deformados” que indicam uma dança que nos leva longe ou ainda Dulcineia, escultura que deixa transparecer os traços de suas veias, ou marcas das mãos do escultor, sob a pele, fazendo falar o material, aflorar a sensação.

As diferentes matérias com as quais o escultor e artesão – pois ele mesmo realiza todo o processo de elaboração de sua obra desde o croqui até a fundição da peça em bronze ou a escultura entalhada em granito ou outro material - trabalha parece conservar um feixe de sensações, uma composição de uma atmosfera, de um momento, de um átimo de espaço-tempo que se torna independente e do modelo e do próprio artista. A escultura é o testemunho do que se conserva transformado através do tempo: um sorriso, uma expressão, um desejo, um gesto a jamais gravado que poderá (mesmo que o material se decomponha) ser observado e sentido dezenas, centenas e milhares de anos mais tarde, registro de um tempo e de um espaço que se foram, mas que pela vivência de quem os sente voltam a existir, tomam vida de outra forma.

A arte de Camizão conserva esses instantes, conserva aquilo que já foi. Mas, não se trata de nostalgia e sim de um conjunto de sensações, de afetos e percepções que gravaram na pedra, no bronze, no mármore ou na madeira algo que existe por si mesmo. As sensações se realizam nos materiais ou os materiais passam nas sensações.

A forma como Nilson se relaciona com suas obras diz muito sobre seu talento e sobre sua intuição e sensação primeira. Ele me dizia que há um mistério, uma sensação, algo de sublime quando está na fase de criação, algo que se revela, mas que vai além da figura como representação religiosa e entra no que poderíamos conceituar como uma transcendência sensitiva, quando os materiais mesmo das esculturas passam na sensação, não mais uma transcendência suprassensível religiosa, mas uma sensação que passa por dentro dos materiais. Em uma ocasião, com sua companheira, Valéria, me contavam da vida própria que as esculturas têm, me diziam que as pessoas, visitantes e transeuntes, reverenciam e respeitam essas figuras presentes em seu atelier, como entes suspensos no tempo e no espaço, presenças-ausências de vários mundos, de outros mundos.

E isso se sente e se vê nas obras de Camizão que ilustram a capa deste número da revista Geografares!