As transvestigêneres e os enfrentamentos acerca do transfemicídio no Brasil
Abstract
A pesquisa é fruto da Iniciação Científica (PIBIC) realizada na Universidade Federal de São Paulo financiada (CNPq). Trata-se de questionar as estruturas sociais e as expressões do transfeminicídio nas relações sociais brasileira, utilizando de uma ótica intersecional. Como ponto de partida refletiu a colonialidade e seus ideários cis-normativo-branco, para compreensão da formação do Brasil acrescido do estudo documental da Associação Nacional de Travestis e Transexuais. Foi identificado como a etnia, articulados com identidade de gênero, orientação sexual e a classe social, influenciam na vida social em uma sociabilidade colonizada e capitalizada, a qual é opressora e destrutiva. Como resultado, a reprodução da transfobia e do racismo engendrados na estrutura social se acentuaram no contexto pandêmico. Tendo como base a necessidade acerca da superação desse “CIS-tema” de alienação, dominação e exploração, a pesquisa buscou identificar formas de atravessar o terror com esperanças de novos futuros, em que a sociabilidade não seja atravessada por relações desiguais e violentas, mas uma organização societária na qual as pessoas Trans não serão esquecidas. Analisou-se os quatro últimos dossiês da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), os quais trazem dados acerca das violências e dos assassinatos das transvestigêneres brasileiras. Desta forma, buscou-se mostrar como sendo um sistema cisgênero que só valoriza saberes e vivências heterossexuais. Tendo em vista que a ANTRA é uma das únicas associações que mapeia e mensura a realidade da população trans em âmbito nacional, esta rede tem como finalidade fortalecer ações de direitos e resgate da cidadania das travestis. No entanto, a investigação da presente pesquisa buscou trazer elementos referentes aos enfrentamentos que essa população faz contra as violências e brutalidades, mostrando, desta forma, como as travestis e transexuais não estão dispostas a negociar suas vidas. As referências bibliográficas deram suporte na fundamentação teórica da pesquisa, a qual teve como base o materialismo histórico dialético, que tem como objetivo a realidade do objeto de estudo, explicitando o que está causando os homicídios dessas sujeitas políticas. O pensamento de MARX (2019) foi o aporte teórico para fazer a crítica ao capitalismo e sua ideologia política. Para sustentar as discussões acerca do racismo no Brasil, a escritora Maria Aparecida Bento (2002), Abdias Nascimento (2016) e Eurico (2020) deram base analíticas. A contextualização do termo Transvestigêneres, cunhado pela travesti e ativista Indianara Siqueira, será analisado a partir do Puta Observatório (2020), em relação ao movimento LGBTQ+, utilizar-se-á Green (2016) Trevisan (2018), Quinalha (2016) e Berenice Bento (2014) ao tratar do transfeminicídio; com relação ao colonialismo Grada Kilomba (2019), Quijano (2005) e Césaire (2020) foram essenciais, bem como Gohn (2000) para contextualizar as questões sobre movimentos sociais; e, por fim, para falar de educação emancipadora Paulo Freire (2017. Dessa maneira, o estudo identificou a necessidade em investir em uma pesquisa exploratória, com o intuito de analisar os documentos que apontam as violências dos últimos quatro anos, para identificar as reais causas do transfeminicídio. O primeiro capítulo tratou de uma imersão histórica, do processo de formação social brasileira, partindo da ótica de que o mesmo se constituiu por meio do colonialismo brutal, e a partir daí gerou uma maneira de pensar e tratar o ser racializado e o ser desobediente de gênero dentro do território. Durante o capítulo, buscou-se observar como o imaginário social do povo brasileiro tem seus aspectos construídos a partir das perspectivas da branquitude europeia e como existe uma ambiguidade nesse imaginário, gerador de contradições, criado a partir da imagem de um povo solidário, acolhedor, amoroso, generoso e ao mesmo tempo violento, sendo neste território onde ocorre um alto índice de assassinatos de pessoas LGBTQ+ e pessoas negras, uma ambivalência que vai do desejo estereotipado à morte de determinados corpos. Assim sendo, o capítulo ocupa-se de problematizar as estruturas sociais, o transfeminicídio e o racismo a partir da ótica da colonialidade, tendo em mente o conceito de colonialidade do poder apontado por Quijano (2005), o qual vem mostrando como ao longo do tempo, como foi se criando uma dependência da América Latina em relação aos países europeus por conta da colonização, que se deu através da dominação de um grupo em relação ao outro, com diferenciação e classificação de raça/etnia, gênero e classe, por conta de interesses econômicos. O capítulo dois foi abordado questões relacionadas ao cotidiano das transvestigêneres negras brasileiras, mostrando como as violências se apresentam na vida diariamente dessas sujeitas políticas. Buscando evidenciar, como os direitos humanos estão sendo negligenciados e se existe alguma tentativa de inclusão social dessa população. Trata-se de mostrar que a história dessa população não deve ser esquecida e que a necro-Trans política está presente em seu cotidiano, conceito formulado por Achille Mbembe (2018) de necropolítica, concepção esta que pretende mostrar como o racismo age sobre os corpos das transvestigêneres negras na atualidade. Por fim, no capitulo três discutiu-se acerca de possibilidades de mudanças tendo as lutas sociais como estratégias para reduzir a violência sobre os corpos racializados negros e corpos não cis-hetero-normativo, formas de combater as opressões, através de práticas consideradas anticoloniais e de alienantes, mostrando como a defesa e a garantia dos direitos são importantes para uma população que vive à margem da sociedade, a qual a maior luta é a sobrevivência. O debate de uma educação anti-LGBTfóbia e Antirracista serão orientadores para o enfretamento das transfigurações impulsionadas e o destroçamento de práticas coloniais e alienantes nas relações sociais brasileiras.
Palavras-chave: Transvestigêneres. Transfeminicídio. Colonialismo. Direitos Humanos. Lutas.