Royal Society pede ‘abertura inteligente’ de dados científicos para o público
Relatório diz que não só os artigos científicos, mas os dados por trás das conclusões têm de ser divulgados
Carlos OrsiReprodução/RSRelatório publicado pela Royal Society britânica em 20 de junho, intitulado Science as an open enterprise(“Ciência como um empreendimento aberto”), pede que pesquisadores adotem uma política de “abertura inteligente” dos dados em que baseiam seus artigos e teorias, tornado-os acessíveis e compreensíveis não apenas para os colegas de área, mas também para o público em geral.
“Muitas pessoas buscam se satisfazer da credibilidade das conclusões científicas que podem afetar suas vidas. Frequentemente, por meio do escrutínio da evidência subjacente”, diz a abertura do trabalho, que foi elaborado ao longo de um ano.
Para que esse grau de abertura seja possível, no entanto, “serão necessárias mudanças que vão ao coração da empreitada científica”, afirma o texto, já que envolvem “muito mais do que uma exigência de publicação dos dados”.
Para tornar reais os benefícios da abertura de dados, argumentam os autores do trabalho, é preciso que todas as informações que levaram às conclusões do estudo estejam acessíveis e sejam fáceis de localizar; e que sejam inteligíveis para quem quiser analisá-las. “A informação precisa ser acessível de um modo que se possa julgar sua confiabilidade, e a competência de quem a criou”.
Para que esses critérios sejam preenchidos, é necessário oferecer o apoio de dados explicativos, ou "metadata". O relatório diz que o primeiro passo rumo a essa abertura inteligente será fazer com que os dados que dão base a artigos científicos estejam disponíveis, online, simultaneamente à publicação. “Estamos no limiar de um objetivo factível”, afirma o texto. "Que toda a literatura científica esteja online, que todos os dados estejam online, e que seja possível operar ambos em conjunto”.
O relatório reconhece, no entanto, que ainda persiste, em alguns cientistas, uma cultura de “avareza” em relação aos dados levantados durante o processo de pesquisa. Mesmo admitindo que “é compreensível” que as pessoas que trabalharam duro para recolher os dados se sintam relutantes em liberá-los antes de publicar as implicações mais significativas, os autores afirmam que a “avareza com os dados” é um obstáculo sério ao processo científico.
“Ela inibe a validação independente dos conjuntos de dados, a replicação de experimentos, o teste de teorias e a reutilização dos dados de modo inovador por terceiros”. O relatório recomenda que um período máximo de acesso exclusivo aos dados seja definido. “Uma dotação para pesquisa deve pré-especificar o prazo e as condições da liberação”.
Ainda persiste, em alguns cientistas, uma cultura de “avareza” em relação aos dados levantados durante a pesquisaAlguns periódicos científicos já impõem políticas de divulgação de dados para aceitação de papers, mas a obediência às normas ainda é pequena. Pesquisa publicada ano passado na PLoS ONE avaliou 50 periódicos da área biomédica, dos quais 44 exigiam algum tipo de divulgação pública dos dados por trás dos artigos publicados.
De uma amostra de 500 papers analisados, publicados em 2009, 351 deveriam ter obedecido a algum tipo de norma de divulgação de dados brutos, mas apenas 143, ou menos da metade, aderiram integralmente à regra cabível. E somente 47, ou 13%, publicaram seus dados, na íntegra, na internet.
Ouvido pelo serviço noticioso NewsBlog, da revista Nature, o principal autor do relatório, o geólogo Geoffrey Boulton, da Universidade de Edimburgo, citou, além das questões de incentivo – pesquisadores não recebem reconhecimento por divulgar dados, mas por apresentar papers – e da “avareza” de matriz cultural, uma terceira razão para explicar a ainda pouca transparência dos dados brutos no meio científico: a dificuldade em manipular o grande volume de informação gerado pelos estudos contemporâneos.
Os custos, que envolvem desde a contratação de especialistas em tratamento de dados ao armazenamento das informações, pode consumir mais de 10% da verba disponível para um projeto.
Boulton usa as respostas dadas por governos a pedidos de informação feitos pelo público como exemplos de como não divulgar dados. “Todos sabemos que alguns pedidos de Liberdade de Informação podem gerar pântanos de dados sem pé nem cabeça”, porque não são organizados de modo inteligível, acessável e utilizável – os três princípios que, segundo relatório da Royal Society, devem nortear a publicação dos dados científicos.
Fonte: Inovação Unicamp