Revista Gestão & Conexões
Management and Connections Journal
Vitória (ES), Vol. 14, n. 1, dE 2025.
iSSn: 2317-5087
doi: https://doi.org/10.47456/regec.2317-5087.2025.14.1.45956.103.124
Artigo submetido em: 03.09.2024 Aceito em: 30.10.2024 PublicAdo em: 27.01.2025
Gestão do teletrabalho na Administração Pública: entre as
racionalidades instrumental e substantiva
RESUMO
A partir da abordagem substantiva das organizações, objetiva-se analisar tensões entre as
racionalidades substantiva e instrumental na gestão de programa de teletrabalho da Administração
Pública. Adota-se abordagem qualitativa, com aplicação do estudo de caso e coleta de dados por
documentos e entrevistas semiestruturadas, obtendo-se os resultados por análise de conteúdo.
Os resultados apontam tensões nos processos organizacionais “hierarquia e normas”, “controle” e
“divisão de tarefas”, tal como a tensão entre os objetivos do programa de garantir melhor qualidade
de vida ao teletrabalhador e de aumentar a produtividade organizacional, bem como a decorrente
da previsão normativa formal de participação de representantes dos servidores na gestão sem que
ocorra efetivamente na prática administrativa. Como contribuição do estudo, garantindo aplicabilidade
aos resultados da pesquisa, indicam-se possibilidades de ajustes para a gestão de programa de
teletrabalho na organização pública.
Palavras-chave: trabalho remoto; gestão pública; racionalidade; ministério público.
Marçal José Cavalcanti Silva Júnior
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
marcalzin@msn.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1896-679X
Washington José de Sousa
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
wsufrn@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6295-2806
Telework Management in Public Administration: between Instrumental
and Substantive Rationalitiesr
ABSTRACT
From the substantive approach of organizations, the research aims to analyze tensions between the
substantive and instrumental rationalities in the management of the Public Administration’s teleworking
program. A qualitative approach is adopted, applying a case study and collecting data through documents
and semi-structured interviews, obtaining results through content analysis. The results point to tensions
in the organizational processes “hierarchy and norms”, “control” and “division of tasks”, such as the
tension between the program objectives of ensuring a better quality of life for teleworkers and increasing
organizational productivity, as well as the resulting from the formal normative provision for the participation
of civil servant representatives in management without actually occurring in administrative practice. As
a contribution of the study, ensuring applicability to the research results, possibilities for adjustments
to the management of teleworking program in public organization are indicated.
Keywords: remote work; public management; rationality; public prosecution.
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Introdução
Na obra A Nova Ciência das Organizações (1989), Alberto Guerreiro Ramos
aponta que a teoria organizacional enfatiza a organização formal, orientada pela
racionalidade instrumental, voltada prioritariamente à maximização de recursos, dirigida
por regras mecânicas, operacionais, que não abarcam a diversidade das finalidades do
agir humano. Delineia, então, uma abordagem substantiva das organizações fundada
na redução das compulsões operacionais impostas às atividades humanas, voltando-
se ao aumento da satisfação pessoal em detrimento do alcance exclusivo de ganhos
materiais (Guerreiro Ramos, 1989).
No Brasil, a abordagem substantiva das organizações avançou quando Serva
(1997), utilizando dados empíricos coletados em três organizações, levou o conceito à
prática, elaborando um quadro analítico com presenças de racionalidade, caracterizando
elementos constitutivos e relacionando-os a processos organizacionais. Classificou,
então, organização substantiva como aquela que apresenta, na prática administrativa,
predominância de racionalidade substantiva pelos elementos autorrealização,
entendimento, julgamento ético, autenticidade, valores emancipatórios e autonomia
(Serva, 1997).
Santos (2012) apontou situações que geram tensão entre as racionalidades
substantiva e instrumental no cotidiano administrativo dos gestores públicos, analisando
como eles respondem a tais situações, observando a forma como se dá o processo
decisório e os valores e objetivos individuais. Sugeriu a exploração dos elementos
de racionalidade de Serva (1997) na Administração Pública para analisar a forma
como se revelam na prática desse tipo organizacional. Aqui, a Administração Pública
é objeto de pesquisa no teletrabalho, que tem sido adotado por órgãos públicos com
o intuito, dentre outros, de agilizar atividades, incrementando a produtividade (Silva
& Sousa, 2023), e de melhorar a qualidade de vida dos teletrabalhadores, finalidades
que refletem tanto elementos de racionalidade instrumental como substantiva.
No mundo do trabalho, ocorrem modificações geradas pela reestruturação
produtiva, pelo progresso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs)
e por formas de trabalho distintas daquelas que exigem a presença na sede física
da organização, tal como o teletrabalho (Silva et al., 2022). Com a pandemia de
covid-19, decretada no Brasil em março de 2020, e seu impacto nos âmbitos social
e econômico do país, a gestão das organizações sofreu influências, com relevantes
decorrências, entre elas a propagação do teletrabalho (Amorim et al., 2023). As
formas de trabalho remoto e híbrido (realizado parcialmente de maneira presencial)
exigiram novas competências e práticas de gestão, pondo, em contraposição, desafios
à qualidade de vida e ao bem-estar no teletrabalho (Velasco et al., 2023).
Abordando as racionalidades substantiva e instrumental nesse contexto da gestão
pública, entende-se a tensão entre elas como uma “situação gerada por dois ou mais
elementos que provocam nos indivíduos sensações como desconforto, indecisão e
incômodo psicológico, podendo provocar manifestações individuais ou coletivas que
podem ter repercussão nas organizações” (Santos, 2012, p. 109). Esta pesquisa é
guiada, então, pelo seguinte problema: como se manifestam elementos de racionalidade
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instrumental e substantiva revelando tensões na gestão de programa de teletrabalho
na Administração Pública?
O teletrabalho no Ministério Público da Paraíba (MPPB), órgão da esfera estadual,
foi adotado inicialmente com a criação do seu programa pelo Ato PGJ n.º 009/2018
(MPPB, 2018), com propósitos variados, direcionados à eficiência da organização,
bem como melhorias aos servidores. O presente artigo tem, assim, o objetivo de
analisar tensões entre as racionalidades substantiva e instrumental, prospectando
informações úteis à retroalimentação de programa de teletrabalho na Administração
Pública, tomando como ambiente empírico o MPPB.
Em termos acadêmicos, o tema apresenta potencial para estimular debates e
auxiliar no avanço de análises sobre racionalidade nas organizações, contribuindo,
portanto, para o avanço do conhecimento. Tomando como base os estudos sobre a
racionalidade nos trabalhos científicos já efetivados e buscando aprofundar a análise
do tema no âmbito da Administração Pública, especificamente quanto ao teletrabalho,
a pesquisa incrementa a limitada produção acadêmica em unidades do Ministério
Público, conforme evidenciado por Silva e Sousa (2023). Há, ainda, contribuição para
a prática administrativa da organização pública, uma vez que os resultados acendem
oportunidades à retroalimentação do programa de teletrabalho.
Para alcançar o objetivo anunciado, após esta introdução são apresentadas
bases teóricas sobre teletrabalho em organizações públicas e racionalidade na prática
administrativa. Advêm, então, os procedimentos metodológicos adotados na pesquisa
e a discussão dos resultados, fechando com as considerações finais que incorporam
limitações do trabalho e sugestões para estudos futuros.
Teletrabalho em organizações públicas
A eficiência é prevista de forma expressa na Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988 (CRFB/1988) como um dos princípios orientadores da Administração
Pública, e considerando que a utilização do teletrabalho pressupõe o aumento da
produtividade (Lopes & Lunardi, 2022), as organizações públicas têm implementado
cada vez mais programas formais de teletrabalho como instrumentos capazes de
auxiliar no alcance da concretização do princípio constitucional.
A Escola Nacional de Administração Pública (Enap), em cooperação com a
Duke University e o Center for Advanced Hindsight, em pesquisa sobre teletrabalho,
com cerca de 36 mil respostas de participantes brasileiros em 2020, identificou que a
pandemia de covid-19 colocou 63% da força de trabalho federal em trabalho remoto (o
equivalente a 357.767 servidores) e que, no futuro, os servidores desejariam conciliar
carga horária de trabalho entre escritório presencial e casa, manifestando, ainda, a
percepção de terem a confiança dos chefes para a execução do trabalho remoto,
além de apoiarem uma política de teletrabalho (Enap, 2020).
O Decreto Presidencial n.º 11.072/2022, dispondo sobre o Programa de Gestão e
Desempenho (PGD) da Administração Pública Federal, estabeleceu regras especiais
para uma de suas modalidades, o teletrabalho (Decreto Presidencial n.º 11.072, 2022).
Diante da estrita legalidade a que se submete a Administração Pública no Brasil, a
regulamentação indica avanço na adoção do trabalho remoto. No âmbito federal,
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140 instituições – 32 órgãos e 108 entidades - implementaram o PGD, viabilizando
teletrabalho pelos servidores (Portal do Servidor, n.d).
Programas formais de teletrabalho igualmente avançam em outras esferas de
governo. Com fundamento na Resolução n.º 157/2017 do Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP), os Ministérios Públicos dos Estados passaram a instituir
programas com tal finalidade. Dados consolidados em 30 de junho de 2022 pelo
Observatório Nacional do Ministério Público apontam que dos 25 órgãos ministeriais
estaduais (não há dados sobre Roraima), 16 possuem regime de teletrabalho
regulamentado. Em 14 deles é necessária a elaboração de plano de trabalho para
acompanhamento, e em oito há previsão regulamentada de desconexão dos servidores
em teletrabalho (Federação Nacional dos Trabalhadores dos Ministérios Públicos
Estaduais [FENAMP], 2022), o que possibilita ao teletrabalhador organizar seu próprio
horário de trabalho, com períodos reservados a atividades pessoais e sociais, desde
que as metas definidas no plano de trabalho sejam cumpridas (FENAMP, comunicação
pessoal, 07 de agosto de 2023).
Analisando se as características da estrutura organizacional do Ministério Público
de Alagoas (MPAL) eram adequadas para a implementação do trabalho remoto dos
analistas jurídicos, Santos (2022) constatou a necessidade de, antes de regulamentar o
trabalho remoto, ser implantado um serviço de triagem, encaminhamento e atendimento
ao cidadão para assistir, especialmente, os excluídos digitais. Evidenciou-se, assim,
a exigência de adequações organizacionais desde a implantação dos programas
formais de teletrabalho, em especial em órgãos que atuam diretamente com o público
em geral, tal como o Ministério Público.
Sob outra perspectiva, em pesquisa realizada no Tribunal Regional do Trabalho
da Oitava Região (TRT 8ª) sobre engajamento, definido por Schaufelli e Bakker (2004)
como um estado de espírito de satisfação e positividade quanto ao trabalho, Franco
(2022) analisou sua intensidade entre servidores que atuam no teletrabalho normativo.
Restou demonstrado que, diante das alterações que o teletrabalho provoca, é preciso
intervir no ambiente laboral, visando ao equilíbrio entre os recursos e demandas que
atingem os grupos com baixo engajamento, diante do risco de desenvolverem estresse
crônico, devendo-se adotar, também, estratégias para assegurar a manutenção do
engajamento nos demais grupos (Franco, 2022).
Tem-se, assim, que a implementação de programas de teletrabalho nas
organizações públicas abrange uma diversidade de perspectivas ao impactar tanto
as relações da instituição com o público externo, como os próprios servidores do
órgão que atuam em teletrabalho. A literatura apoia a noção de que é necessária uma
abordagem multifacetada, entendendo-se que o êxito de um programa de teletrabalho
depende de aspectos relacionados tanto aos indivíduos, a exemplo de suas habilidades
de autorregulação, quanto ao trabalho, como o nível de interdependência das tarefas,
e à organização, como o apoio dos gestores (Allen et al., 2015).
Racionalidade na prática administrativa
Em meio à diversidade de propósitos na adoção do teletrabalho, em que coexistem
interesses da administração e dos teletrabalhadores, emerge a oportunidade de se
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investigar elementos de racionalidade na prática administrativa. Nas atividades de
natureza econômica, condicionadas à maximização de recursos, o homem integra
engrenagem para o alcance de fins, uma vez submetido a padrões de economicidade
e orientado pela racionalidade instrumental (Guerreiro Ramos, 1989) – componente
representado, nos princípios da Administração Pública brasileira, pela eficiência
(CRFB, 1988). Como contraponto, Guerreiro Ramos (1989) elenca condições para
outro tipo de abordagem das organizações, centrada no indivíduo e orientada pela
racionalidade substantiva, o que exige minimamente consenso social para que os
objetivos organizacionais não sejam frustrados (Cardoso & Muller, 2020).
Diante do debate teórico em torno da obra de Alberto Guerreiro Ramos, Serva
(1997) percebeu lacuna nos estudos a respeito da racionalidade: não demonstrada na
prática administrativa. Realizou, assim, exercício empírico para evidenciar a presença
de racionalidade substantiva na prática, suscitando novos caminhos de investigação,
a exemplo do caso aqui reportado que, utilizando seu quadro de análise devidamente
adaptado, considera princípios de Guerreiro Ramos (1989) correlacionados à noção
de tensão formulada por Santos (2012).
Delineando as categorias de análise, de maneira a investigar os elementos
de racionalidade em processos de gestão do teletrabalho no serviço público, foram
selecionados três processos organizacionais dentre aqueles que Serva (1997)
estabeleceu como essenciais no processo analítico da racionalidade nas organizações.
Tendo que a investigação se dá em uma organização pública, com gestores submetidos
à supremacia da legalidade e o poder hierárquico decorrendo das normas legais, o
primeiro processo organizacional definido foi o de “hierarquia e normas” (como o poder
é exercido; natureza e aplicação das regras). Ademais, levando em conta que as
tarefas e o monitoramento de sua execução no teletrabalho são realizados em novos
formatos criados a partir das necessidades surgidas com a adoção do trabalho remoto,
tornando relevante a investigação de como se efetivam na prática administrativa,
os outros dois processos organizacionais selecionados foram o “controle’ (formas,
finalidade, responsáveis e instrumentos utilizados) e a “divisão de tarefas” (critérios
utilizados, intensidade da especialização, flexibilidade).
Na verificação da presença de elementos das diferentes manifestações de
racionalidade são utilizados, para a racionalidade substantiva, os seguintes:
a) autorrealização – processos de concretização do potencial inato do indivíduo,
complementados pela satisfação; b) entendimento – ações pelas quais se
estabelecem acordos e consensos racionais, mediadas pela comunicação
livre e coordenando atividades comuns sob a égide da responsabilidade e da
satisfação; c) julgamento ético – deliberação baseada em juízos de valor (bom,
mau, verdadeiro, falso, certo, errado), que se processa através do debate racional
sobre as pretensões de validez emitidas pelos indivíduos nas interações; [...]
f) autonomia – condição plena dos indivíduos para poder agir e expressar-se
livremente nas interações (Serva, 1997, p. 22, grifo do autor).
Por outro lado, para a racionalidade instrumental são verificados os elementos:
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a) cálculo - projeção utilitária das consequências dos atos humanos; b) fins - metas
de natureza técnica, econômica ou política (aumento de poder); c) maximização
dos recursos - busca da eficiência e da eficácia máximas, sem questionamento
ético, no tratamento de recursos disponíveis, quer sejam humanos, materiais,
financeiros, técnicos, energéticos ou ainda, de tempo; [...] e) desempenho -
performance individual elevada na realização de atividades, centrada na utilidade;
[...] h) estratégia interpessoal - aqui entendida como influência planejada
sobre outrem, a partir da antecipação das reações prováveis desse outrem a
determinados estímulos e ações, visando atingir seus pontos fracos (Serva,
1997, p. 22, grifo do autor).
Sabioni (2018), em análise das motivações e fatores que condicionam a
participação ativa no controle social, revela a complementaridade das racionalidades,
alinhando-se aos estudos de Serva (1997) e Santos (2012), ao constatar que a
motivação para a participação dos cidadãos é dirigida por ambas as racionalidades,
que coexistem, verificando-se uma alternância de predomínio, ora sobressaindo
a racionalidade substantiva, e ora a racionalidade instrumental. Essa existência
simultânea das racionalidades possibilita o surgimento das tensões. Consideram-se,
então, os elementos de tensão entre as racionalidades apontados por Santos (2012),
sendo apresentados sob a forma de representação gráfica (Figura 1).
Figura 1. Elementos da tensão entre as racionalidades
Fonte: Elaboração a partir de Santos, 2012, pp. 109, 162, 205-208.
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Conforme delineado no diagrama, Santos (2012) concebeu características para
cada elemento de tensão entre as racionalidades e, a partir de tal ordenamento e dos
elementos de Serva (1997) conforme descritos, apresenta-se na Tabela 1 o modelo
de análise utilizado para o tratamento dos dados da presente pesquisa.
Tabela 1 - Modelo de análise
Processos
organizacionais
Racionalidade Tensão
Racionalidade
substantiva
Racionalidade
Instrumental
Hierarquia e Normas
Organização e exercício do
poder
Iniciativa e alterabilidade
Flexibilidade
Entendimento
Julgamento
ético
Fins
Desempenho
Estratégia
interpessoal
Características
organizacionais
Ausência de consenso
Forças de pressão e
influências
Inconformidade e convicções
Preferências pessoais e
organizacionais
Legitimidade
Multiplicidade de objetivos
conexos
Controle
Finalidades
Execução
Meta de produção
Entendimento Maximização de
recursos
Desempenho
Estratégia
interpessoal
Divisão de tarefas
Parâmetros
Tarefas
Aptidões
Autorrealização
Entendimento
Autonomia
Maximização de
recursos
Desempenho
Cálculo
Fonte: Dados da pesquisa, adaptado de Serva (1997) e Santos (2012).
Verifica-se, portanto, que a partir dos fundamentos teóricos que servem
de substrato para a pesquisa foram definidas as categorias de análise com a
identificação dos elementos que as constituem, estruturando-se o quadro utilizado
como direcionamento para a coleta e análise dos dados, de forma a intermediar
adequadamente a questão da pesquisa aos resultados.
Procedimentos metodológicos
A escolha do tema proposto partiu da constatação do avanço do teletrabalho
na Administração Pública brasileira, tendo sido o MPPB selecionado como unidade
de pesquisa por ter implementado efetivamente seu programa de teletrabalho desde
maio de 2019 (MPPB, 2019), antes mesmo da pandemia de covid-19, já estando em
pleno funcionamento e com considerável participação dos servidores da instituição.
Os sujeitos participantes da pesquisa foram os gestores do programa.
Adotou-se uma abordagem metodológica qualitativa. Trata-se de pesquisa
exploratória, buscando-se ampliar o conteúdo sobre a temática, e descritiva, traduzindo-
se em registrar e descrever os fatos analisados sem neles interferir (Cervo et. al.,
2007). Considerando a natureza da questão de pesquisa formulada, o método de
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pesquisa aplicado foi o estudo de caso. Justifica-se a utilização do método por permitir
lançar luz empírica sobre a teoria orientadora da pesquisa, corroborando conceitos
teóricos (Yin, 2015).
Foi realizada uma triangulação de dados a partir de múltiplas fontes de
evidência. Na coleta de dados, inicialmente foi realizada uma análise documental,
com a verificação, em relação ao MPPB, dos relatórios de atividades, publicações
do Diário Oficial Eletrônico (DOE) e normas internas do órgão, além de documentos
legais que regulam as atividades ministeriais na Paraíba. Os documentos internos
da instituição foram buscados por meio do sítio eletrônico do MPPB (https://www.
mppb.mp.br), nas abas “Atos e Normas” e “Serviços”, possibilitada a procura pela
matéria e ano do documento. Já o texto da CRFB/1988 e das legislações federais
foram retirados do Portal da Legislação da Presidência da República (http://www4.
planalto.gov.br/legislacao/).
Com o fim de atingir, empiricamente, um amplo entendimento das particularidades
da gestão do programa de teletrabalho do MPPB, foram realizadas entrevistas
semiestruturadas com os seus gestores. Quanto à gestão do programa, o Ato PGJ
n.º 04/2022 prevê a composição da Comissão de Gestão do Teletrabalho, formada
por sete componentes. Ela atua na gestão direta do programa, sendo encarregada
de averiguar seu desenvolvimento, deliberar e propor melhorias. Tendo em vista
que o objetivo desta pesquisa foi direcionado à gestão do teletrabalho, a coleta de
dados foi realizada com os componentes da Comissão de Gestão de Teletrabalho
e também com o Diretor Administrativo do MPPB, que tem atribuições específicas
no direcionamento e execução do programa, tais como receber as solicitações para
ingresso no programa e elaborar o plano de trabalho com o estabelecimento das metas
e atividades a serem desenvolvidas pelo teletrabalhador (MPPB, 2022a). Chegou-se,
então, ao total de oito gestores entrevistados.
Primeiramente foi providenciada a relação com os nomes e contatos dos sujeitos
participantes da pesquisa junto ao Departamento de Recursos Humanos (DRH) do
MPPB para comunicação. Foi enviada mensagem aos participantes por e-mail, e, após
anuência e definição de data e horário, encaminhou-se link de acesso à plataforma
Google Meet para videoconferência. Com a expressa autorização dos participantes,
as oito entrevistas, realizadas entre 14 e 27 de julho de 2023, foram gravadas e
transcritas. A fim de garantir o anonimato dos entrevistados, códigos foram usados
em substituição a nomes ou cargos da seguinte maneira: GESTORES ADM - G1 a
G5: gestores do teletrabalho por ocupar cargo na administração superior do MPPB;
GESTORES SERV - G6 a G8: gestores do teletrabalho sem cargo na administração
superior do MPPB.
A análise de conteúdo dos dados coletados seguiu a técnica concebida por Bardin
(2016). Foram realizadas leituras integrais das transcrições das entrevistas, com a
escolha do corpus de análise, levando em conta todos os seus elementos, por meio
da seleção dos textos pertinentes. Os recortes do texto foram realizados por temas
(ênfase semântica), caracterizados pelos processos organizacionais investigados
(hierarquia e normas; controle; divisão de tarefas), buscando-se em cada um deles os
elementos constitutivos das racionalidades instrumental e substantiva. Tomou-se como
indicador a presença (ou ausência) deles, de forma a compreender a manifestação
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da racionalidade nos processos organizacionais, bem como as tensões existentes,
mantendo-se o encadeamento lógico do modelo de análise e explicitando o vínculo
entre os dados analisados e o referencial teórico. Na sequência, na fase de tratamento
dos dados, realizou-se a operação lógica, com a análise reflexiva e crítica do conteúdo,
chegando-se às interpretações viabilizadas pela categorização realizada (Bardin, 2016).
Passa-se, então, à exposição dos resultados obtidos, a partir da identificação
de sentidos, temáticas e parâmetros relevantes, e às discussões respectivas, com a
consequente obtenção de inferências válidas e fundamentadas.
O programa de teletrabalho no ministério público da Paraíba
A instalação integral do sistema virtual no MPPB, o MPvirtual, possibilitou a
implementação do programa de teletrabalho, permitindo a realização das atividades
ministeriais de forma remota, fora dos prédios físicos da instituição, utilizando os
recursos tecnológicos para tramitar procedimentos, realizar videoconferências,
prestar atendimento à população, entre outras. Assim como constatado em relação ao
Ministério Público de Alagoas (MPAL) no trabalho de Santos (2022), outra importante
característica organizacional que favorece a adoção do teletrabalho pelo MPPB é a
descentralização de sua base operacional, visto que os Promotores e Procuradores
de Justiça possuem independência para a realização de suas atribuições legais
(Lei complementar n.º 97, 2010), bem como para organização de suas equipes de
trabalho, permitindo a anuência à adesão dos servidores que expressarem interesse
e capacidade para o trabalho remoto (Santos, 2022).
O programa foi implementado em 2019 (MPPB, 2019), com a participação de
apenas três servidores (MPPB, 2023). Em 2020, na pandemia de covid-19, com
a imposição do distanciamento social compulsório no Brasil, todos os integrantes
da instituição foram obrigados a cumprir suas atividades em trabalho remoto. A
experiência imperiosa durante a pandemia gerou amadurecimento institucional quanto
à consolidação do teletrabalho na prática administrativa do MPPB, inclusive com
aumento da produtividade do órgão e redução de custos, conforme reconhecem os
gestores G2 e G3 durante a coleta de dados desta pesquisa. Aumentou o interesse
tanto pela administração superior, que realizou modificações regulamentares facilitando
a participação dos interessados, quanto pelos servidores. Em agosto de 2022, a
quantidade era de 74 servidores vinculados ao programa, com 26 na modalidade
integral, 47 na mista e um na parcial (MPPB, 2022c). Em agosto de 2023, participavam
118 servidores, com 43 integralmente à distância, 74 na modalidade mista e um na
parcial (MPPB, 2023b), representando aumento de 59,4% em 12 meses. Os dados
referentes aos anos de 2019 (implantação do programa antes do período pandêmico),
2022 e 2023 (abrangendo o período posterior ao distanciamento social obrigatório)
indicam forte influência da pandemia na adesão ao programa.
A norma regulamentadora do programa, o Ato PGJ n.º 04/2022, que revogou o
Ato PGJ n.º 009/2018, caracteriza o teletrabalho como a prática da atividade laboral
de maneira remota, fora das dependências de sua unidade, com o uso de recursos
físicos e tecnológicos, em regra providenciados e custeados pelo teletrabalhador
(MPPB, 2022a). O art. 3º do Ato PGJ n.º 04/2022 elenca os objetivos do programa,
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que é direcionado, predominantemente, à evolução da eficiência da instituição e ao
alcance de melhores resultados, o que decorre das previsões relativas à redução de
custos com a estrutura, elevação de metas com exigência de índices de produtividade,
redução do consumo de bens e serviços e incremento da força de trabalho. Há,
todavia, repercussões para os servidores, como indivíduos, ao instituir que objetiva
a melhoria da qualidade de vida dos teletrabalhadores, bem como a ampliação da
possibilidade de trabalho aos servidores com dificuldade de locomoção.
Importa registrar, no entanto, que as previsões constantes no regulamento do
MPPB relacionadas à saúde dizem respeito apenas à composição da Comissão de
Gestão do Teletrabalho, integrada por um servidor da área de saúde da instituição (Art.
16, parágrafo único), e o dever do servidor de comunicar à chefia imediata a ocorrência
de acidente de trabalho ou enfermidade durante a execução do trabalho remoto (Art.
12, VIII), sem estabelecer qualquer ação preventiva e efetiva quanto aos cuidados com
a saúde física, mental e emocional do teletrabalhador. Analisando regulamentação do
teletrabalho em órgãos federais, Esteves (2020) apontou a necessidade da inserção,
nos regulamentos dos programas, de regras relativas à saúde, higiene e segurança
do trabalho, o que não se observou no Ato PGJ n.º 04/2022. Para garantir uma efetiva
qualidade de vida do teletrabalhador, é preciso que exista um supervisionamento das
condições do seu ambiente de trabalho, verificando, por exemplo, exigências atinentes
à ergonomia, bem como a adequação do espaço físico, com permissão normativa,
inclusive, para que sejam realizadas vistorias, mediante comunicação prévia, no local
de teletrabalho, condicionando a permanência do servidor no programa ao ajuste às
normas (Esteves, 2020).
No que se refere à gestão do programa, com auxílio direto da Diretoria
Administrativa, é a Comissão de Gestão de Teletrabalho que acompanha o seu
desenvolvimento, apurando resultados alcançados e verificando o cumprimento dos
objetivos. É também responsável pela resolução dos casos não previstos na normativa
e da propositura de aperfeiçoamentos necessários (MPPB, 2022a). Outros integrantes
do MPPB possuem papéis relevantes na execução, mas não diretamente na gestão
do programa, a exemplo daqueles que atuam como chefia imediata, ou seja, membro
ou servidor com atribuição gerencial a quem o teletrabalhador está subordinado
(MPPB, 2022a). Na intranet do MPPB gestores e teletrabalhadores têm acesso ao
sistema Thoth, pelo qual se emitem relatórios estatísticos e gerenciais de eficiência e
produtividade. Nele é possível localizar dados no MPVirtual a partir da movimentação
realizada pelos servidores, possibilitando o acompanhamento (CNMP, 2021). Os dados
coletados, relativos aos índices de produtividade, são utilizados para a estipulação
da meta a ser atingida, que deve ser compatível com a quantidade, complexidade e
realidade da unidade ministerial. (MPPB, 2022a).
Os documentos que regulamentam o programa possibilitam a compreensão
das regras formais e a triangulação de dados com aqueles obtidos nas entrevistas e
submetidos à análise temática, cujos resultados estão expostos na sequência.
Tensões entre as racionalidades substantiva e instrumental
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Hierarquia e normas
A Comissão de Gestão do Teletrabalho tem composição estabelecida no Art.º
16 do Ato PGJ n.º 04/2022. Dois são membros do MPPB, os ocupantes dos cargos
de: Secretário-Geral, que no âmbito da Procuradoria-Geral de Justiça tem, entre suas
atribuições legais, a de auxiliar a administração superior na gerência administrativa;
e o Secretário de Planejamento e Gestão, responsável, em meio a outras funções,
pela criação e implementação de processos de trabalho, além da revisão dos
atualmente desenvolvidos (Lei complementar n.º 97, 2010). Outros dois componentes
são servidores efetivos nomeados pelo PGJ para exercício de cargo em comissão:
o Chefe do Departamento de Recursos Humanos e o Chefe do Departamento de
Desenvolvimento e Gestão de Processos (Lei n.º 10.432, 2015). Esses quatro gestores
são, portanto, também participantes da gestão da instituição como um todo, junto
à administração superior. Os outros três integrantes da comissão são servidores
com atuação ou representatividade específica, sendo eles: um representante dos
teletrabalhadores; um servidor da área de saúde da instituição; e um representante
da entidade sindical ou associação de servidores (MPPB, 2022a).
Completando o número de oito gestores do programa, o cargo em comissão de
Diretor Administrativo também é privativo de servidor efetivo. Dessa forma, tem-se
que do número total de gestores, cinco atuam simultaneamente junto à administração
superior do MPPB (G1, G2, G3, G4, G5), grupo que passa a ser denominado de
GESTORES ADM, e três (G6, G7, G8) – GESTORES SERV – são servidores que
não participam da gestão do programa de teletrabalho pelo fato de exercerem cargos
vinculados à administração da instituição. Objetivamente, o Ato PGJ n.º 04/2022 busca
construir uma gestão orientada pela pluralidade de perspectivas, prezando por uma
composição diversa ao inserir, na constituição da Comissão de Gestão do Teletrabalho,
não apenas representantes da administração superior, com a responsabilidade legal
de assegurar o desempenho e atingimento dos fins institucionais (elementos da
racionalidade instrumental), mas também representantes dos teletrabalhadores e
servidores em geral, possibilitando um canal de comunicação para uma gestão fundada
em entendimento, valores e interesses dos participantes do programa (elementos de
racionalidade substantiva).
Em que pese a composição, os três GESTORES SERV afirmam que não
participaram de reuniões da comissão, inexistindo convocação ou comunicado nesse
sentido, apesar da designação formal para integrá-la, que se deu em 07 de julho
de 2022 (MPPB, 2022b). Esse fato converge com o mencionado por G5, G3 e G2
(GESTORES ADM), que relatam a realização de reuniões, no caso, com apenas
alguns do grupo:
[...] Inclusive agora há pouco foi feita uma reunião justamente para discutir
isso, para alterar o ato que tá hoje em vigor, fazer algumas alterações, e
veio de um membro essas sugestões, fez-se a reunião e eles ainda estão
discutindo como vai se proceder, se vai colocar ou não essas sugestões de
um determinado membro no ato. (G5)
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Marçal José CavalCanti silva Júnior | Washington Jo de sousa
Geso & Conees (ManageMent and ConneCtions Journal). Vitória (Es), v. 14, n. 1, p. 103-124, jan./abr. 2025..
[...] recentemente a gente teve reuniões da comissão, introduziu outros
formatos dentro da comissão do teletrabalho e ainda estamos aprimorando
pra você entender que isso ainda é embrionário. (G3)
[...] algumas situações eu conversava muito, sobretudo com a Secretária
de Planejamento e o Diretor Administrativo, das necessidades de fazer
adequações [...] entendi que era necessário e conversei com a Secretaria
de Planejamento e eu encaminhei essa proposta ao Procurador. (G2)
Dessa constatação infere-se a existência de tensão entre o estabelecido na
norma, com previsão formal de participação de representantes dos servidores e
teletrabalhadores na gestão do programa, e o que ocorre na prática administrativa.
Deixa-se de aplicar, na prática, elementos de racionalidade substantiva previstos
no ato regulamentador, gerando a tensão manifestada pelo elemento denominado
por Santos (2012) de “preferências pessoais e organizacionais”, no aspecto da
dificuldade para integração servidor-organização. Os representantes dos servidores na
Comissão, apesar de formalmente designados, não possuem, de fato, participação no
direcionamento do programa, não se integrando os interesses e valores dos servidores
à gestão do teletrabalho, que se mantém orientada primordialmente pelas preferências
organizacionais. O convite a todos os integrantes da Comissão para acompanhamento
das reuniões e efetiva colaboração nas tomadas de decisão tornaria sua atuação
plural e inclusiva, atendendo à variedade de interesses do corpo funcional que integra
não apenas o programa, mas a instituição, visto que a adesão está disponibilizada
a todos os servidores dos mais diversos setores.
Ainda dentro do processo organizacional em comento, abordando-se o
componente da iniciativa e alterabilidade (origem do poder normativo; possibilidade
e capacidade para alteração das regras), quanto à elaboração das normas que regem
o programa não há divergência no posicionamento dos gestores com relação à
possibilidade de receberem propostas de formulação e alteração das regras. Alterações
normativas buscando o aprimoramento do formato do programa já foram efetivadas,
inclusive por meio da edição do Ato PGJ n.º 04/2022, do qual decorreu a revogação
do Ato PGJ n.º 009/2018, inaugurador do programa. Revela-se, no entanto, que todas
as normas haviam sido elaboradas ou alteradas por iniciativa da própria administração
superior ou dos GESTORES ADM, não tendo os GESTORES SERV encaminhado
qualquer propositura. Os gestores G6 e G8 afirmaram não haver canal formal para
que os servidores proponham medidas.
A tensão surge do fato de os gestores assentirem com a possibilidade de
participação dos servidores na elaboração de regras para o programa de teletrabalho,
o que revelaria a presença de racionalidade substantiva pelo entendimento, enquanto,
na prática, as proposituras partem apenas da administração superior, sem diálogo com
os teletrabalhadores. Regulamentar meios para a gestão do programa, é pertinente
destacar, não necessariamente concretiza uma gestão democrática conforme prevê o
ato regulamentador, sendo isso revelado pelos entrevistados quando pautam a carência
de reuniões e a frágil participação. Dá-se abertura, assim, a uma regulamentação
utilitarista, instrumental, voltada prioritariamente ao alcance de resultados e à
eficiência organizacional. Surge daí o tensionamento manifestado pelo elemento das
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“características da organização”, no enfoque da participação. Como aponta Sabioni
(2018) ao explanar o modelo de administração pública societal, a racionalidade
substantiva se relaciona a ações fundadas em consenso, debate e participação. Sob
tal premissa, disponibilizar e fazer a divulgação de meios de discussão e proposituras
para elaboração dos regulamentos seria capaz de concretizar a abertura da gestão
do programa para uma concepção mais democrática das normas que regulam a vida
funcional dos teletrabalhadores.
No que se refere ao componente da flexibilidade (rigidez quanto ao cumprimento
dos regulamentos e aplicação de penalidades), há diversas regras para assegurar
o respeito ao regulamento do programa, com previsão de penalidades, valorizando
critérios objetivos do Ato PGJ n.º 04/2022 quanto a metas de produção (fins,
desempenho), denotando conteúdo de racionalidade instrumental. Por outro lado,
os relatos dos gestores convergem para destacar caráter flexível, fundado em análise
que vai além dos números, ponderando o contexto da execução das atividades, os
tipos de tarefas realizadas e a unidade onde está sendo realizado o teletrabalho.
Uma tensão emerge entre o fato de os gestores perceberem flexibilidade, revelando
racionalidade substantiva, todavia, predominam regras rígidas que reforçam elementos
de racionalidade instrumental.
A tensão, nesse caso, decorre da estrita legalidade que rege a Administração
Pública, só podendo ser praticado o que está previsto na norma, deixando pouca
liberdade para os gestores se desvencilharem da rigidez legalista. O gestor, então,
ainda que busque agir sob valores de racionalidade substantiva, a fim de satisfazer
o interesse público sem deixar de compreender valores individuais que envolvem
determinada situação (julgamento ético), fica limitado à formalidade a que está
submetida a instituição sob o regime do direito público. Verifica-se, aqui, o elemento
das “características organizacionais”, sob o aspecto da legislação engessada, abordada
por Santos (2012) em razão de a Administração Pública ter uma delimitação estrutural
do que se pode ou não realizar a partir de uma normatização, representando um
impedimento para desenvolver ações além daquilo estabelecido na norma.
Exemplo verificado no Ato PGJ n.º 04/2022 é a limitação de que apenas 50%
dos servidores com funções correlatas na mesma unidade podem participar do
programa na modalidade integral (Art. 6º, I). A regra não considera a possibilidade de
a demanda de servidores presenciais ser menor em determinada unidade, permitindo
uma quantidade maior de teletrabalhadores integralmente em trabalho remoto,
conforme as circunstâncias locais. Isso pode gerar um impedimento à participação
de servidores interessados em ingressar no programa. Tem-se que a inserção de
previsões normativas admitindo maior flexibilidade, no intuito de ampliar o acesso e
permanência dos servidores no programa, assim como o entendimento entre a gestão
e os participantes, poderia viabilizar decisões mais bem refletidas e tomadas sob a
permissão formal de um agir flexível. Além disso, o funcionamento da Comissão de
Gestão do Teletrabalho nos termos previstos no ato regulamentador, com efetiva
participação dos GESTORES SERV, mitigaria, pelo entendimento e participação,
efeitos da rigidez que preside o funcionamento da Administração Pública.
Controle
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O monitoramento do cumprimento das regras do programa de teletrabalho
no MPPB envolve variados sujeitos. A execução desse controle cabe à Comissão
de Gestão do Teletrabalho, verificando o atingimento dos objetivos do programa
e elaborando relatório anual destinado ao PGJ, autoridade máxima da instituição.
Em relação ao componente “finalidades” do processo organizacional em discussão
(objetivos do acompanhamento do desempenho do programa), corroborando a
predominância de elementos de racionalidade instrumental nos objetivos descritos
no já citado Art. 3º do Ato PGJ n.º 04/2022, os relatos dos gestores revelam prioridade
na eficiência do órgão ministerial, não obstante o registro da importância do alcance
da qualidade de vida do servidor, que aparece de forma secundária nas falas da
maioria dos entrevistados. Nesse ponto, há tensão entre os objetivos do programa de
gerar melhorias ao teletrabalhador na sua prática laboral e vida pessoal, e o risco de
sobrecarga de trabalho decorrente do aumento de produtividade exigido, conforme
citado pelos GESTORES SERV:
[...] a gente recebe muita queixa de servidor, né, de que o teletrabalho tem
sido mais exaustivo, às vezes até do que trabalhar aqui, porque acaba que
não tem horário, não tem ergonomia, não tem, e a gente recebe essas
queixas [...] (G7)
[...] essa questão de atenção à saúde do trabalhador estar em teletrabalho,
eu acredito que ainda vai ser objeto de discussões. [...] em relação
especificamente ao servidor que está em teletrabalho ainda não, mas ele
entra na regulamentação agora também da questão de saúde mental, porque
ele também sofre a sobrecarga, o servidor que tá em teletrabalho, ele também
sofre sobrecarga de trabalho, pode sofrer sobrecarga de trabalho. (G8)
[...] às vezes o outro cargo, ele às vezes por conta da matéria mesmo, é
uma Promotoria que é mais travada. Então ela também não tem um fluxo
tão rápido quanto o da outra. Então pode ser que o servidor fique, trabalhe
junto com um Promotor, e tipo ele fique muito congestionado, ele vai ficar
com mais processos do que um que trabalha em outro cargo [...] (G6)
Nessa perspectiva, Franco (2022) destaca que um relevante fator a ser
considerado quanto ao bem-estar dos trabalhadores é o engajamento. Esclarece que
o teletrabalho gera modificações que impactam diretamente as pessoas e o ambiente
de trabalho, sendo capaz de gerar engajamento ou exaustão do indivíduo (Franco,
2022). Schaufelli e Bakker (2004) afirmam que o engajamento é caracterizado por vigor
(elevado nível de energia e resiliência mental enquanto trabalha), dedicação (senso
de significância, entusiasmo, inspiração, orgulho e desafio) e absorção (concentração
e envolvimento com a realização do trabalho). A exaustão se refere ao esgotameto
da energia, constatando-se que a exaustão emocional também está relacionada
às demandas do trabalho, tais como pressão de tempo e sobrecarga de trabalho
(Schaufelli & Bakker, 2004). Verifica-se, então, que o aumento da produtividade exigida
ao teletrabalhor, em busca da eficiência organizacional, pode gerar uma sobrecarga de
trabalho capaz de impactar diretamente sua saúde mental, a depender das demandas
de trabalho que sobrevierem à adesão ao programa.
A tensão está relacionada ao elemento das “características organizacionais”
(valores gerais, objetivos), visto se tratar de organização pública e, assim, a eficiência
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ser princípio da gestão. Não há registro de levantamento sobre satisfação e bem-estar
feito com os teletrabalhadores, de maneira a oportunizar relatos quanto a eventual
sobrecarga de trabalho ou outros desconfortos irrazoáveis gerados pela quantidade
de tarefas imposta. Portanto, a dimensão qualidade de vida só aparece na norma
e não favorece a gestão a identificar e corrigir excessos na cobrança de resultados
e prejuízos dela decorrentes. Instrumentos que assegurem comunicação livre do
servidor, viabilizando ações para entendimento e estabelecimento de consensos,
direcionariam a gestão para elementos de racionalidade substantiva.
Verificou-se, ainda, que no processo organizacional referente ao controle há
relevante atuação da DIADM e da chefia imediata (membro ou servidor a quem o
teletrabalhador está diretamente subordinado). Para ingressar no programa, o servidor
faz um requerimento, com anuência da chefia imediata, que é então encaminhado à
DIADM para elaboração do plano de trabalho, documento que prevê o período, o local e
as metas a serem cumpridas pelo participante na realização do trabalho remoto (MPPB,
2022a). Considerando a necessidade de entender o ambiente em que o teletrabalho
será executado, bem como as demandas inerentes, há, no plano de trabalho, o
auxílio da chefia imediata para que a meta de produção seja fixada não apenas
com base em critérios quantitativos. Leva-se em consideração, também, aspectos
como a complexidade das atividades e a modalidade do teletrabalho. Ressalta-se
que o ingresso no programa de teletrabalho é voluntário, diferentemente do trabalho
remoto compulsório do período pandêmico. Assim, o plano de trabalho é assinado
pelo teletrabalhador, que reconhece o que deverá cumprir mediante pactuação – uma
espécie de entendimento que revela a presença de racionalidade substantiva.
Por outro lado, a depender da necessidade dos setores do MPPB, há meta
extra firmada para o teletrabalhador a ser cumprida em local diverso, sem prejuízo de
suas atribuições na unidade de lotação, sujeitando-o a mais de uma chefia imediata
simultaneamente. Em decorrência, além da necessidade de tratar diretamente com
mais de um superior hierárquico, sujeitando-o a uma dupla avaliação e controle, o
teletrabalhador pode se deparar com realidades funcionais completamente distintas,
em setores com processos internos diferentes, maior diversidade de relacionamentos
interpessoais e aumento das comunicações. Gera-se, assim, intensidade em termos
de tempo e atenção do teletrabalhador, que já está submetido a carga de trabalho
maior gerada pela meta de produção superior àquela exercida em trabalho presencial.
As condições individuais do teletrabalhador (físicas, mentais e emocionais)
não são abordadas pelos informantes em relação à múltipla lotação, relatada como
prática normalizada na instituição entre os participantes do programa. Apesar do
reconhecimento, por parte dos gestores, da necessidade de exame subjetivo, além
da objetividade de metas numéricas, não há menção a riscos causados ao indivíduo
em razão do excesso de informações, ações e relações funcionais geradas pelo
exercício simultâneo de funções em mais de uma unidade. Revela-se, mais uma vez,
prioridade ao desempenho individual, centrado na utilidade do teletrabalho (elemento
de racionalidade instrumental). A tensão se manifesta, aqui, pelo elementos das
“preferências pessoais e organizacionais” (divergências ou mistura de objetivos). Por
um lado, o programa objetiva promover caminhos para a autorrealização e autonomia
do teletrabalhador, mas, tendo a eficiência como finalidade intrínseca à sua estruturação
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e funcionamento, adota ações que priorizam o desempenho organizacional, com
ênfase prioritária no cálculo e nos fins.
A meta extra estabelecida ao teletrabalhador, que é condição para participar do
programa, pode ser utilizada para suprir insuficiência de pessoal em setores diversos,
o que deve ocorrer, segundo o Art. 3º do Ato PGJ n.º 04/2022, de forma temporária.
Constata-se, todavia, que teletrabalhadores têm cumulado serviços por anos em
Promotorias diversas da sua lotação original, a exemplo da Promotoria de Alagoa
Grande – que foi contemplada com teletrabalhador desde o lançamento do primeiro
edital do programa (MPPB, 2019) e continua utilizando o trabalho de teletrabalhadores
com mais de uma lotação (MPPB, 2023). Descaracteriza-se, assim, a temporariedade
da supressão da insuficiência de pessoal.
A literatura, segundo Franco (2022), indica que a sobreposição de demandas
de trabalho sobre os recursos (organizacionais e pessoais) podem levar ao estresse
crônico, capaz de evoluir para a síndrome de burnout. A 11ª revisão da Classificação
Internacional de Doenças (CID-11) da Organização Mundial da Saúde (OMS) descreve
o burnout como um fenômeno ocupacional, resultante, assim, do contexto vivenciado
no local do trabalho, com características específicas descritas em três dimensões: “1)
sentimentos de esgotamento de energia ou exaustão; 2) aumento da distância mental
do trabalho ou sentimentos de negativismo ou cinismo relacionados ao trabalho; e 3)
uma sensação de ineficácia e falta de realização” (CID-11, 2023).
A síndrome de bournout decorre de um gerenciamento malsucedido do estresse
crônico gerado no local do trabalho (CID-11, 2023), que pode decorrer, entre outras
situações, do excesso de exigências e sobrecarga de trabalho em geral, tema da
mais alta relevância a ser considerado pela gestão. Assim, a distribuição e provimento
adequado de cargos entre as unidades ministeriais, lotando servidores em número
suficiente para atender a demanda setorial, considerando também a possibilidade
de execução da meta extra na própria unidade de lotação, tornaria desnecessária a
atuação concomitante dos teletrabalhadores em mais de uma unidade de lotação.
Centrado em elementos de racionalidade instrumental, esse tema encontra dificuldade
de chegar à Comissão de Gestão do Teletrabalho por conta das deficiências apontadas
anteriormente. Tal iniciativa – pela participação e entendimento – incorporaria elementos
de racionalidade substantiva no caso.
Divisão de tarefas
No MPPB, onde todos os processos são virtuais, há variedade de tarefas passíveis
de realização por meio das TICs, incluindo tanto as vinculadas à atividade finalística
quanto as de atividades-meio. As atividades desenvolvidas pelo teletrabalhador são
descritas no plano de trabalho, com a participação da chefia imediata, especialmente
nos setores administrativos, em que são efetivadas tarefas de diferentes naturezas
e complexidades, nem sempre sendo possível a aferição da produtividade pelo
sistema Thoth. Realiza-se, assim, avaliação caso a caso das funções do servidor
e necessidades do ambiente para se definir os tipos e quantidades de atividades
adequadas a determinado teletrabalhador.
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A tensão observada na temática da divisão de tarefas ocorre no quesito da
aptidão individual do teletrabalhador. Três gestores (G1, G2, G3) apontaram que as
tarefas desempenhadas figuram dentre as funções inerentes às atribuições do cargo
do servidor, respeitando, quando da definição das metas extras, a compatibilidade da
necessidade do setor com a atribuição legal e expertise do teletrabalhador. Entretanto,
a maioria dos entrevistados (G4, G5, G6 e G8) relatou que as tarefas são estipuladas
de acordo com a necessidade da unidade de trabalho onde serão desenvolvidas, sem
considerar as aptidões individuais do teletrabalhador. Nesse caso, a tensão surge
mais uma vez no elemento das “preferências pessoais e organizacionais” (divergência
ou mistura de objetivos). A gestão, ao providenciar o atendimento das demandas
da instituição, prioriza exigências de produção, realocando a força de trabalho dos
participantes do programa para setores demandantes, independentemente de consenso
e com motivação eminentemente voltada ao cálculo, beneficiando-se dos resultados
produzidos. Não há diálogo com o teletrabalhador sobre disponibilidade e, menos
ainda, a possibilidade de autorrealização (elemento de racionalidade substantiva)
considerada pelas competências e habilidades individuais.
Sem olvidar as singularidades da organização pública, a aplicação da ferramenta
gerencial de gestão por competências, levando em conta as capacidades individuais
do teletrabalhador para cumprimento de determinadas tarefas, pode favorecer tanto
a qualidade dos serviços, que passam a ser prestados pelo servidor com maior
qualificação para a atividade específica, quanto o teletrabalhador, por meio da
oportunidade de autorrealização no ambiente de trabalho ao estabelecer conexão
entre as atividades que precisa exercer e o domínio e capacidade de execução.
Esse alinhamento entre interesses individuais e organizacionais expressaria
equilíbrio entre as racionalidades instrumental e substantiva, concretizando uma
abordagem multifacetada que possibilitaria o êxito do programa, atendendo aos
aspectos dos indivíduos, do trabalho e da organização (Allen et al., 2015).
Conclusões
O presente estudo foi além de conteúdos já analisados anteriormente em
publicações acadêmicas, como vantagens e desvantagens do teletrabalho ou impactos
e perspectivas de sua execução, abordando o teletrabalho na Administração Pública
sob a perspectiva da racionalidade. Ateve-se a processos administrativos específicos
no âmbito da gestão de programa de teletrabalho, apresentando como ocorrem
tensões entre as racionalidades no que se refere ao exercício do poder hierárquico
e à normatização, ao controle e à divisão de tarefas. Ampliando o debate teórico a
partir da verificação empírica, traz análise da racionalidade em suas expressões
instrumental e substantiva na gestão do teletrabalho no setor público a partir de
elementos manifestados na prática administrativa no MPPB.
Aponta, dentro dos parâmetros categorizados e dos limites do conteúdo dos
dados coletados, fatores que ocorrem e a maneira como se manifestam. Conforme
delineado no referencial teórico e, em sequência, demonstrado pelos dados coletados
a partir de experiências empíricas de gestores, a tensão pressupõe a existência
tanto de elementos da racionalidade substantiva quanto da instrumental, surgindo
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justamente quando da coexistência decorrem circunstâncias que geram reações
indesejadas nos indivíduos, com reflexos nas organizações. Não há que se falar,
portanto, em ocorrência exclusiva de um ou outro tipo de racionalidade na gestão do
programa de teletrabalho, mas, sim, de conjunção de elementos que se apresentam
mediante predominância de racionalidade instrumental.
A despeito da submissão dos gestores à formalidade imperiosa do regime jurídico
de direito público, marcado pelo rigor da legalidade, há espaço e possibilidade de
concretização de ações substantivas. A própria implementação de um programa de
teletrabalho, oportunizando aos servidores uma opção de execução de tarefas distinta
da presencial, por si só, representa elemento de racionalidade substantiva quando
amplia escolhas no contexto de vida laboral. Todavia, a ênfase na eficiência, amparada
na ideia de utilidade dos atos humanos para a produção, gera condições que reduzem
o trabalhador a mero mecanismo de obtenção de resultados para a organização, sem
considerar as múltiplas necessidades humanas não restritas ao êxito quantitativo de
produção na atividade profissional.
No caso do programa de teletrabalho do MPPB, os resultados demonstram
que a racionalidade substantiva pode se manifestar pela pactuação das metas de
produção com a participação do teletrabalhador, viabilizando consenso/entendimento
entre servidor e gestão. No mesmo sentido, a presença de representantes dos
teletrabalhadores na Comissão de Gestão do Teletrabalho, ainda que não tenha
se efetivado na prática, garante o direito de ser exigida. No entanto, é necessário
ressaltar que a inexistência de concreta participação dos representantes dos servidores
na comissão acarreta entraves à democratização da gestão, tais como a falta de
atenção às necessidades dos teletrabalhadores e a impossibilidade de influenciarem
formalmente na elaboração e alteração das normas reguladoras do programa, o que
se mostra incompatível com a essência constitucional do Ministério Público, com
atribuição de defender o regime democrático, devendo assegurá-lo também no âmbito
interno da instituição.
Por outro lado, elementos de racionalidade instrumental se sobressaem pela
rigidez normativa que limita a flexibilidade no serviço público. A priorização dada
à busca por produtividade, redução de custos e aproveitamento máximo da força
de trabalho, inibindo preocupação com a qualidade de vida do servidor, é outro
indicador da predominância de racionalidade instrumental, em que pese a previsão
na norma. Deve-se registrar que a ausência de medidas eficazes de proteção da
saúde do teletrabalhador pode ensejar sérios riscos ao bem-estar dos participantes do
programa, inclusive gerando adoecimento físico e mental. Mais uma vez, a composição
meramente formal da Comissão, sem a efetiva atuação de servidor da área de saúde
da instituição, indica que questões sobre segurança, saúde e higiene do trabalho
podem estar sendo negligenciadas na execução do programa, necessitando-se adotar
providências para garanti-las no cotidiano organizacional.
Como contribuição do estudo, de forma a garantir aplicabilidade aos resultados
da pesquisa, foram traçadas possibilidades de ajustes para a gestão do programa
de teletrabalho do MPPB. Compete aos gestores abrir diálogo para tratar as
tensões existentes entre as racionalidades instrumental e substantiva mediante a
institucionalização de avaliações seguidas de reflexão crítica.
121 Geso do teletrabalho na administração Pública: entre as racionalidades instrumental e substantiva
Geso & Conexões (ManageMent and ConneCtions Journal). Vitória (Es), v. 14, n. 1, p. 103-124, jan./abr. 2025.
Em contrapartida, como limitação da pesquisa, merece destaque a não
participação do PGJ. Como autoridade máxima do MPPB, a quem compete o
direcionamento e deliberação superior da instituição, a efetivação do programa de
teletrabalho sujeita-se às suas disposições, dentro do exame de conveniência e
oportunidade da administração pública. Além dessa limitação, a pesquisa ficou restrita
a entendimentos dos gestores do programa. Assim, para viabilizar novos olhares sobre
o tema da racionalidade no teletrabalho nas organizações públicas, estudos futuros
podem efetivar a análise sob a perspectiva dos teletrabalhadores e em relação a
outros processos organizacionais previstos originalmente no modelo de Serva (1997),
a exemplo da satisfação individual, de grande relevância no estudo da abordagem
organizacional substantiva.
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