Avaliação científica e subjetividade: o “artigo-comprimido” como síntese de uma produção científica alienante

Autores

  • Luana Silvy de Lorenzi Tezza Magnin Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ)
  • José Henrique de Faria Universidade Federal do Paraná (UFPR) https://orcid.org/0000-0003-3971-7992
  • Gustavo Henrique Petean Universidade Federal de Goiás (UFG)

DOI:

https://doi.org/10.47456/regec.2317-5087.2022.11.1.32632.8-38

Palavras-chave:

Alienação, Avaliação científica, Intensificação do trabalho, Pesquisador, Subjetividade

Resumo

Diante das mudanças dos últimos anos no campo da avaliação científica, o objetivo deste artigo é caracterizar os efeitos da relação das atuais políticas de avaliação científica da CAPES e a subjetividade dos pesquisadores públicos em Administração. O estudo qualitativo foi realizado com 13 pesquisadores com alto índice de publicação e os enunciados foram analisados a partir da filosofia da linguagem de Bakhtin. Os resultados apontam para três eixos principais: (i) perda da dimensão coletiva da universidade como instância política de reflexão e decisão; (ii) corrida cega para um fim que não é problematizado; (iii) invisibilidade da intensificação do trabalho e negação de sua relação com os processos de saúde/doença. Esses eixos, em conjunto, expressam o grau de alienação a que chegou o trabalho científico, no qual a publicação da pesquisa segundo um padrão específico torna-se mais meritória que sua própria concepção e desenvolvimento. Constata-se uma ruptura, um desencontro, entre significado e sentido, que passam a ser ocupados por vozes monológicas –  padronizantes – e que aniquilam a pluralidade que constitui, de fato, o fazer científico. Conclui-se que o desejo e o empenho dos pesquisadores em atender aos critérios de avaliação direcionam a produção acadêmica. Nota-se também a redução do exercício da autonomia e da dimensão política e social de reflexão na Academia.

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Biografia do Autor

Luana Silvy de Lorenzi Tezza Magnin, Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ)

Doutora em Administração pela Universidade Federal do Paraná - UFPR. Mestre em Psicologia pela UFPR (2014). Graduada e bacharel em Psicologia pela UFPR (2009), é servidora pública federal e ocupa o cargo de Analista de Gestão em Saúde na Fundação Oswaldo Cruz - FIOCRUZ, com lotação no Instituto Carlos Chagas - ICC/Fiocruz Paraná.

José Henrique de Faria, Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Mestrado em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - PPGA/UFRGS (1979), Doutorado em Administração pela Universidade de São Paulo- FEA/USP (1984) e Pós-Doutorado em Labor Relations pelo Institute of Labor and Industrial Relations - ILIR - University of Michigan (2003). Professor Titular Sênior da UFPR, no Programa de Pós-Graduação em Administração - PPGADM (Mestrado e Doutorado). Pesquisador PQ/CNPq. Professor Visitante da Universidade Federal Tecnológica do Paraná - Programa de Pós-Graduação em Administração.

Gustavo Henrique Petean, Universidade Federal de Goiás (UFG)

Doutor em Administração pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul; Professor do curso de Administração da Regional Goiás, Universidade Federal de Goiás.

 

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Publicado

18-01-2022

Como Citar

Magnin, L. S. de L. T., Faria, J. H. de, & Petean, G. H. (2022). Avaliação científica e subjetividade: o “artigo-comprimido” como síntese de uma produção científica alienante: . Revista Gestão & Conexões, 11(1), 8–38. https://doi.org/10.47456/regec.2317-5087.2022.11.1.32632.8-38

Edição

Seção

Artigos