
Implicações entre avanço teleológico e retorno às origens: a aventura da Geometria em Husserl
Implications between teleological advancement and the return to origins: the adventure of Geometry in Husserl
Carlos D. Côrtes Tourinho [1]
UFF – Universidade Federal Fluminense
Recebido: 29/12/2024
Received: 29/12/2024
Aprovado:29/12/2024
Approved: 29/12/2024
Publicado: 31/12/2024
Published: 31/12/2024
RESUMO
O presente artigo concentra-se no manuscrito de Edmund Husserl de 1936, conhecido do grande público sob o título de “A origem da Geometria”. A primeira parte do artigo aborda a hipótese husserliana segundo a qual haveria uma implicação mútua entre avanço teleológico e retorno às origens nas ciências e, notadamente, na Geometria. A segunda parte examina a passagem do mundo pré-geométrico ao universo da exatidão unívoca. Por fim, o artigo aborda as condições para o nascimento e transmissão da Geometria na concepção de Husserl: a linguagem oral, as conexões intropáticas e, sobretudo, a notação escrita.
Palavras-chave: Edmund Husserl; origem da geometria; linguagem oral; intropatia; notação escrita.
ABSTRACT
The present paper focuses on Edmund Husserl´s manuscript known by the title “The Origins of Geometry”. The first part of the paper addresses the Husserlian hypothesis according to which there would be a mutual implication between teleological advancement and the return to origins in the sciences and notably in Geometry. The second part investigates the changes from the pre-geometric world to the universe of univocal accuracy. Finally, the paper addresses the conditions for the birth and transmission of Geometry in Husserl´s conception: the oral language, the intropathic connections and, above all, the written notation.
Keywords: Edmund Husserl; origins of geometry; oral language; intropathy; written notation.
Introdução
Concebida como uma forma cultural sui generis nascida entre os gregos, para Husserl, a filosofia deve exercer, na humanidade europeia, a função “arcôntica” de toda a humanidade (Funktion als die archontische der ganzen Menschheit)[2]. O ideal da razão filosófica torna-se, enquanto “ideia de uma tarefa infinita” (Idee einer unendlichen Aufgabe), uma ideia diretriz da evolução espiritual do homem europeu, como afirma o autor em sua Conferência de Viena, em 1935[3]. Nessa mesma conferência, Husserl é categórico ao afirmar que as ciências particulares (Sonderwissenschaften) consistiriam em ramificações sistemáticas da própria Filosofia[4]. Em geral, as ciências se deixam guiar por uma ideia fim: a de se constituir como “ciência autêntica” (echter Wissenschaft), aspirando alcançar verdades que pudessem ser válidas “de uma vez por todas e para todos” (ein für allemal und für jedermann gültig)[5]. Como esclarece Husserl no § 9 da Crise das Ciências Europeias (1936), as ciências avançam, de hipótese em hipótese, sempre em direção ao infinito, guiadas por essa ideia fim[6]. Toda hipótese é, por definição, parcial e, portanto, passível de corrigibilidade. Isso não impede, contudo, malgrado o caráter parcial das realizações científicas, que as ciências – enquanto “ramos de uma Filosofia” (Zweige der einen Philosophie)[7] – vivenciem a pretensão dessa ideia fim maior – a de que tudo o que é trazido à enunciação científica possa ser dito de uma vez por todas.
Grosso modo, guiadas por essa ideia fim, aspirando realizações cada vez mais perfeitas, as ciências não poderiam avançar, em termos teleológicos, se não pudessem, no pensamento judicativo que lhes é próprio, fundar seus juízos na evidência de um estado de coisas. Com a marcha teleológica das ciências, vemos que a noção de “progresso” (Progressus, Fortschritt) não resulta de um “começo e fim” (Anfang und Fortgang) fortuitos, mas, antes sim, estaria fundada, como Husserl nos diz, “na natureza das próprias coisas” (in der Natur der Sachen selbst)[8] e, mais especificamente, na evidenciação das mesmas. Temos já aí, poder-se-ia dizer, a ideia de um avanço fundado em um retorno. Mas, se Husserl insiste, por vezes, neste ponto, é, sobretudo, para continuar a mover, nos anos 30, o que talvez seja o seu último grande esforço em denunciar as ciências de seu tempo que não deixariam de promover, sem que se apercebessem disso, certa ruptura na unidade entre a marcha teleológica das realizações científicas e o princípio de fundar na evidência das coisas e estados de coisas os seus próprios juízos. Tal ruptura tem, de certo modo, um caráter “trágico”, posto que tais ciências se tornariam responsáveis pela formação da mentalidade do homem europeu, cujo colapso espiritual tornava-se flagrante a partir da Primeira Guerra Mundial. Seja como for, a etiologia da crise dessa humanidade remete para a crise das ciências que, por sua vez, terminam, nos termos de Husserl, por “substruir” o mundo sensível pré-geométrico, espécie de “subsolo” (Untergrund) de todas as idealizações científicas e da própria Geometria, vestindo-o com uma “roupagem de ideias” (Ideenkleid), de números e operações algébricas, como se a Natureza fosse em si mesma matemática[9]. Eis, resumidamente, o teor das letras do famoso § 9 do texto da Krisis. E já na letra “a” do parágrafo em questão, na qual o autor procura descrever aspectos do mundo pré-científico (anterior às próprias idealidades científicas), o leitor se depara com três anexos. O terceiro deles – um manuscrito datado de 1936 – vem a público em 1939, por intermédio de Eugen Fink, notadamente, no nº 2 da Revista Internacional de Filosofia de Bruxelas, sob o título de “A questão pela Origem da Geometria como problema intencional-histórico” (Die Frage nach dem Ursprung der Geometrie als intentionalhistorisches Problem). Inserido, posteriormente, no volume VI da Husserliana como Anexo III da letra “a” do § 9 da Krisis[10], o texto se tornaria, nos anos 60, sob o título de L´origine de la géometrie, conhecido do grande público por intermédio da tradução – e de uma longa Introdução – feita pelo filósofo francês Jacques Derrida (1930-2004)[11]. É preciso entender, portanto, que o manuscrito em questão deve, por um lado, ser inserido como um anexo “acessório” no conjunto dos problemas do § 9 (notadamente da letra “a”) e, por outro, termina por alcançar certa independência – um caráter “marginal” – em relação a esse parágrafo. Mas, afinal, o que torna esse manuscrito tão importante nos últimos anos da vida de Husserl e, notadamente, para o aclaramento da doutrina teleológica das ciências? Eis o que iremos examinar no presente artigo.
Implicação mútua entre avanço teleológico e retorno às origens
Como vimos acima, Husserl entende que as ciências não podem, autenticamente, avançar em sua marcha teleológica se não puderem fundar na evidência de um estado de coisas os juízos que formulam sobre seus objetos. Já há aí algo como um jogo de reciprocidade (ou de implicação mútua) entre o “avanço” teleológico das ciências e seu “retorno” às coisas mesmas. A quebra dessa conexão revelaria o diagnóstico da crise vivida pelas ciências. De certo modo, a síntese entre o avanço e o retorno em questão é decisiva na elucidação da doutrina teleológica das ciências. Mas, talvez, como em nenhum outro momento, tal síntese tenha sido tão profundamente abordada como no manuscrito da Origem da Geometria. Nele, Husserl procura trazer ao leitor uma descrição fenomenológica da gênese espiritual da Geometria, entendida como um ramo da matemática pura e um extrato na marcha teleológica das ciências. Mas por que exatamente a Geometria e não outra ciência qualquer? Aqui é preciso lembrar que a crise das ciências é resultado do que Husserl identifica como uma “substrução” (substruierende) do mundo por um processo que, a partir de Galileu, vai conduzindo, pouco a pouco, as formas puras da Geometria a uma “aritmética algébrica” (algebraischen Arithmetik), isto é, as figuras geométricas receberiam, primeiramente, um tratamento numérico no qual os números empregados passariam, por sua vez, juntamente com letras, sinais de ligação e relação (+, x, =, etc.), a compor equações algébricas, por intermédio das quais a ciência poderia, então, elaborar “fórmulas numéricas” (Zahlformeln)[12]. Tudo isso, em nome de uma obstinação por aumentar, exponencialmente, as capacidades de previsibilidade das ciências, bem como o seu aprimoramento técnico. E quando se fala de uma aplicação técnica das ciências em geral, a Geometria ganha um lugar de destaque, posto que desde cedo e, portanto, prodigiosamente, revelou a sua vocação para servir aos interesses da vida prática. Mas, malgrado essa especificidade, a Geometria não deixa, enquanto um ramo da matemática pura, de ser inserida na marcha teleológica das ciências (o que vale para a Geometria vale, em grande parte, para as ciências em geral) (Dasselbe gilt für jede Wissenschaft)[13]. Porém, a “aventura” do seu avanço nessa marcha não poderia, devidamente, ser compreendida sem uma “questão de retorno” (Rückfrage) às suas origens, sem que nos interrogássemos pelo “sentido originário” (ursprünglichen Sinn) que marca o seu nascimento[14]. Afinal, ela não cessa de se edificar, como afirma Husserl, na “vivacidade de um trabalho ininterrupto” (lebendiger Fortarbeit)[15], trazendo consigo esse sentido, permanecendo, malgrado as novas formas adquiridas, como tradição milenar, mantendo-se, portanto, como “a” Geometria (“die” Geometrie) (conforme a conhecemos, tal como transmitida por nossos antepassados)[16]. O referido manuscrito coloca, efetivamente, em prática um procedimento metodológico de avançar e retroceder em “zigue e zague” (Zickzack) (anunciado na letra “l” do § 9 da Crise)[17], cuja dinâmica consiste ora em descrever o avanço teleológico da Geometria, ora em promover um retorno – poder-se-ia dizer, “arqueológico” – com vistas a aclarar o “como” do seu nascimento e da sua propagação transcultural. Em outros termos, o avanço incessante, autêntico e vivo da Geometria não poderia ser devidamente compreendido sem a elucidação de suas motivações espirituais originárias, que a acompanha ao longo dessa marcha teleológica. Aqui também avanço e retorno fazem um jogo recíproco, no qual a clareza de um traz a elucidação do outro, refletindo novamente o lado contrário, como nos diz Husserl[18]. Conforme avança em direção ao seu “horizonte de futuro geométrico” (Horizont geometrischer Zukunft), a Geometria termina por extrair novas figuras geométricas que pressupõem, como se estivéssemos diante de uma grande “arquitetura espiritual”, as figuras extraídas anteriormente que, por sua vez, pressuporiam as figuras mais elementares (segmentos de retas, círculos, triângulos etc.). Não se trata, contudo, alerta-nos Husserl, somente de um movimento procedendo sem cessar de aquisição em aquisição, mas de uma síntese contínua na qual todas as aquisições persistem conservando o sentido de ser da Geometria, formando todas, uma totalidade, de modo que, em cada presente, a aquisição total é, poder-se-ia dizer, premissa total para as etapas seguintes[19]. Debruçando-se sobre seu futuro geométrico e trazendo consigo a totalidade de seu passado, a Geometria encontra-se neste tipo de movimento, de modo que cada geômetra tem a consciência de estar engajado em uma progressão continua (no interior dessa arquitetura, nenhuma peça é independente das demais, formando uma “única teoria solidária de todas as suas partes”)[20]. Há, portanto, na descrição dessa tal “aventura” da Geometria, uma temporalidade inerente à própria marcha teleológica, na qual assistimos a mútua implicação entre o futuro geométrico e o seu passado originário. Mas a compreensão dessa marcha se torna vazia sem uma arqueologia da formação do sentido mais primitivo mediante o qual a Geometria entrou na História, constituindo-se como uma tradição milenar. Afinal, se a incorporação das novas formas geométricas pressupõe as anteriores, num primeiro começo lá na origem, não havia pressupostos para as figuras mais elementares da Geometria, mas algo como uma ação inventiva que instituiu uma nova forma de pensar. Necessariamente e a prioristicamente, algo então sucedeu ali, independentemente de quem foram, numa história de fatos, os primeiros geômetras. Torna-se, então, incontornável, uma genealogia capaz de retornar às origens da Geometria e, por conseguinte, ao seu “subsolo” pré-científico. E o que encontramos na pré-história da Geometria? É o que examinaremos a partir de agora.
No “subsolo” da Geometria: do mais ou menos à exatidão unívoca
Husserl dedica à letra “a” do § 9 da Parte II da Crise das Ciências, bem como ao Anexo II dessa letra, uma descrição das relações originárias do homem com as coisas a seu redor na vida da experiência pré-científica (Im vorwissenschaftlichen Erfahrungsleben)[21]. Deparamo-nos com comunidades de homens, com coisas as quais se referem e, como pano de fundo, com o mundo ao qual pertencem (entendido como um horizonte de suas existências, de suas preocupações reais e possíveis). Em comércio espiritual uns com os outros, formando comunidades de linguagem, esses homens se remetem às coisas de seu mundo circundante, identificando-as através de tipos morfológicos (tais como, “redondo”, “linear” etc.). Tais “tipos” assegura a essa humanidade a possibilidade de re-identificar, ainda que de modo inexato, coisas a seu redor. Mas essa esfera pré-científica da relação dos homens com o mundo é também uma esfera de oscilações, de um “rio heraclitiano” (heraklitischen Fluβ) de dados “sensoriocoisais” (sinnendinglichen) (como prefere Husserl no Anexo II)[22], oscilação daquilo que é da ordem de uma “tipologia empírica normal” (normalen Erfahrungstypik) (a identidade das coisas consigo mesmas, o seu “ser igual a si mesmas” e perdurar temporariamente na igualdade é uma mera aproximação). Afinal, as coisas que “caem” sob um determinado tipo encontram-se, num dado contexto, como mais ou menos redondas, lineares, lisas etc., sempre em uma gradação um tanto quanto imprecisa. Algumas delas se mostram, num dado momento, mais perfeitas do que outras, variando conforme passamos de um contexto a outro. Tal imprecisão não afeta, em geral, a vida prática habitual dos homens que, por sua vez, já lançam mão de um sistema de medidas, em que pese o seu alcance ser também limitado e, neste sentido, poder-se-ia dizer para fins domésticos. Temos, então, um cenário pré-científico no qual os homens se remetem a “tipos morfológicos” que, em resumo, são como que idealidades objetivas “inexatas” (mas que terminam por cumprir um papel importante, porém, no registro daquilo que é “mais ou menos” perfeito). Além disso, tais homens fazem já uso de uma teoria da medida, mas de alcance limitado, posto que restrito ao atendimento de pequenas demandas e interesses mais imediatos da vida prática (tal como na contagem das ovelhas que retornam do pastoreio ao final da tarde, por exemplo)[23]. Se num primeiro momento as oscilações contextuais, a inexatidão no uso dos tipos morfológicos e a limitação da técnica de medição não incomodam os homens, atendendo a seus interesses cotidianos, aos poucos, tais aspectos da relação pré-científica dos homens com o mundo atenderá o interesse de alguns, mas não mais de todos. Afinal, as referidas oscilações inviabilizam uma transmissão – unívoca e exata – da identidade atribuída às coisas pelos homens. No mundo do “mais ou menos” ou do “aproximadamente” (como diria um antigo colaborador de Husserl em Göttingen, o filósofo francês de origem russa, Alexandre Koyré, em seu artigo de 1948)[24], as coisas não conseguem perdurar identicamente como as mesmas para além do contexto no qual estão inseridas[25]. Importante destacar que a intenção de equidade na preparação dos terrenos na agrimensura, nos projetos para a construção de habitação etc., não deixaria de indicar um prenuncio de mudança neste cenário. Acompanha essa intenção uma demanda por maior exatidão na descrição, por uma teoria da medida com maior alcance e por um interesse pelo que é tecnicamente mais refinado em um horizonte aberto de melhoramento, no qual o ideal de perfeição vai deslizando “sempre mais além” (immer weiter hinaus)[26]. Husserl detém-se, então, em meio a essa descrição do mundo pré-científico, nas motivações originárias as mais primitivas, responsáveis pelo nascimento da Geometria e, notadamente, por sua inserção na História. Debruça-se sobre a figura de um protofundador da Geometria, cuja ação fundadora nasce da relação desse indivíduo com o material bruto (não idealizado em termos de exatidão) do mundo pré-científico. O autor é claro no manuscrito da Origem da Geometria que não se trata de fazer, nessa descrição da gênese espiritual da Geometria, um levantamento filológico-histórico de quem foram os primeiros geômetras, responsáveis pela formulação das primeiras proposições, demonstrações e teorias geométricas[27]. Ainda que, em geral, nós não saibamos nada ou aproximadamente nada do que de fato se passou no começo, é preciso dizer, afirma-nos o autor, que neste “não saber” (Nichtwissen) se tem sempre e essencialmente um “saber implícito” (implizites Wissen), cuja presença oculta nos convoca a sua explicitação[28]. Posto que a Geometria teve um primeiro começo, uma primeira aquisição a partir da qual pôde se inserir na História, é preciso promover, nos termos do autor, uma “questão em retorno” (Rückfrage), compreendendo, por um procedimento genealógico (por uma “história das profundezas”, “sem datas”, nos termos de Merleau-Ponty)[29], o que teria acontecido para que tal inserção se tornasse possível. Como nos diz Husserl: “homens e humanidades passadas existiram, aos quais pertenceram os primeiros criadores que a partir de materiais disponíveis, brutos e já informados pelo espírito, deram forma ao novo”[30]. Mas o que teria, afinal, acontecido, para que a sucessão do “não-geométrico” para o “geométrico” se efetivasse? Vejamos.
Condições para o nascimento e instauração da Geometria na História
De imediato, para que essa sucessão se efetivasse, foi preciso que um protofundador pudesse ter intuído o projeto (Vorhabe) de uma ciência exata de medição da Terra (uma “Geo-metria”), matemática pura de figuras espaciais. Mas, que pudesse ter antevisto também o sucesso efetivo desse projeto entre os homens (no sentido de um lidar com idealidades objetivas exatas, transmitidas a todo tempo e lugar; idealidades cuja validade incondicionada autorizaria uma aplicação independentemente de contextos). Tal projeto conteria um método unívoco no qual figuras geométricas poderiam ser, gradativamente, extraídas de figuras mais elementares, tais como, retas, círculos, triângulos, precedidos, por sua vez, por um plano e seus infinitos pontos sobre os quais se entrecruzariam infinitos segmentos de retas. Abria-se, com isso, e essa foi, segundo Husserl, a grande descoberta responsável pela criação da Geometria, a possibilidade de gerar, por esse método sistemático e unívoco, todas as figuras ideais em geral imagináveis[31]. Mas Husserl não hesita em se colocar a seguinte questão: se a intuição desse projeto nasce do psiquismo de um protofundador, como daí, de um domínio intrapsíquico (innerpersonalen) e, portanto, “psicológico”, nasceria a idealidade geométrica (geometrische Idealität), exata (absoluta e universal), passível de uma propagação intersubjetiva e transcultural entre os homens?[32] Afinal, quando nos referimos a uma mesma objetidade ideal (idealen Objektivität), como ocorre com os objetos geométricos, remetemo-nos a algo da ordem de um “estar ai”, acessível, objetivamente, a qualquer um (“jedermann”), “aos matemáticos reais e possíveis de todos os povos, de todos os séculos, e sob todas as suas formas particulares”[33]. Quais foram às condições para o surgimento e deflagração unívoca de tais idealidades junto a essa humanidade, para além da vida psíquica desse protofundador? Sem dúvida nenhuma que o caráter prodígio da Geometria para servir, univocamente e numa escala infinitamente maior, à vida prática teve a sua importância para acelerar a disseminação da Geometria. Mas isso não explica como se deu essa passagem do que era intrapsíquico para o que se tornou intersubjetivo. Inicialmente, Husserl nos chama atenção para certa capacidade subjetiva daquele que anteviu o projeto da ciência geométrica. É preciso destacar, primeiramente, na esfera intrapsíquica, que o projeto intuído se evidenciou, “um dia” (dereinst), na atualidade de uma primeira produção – de um presente da “primeira vez” (erstmalig) – para a consciência pessoal desse protofundador[34]. Porém, essa evidência originária não dá lugar a nenhuma aquisição persistente que pudesse se manter objetivamente como a mesma (tal como vemos nos objetos geométricos), uma vez que, enquanto uma evidência “viva”, ela é transitória e degenera rapidamente, esvaindo-se em um fluxo temporal, no qual o que foi retido enfim se esvanece. Mas o passado esvaecido pode ser, assinala Husserl, despertado e revivido ativamente, através de uma faculdade de reativação, capaz de reproduzir, com evidência, o que foi intuído. Todavia, esclarece-nos o autor que estamos ainda no âmbito das faculdades subjetivas desse protofundador e, por conseguinte, não temos assegurado ainda a garantia de nenhuma objetividade como aquela encontrada nos objetos geométricos. Seja como for, tal capacidade de reprodução exigiu, por sua vez, que esse indivíduo pudesse, linguisticamente, expressar o que ele próprio intuiu como um novo projeto de idealização. Isso não seria possível se não tivesse a seu dispor a linguagem e a imensa extensão de suas consignações (do que ela própria torna possível em termos de transmissão), se não constituísse, com outros homens, uma comunidade de linguagem (Sprachgemeinschaft), permitindo, intersubjetivamente, a expressão de objetos geométricos para si e para outros com os quais interage habitualmente. À função da linguagem, acrescenta-se, junto a essa comunidade de homens, uma capacidade de conexões intropáticas (de se colocar no lugar do outro, supondo-o como alguém capaz de compreender, em um discurso comunicativo, o que está sendo transmitido). Essa comunidade é, portanto, uma comunidade dotada da função de linguagem e de uma capacidade recíproca de compreensão. Neste sentido, a humanidade é para cada homem uma comunidade que pode se exprimir na reciprocidade, de modo que nela todos podem também se referir a um estado objetivo de tudo o que se encontra aí, no mundo ambiente dessa humanidade[35]. Na compreensão mútua pela linguagem, essa comunidade de homens assiste à produção originária ser re-compreendida por seus membros[36]. Como assinala Husserl, as produções humanas podem se propagar em uma comunidade de pessoas, penetrando enquanto as mesmas na consciência uns dos outros[37]. Mas, tais funções de linguagem e de conexões intropáticas não são suficientes para evitar que Husserl retome, no manuscrito da Origem, a questão inicialmente colocada: o que fez com que os objetos geométricos perdurassem intersubjetivamente, identicamente como os “mesmos”, para além da vida psíquica daquele que intuiu o projeto propriamente dito da Geometria?[38] Malgrado a importância da linguagem e da intropatia para que a Geometria pudesse se constituir, por transmissão, como uma tradição entre os homens, Husserl nos alerta que tais funções não assegurariam ambas, por si mesmas, a permanência intersubjetiva das idealidades geométricas – no sentido de uma “presença perdurante” (verharrende Dasein) ou de um “ser para sempre” (immerfort-Sein) de tais idealidades que persistiria no tempo, mesmo que seu inventor (Erfinder) não estivesse mais em vida. Afinal, se a comunicação oral libertou tais idealidades da vida intrapsíquica desse inventor da geometria (permitindo, ainda que de forma restrita, um compartilhamento das mesmas com os demais homens), não foi, todavia, suficiente para libertá-la da comunidade na qual se instituiu. Seria o exílio nessa comunidade de protogeômetras o destino inevitável dos objetos geométricos? Husserl mostrará que não exatamente. Apesar dessa insuficiência, há algo em especial na linguagem que Husserl identificará como assumindo uma função decisiva determinante para a introdução da Geometria na História. Eis um momento decisivo no texto da Origem da Geometria. Husserl se volta para a linguagem mediante a qual a geometria pôde ser transmitida, não no sentido de se fazer um estudo filológico da mesma, mas de se acentuar um aspecto que, aos olhos do autor, será decisivo. Husserl compara, então, as idealidades objetivas da Geometria com as demais idealidades da língua falada pelos homens[39]. O autor nos chama atenção para idealidades cujo conteúdo semântico se mantém o mesmo, malgrado o seu encadeamento com o contexto histórico de um dado idioma. Por exemplo, as palavras Löwe (no alemão), Lion (no inglês), Lion (no francês) remetem-nos, em que pese suas diferenças físicas (o aspecto gráfico e o complexo fônico articulado para pronunciá-las) e históricas nos respectivos idiomas, para uma mesma unidade ideal de significação que, nesse caso, encontra-se, enquanto a mesma, digamos “encadeada” a cada um desses idiomas. Mas, em se tratando de objetos geométricos (segmentos de retas, círculos, triângulos, etc.), não encontramos tal encadeamento, no sentido de que as idealidades geométricas são idênticas em todos os idiomas. Ou seja, não há tradução de uma figura geométrica de um idioma para outro, o que a torna, plenamente, transmissível junto às comunidades de homens, sem que haja qualquer encadeamento a esse ou aquele idioma falado (afinal, como nos lembra Husserl: “A geometria é identicamente a mesma na ‘língua original’ de Euclides e em todas as ‘traduções’”)[40]. Mas, é justamente aí que um ponto merece ser destacado: a Geometria como um ramo da matemática pura supõe uma teoria da medição de ângulos, distâncias etc. (e, portanto, supõe uma teoria dos números) que, por sua vez, necessariamente, se apoia na “notação escrita”[41]. Uma teoria dos números não poderia se desenvolver sem que pudesse se apoiar em tal notação e em tudo o que ele torna consignável. E isso valeria mesmo para uma teoria da medição rudimentar, como aquela que encontramos na pré-história da Geometria. Curiosamente, se as idealidades geométricas não se encontram encadeadas a idiomas (como notamos, por exemplo, com a palavra “leão”), não deixam, contudo, de supor uma teoria dos números e, ao fazê-lo, se apoiam na expressão linguística escrita para que possam ser transmitidas como uma produção humana que se consolidará, na História, como tradição[42]. Aqui, encontramos também certo paradoxo na relação da Geometria com a linguagem. Desencadeada deste ou daquele idioma, livre de qualquer tradução (posto que os objetos geométricos perpassam, enquanto os mesmos, todas as línguas), a Geometria se vê forçada a um retorno à linguagem – notadamente, ao signo gráfico – tomando-o, nos termos de Derrida, como uma espécie de “caução da objetividade”[43], capaz de assegurar, como diz Husserl, “sem alocução pessoal direta ou indireta” (“[...] ohne unmittelbare oder mittelbare persönliche Ansprache”)[44], a sua entrada na História. Sem a escritura (ou “sedimentação linguística”)[45], a linguagem permaneceria ainda refém de uma dada comunidade de homens que interagiriam, uns com os outros, tão somente pela comunicação oral. Neste sentido, como assinala Derrida: é preciso que os objetos geométricos sejam “ditos e escritos”, para que possam, efetivamente, ser “emancipados” da comunidade na qual foram instituídos. “Paradoxalmente, é a possibilidade gráfica que permite a última liberação da idealidade”, afirma o autor em sua famosa Introdução ao texto da Origem[46]. Com essa dupla emancipação (oral e escrita), a Geometria alçaria, enfim, o seu “voo” definitivo na História. Como foi dito, a compreensão da marcha da Geometria em direção ao seu horizonte de futuro, incorporando, conforme avança, novas figuras que se juntam às anteriores, torna-se indissociável de uma “questão de retorno” às motivações espirituais originárias responsáveis pelo nascimento e transmissão do projeto geométrico. Na origem, algo sucedeu no mundo pré-geométrico. Deu-se, poder-se-ia dizer, uma conversão do inexato na exatidão: o que era mais ou menos redondo verteu-se em “círculo”, o que era mais ou menos linear em “reta”, e assim por diante. No lugar de tipos morfológicos mediante os quais os homens poderiam re-identificar coisas ao seu redor, numa gradação de maior ou menor redondeza, linearidade etc., tem-se agora – como um gênero novo do pensar puro – idealidades objetivas exatas que vale para todo o mundo o tempo todo, para todos os matemáticos (do presente ou do passado). No lugar de uma matemática “doméstica”, de alcance limitado, tem-se agora uma teoria da medição de longo alcance (que permite operar com números exponencialmente altos, em uma linguagem algébrica) e um método unívoco no qual novas figuras são extraídas a partir de figuras elementares, tais como, segmentos de retas (que, por sua vez, supõe um plano e infinitos pontos), círculos, triângulos etc. Temos, então, na origem, como resultado dessa ação inventiva e fundadora, uma sucessão de conversões do não-geométrico para o geométrico, uma “substrução originária”, através da qual o “mais ou menos” (inexato, limitado etc.) se converte na exatidão (no que é absolutamente idêntico, objetivo, unívoco etc.). Consolida-se, nos termos de Derrida, o “imperativo da univocidade”, “[...] condição de uma comunicação entre as gerações de pesquisadores, não importa a qual distância. Ela assegura a exatidão da tradução e a pureza da tradição”[47]
Considerações Finais
Por fim, Husserl é claro em afirmar que, como tradição, a Geometria somente pôde avançar, autenticamente, em direção a um horizonte de futuro, infinitamente aberto, incorporando novas figuras às anteriores, na medida em que, nesse avanço, preservou uma intenção objetiva do seu começo e do seu fim. Mas Husserl alerta que a possibilidade de um avanço que não se tornasse sensível às motivações originárias seria um avanço vazio e inautêntico (e, de certo modo, “perigoso”). Em que pese a Geometria implicar, desde as suas origens, em uma teoria da medição e numa vocação para servir à vida prática, isso não a impediu de passar, a partir de Galileu, conforme observa Husserl no § 9 da Krisis, por uma nova conversão na qual as formas puras geométricas seriam reduzidas a uma “aritmetização algébrica”, cuja meta consistiria, fundamentalmente, em aumentar, exponencialmente, a capacidade de previsão e de aprimoramento de técnicas de medição para servir, mais eficazmente, aos interesses da vida prática. A utilidade prática tornou-se, segundo Husserl, o motivo capital de aceleração das ciências e, em que pese o crescimento vertiginoso das mesmas, tal conversão não deixaria de ter o seu preço: o de esvaziar, na Geometria, o seu sentido originário[48]. Para Husserl, as idealidades próprias do pensar geométrico transformaram-se, por assim dizer, em operações algébricas (constituídas por letras, números, sinais de relação e de igualdade). Nos termos do autor: “No cálculo algébrico faz-se automaticamente retroceder, ou abandonar-se mesmo por completo o significado geométrico”[49]. Tudo isso implicou em um novo processo de substrução. Mas, dessa vez, sob essa nova diretriz, as ciências – e, notadamente, a Geometria – passam a avançar desconectadas do seu fim e, sobretudo, insensíveis ao seu começo, o que não deixaria de constituir um perigo crescente para a humanidade europeia. Em suma, a crise dessa humanidade torna-se indissociável da crise das ciências e essa é, por sua vez, resultado de uma quebra da unidade entre o avanço teleológico e o retorno às motivações originárias responsáveis pela inserção das ciências (e notadamente, da Geometria) na História, separando o que nessa marcha possui uma implicação mútua: a ideia fim em direção a qual avançam teleologicamente às ciências e a arqueologia do seu sentido originário.
Referências Bibliográficas
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HUSSERL, E. “Die Krisis des europäischen Menschentums und die Philosophie”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1935] 1976).
HUSSERL, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana.Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976).
HUSSERL, E. “Beilage II, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976)
HUSSERL, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976).
KOYRÉ, A. “Do mundo do mais ou menos ao universo da precisão”. In: Galileu e Platão. Lisboa: Gradiva, ([1948] 1986).
LAUNAY, M. A fascinante história da matemática. Da pré-história aos dias atuais. São Paulo: DIFEL, 2019.
MERLEAU-PONTY, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Sous la direction de R. Barbaras. Épimethée. Paris: PUF, 1998.
ROBERT, F. “Présentation”. In: MERLEAU-PONTY, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Sous la direction de R. Barbaras. Épimethée. Paris: PUF, 1998.
Carlos Diógenes Côrtes Tourinho
Doutor em Filosofia pela PUC-Rio. Professor Associado IV do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal Fluminense - UFF (Niterói-RJ/ Brasil)
Os textos deste artigo foram revisados por terceiros e submetidos para validação do(s) autor(es) antes da publicação
[1] Professor Associado IV do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal Fluminense (UFF/Niterói-RJ, Brasil). Coordenador do Laboratório de Fenomenologia – LAFE (https://laboratoriodefenomenologia.uff.br/); e-mail: cdctourinho@gmail.com.
[2] Husserl, E. “Die Krisis des europäischen Menschentums und die Philosophie”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1935] 1976), I, p. 336.
[3] Idem, I, pp. 336/338.
[4] Ibidem, I, p. 321.
[5] Husserl, E. Cartesianische Meditationen und Pariser Vorträge. Husserliana (Band I). Den Haag, Netherlands: Martinuos Nijhoff, ([1931/ 1929] 1973), § 4, p. 58.
[6] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “e”, p. 41.
[7] Husserl, E. “Beilage II, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 363.
[8] Husserl, E. Cartesianische Meditationen und Pariser Vorträge. Husserliana (Band I). Den Haag, Netherlands: Martinuos Nijhoff, ([1931/ 1929] 1973), § 4, p. 53.
[9] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “b”, p. 26.
[10] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976).
[11] Derrida, J.“Introduction”. In: Husserl, E. L´origine de la géometrie. Paris: PUF. Epiméthée, ([1962] 2010), pp. 3-171.
[12] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “g”, p. 46.
[13]Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 367.
[14] Idem, p. 365. Afinal, como assinala Franck Robert: “[...] toda gênese de sentido exige uma Stiftung, uma fundação originária”. Robert, F. “Présentation”. In: Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, p. 7.
[15] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 366.
[16] Idem, p. 365.
[17] Como diz o autor: “temos de ziguezaguiar para frente e para trás” (“wir müssen im Zickzack vor- und zurückgehen”). Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “l”, p. 59.
[18] Idem, § 9, “l”, p. 59.
[19] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 367.
[20] Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, p. 19.
[21] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), “Beilage II, zu § 9a”, p. 357.
[22] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), “Beilage II, zu §9a”, p. 357.
[23] Conforme nos lembra Alexandre Koyré: “Para os usos da vida cotidiana, era-se menos exigente: calculava-se com fichas”. Em outro trecho, citando o influente historiador francês Lucien Febvre, o autor afirma ainda que: “Nem nomenclatura clara e bem definida, nem padrões de uma exatidão garantida, adotados por todos com um alegre consentimento. Havia uma multidão incoerente de sistemas de medidas variáveis de cidade para cidade, de aldeia para aldeia, quer se tratasse de comprimento, de peso ou de volume...”. Koyré, A. “Do mundo do mais ou menos ao universo da precisão”. In: Galileu e Platão. Lisboa: Gradiva, ([1948] 1986), pp. 68/71.
[24] Koyré, A. “Do mundo do mais ou menos ao universo da precisão”. In: Galileu e Platão. Lisboa: Gradiva, ([1948] 1986), p. 60.
[25] Nesse mesmo domínio pré-científico, Koyré afirma que: “há por todo lado, uma margem de imprecisão, de ‘jogo’, de ‘mais ou menos’ e de ‘aproximadamente’”. Idem, p. 61.
[26] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “a”, p. 23.
[27] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 366.
[28] Idem, p. 366.
[29] Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, pp. 18/35.
[30] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 366.
[31] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “a”, p. 24.
[32] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 369.
[33] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 368.
[34] Idem, p. 366. Como assinala Merleau-Ponty: “[...] neste ato originário, a geometria não é senão um momento da vida pessoal”. Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, p. 24.
[35] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 370. Como assinala Franck Robert: “O poder se exprimir e a intersubjetividade tornam-se, assim, a possibilidade mesma da objetividade”. Robert, F. “Présentation”. In: Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, p. 7.
[36] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 371.
[37] Idem, p. 371.
[38] Ibidem, p. 371.
[39] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 368.
[40]Sie ist identische dieselbe in der "originalen Sprache" Euklids und in allen “Übersetsungen"; Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 368.
[41] Como afirma Mickaël Launay: “Sem dúvida não foi por acaso que a necessidade de escrever os números se mostrou tão determinante no surgimento da escrita. Pois se outras ideias podiam ser transmitidas oralmente sem problemas, parece difícil estabelecer um sistema numérico sem passar por uma notação escrita”. Launay, M. A fascinante história da matemática. Da pré-história aos dias atuais. São Paulo: DIFEL, 2019, p. 30.
[42] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 366.
[43] Derrida, J.“Introduction”. In: Husserl, E. L´origine de la géometrie. Paris: PUF. Epiméthée, ([1962] 2010), p. 92.
[44] Husserl, E. “Beilage III, zu §9a”. In: Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), p. 371.
[45] Robert, F. “Présentation”. In: Merleau-Ponty, M. Notes de cours sur L´origine de la géométrie de Husserl. Suivi de Recherches sur la phenomenology de Merleau-Ponty. Paris: PUF, 1998, p. 8.
[46] Derrida, J.“Introduction”. In: Husserl, E. L´origine de la géometrie. Paris: PUF. Epiméthée, ([1962] 2010), pp. 87-88.
[47] Derrida, J.“Introduction”. In: Husserl, E. L´origine de la géometrie. Paris: PUF. Epiméthée, ([1962] 2010), p. 101/103.
[48] Husserl, E. Die Krisis der europäischen Wissenschaften und die transzendentale Phänomenologie. Husserliana. Band VI. Netherlands: Martinus Nijhoff, ([1936] 1976), § 9, “f”, p. 44.
[49] Idem, p. 44.