Servindo a dois senhores: a gestão do HUCAM entre o ensino e a assistência
DOI:
https://doi.org/10.18315/argumentum.v3i1.1441Resumo
Este trabalho analisa a gestão do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes, a fim de identificar os conflitos entre ensino e assistência. Como estudo de caso, realizou-se um levantamento dos dados através de pesquisa documental – documentos institucionais e legislações pertinentes – e entrevistas semi-estruturadas. Foram sujeitos dessa pesquisa os gestores do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes, atuantes período de 2002 a 2010, e representantes do sindicato, dos residentes, das secretarias estadual e municipal de saúde, do Conselho Deliberativo Superior do hospital e do Ministério da Educação – totalizando 12 entrevistados. Para análise dos dados utilizou-se a técnica de análise de conteúdo. Tendo como pano de fundo a contrarreforma do Estado, permeada pelo processo gradual de fragilização das políticas públicas, sobretudo nas áreas sociais, encontrou-se no Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes um cenário de déficit financeiro e insuficiência de recursos humanos, apontados pelos entrevistados como prejudiciais ao desempenho das atividades de formação de recursos humanos em saúde (em nível de Graduação e Pós-Graduação), como também à prestação de assistência em nível de alta complexidade. Os resultados apontaram que sob a missão de atender simultaneamente os interesses da formação e da assistência, o hospital universitário sofre pressões cotidianas (de diversas ordens), como fruto das relações de forças – externas e internas – que sobre ele interferem. O cenário de conflitos que “amarram” a gestão da instituição aqui estudada, mascara os ideais privatizantes implícitos no projeto neoliberal, os quais apontam os aspectos financeiros e de gestão como os únicos fatores causais da crise nos hospitais universitários. Nesse sentido, a sobreposição das ações de assistência sobre a atividade de ensino, ainda que não apareça como uma opção individual da instituição, é justificada como estratégia de sobrevivência financeira do hospital, bem como as legislações referentes e inseridas nesse contexto caminham gradualmente para a transformação dos hospitais universitários em apenas prestadores de serviços, sob administração privada. Conclui-se que a gestão do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes é uma arena de luta na qual as disputas de interesses entre os projetos políticos societários – neoliberal x democrático participativo – evidenciam conflitos no interior do qual perpassam intenções e necessidades do ensino; o distanciamento entre reitoria e hospital universitário; normalizações do governo federal na esfera da saúde carreando os hospitais universitários para sua transformação em Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, desvinculando sua administração das universidades; assistência a saúde estruturada pela produtividade; necessidade de modelagem dos serviços, conforme o desenho de rede de saúde pública do estado; cobranças da contratualização junto à secretaria estadual de saúde; e, a cobrança interna por parte de funcionários e alunos. Por isso, a expressão “entre dois senhores” sintetiza a expansão do projeto neoliberal sobre os hospitais universitários do país, em que a disputa ou a esquiva dos senhores – Ministério da Educação e da Saúde – reforça a fragilidade das políticas públicas e justifica a privatização dos serviços a elas inseridos.
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