A política pesqueira e a estratégia de modernização da pesca: considerações sobre a condução militar naval na criação das colônias de pescadores
Resumen
A trajetória das ações políticas direcionadas para a pesca no Brasil foi marcada pelo ideal de modernização da atividade, tendo o Estado como principal agente, através do projeto nacional-desenvolvimentista. Essa condução foi iniciada pela Marinha do Brasil, através do projeto de nacionalização da pesca, que percorreu todo o litoral brasileiro, criando colônias de pescadores a fim de conduzi-los à “civilização” e ao “progresso”. As ações promovidas pela instituição militar estavam alinhadas à aposta de modernização, controle e expansão da atividade pesqueira. Nesse contexto, o objetivo desse estudo é analisar as ações político-institucionais voltadas para a pesca através da condução militar que criou as colônias de pescadores no Brasil.
Houve motivações que direcionaram a Marinha a atravessar toda a costa do país com o projeto de “instruir e sanear” os pescadores brasileiros, conforme destacam os documentos analisados. Neste sentido, através de análise documental, examinamos o registro Missão do Cruzador José Bonifácio. A obra publicada em 1945, pelo Capitão de Mar e Guerra Frederico Villar, narra a expedição realizada entre 1919 a 1921, que criou mais 800 colônias a fim de regularizar e controlar a atividade pesqueira no país.
Os resultados da cruzada, comandada por Villar, estavam abraçados ao projeto de desenvolvimento nacional defendido pelo governo de Getúlio Vargas, em que o Estado assume o papel de promover as transformações que conduziriam a sociedade a uma ordem industrial moderna e ao avanço social. No próprio registro, o comandante exulta Getúlio Vargas como um grande líder que conduz a nação ao progresso.
Através da criação das colônias de pescadores e a sua regulação pela Marinha brasileira e posterior pelo Ministério da Agricultura, o Estado passou a controlar a pesca em todo o litoral brasileiro, através do registro dos pescadores e a fiscalização da atividade. Divididas em zonas de pesca, as colônias criadas a partir da Missão, disponibilizavam escolas primárias para os filhos de pescadores além de outros serviços assistenciais, como saúde, capacitação e acesso a política pesqueira, o que fortaleceu a centralização e a condução tutelar das ações. Os pescadores passaram a ser considerados como reserva naval, pela Marinha brasileira, a fim de reforçarem a defesa nacional. Desse modo, para servirem à nação, deveriam adotar técnicas modernas de pesca e assumirem valores patriotas. Ademais, no período de 1930 a 1945 foram promulgados diversos dispositivos legais que fomentaram a modernização e controle da atividade pesqueira e subsidiaram o fortalecimento da indústria de pesca e a identificação da atividade artesanal como algo obsoleto.
Os resultados da análise demonstram que a Marinha do Brasil foi a grande propulsora da intervenção estatal ao se propor conduzir os pescadores à modernização das suas atividades e abrir caminhos para a industrialização do setor na trajetória desenvolvimentista no país. Assim, se por um lado a instituição militar passou a mapear todo o litoral a fim de regular a atividade da pesca, os recursos pesqueiros e a quantidade de pescadores; de outro a passou a exercer o controle ideológico, definindo quem os pescadores deveriam ser, controlando seus modos de vida e de suas comunidades.